sexta-feira, 21 de setembro de 2018

“ASSIM QUERO, ASSIM MANDO” – Breves Memórias sobre perseguições e resistências de indígenas e quilombolas na Serra da Mantiqueira, sul de Minas Gerais

“ASSIM QUERO, ASSIM MANDO” –  Breves Memórias sobre perseguições e resistências de  indígenas e quilombolas na Serra da Mantiqueira, sul de Minas Gerais.

Por Alenice Baeta [1]

TAHÉ-ANTAH TXORI DAY LEKAH (Ancestral na mata mora)
DIEH-YUNUN XAMBÊ KOYÁ (Seu filho fala)
PURI TAHÈ-ANTAH KRIM ( Sangue do ancestral Puri)  [2]

 Os primeiros exploradores paulistas advindos do planalto do Piratininga seguiram uma rota principal que atingia a região de Guaypacaré[3] e em seguida o Rio Paraíba, atravessando a garganta do Embau[4] na corda da Mantiqueira inaugurando oficialmente um percurso denominado ‘caminho geral do sertão’. Ao longo deste trajeto surgiram povoados, vilas e capelas. A ideia era atingir as ‘minas dos Cataguases’, encontrar minerais, além de prear e combater indígenas, expandindo fronteiras e dominando novos territórios. Em sua fase inicial, as expedições assumiram a empreitada de abastecer as propriedades rurais com a força de cativos indígenas (MONTEIRO, 2008).
O território que hoje abrange o sul de Minas foi visitado por diversos sertanistas de Taubaté, dentre eles, Antônio Delgado da Veiga, João da Veiga e Miguel Garcia, ‘O Velho’. Alcançaram um lugarejo na região de Rio Verde que foi denominado Baependi. Nesta ocasião, algumas minas de ouro de lavagem já seriam conhecidas por forasteiros paulistas, que se apoderavam dos descobertos baseados nos oficiais ditames: “assim quero, assim mando” (ANASTASIA, 2005. O grifo é meu).
Tempos antes, Dom Francisco de Sousa traçou penetração paulista em direção às Minas, utilizando o caminho de Mogi das Cruzes, e daí seguiu pelo vale do Paraíba, adentrando a Serra da Mantiqueira. Para levar adiante esses projetos, ainda em 1598 Dom Francisco envia Diogo Gonçalves Laço como administrador das minas e capitão da Vila de São Paulo. A partir de 1601, quando recebeu um regimento para serviço das minas, visitou Jaraguá, São Roque e as ‘Minas de Ferro de Araçoiaba’ de onde partiu uma bandeira para Itapucu na Serra da Mantiqueira. Em 1602, acredita-se que "as diligências de Laço pelos sertões de São Paulo fizeram incursões à região de Araraquara no intento de encontrar por terra um caminho para as Minas dos Cataguases derivando de São Paulo pelo Tietê abaixo, saltaram para a margem direita e, após visitar os campos de Araraquara, subira o rio Mogi Guaçu até o sopé do futuro Ouro Fino, em Minas” (MANO, 2006: 53 apud LEMOS, s/d: 14).
João Pereira de Souza Botafogo teria também transpassado essa região, mas há polêmicas sobre a precisão de seu roteiro, além do temido bandeirante Fernão Dias, que em 1674 já teria também penetrado estas plagas (PARANHOS, 2008).
As bandeiras em direção ao sertão contavam com um contingente de escravos cativos apreendidos na região Sul do Brasil pelos paulistas, dentre as localidades ressaltam-se, os Sertões dos Patos e dos Carijós[5] – boa parte dos indígenas teriam sido pertencentes da comunidades Guarani, identificados como: “Carijó, Araxá e Patos”. Mas quando havia queda nos plantéis de indígenas guarani, aprisionavam os “Guainá e Tupinaé” (MONTEIRO, 1995: 61; 62; 82). As expedições de apreamento destinavam-se em parte, na captura prioritária de indivíduos guaranis tendo em vista a dificuldade por parte do colonizador em falar e entender outras línguas não-Tupi (KOK, 2009: 02).
Os indígenas capturados, que se juntavam ainda que compulsoriamente ou mesmo através de alianças junto às expedições paulistas rumo ao Sertão dos Cataguás, eram denominados genericamente como “Carijós”. Os paulistas precisavam que índios guerreiros colaborassem no aprisionamento de outros nativos arredios da região das minas, verdadeiros “obstáculos” nos caminhos rumo ao interior, além do provimento da tropa nas matas e no carregamento de mantimentos (MONTEIRO, 2008; KOK, 2009).
Incluindo as terras delimitadas atualmente pelo município de Extrema, além das bacias do Grande, Sapucaí, Verde e Paraíba do Sul, o vale do rio Piracicaba, onde se insere o Jaguari,  correspondia a antigos territórios tradicionais de muitos indivíduos e famílias indígenas coloniais (ou colonizados), sendo os etnônimos mais comuns associados a essas localidades, os dos Catauá ou Guataguases, Guaranis, Coroados, Xopotós, Tapanhunhos, Cropós, Carapós, Puris, Coroados, Guarulhos, Painguá, Xumeto, Arrepiados, Osorós, dentre outros.

Imagem 1 - Múmia de um indígena. Obra de Jean-Baptiste Debret. O documento etnográfico acima mostra que o corpo foi sepultado no interior de uma igaçaba cerâmica (urna funerária). Modelo de estrutura funerária comum identificada em sítios arqueológicos no estado de Minas Gerais, incluindo o sul do estado. Como essa, 80 urnas funerárias foram carbonizadas no incêndio do Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro.

