quarta-feira, 11 de julho de 2018

A CPT na luta ao lado dos camponeses


A CPT na luta ao lado dos camponeses. Por Gilvander Moreira[1]


Muitas pessoas nos perguntam: “Que tipo de atuação faz a Comissão Pastoral da Terra (CPT) por meio dos seus agentes de pastoral junto aos camponeses? O que é camponês? E posseiro? Que tipo de trabalho dignifica o/a trabalhador/a?” Camponês se distingue também de trabalhador rural proletarizado, que “desapossado da terra e de seus instrumentos de trabalho, em suma, dos meios de produção, não mais dispõe da autonomia social mínima dos cultivadores, fundada no controle costumeiro ou jurídico da terra” (MOURA, 1988, p. 15). Apoiando o camponês está o agente de pastoral da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que é a pessoa integrante da CPT, seja trabalhador/a com carteira assinada pela CPT ou voluntário, que atua prestando um serviço pastoral junto aos camponeses nas suas mais diversas formas: acampados, assentados, sem-terra, Sem Terra, quilombolas, boias-frias[2], assalariados, ribeirinhos, vazanteiros, indígenas, ciganos etc. O serviço pastoral envolve conviver com os camponeses, participar de suas lutas, fomentar a organização deles a partir deles, denunciar as injustiças e defender suas bandeiras de luta. Isso baseando-se em uma inspiração de fé libertadora, vivenciada, como ato primeiro, nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e nas Pastorais Sociais, e, como ato segundo, sistematizada na Teologia da Libertação, que Michael Lowy chama de ‘Cristianismo Libertador’ “por ser esse um conceito mais amplo que ‘teologia’ ou que ‘Igreja’ e incluir tanto a cultura religiosa e a rede social, quanto a fé e a prática” (LOWY, 2000, p. 57). Assim, a CPT presta às camponesas e aos camponeses assessoria pastoral, teológica, metodológica, jurídica, política, sociológica e celebra a fé, as iniciativas, as vitórias e os fracassos do povo camponês com eles/no meio deles, interligando as lutas e dinamizando-as.
Entende-se por posseiro o usuário de terras ainda não tituladas. Ou seja, posseiro é o que reivindica para si as terras sobre as quais está trabalhando. O posseiro luta, não apenas pela terra, mas pela liberdade de trabalho familiar, o que lhe confere liberdade de trabalho autônomo e liberdade de decisão. “A expansão do capital se faz preferencialmente sobre terras ocupadas por posseiros, através (sic) da expropriação e da expulsão. [...] Ele deve ser expulso porque deprime ou elimina, ou seja, destrói a renda fundiária. A posse é a negação da propriedade” (MARTINS, 1983, p. 116). Posseiros e Sem Terra disputando a mesma terra constitui um conflito fundiário diferente do conflito fundiário entre empresas do agronegócio e posseiros ou quilombolas, ou indígenas ou outra comunidade tradicional como os vazanteiros e os geraizeiros. “O posseiro é produto da própria expansão do capital; o índio não o é” (MARTINS, 1983, p. 117). As comunidades tradicionais não são indígenas, mas também não são simples posseiros. Os peões e o trabalho escravo com escravidão por dívida, combatido em campanha permanente da CPT, são também produtos do avanço do capital sobre o campo.
Durante o império romano, na língua latina, o termo tripálio (tripalium, em latim) faz referência a trabalho, mas literalmente significa três paus para empalar e torturar escravos. Na língua grega existem dois termos para se referir a trabalho: doulos e poiesas. O termo doulos se refere ao trabalho enquanto servidão, análogo à situação de escravidão, trabalho fruto de força de trabalho vendida no mercado para gerar mais-valia. O termo grego poiesas se refere ao trabalho criativo e prazeroso, no qual a trabalhadora e o trabalhador criam e gozam os frutos do seu trabalho. Trabalho no sentido de poiesas é o que o profeta Isaías na Bíblia anuncia como utopia em uma sociedade com “novos céus e nova terra”: “Os homens construirão casas e as habitarão, plantarão videiras e comerão os seus frutos. Já não construirão para que outro habite a sua casa, não plantarão para que outro coma o fruto” (Isaías 65,21-22a). No sentido criativo, na luta pela terra há muito trabalho, que vai desde a organização inicial, passa pelo trabalho de base, pelos enfrentamentos que são desencadeados a partir da ocupação de latifúndios que não cumprem sua função social e permeia o dia a dia da vida social nos acampamentos e assentamentos, transcorre a produção, a lida com a terra e a organização que deve ser constante. A luta se torna um trabalho educativo que busca emancipação.
Na realidade brasileira, atualmente o que predomina é o trabalho no sentido de tripalium ou doulos: trabalho escravo, sendo renda capitalizada, em uma espécie de Servidão Moderna[3], enquanto apenas uma minoria tem garantido seu direito de trabalhar no sentido de poiesas, trabalho que dignifica a pessoa humana, pois é criativo e dá asas à criatividade. Para Marx, trabalho é toda ação humana transformadora da natureza.
A CPT, durante várias décadas, preferiu se referir aos camponeses chamando-os de lavradores, como é mais conhecido no meio rural brasileiro, porque lavrador, além de referir-se a quem lavra a terra, exprime aquele que exerce um labor, um trabalho. Logo, lavrador é camponês trabalhador. “A categoria camponês, que etimologicamente vem de campo (campus, no latim), não é, no meio rural brasileiro, mais rica em conteúdo do que lavrador, que contém na raiz a palavra latina labor; esta não só quer dizer trabalho, mas possui também a conotação de esforço cansativo, dor e fadiga” (MOURA, 1988, p. 16).
Enfim, tecemos essas considerações cientes de que a clareza sobre tudo o que envolve a luta pela terra pode aumentar o êxito da luta dos camponeses por todos os direitos sociais, entre os quais o direito à terra é primordial e imprescindível.

