terça-feira, 26 de março de 2019

ASSOCIAÇÃO INDÍGENA KIRIRI DO RIO VERDE/CALDAS/MG: Luta fortalecida. Víd...




ASSOCIAÇÃO INDÍGENA KIRIRI DO RIO VERDE, EM CALDAS, SUL DE MG: Mais um passo na luta pela terra. Vídeo 7 - 27/1/2019.
No dia 27 de janeiro de 2019, o Povo Indígena Kiriri, em retomada de 39 hectares de terra, no Bairro Rural Rio Verde, município de Caldas, sul de Minas Gerais, deu mais um grande passo na luta pela permanência na terra, com a fundação da ASSOCIAÇÃO INDÍGENA KIRIRI DO RIO VERDE, EM CALDAS, MG. O evento que marcou a fundação da Associação foi realizado na Aldeia Indígena Kiriri, em Caldas, sul de MG, e contou com a participação de autoridades locais, apoiadores, moradores da Comunidade do Rio Verde, da cidade de Caldas e região. A cerimônia, programada com antecedência, aconteceu dois dias depois do crime tragédia praticado em Brumadinho, pela Vale, com licença do Estado, o que a fez ser marcada também por luto, dor e indignação. Desde outubro de 2016, 16 famílias do Povo Indígena Kiriri (43 pessoas indígenas), vindas do oeste da Bahia, ocupam, em retomada, uma área de 39 hectares, no município de Caldas, sul de Minas Gerais. A área, até então abandonada há mais de uma década, pertence à UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais) e, com essa luta pela terra, as famílias buscam um local permanente onde possam viver com dignidade e preservar sua cultura. Em 2017, os indígenas Kiriri atenderam a uma ordem de despejo e, seguindo orientações da FUNAI (Fundação Nacional do Índio), foram levadas, pelo Governo de Minas Gerais, para um terreno em Patos de Minas. Foram praticamente abandonados lá, à própria sorte, considerando a falta de estrutura do local e a distância da cidade. Com apoio da comunidade do Bairro Rural Rio Verde e de moradores de Caldas, os Kiriri retornaram à terra onde estavam e onde já tinham construído várias casas de barro e pau a pique. Em outubro de 2018, o Povo Kiriri, em Caldas/sul de MG, foi novamente notificado da Liminar de Reintegração de Posse, reivindicada pela UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais) e Governo de Minas Gerais. Contudo, graças à luta desse povo e de toda a Rede de Apoio (Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Associação da APA da Pedra Branca, Igreja católica de Caldas, capoeiristas, professores/ras da UEMG, estudantes, advogados populares, Ministério Público Federal (MPF) etc), em reunião realizada em Pouso Alegre, no Ministério Público Federal, a UEMG posicionou-se com acordo de cessão das terras aos Kiriri. Atualmente, a Aldeia Indígena Kiriri com 14 casas de taipa, criação de galinhas, porcos, hortas e lavouras agroecológicas, sem uso de venenos e há um projeto de extensão da UEMG para a comunidade. Há um clamor por justiça na esperança de que o Governo de Minas Gerais e o Poder Judiciário decidam pelo acolhimento do direito da Comunidade Indígena Kiriri de permanecer na terra outrora habitada por seus ancestrais e, portanto, legitimamente sua. O justo e ético é que o Governo de Minas e o Poder Judiciário respeitem os direitos do Povo Indígena Kiriri e tudo o que já foi e está sendo construído no território. Nesse vídeo, a sétima parte da videorreportagem feita por frei Gilvander, da CPT, no dia 27 de janeiro de 2019, na Aldeia Indígena do Povo Kiriri, em Caldas, no sul de Minas Gerais, com registro do momento específico da fundação da Associação do Povo Indígena Kiriri do Rio Verde, em Caldas, sul de MG, coordenado por Daniel Tygel, presidente da Aliança em prol da APA da Pedra Branca.

Foto: Povo Indígena Kiriri nas Redes Sociais

* Videorreportagem de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Caldas, sul de MG, 27/1/2019. Vídeo 7.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.

“No campo a gente tem liberdade e adquire saúde”: luta pela terra no sul de MG.


“No campo a gente tem liberdade e adquire saúde”: luta pela terra no sul de MG.
Por Gilvander Moreira[1]

Camponesas Sem Terra do MST em Assentamento da ex-usina Ariadnópolis, no município de Campo do Meio no sul de Minas Gerais, cultivando horta comunitária e horta de plantas medicinais. Foto: frei Gilvander, em 1º/3/2016. 

