Gilvander é frei e padre da Ordem dos carmelitas, Doutor em Educação pela FAE/UFMG; bacharel e licenciado em Filosofia pela UFPR, bacharel em Teologia pelo ITESP/SP, mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas, em Minas Gerais.
A vivência da Sabedoria nos conduz a Deus. Frei Carlos Mesters, do CEBI, em entrevista a frei Gilvander: Mês da Bíblia. 19/8/2018.
Setembro! Eis que vem vindo uma nova primavera. Se o inverno foi rigoroso, as folhas secas continuaram adubando a terra, e nada, mas nada mesmo detém a força, a beleza e o perfume da primavera. E se a criação nos comunica tão linda mensagem de força e esperança na vida da Natureza, o que dizer da própria Palavra de Deus presente na vida e na história do seu povo? Não é por acaso que o mês de setembro foi escolhido pela Igreja no Brasil como o “Mês da Bíblia” há mais de 70 anos. Um convite à leitura, ao estudo, à reflexão dos textos bíblicos para nos animar, nos inspirar e nos fortalecer na caminhada, no esperançar da luta por uma vida digna para todos e todas. Nesse ano de 2018, somos chamados a mergulhar no Livro da Sabedoria, na Bíblia. Em uma sociedade marcada pela linguagem do capital, predominante na grande mídia, nas escolas, nas ações do Estado e até mesmo nas igrejas, o Livro bíblico da Sabedoria vem nos mostrar a Palavra de Deus a nos orientar, nos iluminar para a linguagem da convivência fraterna que só pode ser construída com justiça. Livro da Sabedoria é livro da Justiça e Teologia Política, pois na contradição entre justos e injustos se posiciona ao lado do justo que se torna imortal. O injusto e opressor, por outro lado, será como "palha no fogo", desaparecerá. Nesse vídeo, a Sabedoria nos é apresentada por nosso querido biblista, frei Carlos Mesters, carmelita do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos (CEBI - www.cebi.org.br ). Em entrevista a frei Gilvander, também biblista do CEBI, com ternura e olhar proféticos, frei Carlos Mesters nos ajuda a perceber no Livro da Sabedoria, a mensagem de Deus, tão presente na vida do povo, e nos provoca a compreender melhor o Livro da Sabedoria, na certeza de que “a vivência da Sabedoria nos conduz a Deus”.
Frei Carlos Mesters, carmelita e biblista do CEBI. Foto: G. L. Moreira
*Frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI, entrevista frei Carlos Mesters, um dos fundadores do CEBI e biblista. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação do CPT-MG. Brasília, DF, 19/8/2018.
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Sabedoria, livro da Justiça e Teologia Política. Tea Frigerio, biblista do CEBI, em entrevista a frei Gilvander. 19/8/2018.
Aconteceu, em Brasília, nos dias 17, 18 e 19 de agosto de 2018, no Centro de Pastoral da Paróquia Santa Edwiges, dos Padres Estigmatinos, uma Assembleia Extraordinária do CEBI Nacional (Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos – www.cebi.org.br). Dias de mística, espiritualidade, reflexão, avaliação e convivência fraterna, tendo como centro a Palavra de Deus, Luz que ilumina a caminhada e aquece a esperança dos cebianos. Ao final do encontro, frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e biblista do CEBI, entrevistou uma das matriarcas do CEBI, a biblista Irmã Tea Frigerio que, com visível entusiasmo profético, falou sobre o Livro da Sabedoria. Nesse ano de 2018, a Igreja no Brasil propõe a leitura, o estudo e a reflexão desse Livro que orienta para a prática da justiça, para a construção de uma sociedade em que prevaleça o bem comum.
Irmã Tea Frigerio, biblista do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos (CEBI). Foto: G. L. Moreira.
* Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. Brasília, DF, 19/8/2018.
