Gilvander é frei e padre da Ordem dos carmelitas, Doutor em Educação pela FAE/UFMG; bacharel e licenciado em Filosofia pela UFPR, bacharel em Teologia pelo ITESP/SP, mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas, em Minas Gerais.
quinta-feira, 25 de maio de 2017
quarta-feira, 24 de maio de 2017
No Brasil, são 41 camponeses assassinados, em 2017, até hoje, dia 24/5/2017, segundo dados da CPT. Carta do Ato Denúncia Por Direitos e contra a Violência no Campo
CARTA DO ATO DENÚNCIA “Por
Direitos e contra a Violência no Campo”.
Os casos de violência e
barbárie no campo no mês de abril de 2017 chocaram a população brasileira e
repercutiram mundo afora.
A Comissão Pastoral da Terra
– CPT, que registra e analisa os conflitos no campo desde 1985, percebeu um
aumento significativo no número de assassinatos no campo em 2015, quando sete
camponeses foram assassinados num período de cinco meses, na Gleba Bacajá,
Anapú, PA. Notou também que o número de assassinatos no campo aumentou
sucessivamente, de 36 em 2014, para 50 em 2015 e 61 em 2016.
O ano de 2017 já apresenta
um cenário desolador de violência que não se restringe apenas a algumas
pessoas, mas adquiriu caráter de chacinas e massacres brutais. A CPT já
confirmou 26 assassinatos no campo desde janeiro de 2017.
O Brasil todo viu o massacre
de Colniza, MT, no dia 19 de abril de 2017, quando nove vidas foram ceifadas, e
em Viana, MA, no dia 29 de abril de 2017, quando um ataque brutal deixou 22
feridos.
A região de Vilhena, RO,
palco de conflitos violentos em 2015 e 2016, teve mais um caso em 2017: três
pessoas foram encontradas carbonizadas, dentro de um veículo incendiado; o mesmo
que se viu em Sta. Maria das Barreiras, PA, onde 4 pessoas foram encontradas
carbonizadas dentro de um carro.
Esses casos assustam ainda
mais pelo nível de crueldade e violência empregados. No ataque aos Gamela, um
indígena teve as mãos decepadas e ferimentos graves à altura dos joelhos, e
outro uma das mãos praticamente decepada. Em Colniza, MT, uma pessoa foi
degolada e outras mortas depois de sofrerem tortura. O militante do MST, Etevaldo
Soares Costa, assassinado no dia 5 de maio de 2017, na fazenda Serra Norte em
Eldorado do Carajás, no Pará, teve os dedos cortados, as pernas cortadas em
quatro partes, os olhos furados, e foi colocado num saco plástico e jogado fora
da área da fazenda.
Vivemos uma situação de
violência estrutural e recorrente. A impunidade das violações de direitos
humanos ocorridas no campo garante a eficácia da repressão e aumenta a lista de
pessoas e grupos ameaçados e assassinados. Para exemplificar este cenário,
tendo como referência o período de 2007 a 2017, das 390 vítimas de
assassinatos, 48 foram ameaçadas anteriormente. Neste mesmo período, tivemos
407 vítimas de tentativas de assassinato, destas, 55 foram ameaçadas
anteriormente. De um total de 302 pessoas ameaçadas de morte, 254 foram
ameaçadas mais de uma vez, 55 já sofreram tentativa de assassinato e 48 foram
assassinadas.
A violência não se restringe
às ameaças, tentativas e assassinatos, pois é igualmente preocupante a
intensificação da criminalização de lideranças e movimentos do campo, com
aumento de prisões preventivas e tentativas de aplicação de leis que tratam de
organização criminosa como formas de coibir o protesto social.
As prisões de militantes do
MST nos Estados de Goiás e do Paraná, com acusações de formação de organização
criminosa, são graves e revelam a sanha punitivista de parte de nosso sistema
de justiça.
O Estado não é apenas
conivente e omisso, posição que perpetua a impunidade no campo pela
‘seletividade’, ‘morosidade’ e ‘inoperância’ do sistema de justiça que de um
lado criminaliza os movimentos populares e de outro mantém impunes as ameaças,
homicídios e violações de direitos humanos. O Estado é também agente ativo no
fomento à violência, tanto pelas políticas e programas do Executivo que
fomentam a acumulação de terras e de riquezas, como pelo Legislativo que, ao
passo que destrói os direitos humanos conquistados pelos trabalhadores e
trabalhadoras, faz uso de mecanismos, como a CPI da FUNAI e INCRA, para
criminalizar as vítimas e defensores de direitos humanos.
Nos últimos tempos,
especialmente após o golpe que retirou do poder uma presidenta eleita pelo voto
popular, os ataques institucionais e físicos experimentaram crescimento
acelerado. Entre as primeiras medidas, o governo usurpador extinguiu
Ministérios e autarquias e seguiu o desmonte do Estado com diminuição de
recursos e pessoal de órgãos responsáveis por garantir políticas sociais, como FUNAI
e INCRA.