Ao lado do Assentamento Primeiro do Sul, do MST[2], em Campo do Meio, no sul de Minas Gerais, e na fronteira com a maior fazenda de monocultura do café da América Latina está o megalatifúndio da ex-usina Ariadnópolis, que foi ocupado pelo MST pela primeira vez em 1998, um ano após a conquista do Assentamento Primeiro do Sul. Na luta pela terra, os Sem Terra do MST e o Movimento como tal sofrem diversas pressões. “Sofremos pressão do Estado, por meio da prefeitura, do INCRA, do sistema de saúde, das forças policiais e do poder judiciário. Sofremos pressão do latifúndio do entorno que vem buscar nossos jovens e famílias para trabalharem para eles como boias-frias. A gente sofre com a pressão da cidade, pois a cultura urbana vem para os acampamentos e assentamentos não só para se instalarem, mas para arrancar o povo que está na luta pela terra e levar para cidade. Um exemplo disso é o transporte escolar que tira as crianças do Assentamento e dos Acampamentos e leva lá para cidade”, diz Sílvio Neto, da coordenação nacional do MST.
Todos os instrumentos do Estado, o latifúndio e os latifundiários, a cidade e todas as suas seduções são obstáculos à luta pela terra, pois integram a engrenagem que reproduz a estrutura latifundiária e fazem na prática uma contrarreforma agrária. Entretanto, em 25 de setembro de 2015, o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, assinou decreto desapropriando três fazendas para centenas de Sem Terra do MST acampados há mais de dez anos: a fazenda Nova Alegria, em Felisburgo; a fazenda Gravatá, em Novo Cruzeiro, e o megalatifúndio da Ariadnópolis, em Campo do Meio. Mas a área da CAPIA, que é a sede da ex-usina Ariadnópolis e o parque industrial – 26 hectares -, ficou fora do decreto de desapropriação. Um Mandado de Segurança movido pela CAPIA, que gerencia a massa falida, suspendeu o decreto de desapropriação, o que acirrou mais ainda os ânimos no maior conflito agrário de Minas Gerais e um dos maiores do Brasil. Um dos coordenadores estaduais do MST alertou para isso na reunião com o governo de Minas e com dois comandantes da polícia militar. “O barraco da Maria Baiana foi queimado. Quando nós chegamos aqui na sede da ex-Usina Ariadnópolis, as casas aqui tinham se transformadas em curral de gado. Diante das ameaças, ocupamos também a sede da Ariadnópolis. A reforma agrária não é só terra, mas é também cooperativa, escola, crédito, área de lazer. Por isso precisamos também da estrutura aqui da sede”, bradou Sílvio Neto, em reunião com o Governo de Minas, dia 1º/03/2016.
Na luta pela terra no megalatifúndio da Ariadnópolis, o MST abraçou há vários anos a luta pela instalação de uma Escola do Campo no território. “Se a corda está esticada, não foi esticada por nós. Nós nunca fomos intransigentes. Já sofremos 06 reintegrações de posse aqui. Esperamos a desapropriação aqui há 18 anos. Até quando vamos ter que esperar?”, perguntou outro Sem Terra, em reunião tensa dia 1º /03/2016.
Ocupando as terras do latifúndio há Sem Terra oriundos de muitas regiões, famílias que estão há 21 anos acampadas, outras com menos tempo; há também trabalhadores que trabalhavam ali e que, lesados nos seus direitos trabalhistas após a falência da usina, resolveram se engajar na luta pela terra; e há também trabalhadoras camponesas e trabalhadores camponeses que nasceram naquelas terras e resistem como posseiros na luta pela terra.
O MST coordena a luta histórica e complexa para conquistar de uma vez por todas a integralidade do megalatifúndio da Ariadnópolis. Além da resistência no território ocupado, os assentados e acampados do MST de Campo do Meio têm travado muitas lutas fora das terras da Ariadnópolis. Apenas em 2015, por exemplo, o MST de Campo do Meio levou um caminhão de alimentos e doou para as nove mil famílias das Ocupações Urbanas da Izidora, em Belo Horizonte e Santa Luzia, MG, quando estavam sob seríssima ameaça de despejo; manifestou na portaria da Petrobras, em Betim, MG, em apoio à greve dos funcionários da Petrobras; marchou e bloqueou o trânsito na MG 010, diante da Cidade Administrativa, em Belo Horizonte, reforçando a luta das professoras e dos professores da rede estadual de educação; bloqueou um dos pedágios da BR 381 (Fernão Dias), exigindo Luz para Todos nos Assentamentos Primeiro do Sul, Nova Conquista II e Santo Dias; e ocupou prédios públicos, como a sede do INCRA em Belo Horizonte.