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CEBI-PR: Leitura da Bíblia na ótica da mulher e do/da idoso(a). Carlos Mesters, Tea Frigerio e Wânia Scarpetto. 19/8/2018.
Na Bíblia, Deus se revela a nós pela Palavra transmitida. Palavra que é atual, viva, provocativa e eficaz. O CEBI (Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos - www.cebi.org.br ), pela orientação da leitura popular da Bíblia, atinge milhares de grupos e comunidades, ajudando o povo a reapropriar-se da Bíblia, encontrando nela luz, ânimo e esperança para resistir às dificuldades e lutar por uma vida digna. Nesse contexto, com o suporte de dois renomados biblistas, frei Carlos Mesters e Irmã Tea Frigerio, Wânia Scarpetto, Coordenadora do CEBI-PR, anuncia dois novos projetos a serem desenvolvidos pelo CEBI-PR: a leitura bíblica na ótica do idoso, com textos de
frei Carlos Mesters e a leitura bíblica na ótica da mulher, com assessoria da
Irmã Tea Frigerio. “Lâmpada para os meus pés é tua palavra, e luz para o meu
caminho” (Salmo 119, 105).
Frei Carlos Mesters, biblista do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos (CEBI).
*Vídeo de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI.
Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação do CPT-MG. Brasília, DF, 19/8/2018.
Cachoeira Casca D’Anta: Bênção do Deus da Vida. 2ª Pré-Romaria da XXI Romaria das Águas e da Terra de MG. 7ª Parte. 05/8/2018.
O que poderia marcar melhor o encerramento da 2ª Pré-Romaria da XXI Romaria das Águas e da Terra do Estado de MG, realizada em São Roque de Minas, dia 05/8/2018, do que o canto das águas? Eis que na Cachoeira Casca D’Anta, no Santuário Natural e Sagrado da Serra da Canastra, o próprio Deus se faz Água e jorra, cantando, com força divina total, e se abre em lago e segue contornando pedras, irrigando a terra, unindo as vidas na grandeza do Rio São Francisco, em uma imensurável bênção na vida que, mesmo tão maltratada, ainda segue avançando para as minas, os gerais e para o Nordeste. Cachoeira Casca D’Anta, a maior queda do Rio São Francisco, com queda livre de 186 metros! Um espetáculo belíssimo da natureza que encanta os olhos, aguça os ouvidos, fala fundo à alma. Cachoeira Casca D’Anta! Voz de Deus a clamar por cuidado com a criação, por coragem de lutar contra as forças opressoras e destruidoras do capitalismo - máquina de moer vidas - que violenta a Mãe Terra, faz secar a Irmã Água e depreda as serras, moradas sagradas e preciosas de bens naturais, além de superexplorar a dignidade humana com a acumulação de capital. Na eloquência do murmúrio das águas da Cachoeira Casca D’Anta, o convite aos romeiros e às romeiras da Mãe Terra e da Irmã Água e a todas as forças vivas da sociedade e das Igrejas, à participação na XXI Romaria das Águas e da Terra do Estado de Minas Gerais, cuja culminância acontecerá em Lagoa da Prata, no dia 16/9/2018. Juntos, “Das Nascentes do São Francisco, às Terras da Justiça”, “Cuidando da Mãe Terra e da Irmã Água”, é possível fazer dessa sociedade uma “Terra sem males”, com justiça social, agrária e ambiental, em que a Cachoeira Casca D’Anta e tantas outras maravilhas da criação não sejam uma bela lembrança, uma bonita imagem na memória, mas sejam uma realidade da fé e do compromisso com o Deus da Vida e com as exigências que esse compromisso traz. Esperamos que a Cachoeira Casca D'Anta não continue secando!
Cachoeira Casca D'Anta, próximo ás nascentes do Rio São Francisco, na Serra da Canastra, em Minas Gerais. Foto: G. L. Moreira.
*Reportagem em vídeo de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. São Roque de Minas, MG, 05/8/2018.