Referência
LOWY, Michael. A Guerra dos Deuses: religião e política na América Latina. Petrópolis: Vozes, 2000.
MARTINS, José de Souza. Os Camponeses e a Política no Brasil: as lutas sociais no campo e seu lugar no processo político. 2ª edição. Petrópolis: Vozes, 1983.
MOURA, Margarida Maria. Camponeses. 2ª edição. São Paulo: Editora Ática, 1988.

Belo Horizonte, MG, 10/7/2018.

Obs.: Os vídeos, abaixo, ilustram o texto, acima.

1 - Direito à terra: retomada Indígena Kamakã Grayra, Esmeraldas/MG. 2a parte. 16/6/2018.



2 - A Mãe terra acolhe seus filhos em luta: Ocupação Nova Jerusalém/Nova Serrana/MG. 30/6/2018.



3 - Terra e dignidade para o Povo Cigano da Lagoa de S. Antônio em Pedro Leopoldo/MG. 3ª Parte/ 14/6/2018.





[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. 
www.twitter.com/gilvanderluis             Facebook: Gilvander Moreira III

[2] “Boias-frias são trabalhadores volantes, moradores dos bairros pobres das cidades do interior, convertidos em trabalhadores temporários na agricultura” (MARTINS, 1983: 67).
[3] Filme disponível na internet no seguinte link: https://www.youtube.com/watch?v=Ybp5s9ElmcY .

terça-feira, 10 de julho de 2018

Vídeo - Acampamento Cigano do Bairro Cascata, em Ibirité, MG: clamor por direitos. 1ª Parte. 07/7/2018.


Vídeo - Acampamento Cigano do Bairro Cascata, em Ibirité, MG: clamor por direitos. 1ª Parte. 07/7/2018.


Representantes do Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES), da  Comissão Pastoral da Terra/MG (CPT), do Kaipora – Laboratório de Estudos Bioculturais da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG ) – Unidade de Ibirité - e da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares/MG (RENAP-MG), visitaram, no dia 07 de julho de 2018, o Acampamento Cigano do Bairro Cascata, em Ibirité, Região Metropolitana de Belo Horizonte, MG, a convite do Sr. Ígor, uma das lideranças desse Acampamento Cigano.
A situação das 35 famílias que vivem no Acampamento Cigano do Cascata, em Ibirité, é crítica e extremamente preocupante. Localizado próximo ao Córrego Cascata, totalmente poluído, o Acampamento está montado  em terreno onde o esgoto corre a céu aberto, sem o serviço de coleta de lixo e de saneamento básico, e as famílias, constituídas por muitas crianças, jovens e idosos,  estão expostas a  doenças e em situação de extrema vulnerabilidade social. A sobrevivência dessas famílias depende basicamente do serviço dos ciganos como carroceiros que, como eles mesmos dizem, “um dia tem serviço, no outro não tem” e do que recebem do  Bolsa-Família. Alimentam-se, muitas vezes, de restos trazidos do “Sacolão”, em suas carroças, para alimentar os animais. Separam frutas, verduras e legumes que julgam estar ainda bons para o consumo e repartem entre si. Uma cena  humilhante, que fere totalmente o princípio da dignidade humana.
Para as crianças, nenhum espaço para as felizes experiências da infância, cheia de brincadeiras, já que o espaço não oferece condições para essa liberdade. Para os jovens, a angústia de uma realidade que lhes rouba os sonhos e as esperanças. Para os adultos, pais e mães, a sensação da impotência, da fragilidade. Para os idosos, a dor de toda uma história ferida, desrespeitada em sua cultura, em suas tradições. O que se vê claramente é a marca do cruel abandono dessas famílias pelo Poder Público, municipal e estadual, que não respeita seus direitos  como Povos Tradicionais e como cidadãos e cidadãs, com direito à saúde, à educação, à assistência social, à segurança e, acima de tudo, direito a um terreno onde possam levantar suas barracas e viver em paz.
A Comunidade Cigana do Cascata, em Ibirité, MG, e toda a Rede de Apoio constituída em função da luta em defesa dos Povos Ciganos de Minas Gerais, reivindicam, firmemente, que seja assegurado a essas famílias do Acampamento Cigano do Cascata, e de todos os Acampamentos Ciganos de Ibirité, o direito à terra, com terreno adequado,  onde possam fincar suas tendas e ter acesso à água, à energia elétrica, a banheiro, de forma a viverem com a dignidade a que têm direito. Exige-se, com urgência, o cumprimento de direitos garantidos aos Povos Ciganos na Constituição Federal e na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que foi assinado pelo Brasil em 2002 e entrou em vigor em julho de 2003.
*Reportagem em vídeo de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. Ibirité, MG, 07/7/2018.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a outros vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.