Oitocentos hectares de terra ficaram fora do decreto do governador Pimentel, de 25 de setembro de 2015. Mas em reunião dia 1º de março de 2015, representantes do Governo de Minas asseguraram que o governador de Minas assinaria outro decreto para destinar 100% das terras da Ariadnópolis para as mais de 500 famílias acampadas há 19 anos. “É preciso ter muito amor e muita paixão para poder estar na luta pela terra carregando a bandeira do MST e sob essa bandeira viver. Nós podemos ter várias cores, várias religiões, várias orientações sexuais, várias idades e ter vindo de diversos estados do Brasil, mas o que nos unifica e nos dá unidade como povo camponês na luta pela terra é a bandeira do MST”, afirmou Sílvio Neto, ao finalizar Assembleia Geral no Acampamento Quilombo Grande, na Ariadnópolis, dia 1º/3/2016.
O Acampamento Vitória da Conquista é o mais antigo nas terras da Ariadnópolis, com 21 anos. Nele, 32 famílias estão acampadas, já em casas construídas de tijolo ou de adobe, produzindo café, maracujá, mandioca, banana, feijão e hortaliças. “Como aconteceram muitos despejos aqui no Girassol, a gente organizou o acampamento Vitória da Conquista”, diz Maria De Fátima Silva Meira, Sem Terra do Acampamento Vitória da Conquista. Dezenas de famílias de posseiros estão resistindo nas terras da Ariadnópolis. Muitos já moravam e trabalhavam na Usina. Outros trabalhadores com dívidas trabalhistas acamparam na Ariadnópolis após a falência da usina. Os Sem Terra ali acampados têm uma grande diversidade cultural e de origem. Há trabalhadores camponeses oriundos dos estados de São Paulo, Paraná, Bahia, Pernambuco e de outros estados, além de Minas Gerais, obviamente. O sr. João Batista Pura, 63 anos, que trabalhou na usina por mais de 30 anos, afirma: “Trabalhei aqui na usina Ariadnópolis mais de 30 anos, cortando cana, capinando café e batendo veneno. Meu pai era fiscal na usina. Tenho irmãos que trabalharam na usina. Aqui se produzia açúcar e álcool. Nas partes altas se plantava cafezal e nas baixadas era tudo cana-de-açúcar. Clóvis Azevedo era o dono da usina. Um tanque de álcool pegou fogo aqui e causou um incêndio medonho. Eu trabalhava sem ter carteira registrada desde os 14 anos. Quando os Sem Terra vieram pra cá (em 1998), eu tinha direito a R$135.000,00 (cento e trinta e cinco mil reais) de indenização trabalhista a receber, mas perdi a esperança de receber isso. Hoje, deveriam me pagar acima de quinhentos mil reais.”
Camponeses assolados pela seca e pela cerca, expropriados pela cerca do latifúndio na região Nordeste, também vieram engrossar a luta pela terra no sul de Minas, na Ariadnópolis. José Nery Da Silva, Sem Terra pernambucano do Acampamento Betinho (Herbert de Souza), nas terras da ex-usina Ariadnópolis recorda: “Há 13 anos abracei a luta pela terra para a gente ter uma convivência melhor, porque onde a gente morava (estado de Pernambuco) a vida era muito difícil. Aqui nas terras da Ariadnópolis, a gente tem o que comer, tem uma roupinha melhor. Podemos calçar um sapato. Sapato eu nem conhecia antes de chegar aqui. A gente planta milho, feijão, café e verduras. A gente vive da roça. Nossa vida aqui melhorou 100%. Pulamos da lamparina para a vela que dá menos fumaça. Nóis quer a terra pra nóis trabalhar. Quem receber a terra e vender após mais de 13 anos de luta não tem jeito, pode matar. Na cidade não tem jeito. O jeito é na roça mesmo. Se eu soubesse que a luta pela terra fosse tão boa, eu teria vindo muito antes. Lá no sertão brabo é muito difícil a sobrevivência. Aqui a gente planta, colhe, guarda para comer e vende o bocado que sobra. Trabalhar para o fazendeiro ou na cidade, a gente tem que cumprir horário, o que causa muita pressão e preocupação. Mesmo doente tem que trabalhar, porque tem meta. Patrão não quer nem saber se você está doente ou não. No campo, a gente tem liberdade e trabalha para a gente mesmo, trabalha tranquilo e feliz. Depois que a gente vem pra roça adquire saúde. Na roça tudo é do jeito que a gente quer.”