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Aldeia Kamakã Grayra em retomada na FUCAM, em Esmeraldas, MG: Resistência pelo direito a terra. 18/8/2018.
Na Aldeia Kamakã Grayra, em retomada, na Fazenda Santa Tereza, propriedade do Governo de Minas Gerais, uma das três fazendas da FUCAM (Fundação Educacional Caio Martins), o clima é de indignação, mas também, de luta e resistência. Há um ano e oito meses, dezenas de famílias indígenas, que moravam na Região Metropolitana de Belo Horizonte, viram-se forçadas a mobilizarem-se para a retomada de terras que, por direito lhes pertence. Na capital de Minas Gerais e região metropolitana, sob a alegação oficial de que não podiam ser tratados como indígenas por estarem em território urbano, sofriam preconceitos, discriminação, violência e não tinham acesso às políticas públicas que lhes garantissem viver com dignidade. Essas famílias eram totalmente desrespeitadas em seus direitos fundamentais. Hoje, em retomada, formam a Aldeia Kamakã Grayra, na fazenda Santa Tereza, onde vivem conforme sua cultura, em perfeita harmonia com a Mãe terra, da qual cuidam com especial zelo e respeito, e nela produzem alimentos para sua sobrevivência. Na época da retomada, esta fazenda, assim como as outras duas fazendas da FUCAM, encontrava-se totalmente abandonada, sem cumprir qualquer função social. Com a presença do povo Kamakã, o território ganhou nova paisagem, ganhou vida porque é vida o que é ali semeado, plantado, colhido e vivenciado pelos indígenas da Aldeia Kamakã Grayra, apesar das dificuldades pelas quais passam para sobreviver. Entretanto, a ameaça da reintegração de posse, injusta, ilegal e imoral, faz-se presente sobre essa Aldeia. É preciso fortalecer a Rede de Apoio à permanência do povo Kamakã nessa terra que, originariamente, lhes pertence por legítimo direito. A única ação justa, sensata, humana e legal a ser feita pela Direção da FUCAM e pelo Governo de Minas Gerais é reconhecer a legitimidade dessa retomada indígena pelo povo Kamakã e efetuar o Uso de Concessão da Terra para essa Comunidade Indígena. As famílias da Aldeia Kamakã Grayra e outras famílias que a elas poderão se juntar têm todo direito de (re)construir sua história e viver com qualidade e dignidade em seu território, onde possam fortalecer suas tradições, seu costume, sua cultura, em perfeita harmonia com a Mãe Natureza. Para defender suas terras, o povo Kamakã se fortalece na resistência e está disposto a lutar até às últimas consequências em defesa dos seus direitos. Esta terra é da Aldeia Kamakã Grayra. Sua arma é a resistência. E com as famílias desta Aldeia estão em luta muitas forças vivas da sociedade para que lhes seja assegurado viver no território que lhes pertence.
*Vídeos originais enviados por indígenas da Aldeia Kamakã Grayra. Apoio de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. Esmeraldas/MG, 18/8/2018.
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Marcas do período pré-colonial - figurações rupestres picturais milenares deixadas por grupos humanos, ancestrais dos atuais indígenas nas paredes de abrigos rochosos, Serra do Cipó, MG. Foto: A. Baeta, 2017.