Em 1726, é mencionada oficialmente a existência de assentamento indígena de Guarulhos em região situada entre os rios Camanducaia e Jaguari:
(…) Me pedia lhe fizece mce. Conceder nomemte Em nome de S. Mage. Q. Ds. Ge. Por carta data de terra ou sesmaria as ditas terras no Rio Tyaguary da outra banda, começando da barra de hú Ribeirão, que está no caminho dos batatais da Outra banda q. Chamão feijão queimado, e pella lingoa de terra Camandaucaya, pello dito Rio de Jaguary assima, até hum Saco de hú campo onde os Guarulhos tem sua pescaria, (grifo nosso) e dahi cortando pa. O certão até o Rio Mogi pello rumo Norte, ou quarta de Noroeste, e dahi pello Rio do Mogi abaixo até hum salto q. faz o dito do Rio Mogi abaixo até hum campo do mesmo Rio, com todos os matos, campos, e pontas, q. se acharem na dita terra, e attendendo as razões, q. allegou, ao q. respondeu o Procurador da Coroa, e Fazenda Real, aquém se deu vista, e ser em utilidade della cultivarem-se as terras nesta capitania pello acréscimo dos dízimos Reais (…)[6].
Segundo Mano (2006: 53) houve ainda uma via de acesso à região mineira através do Tietê, Campos de Araraquara e vale do Mogi-Guaçu, ‘desconhecida oficialmente até o final do século XVIII e início do XIX’. A primeira notícia documentada da tentativa de abrir estrada pelos campos de Araraquara em direção à foz do Mogi Guaçu é do governo de Antonio Manoel de Melo entre 1797 e 1802, porém esta rota teria sido em seguida desestimulada pela Coroa.
Porções dos Sertões do Leste e da Mantiqueira foram consideradas pela Coroa zonas proibidas, quer dizer, não abertas oficialmente a fixação definitiva de colonos, à exceção dos titulares de sesmarias, cujas fazendas e suas instalações estivessem voltadas ao abastecimento dos viajantes, à alimentação dos animais e manutenção de caminhos.
À revelia das proibições que se estenderam ao ano de 1755, confirmando os sertões do ‘Distrito da Mantiqueira’ como área proibida, encontramos na área mais alta da Borda do Campo um florescer de pequenos povoados cuja fundação se deu em função de alguns descobertos auríferos, como também pela alternativa de criação de roças voltadas para o abastecimento (OLIVEIRA, 2012).
Nesse contexto, foram sendo estabelecidos pequenos núcleos e entrepostos que originaram as três principais vilas do sul de Minas: Santa Maria do Baependi (originalmente pertencente ao Sertão da Pedra Branca[7]), Airuoca e Campanha, inicialmente conhecida como Campanha Princesa da Beira (ANASTASIA, 2005). O primevo governador da Capitania de São Paulo e Minas do Ouro, Dom Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho, criou em 1710 o distrito das minas, mas foi somente em 1714, que teria sido assinado o termo de repartição e criação das três primeiras comarcas mineiras – a de Rio das Mortes (São João del-Rey), Vila Rica (Ouro Preto) e Rio das Velhas (Sabará) (PARANHOS, 2008).  Pertencente à Comarca do Rio das Mortes, o Termo de Campanha teria sido composto por dez freguesias: Lavras do Funil, Baependi, Pouso Alto, Santa Ana do Sapucaí, Camanducaia, Ouro Fino, Itajubá, Cabo Verde, Jacuí, Carrancas e Airuoca.

Imagem 2 - Detalhe da tela de H. Bernadeli ‘Bandeirantes do Sertão’ – Museu Nacional de Belas Artes (LEME, 1977: 81).