Belo Horizonte, MG, 26/3/2019.

Obs.: Abaixo, vídeos que versam sobre o assunto apresentado, acima.

1 - MST luta pela terra em Campo do Meio/MG desde 1998: Palavra Ética/TVC/BH c/ frei Gilvander. 17/11/18



2 - Sr. Mozar no Quilombo Campo Grande/MST/MG: "Sem a terra ele não vive!" Vídeo 6 – 26/11/18



3 - Função social para a terra nos 11 Acampamentos do MST/Campo do Meio/sul de MG. Vídeo 5 - 26/11/18



4 - Reflorestamento e Produção no Quilombo Campo Grande, do MST/MG - Vídeo 4 - 25/11/2018








[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.comwww.gilvander.org.br - www.freigilvander.blogspot.com.br             www.twitter.com/gilvanderluis             Facebook: Gilvander Moreira III
[2] Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – www.mst.org.br

quinta-feira, 21 de março de 2019

Carliusa Kiriri, mulher guerreira: "O nosso lugar é aqui!"(Caldas/MG) - ...



Carliusa do Povo Kiriri, mulher guerreira: “O nosso lugar é aqui!” (Em Caldas, sul de MG.) – Vídeo 6 – 27/1/2019.

Vindas do oeste da Bahia, 16 famílias do Povo Indígena Kiriri ocupam, em retomada, desde outubro de 2016, uma área de 30 hectares, no município de Caldas, sul de Minas Gerais. A área, até então abandonada há mais de uma década, pertence à UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais) e, com essa luta pela terra, as famílias buscam, um local permanente onde possam viver com dignidade e preservar sua cultura. Em 2017, os indígenas Kiriri atenderam a uma ordem de despejo e, seguindo orientações da FUNAI (Fundação Nacional do Índio), foram levadas, pelo Governo de Minas Gerais, para um terreno em Patos de Minas. Foram praticamente abandonados lá, à própria sorte, considerando a falta de estrutura do local e a distância da cidade. Com apoio da comunidade do Bairro Rural Rio Verde e de moradores de Caldas, os Kiriri retornaram à terra onde estavam e onde já tinham construído várias casas de barro e pau a pique. Em outubro de 2018, o Povo Kiriri, em Caldas/sul de MG, foi novamente notificado da Liminar de Reintegração de Posse, reivindicada pela UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais) e Governo de Minas Gerais. Contudo, graças à luta desse povo e de toda a Rede de Apoio (Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Associação da APA da Pedra Branca, Igreja católica de Caldas, capoeiristas, professores/ras da UEMG, estudantes, advogados populares, Ministério Público Federal (MPF) etc), em reunião realizada em Pouso Alegre, no Ministério Público Federal, a UEMG posicionou-se com acordo de cessão das terras aos Kiriri. A aldeia conta atualmente, com 14 casas de taipa, criação de galinhas, porcos, hortas e lavouras agroecológicas, sem uso de venenos e há um projeto de extensão da UEMG para a comunidade. Há um clamor por justiça na esperança de que o Governo de Minas Gerais e o Poder Judiciário decidam pelo acolhimento do direito da Comunidade Indígena Kiriri de permanecer na terra outrora habitada por seus ancestrais e, portanto, legitimamente sua. O justo e ético é que o Governo de Minas e o Poder Judiciário respeitem os direitos do Povo Indígena Kiriri e tudo o que já foi e está sendo construído no território. Nesse vídeo, o depoimento comovente da Professora Carliusa Kiriri, liderança indígena, esposa do Cacique Adenilson Kiriri, que fala de injustiça, coragem, amizade, solidariedade, resistência... Carliusa fala, sobretudo, de luta pela terra que lhes pertence por direito.

Carliusa, do Povo Indígena Kiriri, foi homenageada na Câmara de Vereadores de Caldas no sul de Minas Gerais, dia 20/03/2019. Foto: Cacique Adenilson.


*Videorreportagem de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Caldas, sul de MG, 27/1/2019. Vídeo 6.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.


quarta-feira, 20 de março de 2019

Agrotóxico e câncer, não; agroecologia, sim.


Agrotóxico e câncer, não; agroecologia, sim.
Por Gilvander Moreira[1]

Foto: Divulgação / Redes Sociais


Já está acionada a luz vermelha sobre a relação da ‘epidemia’ de câncer com o uso e a aplicação de agrotóxicos nas lavouras de monoculturas do café, da cana, do eucalipto, do feijão, da soja e outras. Está comprovado pelo Programa de Avaliação de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos – PARA -, da ANVISA[2]: a) a presença de resíduos de agrotóxicos em alimentos acima dos limites máximos “recomendados”; b) a presença em muitos alimentos de venenos não permitidos.  Afora isso, nas fiscalizações junto às empresas produtoras de agrotóxicos observa-se, recorrentemente, muitas irregularidades. “No Município de Lucas de Rio Verde, no Mato Grosso, constatou-se a contaminação do leite materno, das águas da chuva, do solo e até do ar” (MOREIRA, 2016b, p. 224). Estima-se que, a cada ano, 25 milhões de trabalhadores são contaminados por agrotóxicos apenas nos países empobrecidos.
Põe o dedo na ferida, de novembro de 2011, o Relatório do deputado federal Padre João Carlos (PT/MG), então relator da Subcomissão Especial sobre o Uso dos Agrotóxicos e suas Consequências à Saúde e integrante da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados: “A incidência de câncer em regiões produtoras de Minas Gerais, que usam intensamente agrotóxicos em patamares bem acima das médias nacional e mundial, sugere uma relação estreita entre essa moléstia e a presença de agrotóxico. Neste estado, na cidade de Unaí, está sendo construído um Hospital do Câncer, em virtude da grande ocorrência desta doença na região. Segundo os dados apresentados na Ausculta Pública que realizamos nesse município, já estão ocorrendo cerca de 1260 casos/ano/100000 pessoas. A média mundial não ultrapassa 400 casos/ano/100000 pessoas” (Fonte: Relatório da Subcomissão do Uso de Agrotóxico, 2011, p. 30).
Há muitas pesquisas científicas, tais como as da Fio Cruz, da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), da Universidade Federal do Ceará (UFCE) e da Universidade de Brasília (UNB), que apontam a estreita relação entre uso ou ingestão de agrotóxico e câncer, como atesta Eloísa Caldas, coordenadora do Laboratório de Toxicologia da UNB: “Existem mais de 400 pesticidas permitidos para uso e bactérias diferentes que causam efeitos diversos para a saúde. Podem causar problemas neurológicos, podem levar ao desenvolvimento de câncer e outras patologias” (Fonte: Relatório da Subcomissão do Uso de Agrotóxico, 2011, p. 54).