Acampamento Cigano do Bairro Cascata, em Ibirité, MG: clamor por direito...

Acampamento Cigano do Bairro Cascata, em Ibirité, MG: clamor por direitos. 1ª Parte. 07/7/2018.

Representantes do Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES), da  Comissão Pastoral da Terra/MG (CPT), do Kaipora – Laboratório de Estudos Bioculturais da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG ) – Unidade de Ibirité - e da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares/MG (RENAP-MG), visitaram, no dia 07 de julho de 2018, o Acampamento Cigano do Bairro Cascata, em Ibirité, Região Metropolitana de Belo Horizonte, MG, a convite do Sr. Ígor, uma das lideranças desse Acampamento Cigano.
A situação das 35 famílias que vivem no Acampamento Cigano do Cascata, em Ibirité, é crítica e extremamente preocupante. Localizado próximo ao Córrego Cascata, totalmente poluído, o Acampamento está montado  em terreno onde o esgoto corre a céu aberto, sem o serviço de coleta de lixo e de saneamento básico, e as famílias, constituídas por muitas crianças, jovens e idosos,  estão expostas a  doenças e em situação de extrema vulnerabilidade social. A sobrevivência dessas famílias depende basicamente do serviço dos ciganos como carroceiros que, como eles mesmos dizem, “um dia tem serviço, no outro não tem” e do que recebem do  Bolsa-Família. Alimentam-se, muitas vezes, de restos trazidos do “Sacolão”, em suas carroças, para alimentar os animais. Separam frutas, verduras e legumes que julgam estar ainda bons para o consumo e repartem entre si. Uma cena  humilhante, que fere totalmente o princípio da dignidade humana.
Para as crianças, nenhum espaço para as felizes experiências da infância, cheia de brincadeiras, já que o espaço não oferece condições para essa liberdade. Para os jovens, a angústia de uma realidade que lhes rouba os sonhos e as esperanças. Para os adultos, pais e mães, a sensação da impotência, da fragilidade. Para os idosos, a dor de toda uma história ferida, desrespeitada em sua cultura, em suas tradições. O que se vê claramente é a marca do cruel abandono dessas famílias pelo Poder Público, municipal e estadual, que não respeita seus direitos  como Povos Tradicionais e como cidadãos e cidadãs, com direito à saúde, à educação, à assistência social, à segurança e, acima de tudo, direito a um terreno onde possam levantar suas barracas e viver em paz.
A Comunidade Cigana do Cascata, em Ibirité, MG, e toda a Rede de Apoio constituída em função da luta em defesa dos Povos Ciganos de Minas Gerais, reivindicam, firmemente, que seja assegurado a essas famílias do Acampamento Cigano do Cascata, e de todos os Acampamentos Ciganos de Ibirité, o direito à terra, com terreno adequado,  onde possam fincar suas tendas e ter acesso à água, à energia elétrica, a banheiro, de forma a viverem com a dignidade a que têm direito. Exige-se, com urgência, o cumprimento de direitos garantidos aos Povos Ciganos na Constituição Federal e na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que foi assinado pelo Brasil em 2002 e entrou em vigor em julho de 2003.

*Reportagem em vídeo de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. Ibirité, MG, 07/7/2018.