Apesar das tentativas de barrar o povoamento nos sertões da Mantiqueira, eram reconhecidas por parte das autoridades as dificuldades de se controlar as passagens ocultas pelas inúmeras veredas, acrescentada pelas imperfeições nos limites estabelecidos pelas capitanias nos limites sul de Minas, o que dificultava enormemente que se impedissem certos “extravios” (ANASTASIA, 2005).
Houve descobertos de ouro nessa região que começou a ser mais densamente povoada a partir da década de 1740, a Oeste do Rio Sapucaí. José Pires Monteiro encontra oficialmente ouro à margem esquerda do Sapucaí, e, em 1755, Pedro Franco Quaresma descobre ouro na região de São Carlos do Jacuí. Estas minas atraem mais forasteiros de alhures, sendo que em 1746, Francisco Martins Lustosa é nomeado guarda-mor regente das descobertas do ouro e da região do Sapucaí (PARANHOS, 2008).
Na beira do Caminho iam-se disseminando ranchos, roças e vendas de gêneros da terra e surgindo locais para o abastecimento e pernoite, os pousos. A pequena população dos pousos, contava com alguns escravos, crioulos ou africanos que dividiam os encargos da produção com a ajuda do mestiço semi-servil ou agregado, ou seja, a população indígena que vivia sob a tutela dos colonizadores e, junta, plantou roças de arroz, feijão, milho, mandioca; fabricou aguardente e rapadura. Alguns roceiros foram também rancheiros e, nestes locais, além da venda de gêneros da terra, criaram situações para o abastecimento, pouso para tropeiros e pasto para mulas de carga com os “administrados”. Eram indivíduos ou famílias que contavam apenas com o próprio braço para começar a vida no sertão (RIBEIRO, 2008: 35).
Interessante observar a forte influência de línguas indígenas nos topônimos regionais, de origem Tupi, como por exemplo, o nome das freguesias: “Camanducaia”, que significa “favas queimadas” – através da junção dos termos komandá (fava), kaî (queimar, queimado); Airuoca, que significa “Casa de Papagaio”- através da junção das palavras aîuru (“papagaio”) e oka (“casa”) e Baependi, que significa “rio do monstro marinho”.
Localidades abrangidas pela Cachoeira do Macaco, sobretudo as sequelas e brechas da Mantiqueira foram apossadas por forasteiros e garimpeiros clandestinos liderados pelo famoso bandoleiro “Mão de Luva” e seus comparsas, quando se estabeleceu na região um “território de mando” quando ocorrem inúmeros casos de transgressões, roubos, assassinatos e banditismos. Segundo Anastasia (2005), a quadrilha de “Mão de Luva”, todavia, mantinha boas relações com alguns soldados, comerciantes, fazendeiros e alguns grupos indígenas da região.
O abandono do distrito da Mantiqueira pelas autoridades que o supunham, ou fingiam supor, povoadas apenas pelas ferozes nações indígenas Xopotós, Puris e Osorós, favoreceu as ações daqueles que eram e dos que foram considerados pelas autoridades os facínoras das estradas. (ANASTASIA, 2005: 90).
Visando um maior controle e fiscalização da cobrança do “quinto” a partir da segunda metade do século XVIII, foram instalados registros em vários pontos das Comarcas. Em 1766 já existia o “registro de Sertão de Manducaia”, que se situava às margens do rio Camanducaia, entre a estrada de Atibaia e Santana do Sapucaí e os rios Mandu e Sapucaí-Mirim.
Os registros eram normalmente construídos em uma estrada regular, em gargantas e funis de serras ou morros, desfiladeiros ou bifurcações, próximos a um curso da'água, assegurando o provimento da repartição. Os caminhos clandestinos eram vedados e vigiados por “guardas” em postos de apoios com funções exclusivamente repressoras não só aos contrabandistas, mas, sobretudo aos indígenas, fugitivos, quilombolas, forasteiros e viandantes (ANASTASIA, 2005).
O contingente de escravos africanos trazidos para as fazendas agropecuárias do sul de Minas Gerais era grande, que segundo Slenes (1985) seria 50% composto por indivíduos de origem Banto. Todavia, ganharam no Brasil outras denominações, uma “nomenclatura do tráfico”, que pouco tinha a ver com as etnias de origem.
Angola, Cabinda, Benguela, Congo e outros, ‘nomenclatura do tráfico’ que, entretanto, podem ser tomados como referências significativas para o estudo da ressocialização e da reelaboração das identidades africanas no Brasil (OLIVEIRA, 2000: 219).
Havia ainda um plantel razoável de escravos indígenas não computados nos documentos destas empreitadas. As relações com os indígenas e quilombolas foram também ficando progressivamente tensas, o que gerou uma série de conflitos, fugas e levantes em unidades rurais da região sul.
Rodrigues (2014) desenvolveu importante pesquisa sobre as comunidades negras remanescentes de quilombos na região de Camanducaia[8], indicando um alto índice de escravos no século XVIII nas fazendas agropecuárias, sendo a Serra dos Pretos uma importante localidade relativa à memória da resistência cultural afrodescendente na mesma.
Quando teve fim a instituição da escravidão, grande parte dos integrantes destas famílias puderam permanecer juntos, vivendo em suas próprias terras, que foram doadas pelos antigos senhores. Constituiu-se, assim, uma comunidade negra, na chamada Serra dos Pretos, como muitas outras, formadas neste mesmo período e anteriores, em várias regiões do Império (RODRIGUES, 2014: 221).
Após o final do século XVIII ocorre um forte acirramento e perseguição por parte dos capangas dos potentados a quilombolas e indígenas que buscavam  permanentemente refúgios e locais de resistência ao sistema escravista nos vales do Sapucaí e do Rio Verde; quando a população das zonas auríferas também se espalha em direção aos extremos das comarcas (CARRATO, 1968), ampliando mais uma vez novas zonas de asilo e fatalmente de futuros conflitos, sobretudo para as bandas da Zona da Mata, territórios de vários povos indígenas, dentre eles, destacam-se novamente comunidades Puri; como também para o vale do rio Doce, terras do “Watu[9]” habitadas por inúmeros povos das matrizes culturais Tupiguarani e Jê, como os Paranaubis, Gutkrak e NakNak (BAETA,A; LIMA, M. PILÓ, H., 2009).