XX Romaria das Águas e da Terra do estado de Minas Gerais, em Unaí, dia 23/7/2017, durante a marcha que atravessou grande parte da cidade. Foto: frei Gilvander

Várias leis já foram criadas para tratar dos agrotóxicos: Lei nº 7.802/1989, Lei nº 9.974/2000, Lei nº 11.657/2008, instituíram o dia 18 de agosto como o Dia Nacional do Campo Limpo; Lei nº 6.938/81, referente à Política Nacional de Meio Ambiente e a Lei nº 12.305/10, referente à Política Nacional de Resíduos Sólidos. Essas leis são dribladas o tempo todo, além de serem generosas com a indústria dos agrotóxicos, o que fere mortalmente a dignidade humana e dignidade da mãe terra, da irmã água, do irmão ar e de todos os seres vivos.
Atualmente no Assentamento Primeiro do Sul, do MST, em Campo do Meio, no sul de Minas Gerais, há o acompanhamento e a orientação de agrônomos das cooperativas de café que determinam os tipos de agrotóxicos a serem usados na lavoura e as quantidades. Eles fixam os limites, conforme diz o assentado Wadilsom Manoel da Silva: “O limite é o que o agrônomo determina. Se ele determina usar 200 ml, não adianta usar 300 ml, pois será jogar fora dinheiro e contaminar mais ainda a terra, o ar e a plantação. Temos que seguir a dosagem certa, a que é definida pelo agrônomo. Se não será burrice”. Os assentados seguem os agrônomos que não são da EMATER, mas das quatro cooperativas existentes na região com as quais os assentados têm contratos: a COOXUPÉ, a COPERCAM, a CAFÉ e a CAMPONESA. Os camponeses assentados pagam uma quota para poderem se filiar à cooperativa.
Em média, para se produzir uma saca de café – de sessenta quilos –, em preços de fevereiro de 2015, o custo estava em torno de 280 a 300 reais e se podia vender por 400 reais por saca quando o café era muito bom, nível 6. O preço depende de uma série de fatores. “A qualificação do café vai do número 6 ao número 10. O número 6 é o melhor e 10 é o pior. A maior parte do café que enviamos para a cooperativa é classificado como número 7, o que reduz muito o preço”, informa Wadilsom Manoel. Mas, outro Sem Terra, com olhar crítico, alerta: “O nosso café é avaliado de acordo com o que está rolando na bolsa de valores”.
Dentro da proposta de Reforma Agrária Popular, definida no 6º Congresso do MST, em janeiro de 2014, a autonomia na gestão daquilo que os camponeses assentados produzem é fundamental. Aqui se insere a criação da Cooperativa Camponesa, que é imprescindível para emancipar os assentados das teias das cooperativas do agronegócio. É o que diz Sílvio Neto, da coordenação nacional do MST: “Não terá nenhum assentado que aceitará converter toda sua produção para o modelo agroecológico se não tiver uma cooperativa para viabilizar a comercialização, pois se ele for produzir de forma agroecológica e entregar sua produção nas cooperativas convencionais, perderá muito economicamente, pois certamente sua produção será classificada como inferior. Não é uma questão de boa ou má vontade. Acontece que o fator econômico é preponderante. Não dá para defender o que economicamente implica prejuízo.
A produção de café só pode sair do terreno do produtor com a guia autorizando o transporte e com o seguro antirroubo, pois o café está muito visado. Não dá para correr o risco de andar com uma carreta de café procurando preço melhor e ser roubado antes de entregar o produto para o comprador. É o que analisa Sílvio Neto: “Teríamos que ter o controle de toda a cadeia produtiva, desde a produção até a venda final. Muitas famílias vendem o café antecipadamente, porque precisam de insumos, de botas e do sustento diário ou porque um filho adoeceu e é preciso dinheiro para realizar o tratamento. Precisamos romper com as empresas do agronegócio, as cooperativas, mas não dá para romper somente no tocante à comercialização. Temos que construir autonomia em toda a cadeia produtiva, senão é muito difícil implementar o modelo da agroecologia. O poder do agronegócio no campo não passa necessariamente pela propriedade da terra, mas muitas vezes, por uma lógica e engrenagem que aprisionam os pequenos produtores que acabam forçados a fazer o tal do agronegocinho. Ou seja, o modelo do agronegócio envolve matriz tecnológica, pacote de insumos, assistência técnica ditada pelo capital, financiamento etc. Enfim, controla de ponta a ponta a vida do campesinato. Nesse cenário, a agroecologia não é apenas um conjunto de práticas de cultivo com adubação orgânica e não uso de venenos. É outra lógica que exige outra engrenagem que possa estar sob o controle autônomo dos camponeses assentados. É outro modelo que garante cooperação popular, autonomia na produção, na venda, na compra etc.”.

Referências.
MOREIRA, Gilvander Luís. A luta por direitos no campo e na cidade. In: SOUZA, Miracy Barbosa de; MUNDINM, Fernanda de Lazari Cardoso; PEREIRA, Aline Rose Barbosa (Orgs.). CIDADE E ALTERIDADE: Convivência multicultural e justiça urbana. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, p. 211-228, 2016b.

Belo Horizonte, MG, 20/03/2019.

Obs.: Abaixo, vídeos que versam sobre o assunto discutido, acima.

