“Libertai os
presos”! “Eu vim para libertar os presos” (Lucas 4,18), proclamou Jesus na
sinagoga de Nazaré.
Por frei Gilvander Luís Moreira[1]
56
presos – ou mais? - foram crucificados e sacrificados, em presídio em Manaus,
dia 02 de janeiro de 2017: sinal vermelho para o encarceramento de massas no
Brasil.
Após ser criado na Galileia (periferia
da Palestina), convivendo com o povo, Jesus de Nazaré, antes de se tornar
mestre se tornou discípulo do grande profeta João Batista. Ao saber que o
profeta João Batista tinha sido encarcerado em uma prisão de Segurança Máxima[2]
e condenado à pena de morte, o Galileu foi tomado por uma ira santa e sentiu
dentro de si a voz do Pai: “É chegada a minha hora!” (Mc 1,14). Por
solidariedade a um preso Jesus começou sua missão pública.
Na
pequena sinagoga de Nazaré, Jesus lançou seu programa de ação pública:
libertação integral de todos. “Vim para libertar os presos!” (Lc 4,18).
Isto se trata de libertação política, pois quem prende é a polícia a mando do
rei, poder político.
“56 mortos em presídio em Manaus, dia
02/01/2017”. Essa é a informação oficial. No massacre de Carandiru, em
02/10/1992, oficialmente foram 111 mortos, mas segundo o padre da Pastoral
Carcerária, na época, o massacre pode ter atingido letalmente mais de 200 presos.
Portanto, será que em Manaus não foram assassinados muito mais do que 56
presos?
“É
uma fábrica de tortura, que produz violência e cria monstros”, diz padre que
visitou presídio em Manaus. Pessoas feridas, celas superlotadas e alimentação
precária. Essas são as principais lembranças que o padre Valdir João Silveira,
coordenador nacional da Pastoral Carcerária, tem das três visitas que fez ao
Complexo Penitenciário Anísio Jobim (COMPAJ), em Manaus, no ano de 2015. O
padre Valdir afirma que encontrou situação semelhante em diversos presídios do
país. "Você vê isso em todos os Estados. É uma bomba-relógio que pode
explodir a qualquer momento no país inteiro”. Para padre Valdir, a estrutura do
sistema prisional brasileiro facilita que os presos sejam cada vez mais
violentos. "É como um campo de concentração. Não entendo como os presos
ainda se mantêm tão calmos", diz padre Valdir. Segundo o padre Valdir,
diariamente ocorrem diversas rebeliões em presídios no país, mas apenas as
maiores são relatadas pela imprensa.
Na madrugada de 01 de janeiro de 2017
houve também rebelião no Presídio de Nova Lima, região metropolitana de Belo
Horizonte, MG. Situação denunciada por nós dia 03/03/2016, conforme denúncia na
internet em vários blogs, sob o título: “Libertai os presos do Presídio
Regional de Nova Lima, prisão subterrânea, no porão de uma casa. Por frei
Gilvander”. Divulgamos também na internet o texto “Segurança Pública: uma visão
crítica. Artigo de frei Gilvander Moreira”, em 24/02/2012.
Na Campanha da Fraternidade de
2009, sobre Segurança Pública, com o Lema “A paz é fruto da justiça!”, ouvimos
o brado de Jesus de Nazaré: “Libertai os presos!” “Eu vim para libertar os
presos” (Lucas 4,18), proclamou Jesus de Nazaré ao apresentar seu projeto de
ação pública na pequena sinagoga de Nazaré.
Entre os 600 mil presos no Brasil, cerca de 40%
aguardam julgamento, enquanto os fazendeiros e empresários como Adriano Chafic
(condenado a 115 anos como mandante do Massacre de 5 Sem Terra em Felisburgo,
MG) e os 4 mandantes da Chacina dos fiscais em Unaí (Antero Mânica, Norberto
Mânica, Hugo Pimenta e José Alberto, condenados a quase 100 anos de prisão)
continuam livres sob a proteção de recursos intermináveis. Que injustiça!
Milhares de presos sendo castigados, enquanto uns poucos privilegiados
criminosos gozam de liberdade.
O
ministro Gilmar Mendes, do STF, disse dia 16 de fevereiro de 2009:
“Aproximadamente um terço da população carcerária nacional se encontra
recolhida aos presídios indevidamente. Ou porque já cumpriu a pena ou porque
não deveria ter sido recolhida”.