Referências Bibliográficas

ANASTASIA, C. M. J. A Geografia do Crime – violência nas minas setecentistas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005.
BAETA A.; LIMA, M & PILÓ, H.  As ocupações humanas no período pré-colonial no Médio Vale do rio Doce. In: Era Tudo Mata. (Orgs. ALVARES, R. & REZENDE, M.) pp.14- 26, CHA, Belo Horizonte/Aimorés, 2009.
CARRATOJosé FerreiraIgreja, iluminismo e escolas mineiras coloniais. São Paulo: EdUSP, 1968.
KOK, G. Descalços, Violentos e Famintos. In: Revista de História da Biblioteca Nacional. Ano 3, N. 34, Rio de Janeiro, julho de 2008.
LEME, P. T. de A. P. Notícias das Minas de São Paulo e dos Sertões da mesma Capitania. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1977.
MANO, M. Os Campos de Araraquara- um estudo de história indígena no interior paulista (Tese de Doutorado), UNICAMP, Campinas, 2006.
MONTEIRO, J. Os guarani e a história do Brasil meridional: séculos XVI – XVII. In: (Org. CARNEIRO DA CUNHA, M. ) História dos índios no Brasil, São Paulo: Cia das Letras, pp. 475-498, 1992.
MONTEIRO, J. Negros da Terra: índios e bandeirantes na origem de São Paulo. São Paulo: Cia das Letras, 1994.
MONTEIRO, J. Bandeiras Mestiças. In: Revista de História da Biblioteca Nacional. Ano 3, 34, Rio de Janeiro, julho de 2008.
OLIVEIRA, M. R. de. Famílias dos Sertões da Mantiqueira In: RAPM, Anos XLVIII, Belo Horizonte, Jan-Dez de 2012.
PARANHOS, P. Primeiros Núcleos Populacionais no Sul de Minas Gerais. In. Revista da ABRASP., V. 13, 2008.
RODRIGUES, J. L. Serra dos Pretos: Trajetórias de famílias egressas do cativeiro no pós-abolição (Sul de Minas, 1888-1950) In: Afro-Ásia, vol. 50, 2014.
SLENES, R. Os múltiplos de porcos e diamantes: a economia escravista em Minas Gerais no séc. XIX. Cadernos IFCH Unicamp, Campinas, 1985.
[1] Membro do CEDEFES (Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva), Historiadora e Dra. com pós-doutorado em Arqueóloga.
[2] Trecho de música ritualística Puri – Transmitido por Kapua Lana Puri.
[3] Atual município de Lorena, em São Paulo.
[4] Embaú, na língua tupi, quer dizer segundo T. Sampaio “a derradeira aguada” mas para o linguista S. Bueno, em seu “Vocabulário Tupi-Guarani-Português”, afirma que quer dizer “bica d’água”.
[5] Abrangia os vales dos Paranapanema, Guairá, Piquiri e Tibagi.
[6] In: Documento de doação de sesmaria a favor de Francisco Paes da Silva, expedida em 26 de fevereiro de 1726, in Sesmarias vol. III. Arquivo do Estado de São Paulo; Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, 1937.
[7] Pedra Branca seria um grande rochedo na região de Campanha do Rio Verde, que servia de referência geográfica para os bandeirantes que adentravam o caminho das minas.
[8] O foco da pesquisa de Rodrigues (2013) foi analisar as trajetórias familiares de escravos e libertos no decorrer do século XIXe primeira metade da centúria seguinte, na freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Camanducaia, extremo sul de Minas Gerais.
[9] Rio na língua materna do povo indígena Krenak  (ou Borum) que habita atualmente um território indígena de 4000 ha no município de Resplendor, Médio Vale do rio Doce .

24º Grito dos Excluídos/BH/MG – Vida em primeiro lugar! - 3ª Parte - 07/...



XXIV Grito dos Excluídos, em Belo Horizonte/MG – Vida em primeiro lugar! - 3ª Parte - 07/9/2018.

“Até quando nós vamos ter que fazer Grito dos Excluídos”? – Perguntava frei Gilvander aos participantes da caminhada com o Grito dos Excluídos, em Belo Horizonte/MG. Será a resposta uma utopia? Com certeza, não. Manter a resistência e seguir firmes na caminhada construída no esperançar de todos e todas que acreditam que é possível construir uma sociedade justa, fraterna, solidária, sustentável ecologicamente e ecumênica. Uma Pátria verdadeiramente livre onde a democracia, a soberania do país, sua história e sua memória sejam respeitadas, todos e todas possam viver com dignidade, a Natureza seja respeitada, com a Mãe Terra e a Irmã Água – dons do Deus da Vida, direitos de todos e todas - tendo a atenção, o respeito e o cuidado que lhes são devidos. Em Belo Horizonte, milhares de pessoas fizeram ressoar esse grito: “Vida em primeiro lugar! Desigualdade gera violência: basta de privilégios!” Essa mobilização popular que se fez presente em todo o Brasil é que pode vencer o avanço da força opressora do capitalismo e dos capitalistas e sua participação no Poder Executivo e Legislativo (com apoio de grande parte do Judiciário) que não têm o menor escrúpulo ao propor, aprovar e defender medidas politiqueiras criminosas, que só fazem aumentar a desigualdade, a miséria e a violência social. Somente uma ampla mobilização popular é que pode interromper o golpe em curso e fazer valer os direitos fundamentais, o respeito aos povos tradicionais, aos camponeses e camponesas, ao povo negro, aos jovens, aos LGBTs, a todas as populações das periferias, aos Movimentos Populares, enfim, fazer com que seja garantido a todos e todas o respeito à sua dignidade. 

24o Grito dos Excluídos/as em Belo Horizonte, MG.
Foto: Lucas Prates/HOJE EM DIA.

*Reportagem em vídeo de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. 2ª Parte. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. Belo Horizonte/MG, 07/9/2018.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.

Diocese de Ruy Barbosa, BA: Carta ao Povo de Deus sobre as Eleições de 2018.