1 - Do Agrotóxico para a Agroecologia/1ª Pré-Romaria da XXI Romaria/Águas e Terra/MG/Arcos/23/6/2018



2 - Comida saudável vem da luta-Inauguração do Armazém do Campo, do MST - BH/MG–3ª Parte- 26/11/ 2017



3 - Horta Comunitária na Ocupação Esperança - Região da Izidora - BH/MG - 1a Parte - 12/11/2017


4 - Comida saudável/Economia Solidária/Festival Reforma Agrária/MST-BH/MG-08/10/2017-2ª Parte



5 - Nazaré - Câncer na Família e agrotóxicos em Unaí: 20ª Romaria das Águas e da Terra/MG. 20/7/2017



6 - Na TV Assembleia, denúncia de exagero de agrotóxico no feijão em Unaí.



7 - Frei Gilvander denuncia na TV Assembleia: exagero de agrotóxico causa câncer em Unaí/MG. 12/12/2012 








[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.comwww.gilvander.org.br - www.freigilvander.blogspot.com.br             www.twitter.com/gilvanderluis             Facebook: Gilvander Moreira III
[2] Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Cf. www.anvisa.gov.br

quinta-feira, 14 de março de 2019

Povo Indígena Kiriri/Caldas/MG:Retrospectiva da luta pela terra/Cacique ...



Povo Indígena Kiriri em Caldas, sul de MG: A trajetória da luta pela terra, por Cacique Adenilson. Vídeo 5 – 27/1/2019.

Em Caldas, sul de Minas Gerais, 16 famílias do Povo Indígena Kiriri, vindas do oeste da Bahia, ocupam uma área situada no bairro rural Rio Verde, a 7 km da sede do município de Caldas. Na área, os Kiriri construíram suas casas de pau a pique e barro, plantam lavouras, árvores frutíferas e plantas medicinais de forma agroecológica, sem veneno e, mesmo sem a estrutura adequada, passando por dificuldades pela falta de atenção do Poder Público, as famílias lutam pelo sagrado direito à terra que lhes pertence, por direito legítimo, para que possam nela viver e conviver em paz e harmonia com a Mãe terra e toda a natureza, e uns com os outros e com comunidade entorno, conforme sua cultura, suas tradições, suas origens, em sintonia com todos os encantados, seus ancestrais. Em outubro de 2018, o Povo Kiriri, em Caldas/sul de MG, foi notificado da Liminar de Reintegração de Posse, reivindicada pela UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais) e Governo de Minas Gerais. Entretanto, graças à luta desse povo e de toda a Rede de Apoio (Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Associação da APA da Pedra Branca, Igreja católica de Caldas, capoeiristas, professores/ras da UEMG, estudantes, advogados populares, Ministério Público Federal (MPF) etc), em reunião realizada em Pouso Alegre, no Ministério Público Federal, a UEMG posicionou-se com acordo de cessão das terras aos Kiriri. Há um clamor por justiça na esperança de que o Governo de Minas Gerais e o Poder Judiciário decidam pelo acolhimento do direito da Comunidade Indígena Kiriri de permanecer na terra outrora habitada por seus ancestrais e, portanto, legitimamente sua. O justo e ético é que o Governo de Minas e o Poder Judiciário respeitem os direitos do Povo Indígena Kiriri e tudo o que já foi e está sendo construído no território. Nesse vídeo, a quinta parte da videorreportagem feita por frei Gilvander, da CPT, no dia 27 de janeiro de 2019, na Aldeia Indígena do Povo Kiriri em Caldas, MG, com a retrospectiva dessa luta pela terra em Caldas, sul de MG, apresentada pelo Cacique Adenilson.

Povo indígena Kiriri sofreu ordem de despejo em 2017 / Foto: Ronaldo Eli/ASA 

*Videorreportagem de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Caldas, sul de MG, 27/1/2019. Vídeo 5.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.


quarta-feira, 13 de março de 2019

“Esta terra (em Caldas, sul de MG) é Kiriri!” Despejo, não! – Vídeo 4. 2...




A luta dos povos indígenas é nossa também. “Esta terra (em Caldas, sul de MG) é Kiriri!” Despejo, não! – Vídeo 4 – 27/1/2019.

