quinta-feira, 29 de maio de 2025

ASCENSÃO E EXALTAÇÃO DE JESUS: O PROJETO DE JESUS CONTINUA NA PRÁXIS DAS PESSOAS E COMUNIDADES (Lc 24,46-53; At 1,9-11) - Por frei Gilvander

ASCENSÃO E EXALTAÇÃO DE JESUS: O PROJETO DE JESUS CONTINUA NA PRÁXIS DAS PESSOAS E COMUNIDADES (Lc 24,46-53; At 1,9-11) - Por frei Gilvander Moreira[1]

Jesus negro. Reprodução Redes Virtuais

Antes da separação da obra lucana – Evangelho de Lucas (Lc) e Atos dos Apóstolos (At) - só existia o relato da Ascensão em Lc 24,50-53. Após a separação de Lucas e Atos, acrescentaram outra referência à Ascensão em At 1,1-2.9-11. A tradição original comum apresenta a ressurreição de Jesus como uma exaltação (cf. Rm 1,4; Fl 2,6-11, etc.). Só o evangelista Lucas fala da Ascensão, separando-a da ressurreição. Ele quer evidenciar o caráter histórico de cada uma dessas realidades. Lucas insiste na corporalidade do ressuscitado. Na Ascensão, uma linguagem mítica expressa a realidade histórica da exaltação/glorificação de Jesus. Com a Ascensão, Lucas quer dizer que Jesus não vai embora, mas é exaltado, glorificado. Jesus não sai deste mundo. A parusia não é o retorno de um Jesus ausente, mas, sim, a manifestação gloriosa de um Jesus que sempre esteve presente no meio das comunidades (cf. Mt 1,23; 18,20; 28,20). “Estou e sempre estarei com vocês”, enfatiza o Evangelho de Mateus.

As Comunidades Cristãs não nascem, porque Jesus vai embora ou porque não retorna, mas nascem justamente porque o ressuscitado não vai embora. Após a Ressurreição, Jesus continua presente na ausência física e no corpo dos cristãos e das cristãs. As Comunidades Cristãs não são frutos de uma parusia frustrada, mas de uma presença amorosa de Jesus, vivida de maneira histórica, não como presença visível e empírica, mas como presença transdescendente vivida na história. No livro dos Atos dos Apóstolos, as comunidades eclesiais são igrejas escatológicas não porque esperam a segunda vinda de Jesus, mas porque vivem desde já, historicamente, a experiência de Cristo ressuscitado e glorificado, no mundo e nas comunidades (cf. aparições de Jesus ressuscitado a Estevão, Pedro e Paulo e a experiência permanente do Espírito Santo nas comunidades).

A cena da Ascensão, sem paralelos no Evangelho de Mateus e no Evangelho de João, representa é o clímax dos relatos de aparições de Jesus que começam em Lc 24,36. Em Mc 16,19 há alguma semelhança. A descrição da Ascensão foi pintada com traços apocalípticos. Tendo o Primeiro Testamento como pano de fundo, encontramos algumas histórias de "Ascensão", como se pode ver nos casos de Enoc (Gn 5,24; Eclo 44,16; Hb 11,5); Elias (2 Rs 2,11; Eclo 48,9; 1 Mac 2,58), Esdras (2 Esd 14,9) e Moisés.

Em Lc 24,51 se diz que Jesus "foi elevado" (= anephereto), enquanto em Mc 16,19 se diz que Jesus "foi tomado" (= anelemppthe). Esse verbo ressalta mais a iniciativa e o poder de Deus, enquanto "foi elevado" (= anephereto) sugere mais iniciativa e poder de Jesus; sugere que Jesus atinge a plenitude humano-divina. O quarto Evangelho canônico, o do discípulo amado, comumente chamado de Evangelho de João, diz que Jesus apareceu a Maria Madalena antes da Ascensão (Jo 20,17). Lucas relata também que depois da Ascensão Jesus aparece a Paulo (At 9,4-6; 22,6-11; 26,14-17).

Segundo o Evangelho de Lucas, a Ascensão acontece na noite de Páscoa (cf. Lc 24,51; At 1,2). No entanto, conforme o relato de At 1,9-11, a Ascensão acontece "40 dias depois". Não é possível saber por que Lucas deu essas indicações de dois momentos diferentes para o relato do episódio da Ascensão. Não existem razões para pensar que Lucas considere como sendo dois episódios diferentes[2]. Não é provável que Lucas tenha descoberto a data de "40 dias" depois que tenha escrito o Evangelho.

A Ascensão é a plenitude da Páscoa de Jesus Cristo. Já em Lc 9,31.51, Moisés e Elias conversavam sobre o êxodo de Jesus. Com a Ressurreição-Ascensão, Jesus entra definitivamente na esfera de Deus, celestial[3]. A expressão grega "eis ton ouranon" pode ser traduzida por "para o seu céu", ou "no céu", ou em sentido aramaico por “no universo”. Logo o que Lucas quer dizer é que Jesus atinge a Transcendência. Não afirma que esta se dá no além, depois das nuvens, mas está principalmente na imanência. Somos um projeto infinito, com sede de transcendência, com vocação para superar os nossos limites e barreiras. Logo, a Ascensão é a coroação da caminhada libertadora do Filho do Homem. Os cristãos e as cristãs têm nesse evento um sinal-esperança capaz de sustentar a árdua tarefa de serem testemunhas desses acontecimentos, sendo outros cristos.