Diocese de Ruy Barbosa, BA: Carta ao Povo de Deus sobre as Eleições de 2018.
Dom André de Vitte, bispo da diocese de Ruy Barbosa, na Bahia, e Presidente Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Nossa solidariedade ao Bispo de Ruy Barbosa, BA, Dom André de Vitte, presidente Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que, depois de tornar público a Carta da Diocese de Ruy Barbosa ao Povo de Deus, vem sofrendo agressões nas redes sociais por grupos de eleitores do candidato Jair Bolsonaro, do PSL.
Veja a carta, abaixo.
Diocese de Ruy Barbosa, BA: Carta ao Povo de Deus sobre as Eleições de 2018.
“Ai daqueles que fazem leis injustas, que escrevem decretos opressores para privar os pobres dos seus direitos e da justiça” (Isaías 10, 1).
Caros irmãos e irmãs,
O ano eleitoral representa um especial desafio à nossa rede de comunidades. A esse desafio, a Igreja nos convida a dar respostas à luz da nossa fé cristã. Cada pessoa é convidada a exercer o seu direito e a cumprir o dever de dar o seu voto consciente. A Igreja não se sobrepõe à consciência de nenhuma pessoa, mas oferece critérios para o necessário discernimento nesse ano eleitoral.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) publicou vários documentos sobre o ano eleitoral. Entre eles destacamos a CARTA DO FÓRUM NACIONAL DAS PASTORAIS SOCIAIS, SETOR DA MOBILIDADE HUMANA E ORGANISMOS  – http://www.cnbb.org.br/carta-do-forum-das-pastorais-sociais-setor-de-mobilidade-humana-e-organismos-da-cnbb/  – e a Mensagem da CNBB para 07 de setembro: A FORÇA TRANSFORMADORA DE UM POVO – http://www.cnbb.org.br/wp-content/uploads/sites/32/2018/09/Mensagem-7-de-setembro-A-for%C3%A7a-transformadora-de-um-Povo.pdf– .
Com base nesses Documentos, trazemos aqui algumas orientações para um bom exercício da cidadania, à luz da Doutrina Social da Igreja:
3 – Apoiar candidaturas que tenham uma trajetória de compromisso com as lutas por direitos do povo, propostas que apontem para a inclusão social das pessoas mais vulneráveis, pobres e excluídas; priorizem a defesa da vida humana, em todas as suas etapas, e da mãe-natureza; lutem pela igualdade de direitos entre homens e mulheres; defendam os direitos humanos, principalmente das crianças, dos adolescentes, dos jovens, das pessoas idosas e dos encarcerados; lutem pelo reconhecimento dos territórios dos Povos Indígenas, quilombolas, ciganos e comunidades tradicionais; tenham compromisso com a Reforma Agrária, habitação popular e com os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras.
4 – Conhecer as propostas dos partidos e verificar se correspondem à visão de bem comum coerente com os valores do Evangelho.
5- Verificar se os candidatos têm clareza acerca do cargo que ocuparão e de suas funções.
6- Verificar se os candidatos estão mais preocupados com um bom marketing de sua imagem na campanha ou em apresentar propostas realistas para os grandes problemas sociais do país.
Nas eleições de outubro, devemos avaliar com seriedade cada candidato, cada candidata, suas promessas, sua campanha, as alianças de seu partido e sua atuação política passada. “O bem maior do País, para além das ideologias e interesses particulares, deve conduzir a consciência e o coração tanto de candidatos, quanto de eleitores” (CNBB, Eleições 2018: Compromisso e Esperança). Precisamos ter cuidado na escolha dos senadores e deputados, que constituem o Poder Legislativo. No Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas é que se votam as leis que podem ajudar ou prejudicar o povo. Anular o voto ou votar em branco favorece o pior político, enfraquece a democracia e põe em risco a oportunidade de purificar a política. A cidadania, no entanto, não se esgota no voto. É preciso continuar acompanhando os eleitos, cobrando-lhes o cumprimento de seu dever de servir o povo, através de conselhos municipais e fóruns de cidadania, entre outros.
O Papa Francisco afirma: “Envolver-se na política é uma obrigação para um cristão. Nós, cristãos, não podemos nos fazer de Pilatos e lavar as mãos. Não podemos! Devemos nos envolver na política porque a política é uma das formas mais elevadas da caridade, porque ela procura o bem comum. ”
Que Santo Antônio e nossa Mãe Aparecida intercedam junto à Trindade Santa, pelo povo brasileiro, para que possamos resgatar a democracia, vencer a tentação da intolerância e dialogar sempre para anunciar o Reino de Deus, sendo “sal da terra e luz do mundo”.
Assina essa Nota Pública:
CONSELHO DIOCESANO DE PASTORAL
DOM ANDRÉ DE WITTE
Bispo Diocesano da Diocese de Ruy Barbosa – BA – Regional Nordeste II da CNBB

Nota de apoio aos Direitos de Carroceiros/as e Cavalos de Belo Horizonte e Região Metropolitana!

Nota de apoio aos Direitos de Carroceiros/as e Cavalos de Belo Horizonte e Região Metropolitana!

Manifestação de Carroceiros e Carroceiras em Belo Horizonte, MG, contra o PL 142.