O
‘marco temporal da ocupação’ é uma argumentação insustentável e racista que
ignora completamente as perseguições, violências e massacres sofridos por
milhares de comunidades indígenas e quilombolas desde o período colonial,
trazendo insegurança jurídica e social a estes povos. Trata-se de uma farsa
perpetrada no Congresso Nacional pela bancada ruralista em 2009, capitaneada
pelo ex-ministro Carlos Ayres de Brito do Supremo Tribunal Federal (STF), que
plantou, durante o julgamento da Terra Indígena (TI) Raposa Terra do Sol
situada em Roraima, a inconsistente tese que preconiza que os direitos
territoriais dos povos indígenas só teriam validade se eles estivessem em suas
terras em 5 de outubro de 1988 - data da promulgação da atual Constituição
Brasileira. Significou o estabelecimento deste ano como balizamento único de
ocupação para fins de demarcação de terras indígenas. Posteriormente, o próprio
STF reconheceu que a decisão proferida neste processo não poderia causar efeito
vinculante, ou seja, não deveria estender as suas implicações ou decisões a
outros casos. Não obstante, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil apresentou
a Proposta da Súmula Vinculante nº 49, onde solicitou a reativação da adoção geral de
1988 como marco temporal para validação de direitos originários às terras (NAKANE
& MICHELLETI, 2017; MILANEZ, 2017). Mesmo
com a manifestação da Comissão de Jurisprudência do STF indicando o imediato
arquivamento dessa proposição, em 20 de julho de 2017, o golpista Michel Temer,
buscando oficializar esta absurda falácia, publicou no Diário Oficial da União
(DOU) o Parecer 001/2017/GAB/CGU/AGU que estende os intentos do julgamento da Terra
Indígena Raposa Terra do Sol para todo o país, em troca de apoio político da
bancada do agronegócio no Congresso Nacional golpista, além de prescrever a
obstrução à possibilidade de ampliação de terras indígenas já demarcadas
(NAKANE & MICHELLETI, 2017).
Visando
o fortalecimento desta política de violação de direitos dos povos originários,
também em julho de 2017, o impostor (des)governo Temer publicou uma portaria que
criou um grupo de trabalho formado pela Polícia Federal, Secretaria de
Segurança Pública e Fundação Nacional do Índio (FUNAI), visando formular propostas
de “organização social” das comunidades indígenas e quilombolas. A ideia seria trazer ainda a questão
quilombola para o âmbito do Ministério da Justiça, até então tratada na esfera
do Ministério da Cultura e no Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA), dificultando procedimentos identitários, demarcatórios e
trâmites relacionados à titulação das terras remanescentes (MILANEZ, 2017).
Esta
medida se alinha também à proposição de Emenda Constitucional conhecida como
PEC 215 bancada pelo mesmo grupo político reacionário ruralista que prevê a transferência
do Executivo[3] Federal para
o Congresso Nacional com relação à decisão final sobre a demarcação de terras
indígenas, a titulação de territórios quilombolas e a criação de unidades de
conservação ambiental. O texto ainda proíbe a ampliação de terras indígenas já
demarcadas, prevendo a indenização aos proprietários.
O
que também se pretende legitimando o ‘marco temporal’ e todas estas proposições
fascistas é anistiar os crimes cometidos contra os povos tradicionais
relacionadas à escravidão, torturas, confinamentos em pequenos territórios,
aprisionamentos, exílios, remoções forçadas, desterros, separação de
familiares, assassinatos, apropriações indevidas de territórios tradicionais, desconsiderando
assim as noções de reparação histórica, de dívida histórica com os povos
originários, de resguardo cultural e imemorial, de direitos congênitos,
imprescritíveis, intangíveis e da posse coletiva da terra.
Além
de lideranças indígenas e quilombolas e especialistas em Direitos Humanos,
renomados juristas brasileiros afirmam que o argumento do ‘marco temporal’ é
inconstitucional e inconvencional, ferindo, em especial os artigos 231 e 232 da
Constituição, além de desrespeitar a Convenção da Organização Internacional do
Trabalho (OIT) n. 169, de 1989, ratificada pelo Brasil, que consagra os
direitos culturais e territoriais, bem como a autodeclaração, como instrumento
primaz da identidade étnica, além do reconhecimento das diferentes formas de ocupação,
manejo e uso da terra. Isto implica, obviamente, que o preceito da
tradicionalidade deve transcender requisitos temporais e restritivos. Ainda vem
sendo constatada a infringência do direito à consulta, prevista na convenção
supracitada, uma vez que novos processos não têm tido a participação prevista
por parte dos povos tradicionais, criando um clima de provisoriedade e
injustiça jurídico-política.