As pessoas cristãs são testemunhas do cumprimento das Escrituras (Lc 24,45-48). O Espírito Santo traz luz para reler as Escrituras e é chamado "Força do Alto". Já em Lc 1,35 se diz que pela "Força do Alto" Jesus se encarnou no seio de Maria. Agora, por essa mesma força, Jesus se encarnará na vida de seus seguidores e seguidoras. À luz desse Espírito, os cristãos e as cristãs são capazes de desmascarar e destruir as estruturas geradoras de morte, a fim de construir a nova história inaugurada pela prática e ensinamento libertadores de Jesus.

Jesus abençoa e dá vida (Lc 24,50-51). Usando imagem própria do tempo, segundo a qual se pensava que Deus habitasse além das nuvens, Lucas descreve Jesus sendo levado para o céu (Lc 24,51). A cena recorda Lv 9,22-24: "Arão levantou as mãos sobre o povo e o abençoou; e desceu, havendo feito a expiação do pecado, e o holocausto, e a oferta pacífica... Arão entrou na tenda da reunião.... e a glória do SENHOR apareceu a todo o povo... vendo todo o povo, jubilou e prostrou-se com o rosto por terra". Assim Lucas reafirma a continuidade das primeiras comunidades cristãs com a fina flor dos povos do Primeiro Testamento bíblico.

À semelhança dos povos do Primeiro Testamento (cf. Lv 9,24), a reação dos discípulos é de reconhecimento, expectativa e alegria: "Eles o adoraram e depois voltaram para Jerusalém, com grande alegria" (Lc 24,52). Reconhecem que Jesus realizou o projeto do Pai. E por isso é merecedor de adoração, que não é ficar de joelhos, paralisado diante do Senhor de nossas vidas, mas é associar-se ao projeto do Mestre Galileu sendo pessoas continuadoras criativas do Evangelho de Jesus Cristo. Vão a Jerusalém, alegres e com coragem, na expectativa de receberem a “força e a luz do Alto”, para continuarem a luta libertária iniciada pelo mestre da Galileia.

Vivem alegres porque Jesus não lhes foi tirado: ele se manifestará no seu Espírito, o animador e sustentador da caminhada dos cristãos e cristãs. A Ascensão de Jesus não é uma viagem para além das nuvens, mas a comunhão definitiva e plena com Deus, um mistério infinito de amor que envolve e perpassa toda a Criação.

A informação “Jesus sendo elevado” é uma importante afirmação cristológica, pois reflete a convicção das Igrejas primitivas que Jesus realmente ressuscitou, se tornou Senhor, Kyrios, está na presença do Pai.

Em At 1,9-11, na narrativa da Ascensão, Lucas conta a exaltação de Cristo ressuscitado. É composição lucana, possivelmente a partir de fonte oral. Os sinópticos descrevem somente a ressurreição. O evangelho apócrifo de Pedro também descreve a Ascensão (§35-42). A Ascensão é entendida como a última aparição “convincente” de Jesus. Lucas enfatiza a visão perceptiva de Jesus subindo; cinco verbos indicam isto. Assim os apóstolos se tornam testemunhas oculares da exaltação de Cristo. “Dois homens vestidos de branco” dizem “homens galileus...” e não dizem “apóstolos”. Também em Emaús Jesus aparece não aos apóstolos, mas a duas pessoas que têm a experiência de Jesus Cristo ressuscitado e voltam para Jerusalém. O Cristo que sobe inaugura o tempo da/s igreja/s. Com a Ascensão, à primeira vista, pensamos que Jesus “foi embora”, mas, na realidade mais profunda, o texto quer dizer que Jesus não foi embora. Ele continua vivo no corpo dos discípulos e discípulas.

Em At 1,9 fala do arrebatamento de Jesus. A referência à nuvem, símbolo teofânico, afirma que Jesus pertence definitivamente à esfera de Deus. É a certeza da comunidade de que Jesus cumpriu perfeitamente a vontade do Pai. Contudo, não basta sabê-lo. Torna-se necessário descruzar os braços, deixar de olhar passivamente para o céu, encarar a realidade que nos cerca, perceber que somos todos “homens da Galileia”, comprometidos com o testemunho de Jesus (At 1,10-11). O texto da Ascensão termina fazendo referência à volta de Jesus, da mesma forma como foi visto partir para o céu, ou seja, pelo testemunho coerente do Evangelho de Jesus Cristo.

Com a Ascensão, "Jesus não foi embora". Mesmo na ausência física, continua presente nas comunidades que se deixam guiar pelo Espírito Santo. Sua nova forma de presença na ausência física já se manifesta na encarnação e na ressurreição. Ele deve somente terminar de voltar e não começar a voltar, ou seja, manifestar visivelmente e de forma plena a sua presença. Isso é o que em grego se chama parusia.