Mais uma vez, estamos na defesa dos direitos dos/as carroceiros/as e cavalos de Belo Horizonte, MG! Dia 11 de setembro de 2018 houve tentativa de votar na câmara de vereadores de Belo Horizonte o Projeto de Lei 142/2017, que pretende acabar com o ofício dos carroceiros na cidade. Com a presença dos Carroceiros e Carroceiras em luta contra esse injusto projeto, a sessão foi suspensa. Apresentado pelo vereador Osvaldo Lopes (PHS) e apoiado por parte do movimento em defesa dos direitos animais, o projeto é um grave ataque ao direito e à vida dos mais de 8000 carroceiros e carroceiras da capital mineira.
Os carroceiros e carroceiras fazem parte da história e da vida da cidade de Belo Horizonte. Além de fonte de renda, o trabalho dos/as carroceiros/as é também um modo de vida, uma forma de habitar e produzir a cidade. Os carroceiros e as carrocerias são detentores de saberes tradicionais que compõem o patrimônio cultural das cidades. Foi a partir do trabalho na carroça junto com seus companheiros, os cavalos, que gerações de carroceiros construíram suas vidas, educaram seus filhos, construíram suas casas e contribuíram para que a cidade chegasse até aqui. Negar o direito ao trabalho aos carroceiros é negar parte importante de nossa própria história e negar os direitos de um Povo Tradicional que são os carroceiros e as carroceiras. Cumpre lembrar que a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), da ONU, assegura a todos os Povos Tradicionais o direito de se autodefinir como Povo Tradicional e o direito de ter todos seus direitos assegurados pelo Estado.
Uma das principais alegações daqueles que defendem o PL 142/20117 é a eventual existência de maus tratos contra os animais. No entanto, os próprios carroceiros sabem da importância do cuidado e do amor aos animais, já que é com eles que ganham o pão de cada dia. Outros ainda dizem que, mesmo que não haja maus tratos, o trabalho na carroça é uma forma de exploração dos animais. Isso demonstra o caráter classista e etnocêntrico do projeto, já que pretende proibir apenas os carroceiros de trabalhar com seus cavalos, sem dizer uma só palavra sobre os cavalos de haras, fazendas ou mesmo aquele utilizados pela cavalaria da polícia militar. Para os carroceiros, os cavalos não são simples objetos que podem ser substituídos por motos adaptadas ou qualquer outra máquina. Estaria o PL 142/2017 atendendo aos interesses da grandes empresas produtoras e vendedoras de motos? Entre os carroceiros e cavalos as relações são de afeto e cuidado e não relações de mercado.
É importante que todos saibam que os carroceiros e carroceiras estão organizados e na luta por seus direitos. Nos últimos meses diversas reuniões foram realizadas com a prefeitura de Belo Horizonte para a discussão e revisão da portaria conjunta que regulamenta o trabalho dos carroceiros no município de Belo Horizonte. Entre as principais demandas dos carroceiros e das carroceiras está justamente a fiscalização para que haja coibição de maus tratos e a garantia dos direitos dos animais.
A luta dos carroceiros e carroceiras é pelos direitos humanos e animais. E não estamos sós. Diversas pessoas, movimentos, organizações e universidades estão junto conosco nessa luta. O direito ao trabalho nas carroças é parte do direito a uma cidade plural que sabe acolher e respeitar todas as formas de cultura e natureza que nela habitam. Por isso, pedimos o arquivamento do PL 142/2017 e o fortalecimento de políticas públicas que garantam os direitos e a dignidade de carroceiros/as e cavalos.

Na luta, seguimos gritando: “A Cidade é Nossa Roça! Nossa Luta é Na Carroça!”
Assinam essa Nota Pública:
ACCBM – Associação dos Carroceiros e Carroceiras Unidos de Belo Horizonte e Região Metropolitana
Associação dos Carroceiros e Charreteiros das Regiões Norte, Venda Nova e Pampulha
Associação dos Carroceiros de Contagem
Associação dos Carroceiros da Vila São José
Kaipora – Laboratório de Estudos Bioculturais (UEMG)
GESTA – Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (UFMG)
GEPTT – Grupo de Estudos e Pesquisas em Trabalho e Tecnologias (CEFET – MG)
NIISA – Núcleo Interdisciplinar de Investigação Socioambiental (UNIMONTES)
NuQ – Núcleo de Estudos em Comunidades Quilombolas e Tradicionais (UFMG)
CEDEFES – Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva
MLB – Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas
AMAU – Articulação Metropolitana de Agricultura Urbana
Associação Amanu – Educação, Ecologia e Solidariedade
Grupo Aroeira – Agroecologia Urbana
MNCR – Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis
REDESOL – Cooperativa Central Rede Solidária de Trabalhadores de Materiais Recicláveis de Minas Gerais
Associação Mãos Amigas dos Catadores de Materiais Recicláveis de Sabará
Coletivo de Agroecologia do Aglomerado Cabana
COMARB – Associação dos Trabalhadores com Materiais Recicláveis de Baldim
UNICICLA – Associação dos Catadores de Material Reciclável de Nova União
CPT/MG – Comissão Pastoral da Terra – MG
Instituto Guaicuy SOS Rio das Velhas
Projeto Manuelzão (UFMG)
RENAP – Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares
Eis, abaixo, algumas fotografia os Carroceiras e Carroceiras de Belo Horizonte em luta pelos seus sagrados direitos.
Eis, abaixo, Vídeos que atestam a legitimidade da luta dos Carroceiros e Carroceiras. Se gostar, compartilhe.
1 – Carroceiros e carroceiras de BH/MG: Respeito à cultura, direito ao trabalho. 1ª Parte. 07/7/2018.
2 – Carroceiros/as de BH/MG: Cuidado com o meio ambiente e respeito aos animais/2ª Parte/ 07/7/2018.
3 – Carroceiros/as, cavalos e éguas em BH/MG: dignidade e sobrevivência, 3ª Parte. 07/7/2018.
4 – Luta dos/das carroceiros/as pelo direito de trabalhar com cavalos e éguas/BH/MG. 4ª Parte/07/7/2018.
5 – Luta dos carroceiros/as e cavalos em BH/MG: pelo direito de existir na cidade/5ª Parte/07/7/2018.
6 – Luta de carroceiros/as de BH/MG: Trabalho e respeito aos cavalos e éguas. 6ª Parte. 07/7/2018.

