terça-feira, 26 de agosto de 2025

MÁRTIR DOS GARIS, LAUDEMIR CONTINUA VIVO NA LUTA POR DIREITOS. Por Frei Gilvander

MÁRTIR DOS GARIS, LAUDEMIR CONTINUA VIVO NA LUTA POR DIREITOS. Por Frei Gilvander Moreira1

O gari Laudemir de Souza Fernandes. Foto Reprodução Redes Virtuais

Como fazia há nove anos, o gari LAUDEMIR DE SOUZA FERNANDES levantou às 2h30 da madrugada do dia 11 de agosto de 2025 e foi trabalhar, cumprir sua missão que ele fazia com muito amor: trabalhar na limpeza urbana de Belo Horizonte, MG, na Localix, uma empresa terceirizada pela Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), autarquia da Prefeitura. Porém, como a capital mineira não tem mais apenas um belo horizonte, encontrou na rua um empresário branco, bombadão, Renê da Silva Nogueira Júnior, que se intitulava como “cristão” e “patriota”. Inúmeros acontecimentos de agressão, violência e assassinatos no Brasil, em tempos de extrema-direita raivosa, têm sido praticados por pessoas que se dizem cristãs e patriotas, que destilam ódio e intolerância na convivência humana e social, o que demonstra que são falsos cristãos e falsos patriotas. Como reflexo disso a direita política ganhou as últimas eleições em Belo Horizonte e a extrema-direita disputou até no segundo turno.

Neste contexto social agressivo, o trabalhador com 44 anos, negro, de periferia, honrado, ético, cordial, ser humano com empatia, Laudemir, enquanto catava às pressas sacos de lixo, no bairro Vista Alegre, ao perceber que a motorista do seu caminhão de lixo, estava sendo ameaçada de morte por um homem branco e bombadão, que, em seu carro de luxo, aos gritos a ameaçava, Laudemir se fez solidário à motorista e tentou acalmar os ânimos do criminoso reincidente. Inesperadamente, por volta das 9h03 da manhã, Laudemir foi alvejado por Renê com um tiro certeiro e fatal desferido por meio de uma pistola calibre 380. Enquanto Laudemir limpava a rua recolhendo o lixo, seu sangue foi jogado na rua. É com o sangue dos mártires, pessoas inocentes e justas, que se escreve a história autêntica. Laudemir estará muito vivo em todos os garis e em todas pessoas que lutam por todos os direitos dos garis.

Este crime hediondo e bárbaro, execrável sob todos os aspectos, gerou comoção em todo o Brasil e foi muito divulgado pela imprensa, que deve acompanhar atenta o processo deste crime macabro que não pode cair no esquecimento e deve ser julgado rápido com o rigor das leis. Mais uma sexta-feira da paixão em Belo Horizonte com o assassinato brutal, por motivo fútil e abjeto, do Laudemir. O assassino matou e, em seguida, como se nada tivesse acontecido, foi malhar na academia, foi para a empresa, depois foi passear com cachorro até ser preso em flagrante. Acendeu-se luz vermelha em Belo Horizonte e em todas as cidades sobre as condições de trabalho dos garis.

Dia 20 de agosto último (2025), na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de MG (ALMG), sob a presidência da deputada Bella Gonçalves, aconteceu uma emocionante Audiência Pública, com transmissão pelo canal no You Tube da ALMG. Vídeo que precisa ser visto por toda a população brasileira. A mãe do Laudemir, dona Irani, não teve forças para falar ao microfone, mas a simples presença dela clamava por justiça. Liliane, a esposa do Laudemir e agora, viúva, mulher de uma fé inabalável, falou com firmeza. Em cada frase, uma espada de verdade que interpela a consciência de quem tem sensibilidade humana e empatia. Com lágrimas caindo, Liliane França da Silva clamor por JUSTIÇA: “A dor que sinto é imensa. Laudemir levantava todos os dias às 2h30 da madrugada e ia fazer o que ele amava fazer: trabalhar na limpeza urbana. Homem honrado, solidário e sempre preocupado com a família. Eu perdoo o assassino, mas exijo justiça. Meu quarto está vazio. Minha casa está vazia. Peço às autoridades: Ouçam os garis, pois eles sentem e sabem o que precisa melhorar no trabalho tão essencial que eles fazem. Respeitem os garis. Vou fazer da minha dor luta. A vida dos garis não vale menos. Que Laudemir seja o último gari assassinado. Que nenhuma mãe, esposa, filha/o tenha que chorar pela morte de outros garis. Que a morte de Laudemir não seja em vão.”

Na Audiência Pública foi denunciado que Laudemir foi morto com arma do Estado, pois o assassino Renê usou uma pistola 380, da esposa dele, a delegada da Polícia Civil, Ana Paula Balbino Nogueira. Por que o assassino usava a arma da delegada? Ela consentia com o uso da arma dela? A Corregedoria da Polícia Civil apreendeu a arma e está investigando a eventual participação da delegada no crime. O criminoso reincidente tinha porte de arma? Se não tinha, ele pediu porte de arma? Se pediu e não conseguiu, por quê? Ele não conseguiu tirar porte de arma por ter já praticado vários crimes, tais como matar uma mulher no Rio de Janeiro por atropelamento, lesão corporal em outra mulher, extorsão e perseguição?  O criminoso também cometeu falsidade ideológica por dizer que tinha vários cursos, o que foi desmentido por várias universidades.