É longa, enfadonha e trágica
a série de Medidas Provisórias, Projetos de Lei, Propostas de Emendas à
Constituição e Decretos que afetam diretamente povos e comunidades do campo,
entre as quais destacamos:
A PEC 215, que propõe
transferir para o Congresso Nacional a prerrogativa de reconhecimento de terras
indígenas, hoje competência do Executivo Federal;
Os 29 Projetos de Decreto
Legislativo-PDCs, apresentados pelo deputado federal Jerônimo Goergen-PP-RS em
junho de 2016, à Câmara Federal, para suspender decretos assinados pela
presidenta afastada Dilma Rousseff, de desapropriação de imóveis rurais para a Reforma
Agrária e regularização de territórios quilombolas e terras indígenas;
A MP 759/2016, que aniquila
políticas de reforma agrária e do uso social da terra, municipaliza a
prerrogativa de regularização fundiária urbana e rural e privatiza ainda mais as
terras públicas.
O povo do campo clama por
seus direitos e protesta:
Pelo cumprimento dos acordos
internacionais assinados pelo Estado Brasileiro e respeito à Constituição
Federal;
Pela autodeterminação dos
povos originários e tradicionais;
Pela realização da Reforma
Agraria com a ampliação das desapropriações de terras para assentar a todas as
famílias de trabalhadores e trabalhadoras rurais sem terra e com pouca terra,
atendendo emergencialmente aquelas que se encontram em áreas de conflito
agrário, em ocupações e acampamentos;
Pela titulação dos
territórios quilombolas;
Pela demarcação dos
territórios indígenas;
Para que sejam assegurados
recursos orçamentários e financeiros em quantidade suficiente para a execução
das políticas de reforma agrária, titulação de territórios quilombolas,
demarcação das terras indígenas, atendendo à demanda por ampliação dos recursos
humanos, tecnológicos e operacionais de modo a permitir a realização das
políticas públicas, programas e serviços destinados aos trabalhadores e
trabalhadoras rurais;
Pela não aprovação da MP
759/2016 e dos demais instrumentos normativos que significam retrocessos nos
direitos dos povos, comunidades tradicionais e trabalhadores rurais;
Pela atualização dos
instrumentos normativos que possibilitem o fortalecimento do papel do Estado
nos processos de fiscalização do latifúndio e das propriedades rurais que não
cumpram a Função Social, especialmente quanto à Função Social da Propriedade, à
Criminalização da Luta pela Terra, à atualização dos índices de Produtividade,
e contra a estrangeirização das Terras;
Pelo pleno desenvolvimento
econômico e social dos projetos de assentamento de reforma agrária, garantindo
crédito, políticas públicas, infraestrutura e serviços de qualidade, em
quantidade e com prazos adequados para que as famílias assentadas possam
fortalecer seus processos organizativos e produtivos e viver com dignidade e
segurança nas áreas reformadas;
Pela adoção emergencial de
procedimentos e ações de combate à violência e impunidade no campo, em
especial:
a) Retomada da Ouvidoria
Agrária Nacional com caráter independente do INCRA, assegurando condições
operacionais e financeiras para atendimento de toda a demanda;
b) Fortalecimento da FUNAI
como autarquia responsável pela política indigenista garantindo o orçamento e
estrutura necessária para dar celeridade aos processos de demarcação e
atendimento aos povos indígenas;
c) Gestão junto aos órgãos
do poder judiciário nos estados, junto aos tribunais regionais e aos ministros
do STJ e STF, visando dar prioridade ao julgamento de ações pendentes e que
tenham relação com os conflitos fundiários, uma vez que a demora no julgamento
das mesmas faz acirrar os conflitos fundiários e geram imensos prejuízos
financeiros ao Estado;
d) Gestão junto aos
tribunais estaduais e regionais cobrando julgamento prioritário dos processos
criminais relativos à violência no campo e ao trabalho escravo;
e) Reativação do Fórum de
Assuntos Fundiários no âmbito do CNJ;
Pela urgente investigação e
punição dos responsáveis pelos assassinatos, massacres e violências no campo!
Diante do exposto, nós
participantes deste Ato Denúncia, nos comprometemos a:
Manter esta articulação com
a sociedade para o desenvolvimento de ações urgentes;
Lutar pelo direito à terra e
ao território dos povos indígenas, quilombolas, povos e comunidades
tradicionais e camponeses;
Lutar pelo direito dos povos
originários e tradicionais à autodeterminação;
Lutar contra a
criminalização dos movimentos sociais e defensoras e defensores de direitos
humanos;
Lutar por direitos e
combater as violações de direitos humanos no campo!
Brasília, DF, 23 de maio de
2017
Assinam essa Carta Ato
Denúncia:
Leia, no link, abaixo, Carta Ato Denúncia de 23/5/2017, Por Direitos e contra a violência no Campo. Leia e divulgue, sugerimos.
https://atodenuncia.wordpress.com/carta/
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