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Vida em primeiro lugar!/24º Grito dos Excluídos/BH/MG - 2ª Parte - 07/9/...



Vida em primeiro lugar! – XXIV Grito dos Excluídos/BH/MG - 2ª Parte - 07/9/2018.

Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, realizou, com grande participação popular, o 24º Grito dos Excluídos. “Vida em primeiro lugar! Desigualdade gera violência: basta de privilégios!” Milhares de pessoas fizeram ressoar esse grito pelas ruas da capital mineira. É o grito contra a violação da democracia e dos direitos fundamentais, em consequência do golpe em curso, que fere a vida e a dignidade do povo brasileiro. Um grito contra as medidas politiqueiras criminosas de austeridade que só fazem aumentar a desigualdade social e, por consequência, a violência social. O momento é preocupante, é crítico, e só a mobilização popular, consciente e responsável, pode frear essa tentativa de avanço das forças do capital e dos capitalistas, que defendem privilégios, oprimem, excluem, matam, querem se apoderar das terras, das águas e gerar cada vez mais riqueza para poucos à custa de mais pobreza para muitos. Só a mobilização popular pode dar rumo novo a essa história e construir uma nova sociedade fundamentada na justiça social, a serviço da vida com dignidade para todas e todos. 

Grito dos Excluídos em Belo Horizonte, MG, dia 07/9/2018. 
Foto: Pedro Ângelo/G1.

*Reportagem em vídeo de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. 2ª Parte. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. Belo Horizonte/MG, 07/9/2018.
*Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

XXI Romaria das Águas e daTerra/MG/Frei GIlvander na Rádio TropicalFM/La...



XXI Romaria das Águas e da Terra de MG: frei Gilvander na Rádio Tropical FM 89,9, em Lagoa da Prata/MG. 12/9/2018.

Registro em áudio da entrevista ao vivo de Frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI, à Rádio Tropical FM – 89,9, de Lagoa da Prata/MG, Programa “Pra ser feliz”, na Semana de Missões em preparação à XXI Romaria das Águas e da Terra do Estado de Minas Gerais, cuja culminância acontecerá dia 16/9/2018, em Lagoa da Prata, Diocese de Luz/MG.


*Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG.

* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.




terça-feira, 18 de setembro de 2018

Pesquisa e ciência neutras?


Pesquisa e ciência neutras?
Por Gilvander Moreira[1]