No Brasil, os presídios estão
superlotados, onde a integridade física e mental dos presos é pisoteada
cotidianamente. As prisões brasileiras, atualmente, são verdadeiros “campos de
concentração”. A quase totalidade dos presos é pobre, negra, jovem e de
periferia. Prende-se em demasia pessoas da classe trabalhadora e não se prende,
ou raramente se prende, pessoas da classe dominante. Exagero de punição para a
classe oprimida e impunidade para os de ‘colarinho branco’. Isso é injustiça
que clama aos céus! Em um presídio de Ponte Nova, Minas Gerais, no dia 23 de
agosto de 2007, 25 presos morreram queimados durante um incêndio. Outros oito
presos foram queimados vivos em Rio Piracicaba , MG, em janeiro de 2008, e outros
três, numa cadeia de Arcos, MG. Em menos de um ano, em 2008, só em Minas Gerais , 36
presos morreram queimados em prisões; feridos, centenas.
Em 10 de novembro de 2005, proferindo
sentença em uma Ação Civil Pública (ACP) movida pelo Ministério Público contra
a situação carcerária do 1o Distrito Policial de Contagem, em Minas Gerais , o juiz
Livingsthon José Machado determinou a soltura de 16 presos - todos eles pobres,
negros e jovens -, sob o argumento de que a incúria do Estado feria o artigo
5o, LXV da Constituição Federal. Esse inciso diz o seguinte: “a prisão ilegal
será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”. Provada a ilegalidade
– 63 presos em uma cela com capacidade para apenas sete -; provada a
insalubridade; provado o risco à saúde dos presos - pessoas enfermas amontoadas junto com pessoas
sadias; provado o abuso de manter presos sentenciados em até quatro anos em
cela insuportável, sem encaminhá-los
para uma penitenciária; dada a incapacidade de o juiz mandar construir
cadeias (já tinha exigido do governo, mas não foi atendido.), o juiz Dr.
Livingsthon José Machado concluiu, após interpretar com inteligência e sensatez
a Lei em vista dos princípios constitucionais: uma prisão que não cumpre os
requisitos da lei é uma prisão ilegal e deve ser imediatamente relaxada.
O então governador Aécio Neves, do PSDB,
e a mídia investiram contra o juiz Livingsthon alegando que ele teria colocado
“marginal na rua”. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, insensível aos
clamores dos presos, afastou o juiz de suas funções.
O Dr. Livingsthon fundamentou a soltura dos presos no respeito que
a Declaração universal dos Direitos Humanos consagrou à
humanidade, que assim dispõe: "Ninguém será submetido a tratamento
cruel, desumano ou degradante...". Por essa razão, a soltura dos presos ganhou uma
dimensão oportuna, no que tange à interpretação dos direitos humanos em tempos
de desumanidade sangrenta nos presídios de Minas e do Brasil. A situação
carcerária no Brasil em que vivem os presos é degradante e cruel, e isso
não é fato novo. Portanto, a libertação de alguns presos trouxe à tona as
mazelas do sistema penal e da farsa da Segurança Pública no Brasil. Com a
sua atitude, o juiz Livingsthon humanizou o direito e fez cumprir o que a
sociedade desejou na elaboração da Lei de Execuções Penais.
Vale a pena
apostar na construção de uma sociedade com verdadeira segurança social, com paz
como fruto da justiça (Is 32,17) e SEM PRISÕES. Ouçamos o clamor dos nossos
irmãos e irmãs que estão detrás das grades! Libertai os presos, pelo menos do
castigo permanente a que estão submetidos!
Cf. reportagem
da BBC no link, abaixo:
Belo Horizonte, MG, 03 de janeiro de
2017
Frei Gilvander Moreira, e-mail: gilvanderufmg@gmail.com – facebook: Gilvander Moreira III
[1]
Padre carmelita, mestre em Exegese Bíblica, doutorando em Educação na FAE/UFMG,
coordenador da CPT/MG, assessor do CEBI, de CEBs e do SAB; e-mail: gilvanderufmg@gmail.com – www.freigilvander.blogspot.com.br
- www.gilvander.org.br – www.twitter.com/gilvanderluis -
facebook: Gilvander Moreira III
[2]
Pesquisas arqueológicas indicam que, provavelmente, João Batista tenha sido
encarcerado na Prisão de Maquerontes, uma das fortalezas do rei Herodes.
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