Enfim, pela Ascensão Jesus passa o bastão para os discípulos e discípulas que, com alegria e coragem, devem seguir testemunhando a presença amorosa e libertadora do mestre galileu construindo o reinado divino. A presença de Jesus se dá pela autenticidade de seus discípulos e discípulas. Conclusão: carregar a bandeira do Evangelho é tarefa intransferível nossa.

É evidente a nossa responsabilidade pela presença do Reino na vida de todas as pessoas, no meio de nós, além de nos iluminar no sentido de que devemos rever nossa prática da fé, se estamos testemunhando com coerência o Reino de Deus pensado por Jesus em todas as dimensões da vida,  como presença de sua proposta de libertação, de vida digna para todos e todas e toda a criação. Conforme o testemunho do quarto evangelho (João 17), um primeiro e importante sinal disso é a unidade das Igrejas cristãs. Por isso, entre esse domingo, festa da Ascensão e o próximo, Festa de Pentecostes, celebramos a Semana de Oração e de Diálogo pela Unidade dos Cristãos. “Pai que todas as pessoas que vierem a crer em mim sejam UM, como Eu e Tu somos um, para que o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo 17, 21). Unidade na diversidade, sim; uniformismo, não!

29/05/2025.

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 - SEM TERRA FUNÇÃO SOCIAL P/ TERRA OCIOSA DA SIDERÚRGICA CAJURUENSE FALIDA, PRES. OLEGÁRIO/MG. Vídeo 7



2 - CARLITO E CIDA, EXEMPLO DE LUTA PELA TERRA: ACAMPAMENTO SANTA FÉ, PRESIDENTE OLEGÁRIO, MG. Vídeo 6



3 - PRÉ-JORNADA DE AGROECOLOGIA, TEIA DOS POVOS E MLB, NA OCUPAÇÃO PAULO FREIRE, BH/MG: MINERAÇÃO, NÃO!



4 - FÉ NA LUTA PELA TERRA: MÍSTICA BÍBLICA NA: ACAMPAMENTO SANTA FÉ, PRESIDENTE OLEGÁRIO, MG. Vídeo 4




[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI e Ocupações Urbanas; autor de livros e artigos. E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       Canal no you tube: https://www.youtube.com/@freigilvander      –    No instagram: @gilvanderluismoreira - Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Cf. P. BENOIT, "The Ascension", 242; Exégèses et Théologie, 1.399.

[3] Cf. Aristóteles, Metafísica, 12.8 & 1073a.

quarta-feira, 28 de maio de 2025

TSUNAMI DAS MINERADORAS E DO AGRONEGÓCIO: INDO DE ENCONTRO AO ABISMO? Por frei Gilvander

TSUNAMI DAS MINERADORAS E DO AGRONEGÓCIO: INDO DE ENCONTRO AO ABISMO? Por frei Gilvander Moreira[1]

O distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, MG, foi completamente devastado pela lama tóxica da barragem de Fundão, das mineradoras Vale, BHP Biliton e Samarco. O brutal crime continua se reproduzindo de muitas formas. Foto Reprodução Redes Virtuais.

Feliz quem observa os sinais dos tempos e dos territórios, e de forma cidadã convive e luta pela preservação das condições objetivas de vida para toda a Comunidade de vida, entre os quais estamos nós, os humanos. Em um olhar panorâmico sobre Minas Gerais, vemos a mineração devastadora avançando como um tsunami desenfreado nas Minas e nos Gerais. Na entrada de Ouro Preto, patrimônio mundial da humanidade e palco de mais de 300 anos de mineração, na Serra de Ouro Preto, território sagrado, berço das águas e de memórias ancestrais, estão oito mineradoras se instalando, entre elas a Patrimônio Mineração, estão cercando e sitiando Ouro Preto. Se não fosse a brutal devastação socioambiental, histórica e arqueológica que causam, só o fato de se instalarem na chegada de uma cidade histórica e turística como Ouro Preto, já seria motivo para proibir a instalação delas, mas autoridades municipais, estaduais e federais continuam se vergando ao poderio das mineradoras.

No município de Itabirito, onde a mineradora Vale S/A já devastou toda a região do eloquente Pico do Itabirito chegando ao absurdo de um engenheiro da Vale propor construir um Pico de concreto em substituição ao Pico natural de Itabirito, construído nas ondas da evolução em milhões de anos, há cinco projetos novos de mineração e mais um Terminal para carregamento de minério sendo construído em São Gonçalo do Bação, tudo com licenciamentos caricaturais com ilegalidades flagrantes, sem contar as muitas mineradoras que seguem devastando ao redor da magnífica Estação Ecológica de Aredes, que resiste à fúria de mineradoras como a Minar, liderada por ex-deputado do Partido dos Trabalhadores e que fez lobby na Assembleia Legislativa de Minas Gerais para aprovar Projeto de Lei para alterar os limites de Aredes para legalizar mineração dentro da Estação Ecológica.

Na Serra do Rola Moça, onde está o Parque Estadual da Serra do Rola Moça, terceiro maior parque em região metropolitana do Brasil, as mineradoras AVG e Santa Paulina seguem insistindo em reabrir crateras deixadas por mineração devastadora ao longo de várias décadas, com o álibi mentiroso de que para “descomissionar barragens” é preciso minerar mais.   