Ainda
na esfera Internacional, importante mencionar o posicionamento da Corte Interamericana
de Direitos Humanos (CIDH) no tratamento de julgamentos relacionados aos
direitos possessórios indígenas, que costuma considerar em suas sentenças violação
aos seus direitos a demora ou postergação na adoção de medidas internas que
visem o eficaz reconhecimento e a demarcação de terras, além de reiterar a
prerrogativa da autodeterminação, invocando a sua plena autonomia. Fica mais
que claro que os procedimentos do STF estão em total desacordo com a jurisprudência
da referida Corte (SCHWANTES & STARCK, 2017).
“Agora, o Supremo ao invés de ser portador da
segurança dos direitos possessórios indígenas, cria um entendimento que viola
totalmente a Constituição e documentos internacionais de direitos humanos em
nome de, entre outras razões, a dificuldade de se estabelecer uma retrospectiva
imemorial sobre as terras indígenas” (SCHWANTES & STARCK, 2017: 160).
Contudo,
o advogado indígena Luiz Henrique Eloy, da Articulação dos Povos Indígenas do
Brasil (APIB), alerta que: “Muitos juízes
de primeira instância têm aplicado cegamente o ‘marco temporal’ e determina
reintegração de posses”[4] avaliando que aplicações
nas varas de primeira instância vêm desestabilizando e impactando a organização
de comunidades indígenas.
A
demora ultrajante por parte do STF em julgar[5] infundada a tese do ‘marco
temporal’ afronta os direitos humanos, contrariando também as informações e
revelações contidas no relatório da Comissão Nacional da Verdade (CNV)[6]. Tal documento da CNV
denuncia que no período de 1940 a 1988, o Estado foi responsável por várias
omissões e ilicitudes, sendo comum a elaboração de laudos fraudulentos
atestando a inexistência de povos tribais em inúmeras parcelas de terras
almejadas. Houve uma clara tentativa de eliminar famílias e comunidades
tradicionais durante o regime ditatorial civil-militar-empresarial, agravando
ainda mais o quadro de violações de suas terras em nome do chamado “desenvolvimento
e integração nacional”. Neste período, povos foram aprisionados, forçados a
serviços militares e banidos de seus territórios para instalações de
agroindústrias, hidrelétricas, explorações de minerais, madeira, abertura de
estradas, entre outros empreendimentos e negociatas. As informações sobre
delitos e transgressões contra os povos indígenas foram tão aviltantes que
resultou na proposição final da criação de uma Comissão Nacional da Verdade
Indígena (CNVI). O que se pretende é dar luz e tornar públicas as remoções
forçadas dos povos indígenas de seus lugares, a partir da compreensão da
realidade fática e não da institucionalmente construída ou fabricada, dando
visibilidade à história da resistência indígena e de sua espoliação (OSOWSKI,
2017).
O
que se constata é que o poder judiciário vem agenciando uma verdadeira política
de esquecimento, negando o território e o sentido de pertencimento desses
povos. Baseando-se nas premissas sobre a “memória das tragédias ou do
infortúnio” de J. Candau (2016), R. Osowsky propõe que “a lembrança das violências, dos deslocamentos forçados e a usurpação de
terras por parte dos brancos continua na esfera do memorável por parte dos
povos indígenas (OSOWSKY, 2017: 337). As lembranças frequentemente estão
associadas a lugares com testemunhos materiais, arqueológicos e intangíveis do
passado e de uma ancestralidade, ou seja, a espaços territoriais onde fluem memórias
coletivas vividas, construídas e reinterpretadas.
Segundo
o jurista Carlos Frederico Marés (2013), a manutenção desta política de
esquecimento por parte do Estado resultará na ausência de demarcação de terras,
o que ocasionará, no médio e longo prazo, um verdadeiro etnocídio. O direito
originário não se restringe somente em restaurar um passado ancestral e a sua história
marcadamente violenta, mas também garantir um futuro possível e harmônico, por
meio de políticas que coadunam com os preceitos dos direitos humanos
internacionais e com os prevalecentes dispositivos constitucionais.