Na Aldeia Indígena Kiriri, em Caldas, no sul de Minas Gerais, 16 famílias (43 pessoas) vindas do oeste da Bahia ocupam uma área de 30 hectares, em retomada, onde convivem em plena harmonia com a Mãe Terra, a Irmã Água e toda a Natureza. Essa harmonia se faz também presente na convivência uns com os outros e com a comunidade rural do Rio Verde, onde estão inseridos. Ali, além de dedicarem-se ao cultivo de lavouras, pomar e plantas medicinais de forma agroecológica, sem uso de veneno nas plantações, os indígenas cuidam também da preservação da mata do território e dedicam-se ao reflorestamento de áreas devastadas da mata. Para o Povo Indígena Kiriri, esta mata é templo sagrado, espaço de espiritualidade e fortalecimento de sua fé, de sua cultura e garantia de sobrevivência. Em outubro de 2018, o Povo Kiriri, em Caldas/sul de MG, foi notificado da Liminar de Reintegração de Posse, reivindicada pela UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais) e Governo de Minas Gerais. Entretanto, graças à luta desse povo e de toda a Rede de Apoio (Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Associação da APA da Pedra Branca, Igreja católica de Caldas, capoeiristas, professores/ras da UEMG, estudantes, advogados populares, Ministério Público Federal (MPF) etc), em reunião realizada em Pouso Alegre, no Ministério Público Federal, a UEMG posicionou-se com acordo de cessão das terras aos Kiriri. Há um clamor por justiça na esperança de que o Governo de Minas Gerais e o Poder Judiciário decidam pelo acolhimento do direito da Comunidade Indígena Kiriri de permanecer na terra outrora habitada por seus ancestrais e, portanto, legitimamente sua. O justo e ético é que o Governo de Minas e o Poder Judiciário respeitem os direitos do Povo Indígena Kiriri e tudo o que já foi e está sendo construído no território. Nesse vídeo, a quarta parte da videorreportagem feita por frei Gilvander, da CPT, no dia 27 de janeiro de 2019, na Aldeia Indígena do Povo Kiriri, em Caldas, no sul de Minas Gerais, quando a comunidade indígena e apoiadores reuniram-se para celebrar mais um passo nessa luta pela terra, com a fundação da Associação do Povo Indígena Kiriri de Caldas, sul de MG.

Cacique Adenilson, do Povo Indígena Kiriri, em Caldas no sul de Minas Gerais, e o Tenente da cidade de Caldas. Foto: Frei Gilvander

* Videorreportagem de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Caldas, sul de MG, 27/1/2019. Vídeo 4.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.

terça-feira, 12 de março de 2019

MST no sul de MG e Agroecologia: que beleza!


MST no sul de MG e Agroecologia: que beleza!
Por Gilvander Moreira[1]