Outro dia, ao visitar a Comunidade Tradicional Ribeirinha da rua do Amianto, em Brumadinho, MG, onde 53 famílias sobrevivem prensadas pelo rio Paraopeba poluído, tendo enchente alagado todas suas casas e deixado montanhas de lama tóxica nos quintais – “se pisa na terra, coceiras aparecem na hora” – e uma ferrovia pela qual, até a década de 1970, passavam trens de passageiros, Maria dos Anjos nos informou: “Os trabalhadores que construíram esta ferrovia passaram a morar aqui e como João de Barro foram construindo suas humildes casas. Muito tempo atrás aqui passavam trens de passageiros levando o povo para Belo Horizonte e outras cidades. Trens de minério eram só dois por dia, mas ultimamente está passando um trem lotado de minério de 30 em 30 minutos, 24 horas por dia. E vem tão superlotado, jogando poeira tóxica ao longo de toda a ferrovia. O povo está cada vez mais adoecido. A Fiocruz (Fundação Osvaldo Cruz) já comprovou a presença de metais pesados no sangue do povo e de todas as crianças de Brumadinho.”

O desgovernador Zema segue empurrando goela abaixo o famigerado Rodoanel a ser construído na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). De forma ilegal e injusta, sem fazer Consulta Prévia, Livre, Informada, de Boa-Fé e Consentida aos Povos e Comunidades Tradicionais, como garante a Convenção 169 da OIT[2] da ONU[3], foi feito o leilão do Rodoanel na Bolsa de Valores, o contrato com uma empresa transnacional da Itália e constituído um Consórcio de empresas, como Rodoanel BH, Tracbel etc., que estão pressionando famílias e comunidades a já discutirem preço de indenização sem se fazer a Consulta Prévia. Este Rodoanel é mentiroso desde o nome, pois para ser rodoanel deveria rodear a região metropolitana, mas trata-se de um intra-anel, um rodominério, infraestrutura para aumentar mineração na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), é uma obra absurda e insustentável sob todos os aspectos.

Para impedir a agudização das injustiças socioambientais, econômicas e políticas reinantes em Belo Horizonte e RMBH propomos quatro alternativas à construção do Rodoanel: 1) Ampliação do Metrô de Belo Horizonte para várias cidades da RMBH, que volte a ser público e com tarifa a mais barata possível; 2) Resgate do transporte de passageiros/as através de trens entre as 34 cidades da RMBH e Belo Horizonte, realidade que existia até por volta da década de 1970; 3) Melhoria do transporte público de ônibus em Belo Horizonte e RMBH; 4) Revitalização, ampliação e duplicação do Anel Rodoviário de Belo Horizonte, o que é viável tecnicamente e será muito menos oneroso e não trará as brutais violações aos direitos socioambientais, históricos e arqueológicos de Belo Horizonte e 13 municípios da RMBH.

A crise hídrica já deixa centenas de bairros sem água todos os dias em Belo Horizonte e nas 34 cidades da RMBH. A história demonstra que um dos motivos para se construir uma nova capital de Minas Gerais, após Ouro Preto, aos pés do Curral Del Rey foi a existência na região de mananciais com capacidade de abastecer uma cidade de até três milhões de pessoas, mas Belo Horizonte e as 34 cidades da RMBH, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), já estão se aproximando de seis milhões de habitantes. Em 34 audiências públicas, as últimas em 2024, para se atualizar o Plano Diretor da RMBH ficou demonstrado que um dos maiores desafios dos gestores públicos municipais é conter o número muito grande de loteamentos ilegais e clandestinos que estão conurbando BH e toda a RMBH. Se nas margens do Anel Rodoviário, em Belo Horizonte, em apenas 26 Km, já se aglomeram 8 mil famílias, ao longo do “Rodoanel”, com mais de 100 Km, cem mil pessoas irão se instalar rapidamente nas suas margens, pois toda estrada próxima de cidades atrai aglomeração urbana. Em síntese, está se construindo o fim das áreas rurais em BH e na maior parte das 34 cidades da RMBH. Com isso, os mananciais já escassos serão dizimados completamente como o manancial da Pampulha e o de Águas Claras, na Serra do Curral, que já foram sacrificados.

No Vale do Jequitinhonha, mineradoras como a Sigma Lithium, seguem invadindo territórios de Povos e Comunidades Tradicionais, cooptando prefeitos, vereadores e fazendeiros a ponto de se aprovar Projeto de Lei que amputa cerca de seis mil hectares, 23%, da área da Área de Proteção Ambiental (APA) Chapada do Lagoão, no município de Araçuaí. No norte de Minas Gerais, mineradoras como a Vale S/A, CSN, Grupo Votorantim, MTransminas, Mineração Minas Bahia (Miba), Gema Verde, Sul Americana de Metais (SAM) e a Mineração Rio do Norte (MRN) seguem devastando os gerais, fazendo insidiosa campanha contra a criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Córregos Poções-Tamanduá-Peixe Bravo, nos municípios de Riacho dos Machados, Serranópolis e Rio Pardo de Minas.