Vale
a pena mencionar uma importante frase dos assessores jurídicos do Conselho
Indigenista Missionário (CIMI) a respeito do ‘marco temporal’, reiterando que
este fere os direitos possessórios indígenas e o instituto do indigenato
(direitos originários), gerando um cenário de alto risco.
“(...)
Além de se configurar como uma
interpretação distanciada do contexto histórico e social, é visivelmente
inconstitucional. (...) Verifica-se que se tenta impor uma interpretação
jurídica desvinculada dos sujeitos de direito de hoje - os povos indígenas -
como se não houvesse relação entre o passado, o presente e futuro das 305
etnias que vivem no território brasileiro atualmente” (CUPINSKY et al., 2018).
A
mais recente manobra ocorreu no mês agosto de 2018, quando os representantes da
Confederação Nacional de Agricultura (CNA), da Frente Parlamentar de
Agricultura (FPA) no Congresso Nacional e uma deputada do DEM do Mato Grosso do
Sul encaminharam ao golpista Temer a revogação do Decreto nº 6040/2007 que
institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos Indígenas,
solicitando ainda a suspensão de processos demarcatórios. Especialistas
analisam que esta ação da “bancada do boi e da bala” seria uma represália
declarada à conquista das comunidades quilombolas sobre o julgamento da Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 3239, que questionava o Decreto nº 4.887/2003,
que regulamenta o processo de demarcação e titulação das terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombos.
Em
entrevista[7], a procuradora da
República Deborah Duprat assevera que o judiciário desconhece a real profundidade
e a multiplicidade de circunstâncias históricas que envolvem os povos tradicionais,
sendo que os direitos fundamentais destas comunidades apresentam caráter
inalienável, propondo que o “problema” do ‘marco temporal’ antecede o
julgamento da Raposa Serra do Sol, tendo sido construído internamente pelo STF
desde o final da década de 1990. Duprat considera que foi a mobilização contínua
e aguerrida dos povos indígenas e quilombolas que impediu, de fato, que estas
medidas e políticas conservadoras avançassem ainda mais. “A PEC 215 já teria sido aprovada e as decisões do STF sobre o ‘marco
temporal’ e as demarcações já estariam consolidadas.”
Sigamos atentos e na
luta. ‘Marco Temporal’ Não, porque é
absurdo, inconstitucional e violação aos direitos dos povos originários!
SCWANTES, S. & STARCK, G. Marco temporal
e as violações aos direitos dos povos indígenas. In: Anuário Brasileiro de Direito Internacional, vol. 2, n. 23, jul. de
2017.
SOUZA FILHO, C. F. M. Os Povos indígenas e o
Direito Brasileiro. In: SOUZA FILHO, C. F. M &
BERGOLD, R. C. (Orgs). Os Direitos dos Povos
Indígenas no Brasil: desafios no século XXI. Curitiba: Letra da Lei, 2013. p. 13-34.
Belo Horizonte, MG, 28/8/2018.
Obs.: Os vídeos, abaixo, ilustram o texto, acima.
1 -
Retomada Indígena Kamakã Grayra/Esmeraldas/MG: O direito à terra. 1ª Parte.
06/6/2018.
3 -
Retomada Indígena na FUCAM/Esmeraldas/MG: Luta legítima pelo direito à terra/3ª
Parte. 06/6/2018.
4 -
Quilombo Marobá dos Teixeira, Almenara/MG: clamor por justiça. Sr. Orlindo
Teixeira e Kena. 15/04/2017
5 -
Daiane, Comunidade Quilombola Baú/MG - Ameaças e violência por lutar pelo
território/24/5/2018.