]Foto: Divulgação / MST

O Projeto de Assentamento (PA) Primeiro do Sul, do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), em Campo do Meio, no sul de Minas Gerais, foi formado, primeiro, para produzir alimentos com a finalidade de matar a fome e eliminar a miséria que reinava no seio das 48 famílias camponesas assentadas. Ainda não se tinha a consciência do paradigma agroecológico. Diferentemente, o PA Santo Dias, em Guapé, de 12 de maio de 2006, distante 70 quilômetros de Campo do Meio, nasceu dentro da concepção agroecológica e, por isso, sua produção é hoje, basicamente, agroecológica. É o que informa Sílvio Neto, da Direção Nacional do MST: “No PA Santo Dias, em Guapé, desde que os Sem Terra pisaram lá não jogaram nem uma gota de agrotóxico no assentamento. Lá tem 19 modelos agroecológicos sendo praticados. Temos, inclusive, homeopatia para o manejo do gado. Enfim, temos no PA Santo Dias um amplo processo agroecológico, coisa que não existe em nenhuma outra propriedade da região sul de Minas”.
O MST está se dedicando em aprofundar o debate, a consciência e as práticas agroecológicas nos assentamentos em todo o Brasil. Uma série de fatores influenciam os camponeses assentados para se desenvolverem como agroecológico ou não. É o que recorda o Sem Terra Sebastião Mélia, do PA Primeiro do Sul: “No PA Santo Dias, a questão geográfica influencia muito, pois lá é muito difícil de mecanizar por causa dos terrenos acidentados. Por outro lado, o PA Primeiro do Sul está ao lado da fazenda Ipanema, que, com 23 mil hectares, é a que mais produz café em toda a América Latina: cerca de 100 mil sacas por ano, 100% com agrotóxico”.
Essa condição material objetiva, que é estar ao lado de uma fazenda gigante do agronegócio do café, influencia sobremaneira a consciência e a postura dos assentados do PA Primeiro do Sul. Acresce-se a isso o fato da prática dos assentados que trabalharam por muitos anos como boias-frias nas fazendas de café da região, sem nenhuma experiência agroecológica. Assim, os camponeses Sem Terra, com a experiência da agricultura tradicional, ouvem o tempo todo o canto da sereia do agronegócio que acontece à base do agrotóxico. Mas o MST não está resignado diante disso e vem apresentando a proposta de mudança do jeito de produzir, de saída do agronegocinho e assimilação da perspectiva agroecológica. O MST não impõe às camponesas assentadas e aos camponeses assentados deixar as práticas de agricultura com uso de agrotóxico, o que geraria um ônus político muito grande para o MST internamente nos assentamentos. Em uma perspectiva emancipatória, militantes do MST vêm desenvolvendo um processo pedagógico[2] que acontece conforme o que é relatado por Sílvio Neto: “A partir de reuniões, estudos e visitas a comunidades com práticas agroecológicas, propusemos às famílias do PA Primeiro do Sul que elas apartassem 10% da lavoura para um lote de plantio na linha agroecológica. Propomos às famílias fazer a experiência de plantar sem uso de venenos e comparar a produção em termos quantitativos e qualitativos, os custos, a produtividade etc. Há vários anos estamos fazendo essa experiência. Há famílias que estão percebendo que caiu a produção, mas caiu também o custo. Muitos estão observando que a qualidade da produção agroecológica é infinitamente melhor. Uns estão contentes; outros, não. Isso tudo está na perspectiva de fazermos uma transição efetiva da produção de café com uso de agrotóxicos para a produção de café totalmente agroecológico. Esse é nosso sonho, difícil, mas não impossível, pois o contexto conspira a favor do agronegócio, que é produção totalmente com venenos”.
A transição da agricultura com agrotóxicos para a agricultura agroecológica é um processo difícil, mas necessário e questão de responsabilidade social, ambiental e geracional, sob a perspectiva de futuro. Se as famílias camponesas do PA Primeiro do Sul abandonassem abruptamente o uso de agrotóxico, poderia implicar em um primeiro momento na diminuição do poder econômico delas, o que reduziria seu nível de vida econômico, visto que a produção certamente diminuiria e também porque o mercado para a produção agroecológica ainda é pequeno e extremamente difícil. “As famílias no PA Primeiro do Sul têm vínculos - não amorosos, mas econômicos - com as cooperativas do agronegócio da região. Isso as obriga muitas vezes a venderem a safra antes de ela ser produzida. Tem contratos assinados que precisam ser honrados”, informa Sílvio Neto.
Além da produção de café com o uso de agrotóxico determinado pelo sistema de mercado, essas famílias acampadas ou assentadas do MST estão produzindo café ecológico com a marca Café Guaii, que está sendo produzido em proporção minoritária no PA Primeiro do Sul, mas em 100% da produção de café no PA Santo Dias, em Guapé, e em vários pré-assentamentos do MST nas terras da ex-usina Ariadnópolis. Essa transição do café convencional - o que segue os ditames do mercado e do agronegócio – para o café agroecológico tem gerado muita discussão entre as famílias. Além disso, estão se avolumando os problemas no plantio convencional, conforma relata o assentado Wadilsom Manoel do PA Primeiro do Sul: “Tem dado muitas discussões, mas é uma experiência muito interessante até porque a produção de café convencional nos últimos anos tem sido péssima. Em 2013, tivemos uma produção muito boa, mas o preço caiu lá embaixo e, assim, mal deu para cobrir os custos. Em 2014, o preço foi razoável, mas quase não tinha café.
Vários casos de câncer já aconteceram em pessoas que moravam e trabalhavam no PA Primeiro do Sul, conforme recorda Sebastião Mélia: “Várias pessoas morreram de câncer no Assentamento Primeiro do Sul, mas é bem provável que já chegaram ao Primeiro do Sul envenenados. Há relatos que enquanto trabalhavam nas fazendas de café da região, trabalhadores levavam água para beber nos galões de roundup, veneno à base de glifosato. Esse era o costume nas fazendas onde trabalhavam como boias-frias, de onde vieram grande parte dos trabalhadores para a luta pela terra. Quando eu era criança, cheguei a ver trabalhadores que passavam o inseticida BHC[3] no corpo para os carrapatos não subirem no corpo enquanto roçavam as pastagens. De primeiro, não se falava que BHC era veneno, mas remédio. Era como se fizesse um bem para a pessoa. Os que aqui morreram de câncer provavelmente vieram contaminados das fazendas de café da região. Mas hoje o povo está mais orientado, tem mais preocupação. Já seguem várias cautelas como usar os EPI, equipamentos de proteção individual”.
Enfim, a luta do MST para produzir alimentos saudáveis, na linha da agroecologia, aponta para a construção de uma sociedade do Bem Viver e Conviver, onde a preservação ambiental é condição para a convivência social e adquirir estilo de vida simples e austero será um caminho promissor.

Belo Horizonte, MG, 12/03/2019.

Obs.: Abaixo, vídeos que versam sobre o assunto discutido, acima.

1 - Reflorestamento e Produção no Quilombo Campo Grande, do MST/MG - Vídeo 4 - 25/11/2018



2 - Trabalho e Produção Sustentável: Acampamentos/MST/Campo do Meio/sul de MG. Vídeo 2. 25/11/18



3 - Quilombo Campo Grande/MST/MG: A terra produz e reergue Campo do Meio/Vídeo 3. 22/11/18





[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.comwww.gilvander.org.br - www.freigilvander.blogspot.com.br             www.twitter.com/gilvanderluis             Facebook: Gilvander Moreira III
[2] Como fruto da luta do MST no sul de Minas, o Reitor e Presidente do Conselho Superior do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS), Professor Marcelo Bregagnoli, assinou em 23 de março de 2016 a Resolução n. 010/2016, aprovando o Projeto Pedagógico e criando o Curso Técnico em Agropecuária Subsequente: ênfase Agroecologia para Educandos da Reforma Agrária do Sul de Minas Gerais no IFSULDEMINAS, Campus Machado.
[3]  BHC é um inseticida fitossanitário organoclorado persistente. A sigla advém do nome na língua inglesa - Benzene Hexachloride. Trata-se de um produto que combate pragas na lavoura e ao entrar em contato com a pele tem efeito cumulativo, causando danos irreversíveis ao sistema nervoso central. A absorção pelo organismo pode ocorrer por via oral, respiratória ou simples contato com a pele. Entre os sintomas estão convulsões, dores de cabeça, tremores, arritmia e até óbito em casos mais graves. O BHC está proibido no Brasil desde 1985.