Dom Vicente Ferreira, que foi bispo em Brumadinho e conviveu diretamente com os povos golpeados pelos crimes das mineradoras em conluio com o Estado, sempre pergunta: “Será que as autoridades não vão aprender nada com os brutais crimes das mineradoras com anuência de autoridades do Estado?” Paulo Freire alerta-nos que é ingenuidade esperar que opressor/explorador vá libertar quem está oprimido/explorado. Melhor acreditar em Thiago de Mello, que diz: "As colunas da injustiça sei que só vão desabar quando o meu povo, sabendo que existe, souber achar dentro da vida o caminho que leva à libertação! ... Quando a verdade for chama nos olhos da multidão, o que em nós é palavra no povo será ação!"

O capitalismo é um sistema que marcha na contramão da emancipação humana, pois desumaniza as pessoas através de uma engrenagem espoliadora e superexploradora da dignidade humana. Por um lado, a trabalhadora e o trabalhador são expropriados no seu ser, coisificados e reduzidos a mercadoria/máquina, e, assim, impedidos de desenvolverem-se humanamente. Por outro lado, o capitalista também se torna um opressor como Ulisses amarrado no mastro do navio, conforme o canto XII da Odisseia de Homero: saboreia a sedução do canto das sereias, mas, amarrado no mastro, não pode impedir a engrenagem que o sustenta. Quanto mais o capitalista acumula riquezas, tanto mais é impelido a acumular, gerando necessariamente miséria crescente para a classe trabalhadora e para o campesinato.

Olhando da perspectiva das mineradoras e do grande capital parece que está tudo dominado, mas não está. Em todos os territórios e comunidades há resistência que cresce na medida em que as contradições se esgarçam. Sigamos firmes, com a sabedoria ancestral dos Povos Originários e Tradicionais e com coragem, como peixe vivo que nada contra a correnteza ou como os girassóis que sabem que o segredo da felicidade é seguir a luz, mesmo nos dias mais nublados. Ou como os galos que, no escuro da madrugada, cantam anunciando a chegada de uma nova aurora com justiça, amor e paz, na certeza de que violência somente sobrevive à custa de silêncio cúmplice.

O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está na Constituição, no Art. 225 que diz: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações." Feliz quem continuar remando no sentido da preservação ambiental, da produção de alimentos saudáveis na linha da agroecologia, da demarcação de todos os territórios dos Povos Originários (Indígenas) e Tradicionais, da reforma agrária popular e quem se opõe radicalmente ao PL 2159/2021, na iminência de ter aprovação concluída no Congresso Nacional, Projeto de Lei inconstitucional que desmonta as leis de licenciamento ambiental abrindo a porteira para a boiada do agronegócio, das mineradoras e do Estado capitalista para acelerar a colocação no altar do sacrifício territórios essenciais para a garantia das condições de vida dos Povos e de toda a biodiversidade. Enfim, é com opção de classe e junto com os Movimentos Sociais Populares na luta pelo bem comum e pelos direitos da classe trabalhadora e de todo o campesinato forçando a superação do capitalismo, máquina de moer vidas, que frearemos a marcha no desfiladeiro rumo ao abismo que a barbárie da idolatria do mercado está impondo à humanidade.

28/05/2025.

 

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 - POR QUE É JUSTO CRIAR RDS CÓRREGOS POÇÕES-TAMANDUÁ-PEIXE BRAVO NO NORTE DE MINAS GERAIS? RDS, JÁ!



2 - PRÉ-JORNADA DE AGROECOLOGIA, TEIA DOS POVOS E MLB, NA OCUPAÇÃO PAULO FREIRE, BH/MG: MINERAÇÃO, NÃO!



3 - “EI MEU PEIXE BRAVO, VAMOS JUNTOS APOIAR A RDS PRA TODOS SALVAR...” SIM À RDS, NORTE DE MG. Vídeo 16



4 - MÚSICA QUE EMBALA A RDS CÓRREGOS POÇÕES-TAMANDUÁ-PEIXE BRAVO, NO NORTE DE MG. É O JUSTO! Vídeo 14



5 - CARLITO E CIDA, EXEMPLO DE LUTA PELA TERRA: ACAMPAMENTO SANTA FÉ, PRESIDENTE OLEGÁRIO, MG. Vídeo 6




[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI e Ocupações Urbanas; autor de livros e artigos. E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       Canal no you tube: https://www.youtube.com/@freigilvander      –    No instagram: @gilvanderluismoreira - Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Organização Internacional do Trabalho.