6 -
Comunidade Quilombola Braço Forte, em Retomada/Salto da Divisa, MG/A luta pela
terra/09/6/2016.
oHorHor
[1] Doutora em Arqueologia pelo
MAE/USP; Pós-Doutorado no Departamento de Antropologia e Arqueologia na FAFICH/UFMG;
Mestra em Educação pela FAE/UFMG; Historiadora e integrante do CEDEFES (Centro
de Documentação Eloy Ferreira da Silva – www.cedefes.org.br ).
[2] Frei e padre da Ordem dos
carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em
Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e
Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos”
no IDH, em Belo Horizonte, MG.E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br - www.freigilvander.blogspot.com.br–
[3] Segundo o Estatuto do
Índio, em vigor desde 1973, o reconhecimento de terras para uso exclusivo dos
índios é homologado por decreto do presidente da República. Ao Executivo,
também cabe proteger esses povos.O
processo de demarcação depende de estudos técnicos realizados pela FUNAI e de
aprovação do Ministério da Justiça. A pasta também determina a desapropriação
de fazendas na área demarcada e os proprietários são ressarcidos pelas
benfeitorias realizadas no local. Já o pagamento pela terra não está previsto
em lei. A PEC 215 segue em tramitação no Congresso Nacional.
[5] No dia 16 de agosto de 2018 foi
previsto pelo STF a análise do ‘marco temporal’, o que não ocorreu, postergando
a decisão, mantendo sob ameaças os direitos básicos dos povos indígenas e
quilombolas. Nessa seção julgaram,
todavia, duas ações civis abertas pelo estado do Mato Grosso com questionamento
sobre demarcações de terras indígenas.
[7] Concedida a M.
Pellegrini publicado em 18/11/2015 na Carta Capital. (https://www.cartacapital.com.br/sociedade/temos-tracos-de-colonialismo-dos-quais-nao-nos-libertamos-1405.html)
"As Reformas são para sangrar o povo." 2a Pré Romaria da XXI Romaria/Terra/Água/MG. Padre Tonhão. 3ª Parte. 05/8/2018.
No dia 05/8/2018, no município de São Roque de Minas, foi realizada a 2ª Pré-Romaria da XXI Romaria das Águas e da Terra do Estado de Minas Gerais. A escolha do local para essa 2ª Pré-Romaria foi mesmo providencial. Um município emoldurado por uma das mais belas paisagens de Minas Gerais, onde brotam as principais nascentes do Rio São Francisco, na Serra da Canastra, rica dos mais diversos bens naturais, um verdadeiro Santuário Sagrado Natural que abriga a mãe terra e a irmã água, dons de Deus para o uso necessário de todos e todas. Um paraíso ameaçado pela ganância dos capitalistas que, em nome do deus mercado, querem seguir explorando tudo, destruindo matas, envenenando o solo, poluindo as águas, expulsando vidas, desrespeitando os direitos das Comunidades Tradicionais Canastreiras, colocando em risco o ecossistema da região, colocando em risco a vida em toda sua biodiversidade. Essa corrida, enfrentada com luta e resistência dos que ali dedicam-se a defender a mãe terra, a irmã água e as Comunidades Tradicionais Canastreiras, precisa ser fortalecida. É esse o alerta e o chamado feito por Padre Antônio Campos Vieira, o Padre Tonhão, Vigário da Diocese de Luz/MG: é preciso mudança de comportamento, é preciso ter a coragem de incomodar para defender a vida. Nesse vídeo, o registro do anúncio das maravilhas da região, da denúncia feita por Padre Tonhão das ameaças a esse Santuário e da esperança na coragem de todas as pessoas de bem e de todas as forças vivas da sociedade de colocarem-se como romeiros e romeiras da mãe terra e da irmã água, “das nascentes do São Francisco às terras da justiça.”
*Filmagem de Maria do Rosário de Oliveira Carneiro, da Cáritas Brasileira, Regional MG e Advogada Popular. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.