Ao ser encontrado pela Polícia Militar de Minas Gerais (PM/MG), o assassino foi posto no banco detrás da viatura e foi levado para a delegacia sem ser algemado.  Por que os policiais militares não o algemaram e nem jogaram no camburão da viatura ao prendê-lo em uma academia de musculação horas após ele cometer o crime? Por que a PM usa de truculência com os pobres, pretos e periféricos e é boazinha com pessoas de classe social média ou alta? Este racismo institucional tem que acabar. Que a PM respeite os direitos humanos de todas as pessoas e as trate em igualdade de condições e não de forma seletiva.  

O assassinato do Laudemir demonstra pela enésima vez que armamentismo não gera segurança pessoal e nem social; ao contrário, aumenta a violência e o número de mortes. Se o Renê não estivesse armado, ele não teria matado o Laudemir. Quem defende o armamentismo também é cúmplice do assassinato de Laudemir. A paz social exige o desarmamento das pessoas. É preciso empatia e capacidade de dialogar diante dos conflitos.

Renê cometeu vários crimes ao assassinar a sangue frio o gari Laudemir. Primeiro, foi machista ao ameaçar uma mulher, a motorista do caminhão da limpeza urbana. Segundo, homicídio doloso e hediondo. Laudemir foi morto enquanto trabalhava e, por isso, é também “acidente”/crime trabalhista. Renê assassinou Laudemir porque o poder judiciário falhou, pois não o condenou por crimes anteriores.

Temos a responsabilidade de transformar esta dor brutal em um domingo de ressurreição que só acontecerá se conquistarmos justiça no sentido mais profundo. Justiça que incluí condenação implacável nas esferas criminal, cível e trabalhista. O abjeto criminoso não pode voltar a conviver socialmente por décadas. Deve, sim, ter seu direito de ir e vir retirado. Seus bens precisam com urgência ser bloqueados e repassados para a mãe do Laudemir, esposa, enteadas e outros familiares. A justiça trabalhista precisa julgar o “acidente”/crime trabalhista ocorrido.

O Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional precisam, com urgência, regulamentar o pagamento de auxílio periculosidade para todos os garis do Brasil, pois ainda não lhes é pago. A prefeitura de Belo Horizonte e todas as prefeituras do país precisam revisar e melhorar as condições de trabalho da limpeza urbana. É preciso discutir a reestatização da limpeza urbana, o que existia décadas atrás e garantia melhores salários e melhores condições de trabalho. Os salários dos garis do Brasil precisam ser justos. Se os garis, ao limpar o meio ambiente, criam as condições para saúde pública, o salário deles precisa ser equivalente aos salários dos trabalhadores da saúde, médicos e enfermeiras/os.

As prefeituras precisam educar permanentemente a população para respeitar, admirar e cuidar dos garis e multar pessoas que jogam nos sacos de lixo cacos de vidro, espetos de alumínio ou ferro que ferem os garis. Não é justo trabalhar correndo atrás do caminhão, correndo risco de cair, pegar sacos de lixo com cacos de vidro, ponta de espeto, entre outras situações de perigo. Não pode ter meta de trabalho extenuante. E todas as pessoas que vivem nas cidades precisam reconhecer que o trabalho dos garis é essencial e deve ser respeitado e valorizado.

Na Audiência Pública foi dito e enfatizado que é preciso adaptação nos caminhões para melhorar as condições de trabalho. Foi protocolado na ALMG um Projeto de Lei para tornar obrigatório o uso de câmeras nos caminhões da limpeza urbana em Minas Gerais. Foi dito também que já existem em Curitiba, PR, poltronas na traseira dos caminhões de lixo para que os garis não tenham que andar e correr o tempo todo de pé no para-choque do caminhão.

Se não forem feitas as melhorias necessárias, outros garis serão mortos. Em Uberlândia, MG, esta semana um gari morreu atropelado. Na Audiência Pública, um gari motorista de caminhão de lixo denunciou que esta semana foi ameaçado por outro homem. O Ministério Público pediu o bloqueio de três milhões de reais do assassino Renê e da delegada Ana Paula, mas o Poder Judiciário negou. Decisão injusta, pois abre brecha para a dissipação dos bens do criminoso, o que poderá deixar a família enlutada sem indenização.

Enfim, como Jesus Cristo, justo e inocente, Laudemir foi executado em plena luz do dia, enquanto trabalhava honestamente. Laudemir se tornou um mártir da luta dos garis por direitos. Perdemos a presença física do Laudemir, mas ele agora transvivenciado, partilhando vida plena, terna e eterna, viverá sempre em nós na luta por todos os direitos dos garis de Belo Horizonte, do Brasil e do mundo. Nosso abraço solidário a todos os familiares, colegas de trabalho e amigos/as do Laudemir. Laudemir, presente em nós sempre!

26/08/2025

 

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 - EMOCIONANTE CLAMOR POR JUSTIÇA: LILIANE FRANÇA DA SILVA, ESPOSA DO GARI LAUDEMIR ASSASSINADO, BH/MG

2 - LAUDEMIR, MÁRTIR DA LUTA DOS GARIS POR DIREITOS. VAMOS DO LUTO À LUTA POR DIREITOS (FREI GILVANDER)

3 - JUSTIÇA PELO GARI LAUDEMIR E P/ TODOS/AS GARIS: AUDIÊNCIA PÚBLICA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS/ALMG



 

 

 

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