[3] Organização das Nações Unidas.

terça-feira, 13 de maio de 2025

LEÃO XIV SERÁ PAPA DA LUTA PELA JUSTIÇA SOCIAL? Por frei Gilvander

LEÃO XIV SERÁ PAPA DA LUTA PELA JUSTIÇA SOCIAL? Por frei Gilvander Moreira[1]

Papa Francisco e Papa Leão XIV. Reprodução Redes Virtuais

O novo Papa LEÃO XIV assumiu o ministério de bispo de Roma e primaz da comunhão universal da Igreja dia 08 de maio de 2025. De nascimento, ele é norte-americano, mas é muito mais latino-americano porque foi missionário no meio dos pobres no Peru. Por mais de vinte anos, trabalhou com comunidades camponesas e indígenas, e por amor ao povo peruano adquiriu a cidadania peruana. Após ser anunciado como Papa, escolhido pelos Cardeais no Conclave, Robert Francisco Prevost saudou o povo da Diocese de Chiclayo no Peru em espanhol e não disse nada em inglês ao povo dos Estados Unidos.

Pelo Papa Francisco, em 2014, foi nomeado bispo da Diocese de Chiclayo no norte do Peru, região de povo empobrecido, onde caminhou no meio dos pobres, ouviu, dialogou, animou lutas por justiça e solidariedade. Prevost já denunciou atrocidades do ex-presidente Fujimori e criticou Trump na sua postura autoritária, ao deportar imigrantes. Os mais de 20 anos que viveu e atuou pastoralmente no Peru forjaram Robert Francisco Prevost como "pastor com cheiro de ovelha" que Francisco tanto gostava. Por não ser bispo príncipe e nem de palácio, Prevost foi convidado pelo Papa Francisco para, em Roma, assumir o Ministério (Dicastério) dos Bispos. Como bom mineiro, desconfio que o Papa Francisco, ao torná-lo Cardeal, quando já sentia que suas forças físicas estavam diminuindo, quis sinalizar que Prevost era o Cardeal que ele, Francisco, queria como seu sucessor, pois se revelava ser da mesma linha de Francisco e discípulo autêntico de Jesus Cristo e do seu Evangelho.

Na sua primeira aparição como Papa na janela do Vaticano, Prevost citou duas vezes o papa Francisco. Adotar o nome de papa Leão XIV indica que ele vai abraçar o estilo do papa Leão XIII, criador e pai do Ensinamento Social da Igreja, papa que publicou a histórica Encíclica RERUM NOVARUM (“Das Coisas Novas”), que defende os direitos da classe trabalhadora, a dignidade humana. Ao aparecer sorrindo na janela do Vaticano me fez recordar do Papa João Paulo I, o que viveu apenas 33 dias como Papa, que se apresentou sorrindo e dizendo: “Deus é Pai e é Mãe, mas é mais Mãe do que Pai..." Eloquente também o Papa Leão XIV ter dito na sua primeira saudação: "A paz de Jesus Ressuscitado, paz desarmada e desarmante, esteja com vocês". “A igreja deve construir pontes”, indireta aos fascistas Trump e Netanyaru que têm investido de forma brutal na construção de muros de segregação. “Queremos ser uma igreja sinodal, uma igreja que caminha, que sempre busca a paz...” "Igreja que acolha todos/as, principalmente os sofredores".

Por que e para que o novo Papa adotou o nome de Leão XIV? É porque ele quer ser o Papa da luta pela Justiça Social? Temos que recordar que, em contexto de desrespeito à dignidade humana e de superexploração da classe trabalhadora e da classe camponesa e diante da luta dos socialistas que defendiam a abolição da propriedade privada, reforçando a luta pelos direitos humanos fundamentais, a dignidade humana tem sido defendida pelo Ensinamento Social da Igreja Católica, expressa em várias encíclicas papais.

Nessa perspectiva, rejeitando a tese socialista da abolição da propriedade, a Rerum Novarum: sobre a condição dos operários, encíclica do Papa Leão XIII, de 15 de maio de 1891, afirma que a propriedade, inclusive a dos bens de produção, é um direito natural de todas as pessoas e não apenas de 5% da humanidade. A propriedade tem que exercer sua função social e não se destina apenas a satisfazer os interesses do proprietário. Significa, também, uma maneira de atender às necessidades de toda a sociedade.

Em um contexto no qual as Constituições de muitos países garantiam direito absoluto à propriedade, como a Constituição Imperial Brasileira de 1824, na Rerum Novarum, o Papa Leão XIII advogou que toda propriedade tem que cumprir sua função social. Na época e até em nossos dias, isso é algo que parece revolucionário, pois, injustamente, na prática o direito à propriedade segue sendo garantido apenas para uma minoria e sem cumprir nenhuma função.

Desde 1891 os papas (re)afirmam Ensinamento Social semelhante em várias encíclicas: a Quadragesimo Anno, do papa Pio XI, de 1931 (escrita justamente em celebração ao 40º aniversário da Rerum Novarum); a Mater et Magistra (Mãe e Mestra), do papa João XXIII, de 1961; a Gaudium e Spes (Alegrias e Esperanças), documento do Concílio Vaticano II, de 1965, e a Populorum Progressio (Do Progresso dos Povos), do papa Paulo VI, de 1967, as quais afirmam que o conjunto de bens da terra destina-se, antes de mais nada, a garantir a todas as pessoas um decente teor de vida pelo conjunto de condições sociais que permitam e favoreçam o desenvolvimento integral de sua personalidade. A propriedade é um direito que comporta obrigações sociais.[2]

O papa Francisco na carta Encíclica Laudato Si’ (Louvado Sejas), de 24 de maio de 2015, reafirma o destino comum dos bens como um princípio inarredável do Ensinamento Social da Igreja. Diz Francisco: “A tradição cristã nunca reconheceu como absoluto ou intocável o direito à propriedade privada, e salientou a função social de qualquer forma de propriedade privada. [...] Sobre toda a propriedade particular pesa sempre uma hipoteca social, para que os bens sirvam ao destino geral que Deus lhes deu” (PAPA FRANCISCO, 2015: n. 93).