Fez parte da dominação imperialista a afirmação de uma ciência neutra, pura, apolítica, pretensamente objetiva, portadora de uma verdade única e universal e não comprometida com a causa das classes (super)exploradas. Afirmar a neutralidade da ciência é uma forma de tergiversar sobre o compromisso conservador que as universidades via de regra têm. Assim, muitas vezes, pesquisa-se para manter e reproduzir o sistema estabelecido opressor. Entretanto, “com o marxismo, começou a batalha pelo desmascaramento do discurso pretensamente neutro e objetivo presente no positivismo e no empirismo lógico, e mesmo no historicismo” (OLIVEIRA, 2004, p. 33). E a partir da década de 1980, “os cientistas sociais se veem na contingência de tomar partido, de colocarem com urgência a que interesses sociais e políticos servem. Como nos tempos de Hitler, os cientistas que guardam silêncio ou pretendem ser neutros estão, na prática, tão comprometidos com as atrocidades do sistema vigente como aqueles que o fazem conscientemente” (BONILLA et al., 1987, p. 135).
No contexto dos Anos de Chumbo, no Brasil, de 1964 a 1979, a partir dos militantes que resistem às investidas do capitalismo, surgem os conceitos de “compromisso”, de “inserção”, junto às classes oprimidas pesquisando e somando forças nas suas lutas emancipatórias. “A inserção, como técnica, incorpora o investigador aos grupos populares, não mais de acordo com a antiga relação exploradora de “sujeito e objeto”, mas valorizando a parcela de contribuição dos grupos quanto à informação e interpretação, bem como seu direito ao uso dos dados e de outros elementos adquiridos na investigação” (BONILLA et al., 1987, p. 138).
Uma das raízes da pesquisa participativa está na ideia de compromisso – uma questão ética - com as classes oprimidas na luta coletiva para superar de forma justa seus problemas – injustiças perpetradas pelo capitalismo ao (super)explorar a classe trabalhadora e também o campesinato pela extração ampliada de mais-valia. Com opção de classe busca-se compreender os problemas para resolvê-los de forma emancipatória. Esse compromisso com a opção pelos pobres levou muitos intelectuais que pouco leram Marx a desenvolver metodologias semelhantes às dele. Citamos como exemplo, Paulo Freire, o biblista Carlos Mesters e o sociólogo Orlando Fals Borda.
Mesmo que seja analfabeto e não tenha conhecimento formal erudito, ninguém é ignorante, pois nas relações humanas se ensina e se aprende. Toda pessoa camponesa injustiçada, mas de pé na luta coletiva, “é dona de uma rica experiência de luta, conhece inúmeros modos e maneiras de aprender, sobreviver e se defender; participa amiúde de uma memória coletiva, que forma uma base ideológica e cultural respeitável e, portanto, compreende que qualquer passo adiante que se pretenda dar deve estar afiançado por este conhecimento já existente” (BONILLA et al., 1987, p. 146).
A pesquisa participante não é um instrumental pronto e acabado, precisa ser repensada permanentemente, sempre em busca de emancipação humana, mas ela nunca reivindicará uma pretensa neutralidade científica e política. “A pesquisa participante se situa entre as correntes das ciências sociais que rejeitam a chamada neutralidade científica e partem do princípio de que a investigação deve servir a determinados setores sociais, buscando uma resposta coerente que permita, por um lado, socializar o conhecimento e, por outro, democratizar os processos de investigação e educação” (GIANOTTEN; WIT, 1987, p. 158).
Qualquer atividade humana, até uma pesquisa caracterizada como estritamente acadêmica, por ser intervenção na realidade, transforma a realidade de alguma forma, seja para emancipar ou para reproduzir relações materiais objetivas de desigualdade. A questão não é em si buscar transformar a realidade, mas com que objetivo, com qual utopia e como. Não podemos recair em cientificismo, nem em dualismos, nem em dicotomias, nem em academicismo, nem em sacralização do senso comum, que é ambíguo, muitas vezes contraditório, e diferente de bom-senso. Não recair também nem em romantismo ou basismo, que é o “que sustenta que o povo tem todas as respostas porque dispõe do verdadeiro conhecimento, sacralizando assim o poder popular” (GIANOTTEN; WIT, 1987, p. 164). Nas entranhas de um contexto de crise teórica e de avanço das forças do capital, a pesquisa participante nasceu fora da universidade, melhor dizendo, “quase sempre à margem das universidades e de seu universo científico” (BRANDÃO; STRECK, 2006, p. 29). Na pesquisa participante exige-se relação de confiança entre sujeito pesquisador e o sujeito pesquisado. Da pesquisa participante faz parte a copesquisa, segundo a qual “teoria e prática se distinguem, mas não se separam. Não há teoria que não esteja nutrida de práticas, nem prática que não seja animada por teorias. É caso de perceber os atravessamentos. A prática eficaz pode ajudar a mobilizar teorias até então infecundas, tanto quanto uma boa teoria pode desbloquear práticas ineficazes. Uma prática pura é tão impossível quanto uma teoria pura. Erros simétricos: voluntarismo e intelectualismo. Teoria e prática que não se percebem entre si significam teoria ruim e prática ineficaz” (CAVA, no artigo Copesquisa, 2012, na internet).[2]
A copesquisa se faz “entre sujeitos abertos à mudança de perspectiva. Nesse sentido, ela é perspectivista. O portador do método dispara uma perspectiva de emancipação. À tendência descritiva ou sociológica, tem-se uma tendência política voltada à ruptura” (CAVA, 2012, na internet).[3] Queremos, sim, ruptura com o latifúndio – território acima de 15 módulos fiscais -, essa arma mortífera nas mãos dos quem detêm a propriedade capitalista da terra e, por isso, pela renda da terra violenta o campesinato e também a classe trabalhadora na cidade. Copesquisa é pesquisa das lutas na luta, pesquisa militante onde os saberes são vivos, porque sustentam processos emancipatórios que se dão na constituição de subjetividades revolucionárias. O que interessa é a materialidade da luta pela terra. Por exemplo, a contradição latifundiário versus camponês, acontece não por má intenção, mas por controlar a propriedade capitalista da terra - um dos meios de produção, - o latifundiário explora expropriando o camponês, por causa de condições históricas materiais que são forjadas a partir do momento que uns são proprietários e a maioria das pessoas, não.

Referências.
BONILLA, Victor Daniel. CASTILLO, Gonzalo; BORDA, Orlando Fals; LIBREROS, Augusto. Causa popular, ciência popular: uma metodologia do conhecimento científico através da ação. In: BRANDÃO, Carlos Rodrigues (Org.). Repensando a pesquisa participante. 3ª edição. São Paulo: Brasiliense, 1987.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues; STRECK, Danilo R. (Org.). Pesquisa participante: o saber da partilha. 2ª edição. Aparecida/SP: Ideias & Letras, 2006.
GIANOTTEN, Vera; WIT, Ton de. Pesquisa participante em um contexto de economia camponesa. In: BRANDÃO, Carlos Rodrigues (Org.). Repensando a pesquisa participante. 3ª edição. São Paulo: Brasiliense, 1987.
OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Geografia Agrária: perspectivas no início do século XXI. In: OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de; MARQUES, Marta Inez Medeiros (Orgs. ). O Campo no século XXI: território de vida, de luta e de construção da justiça social. São Paulo: Casa Amarela e Paz e Terra, p. 29-70, 2004.

Belo Horizonte, MG, 11/9/2018.

Obs.: Os vídeos, abaixo, ilustram o texto, acima.
1     - 24º Grito dos Excluídos em Belo Horizonte/MG - 1ª Parte - 07/9/2018.



2     - Vida em primeiro lugar/24º Grito dos Excluídos/BH/MG - 2ª Parte - 07/9/2018.



3 - Incêndio/Museu Nacional/RJ: Descaso com a história/Dra. Alenice/Merong e Marinalva, Kamakã/03/9/2018.





[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. 
www.twitter.com/gilvanderluis             Facebook: Gilvander Moreira III

[3] Ibidem.