O papa Francisco transcreve na Encíclica Laudato Si’ o que disse os bispos do Paraguai na Carta Pastoral El campesino paraguayo y la tierra, de 1983: “Cada camponês tem direito natural de possuir um lote razoável de terra, onde possa gozar de segurança existencial. Este direito deve ser de tal forma garantido que o seu exercício não seja ilusório, mas real. Isto significa que, além do título de propriedade, o camponês deve contar com meios de formação técnica, empréstimos, seguros e acesso ao mercado” (PAPA FRANCISCO, 2015: n. 94).

Está na Constituição brasileira de 1988 a exigência de cumprimento da função social da propriedade fundiária, mas o Estado não cumpre a Constituição neste e em nenhum dos direitos sociais constitucionais. Pior, dribla o tempo todo as leis que garantem os direitos sociais. Por isso, a luta pela Justiça Social precisa seguir de forma firme.

Conforme escreveu o padre Alfredo Gonçalves: "O nome do pontífice eleito obedece a critérios pastorais precisos. Enquanto Francisco nos remetia ao pobre de Assis, Leão XIV nos remete a Leão XIII. Leão XIII, por sua vez, foi o Papa que teve a coragem de publicar a Carta Encíclica Rerum Novarum, em 1891, que tinha como subtítulo "a condição dos operários". Carta que se tornou o primeiro documento da Doutrina Social da Igreja (DSI). Cabe lembrar que esse subtítulo havia sido publicado em um livro do companheiro de Karl Marx, Friedrich Engels - A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra - a condição dos operários nas fábricas da Inglaterra" – publicado em 1845, 46 anos antes.

O depauperamento moral de mulheres e crianças, resultante da exploração de seu trabalho pelo capital, foi descrito por vários escritores e com toda a precisão necessária por Engels, aos 25 anos, na sua obra sobre a condição/situação dos operários. Em O Capital, Marx cita vários relatórios de inspetores ingleses de trabalho. Em um relatório se diz: “O fato é que, antes da lei de 1833, crianças e adolescentes de ambos os sexos eram postos a trabalhar toda a noite, o dia inteiro, às vezes, noite e dia segundo a vontade do empregador” (MARX, 1982: 99).

Na época em que a classe trabalhadora reivindicava diminuição da jornada de trabalho para 18 horas diárias, profundamente incomodado e indignado com a miséria imposta à classe trabalhadora inglesa, para sustentar que na sociedade capitalista o motor da história é a luta de classes, Marx cita também M. Broughton, juiz de paz, que declarou: “Na parte da população urbana empregada nas fábricas de renda, reinam uma miséria e uma carência desconhecidas pelo resto do mundo civilizado [...] às duas, três, quatro horas da manhã, crianças de nove e dez anos são arrancadas de seus leitos miseráveis e forçadas a trabalhar até dez, onze, doze horas da noite para ganhar simplesmente o necessário para a subsistência. Enquanto elas trabalham, seus membros definham, seu talhe diminui, sua fisionomia toma um ar abobalhado, todo o seu ser cai num torpor tal que seu aspecto as assusta” (BROUGHTON apud MARX, 1982: 99).

Da oficina artesanal para a fábrica de manufatura o operário é transformado de ferramenta a máquina. Em um trabalho sem fim e extenuante, imediatamente, o operário não mais produz diretamente a mercadoria, mas apenas move a máquina que produz a mercadoria. “Na manufatura, os operários são membros de um mecanismo vivo; na fábrica, são apenas complementos vivos de um mecanismo morto que existe independentemente dele” (MARX, 1982: 113). No volume I de O Capital, Marx cita Engels em A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra, de 1845: “A lamentável rotina de um trabalho sem fim, onde o mesmo processo mecânico renova-se sem cessar, assemelha-se ao trabalho de Sísifo; o peso do trabalho cai sempre sobre o operário esgotado” (ENGELS apud MARX, 1982: 113).

Este contexto de exploração da dignidade humana no mundo do trabalho da primeira revolução industrial moveu o Papa Leão XIII a defender os direitos dos trabalhadores. Agora, ao assumir o nome de Leão XIV, o novo Papa se coloca na esteira dos papas que se preocuparam com a questão social e assumiram a luta pela Justiça Social.

O Papa Leão XIV disse no seu primeiro Encontro com os Cardeais após ser escolhido: “Escolhi adotar o nome de Leão XIV. As razões são várias, mas a principal é que o Papa Leão XIII, com a histórica Encíclica Rerum Novarum, abordou a questão social no contexto da primeira grande revolução industrial e hoje a Igreja oferece a todos o seu patrimônio de doutrina social para responder a mais uma revolução industrial e ao desenvolvimento da inteligência artificial, que trazem novos desafios na defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho” (Discurso do Papa Leão XIV ao colégio dos Cardeais, dia 10/05/2025).

Avançando em barbárie, o sistema capitalista está mostrando suas garras brutais ao pisotear a natureza com toda sua biodiversidade e violentando cada vez mais de forma atroz a dignidade humana. Ao concentrar renda, riqueza e poder em apenas 5% da população e impor exclusão social, pobreza e fome para 95%, este sistema fomenta o fascismo e empurra as massas desesperadas para as propostas religiosas espiritualizantes, desencarnadoras da fé e negadoras da dimensão social do Evangelho de Jesus Cristo. Tendo como motor o lucro e a acumulação de capital, gigantescas desigualdades sociais e migrações compulsórias estão sendo produzidas por esta “economia de morte”, como dizia o papa Francisco. Consequência: desemprego, subemprego, trabalho informal e/ou nos moldes da escravidão contemporânea.

Ao trabalhar como missionário no norte do Peru em meio aos mais pobres, Leão XIV experimentou essas contradições e descobriu que sem Justiça Social não teremos paz, nem respeito à dignidade humana e nem à dignidade da natureza. Ecologia Integral não se constrói sem Justiça Social. “Buscando inspiração em Leão XIII, pastor dos operários e da Doutrina Social da Igreja, e dando seguimento a Francisco, pastor dos pobres e migrantes... seja firme na defesa dos direitos humanos e na promoção da dignidade humana”, propomos em sintonia com o escrito pelo padre Alfredo Gonçalves.

O Papa Leão XIV disse em seu primeiro discurso aos Cardeais: “Vamos reunir a valiosa herança do Papa Francisco e retomar o caminho proposto pelo Concílio Vaticano II”. Esperamos que o papa Francisco, Leão XIII e Jesus Cristo sigam vivos no papa Leão XIV e em nós na luta sempre pelo que justo e ético. Por isso, intuo que o papa Leão XIV entrará para a história como o Papa da luta pela Justiça Social também colocando em prática a Opção pelos Pobres, que passa necessariamente pelos grandes desafios a serem por ele enfrentados, apontados sabiamente por Leonardo Boff: “desocidentalizar e despatriarcalizar a Igreja Católica face à nova fase da humanidade.”

Enfim, a nossa esperança é que o Papa Leão XIV valorize o legado do Papa Francisco, os avanços conquistados em seu pontificado: compromisso com os pobres, ecologia integral, sinodalidade, cultura do encontro..., com Evangelho para além dos templos. E siga avançando no que se refere à maior participação de todas as pessoas, inclusive nas diversas posições de liderança, especialmente das mulheres,  na construção de uma Igreja fraterna, igualitária, conforme as exigências do Evangelho de Jesus de Nazaré.

13/05/2025.

Referências

MARX, Karl. O Capital. Edição resumida. 7ª edição. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1982.

MOREIRA, Gilvander Luís. Laudato si´ e as lutas dos movimentos socioambientais. In: MURAD, Afonso; TAVARES, Sinivaldo Silva (Org.). Cuidar da Casa Comum: chaves de leitura teológicas e pastorais da Laudato Si´. São Paulo: Paulinas, p. 197-217, 2016a.

 

Obs.: As videorreportagens no link, abaixo, de alguma forma VERSAM sobre o assunto tratado, acima.

1 - Paz e Bem #2363 - Habemus papam (Emerson Sbardelotti) - 12.Mai.25

2 - PAPA FRANCISCO E O EVANGELHO DE JESUS CRISTO, SEU LEGADO E DESAFIOS NOSSOS. Marcelo Barros/Gilvander


3 - PAPA FRANCISCO, OUTRO FRANCISCO DE ASSIS, PEREGRINO DE ESPERANÇA - Por frei Gilvander Moreira


4 - 7a Live: A "Fratelli Tutti" do Papa Francisco e o papel dos Cristãos na Política: Fora, Bolsonaro?



[1] Doutor em Educação pela FAE/UFMG; Mestre em Ciências Bíblicas; Bacharel e Licenciado em Filosofia; Bacharel em Teologia; frei e padre da Ordem dos Carmelitas; e Agente de Pastoral e Assessor da CPT/MG (Comissão Pastoral da Terra – www.cptmg.org.br ); e-mail: gilvanderlm@gmail.comwww.gilvander.org.brwww.youtube.com/@freigilvander – No instagram: @gilvanderluismoreira

[2] Cf. nota n. 7 de MOREIRA, G. L.; LAUREANO, D. S.; “MST – 25 anos de luta por reforma agrária”. In: Revista Veredas do Direito, Belo Horizonte, v. 6  n. 11  p. 11-29, Janeiro - Junho de 2009, p. 18, onde se cita CHEMERIS, Ivan Ramom. “A Função Social da Propriedade, o Papel do Poder Judiciário Diante das Invasões Coletivas”. Disponível em: http://www.domhelder.edu.br/veredas_direito/pdf/29_180.pdf , acesso em 02/11/2016, às 22h27.