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#FreiGilvander


Acampamento Cigano do Cascata, em Ibirité, MG: mais um caso de descaso com um Povo Tradicional e clamor por Direitos.


Acampamento Cigano do Cascata, em Ibirité, MG: mais um caso de descaso com um Povo Tradicional e clamor por Direitos.

A cigana Mariana e crianças no Acampamento Cigano do
Cascata, em Ibirité, MG, dia 07/7/2018. Foto de A. Baeta.

No dia 07 de julho de 2018, foi realizada a primeira visita de representantes da Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (RENAP-MG), do Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES) e do Kaipora – Laboratório de Estudos Bioculturais da Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG - Ibirité) ao Acampamento Cigano do Cascata, na periferia de Ibirité, região metropolitana de Belo Horizonte, MG. Fomos convidados por uma das lideranças do Acampamento, o Senhor Igor, que solicitou formalmente uma ida nossa ao local para conhecer a realidade do acampamento, bem como para uma conversa inicial com a comunidade e apoio na luta por direitos sociais.  
As 35 famílias ciganas do Acampamento do Cascata, várias delas presentes à reunião, afirmaram que Igor e Waguinho são lideranças no Acampamento do Cascata. Por sua vez, as entidades ali presentes informaram também que só reconheceriam as lideranças ciganas que morassem no acampamento e que esta tem sido a conduta para com os outros acampamentos ciganos. Em seguida, os ciganos e as ciganas nos contaram em linhas gerais a migração forçada deles/as em várias localidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).  Relataram que já acamparam durante 25 anos em Betim e tiveram que sair de lá às pressas, devido a perseguições e que na sequência já estiveram acampados em Ribeirão das Neves e em Igarapé, e de lá tiveram que sair, montando acampamento em uma área da Fazenda Pintado, no Bairro Cascata, em Ibirité, no início de 2015, onde residem até hoje. O terreno onde se encontram possui pouco menos de 1 (Hum) hectare (10 mil metros quadrados, cerca de 1 campo de futebol), tendo sido alugado quando da sua chegada. Relataram as dificuldades para levantar recursos para o pagamento do aluguel e de alimentos, mês a mês.  Como o terreno é pequeno para todas as famílias, mais recentemente três famílias transferiram as suas tendas para um terreno vizinho da mesma fazenda, também alugado. Fomos informados de que várias famílias ciganas repassam parte do recurso de benefícios, como bolsa família, para o pagamento do aluguel do terreno, a fim de garantir a moradia no local e, com isso, manter seus filhos/as na escola, poder acessar o posto médico etc.
Ouvimos atentamente as famílias ciganas, mulheres, homens, jovens, adolescentes e crianças e percebemos o quanto é necessário, para estas famílias, a garantia da terra e do território para que possam criar e educar seus filhos, garantindo-lhes o direito à educação, alimentação saudável, saúde, entre outros direitos. Como afirmou uma jovem mãe, "eu e as demais mães não tivemos oportunidade de estudar, aprender a ler. A gente tinha que ficar mudando o tempo todo. Não queremos isso para nossos filhos. Queremos que eles estudem. Os tempos mudaram. E não tem como estudar se não tiver moradia. Estão todos estudando aqui perto, em Ibirité, em escola municipal aqui perto. Não podemos sair daqui. Nós, mães, também queremos aprender a ler".
O que se vê, mais uma vez, é um cenário muito preocupante e alarmante, pois o Acampamento Cigano do Cascata está implantado à beira de um córrego (homônimo) que se encontra extremamente poluído, um verdadeiro esgoto a céu aberto. As famílias que vivem no acampamento estão sem condições sanitárias adequadas, expostas a doenças pela falta de água potável e serviços básicos de saneamento.
Tem necessidade e direito de ter acesso aos serviços públicos que garantam qualidade de vida com saúde, bem-estar e, sobretudo, dignidade à Comunidade Cigana do Cascata, assegurando-lhes seus direitos fundamentais, tais como: terreno adequado para as suas moradias, sem necessidade de pagamento de aluguel, atendimento específico no âmbito da saúde, educação, assistência social, ambiental, garantindo rede de água, energia e saneamento.
Diante disso, denunciamos a ausência de políticas públicas que garantam o direito ao território e outros direitos humanos fundamentais para a Comunidade Cigana do Cascata, em Ibirité, MG. Reivindicamos que o Poder Público, municipal e estadual, destine terreno adequado, em tamanho e qualidade, para que todas as Comunidades Ciganas possam viver com dignidade e cultivando sua linda tradição cultural. Ao mesmo tempo, anunciamos a vida, a força, a beleza e a coragem da Comunidade Cigana do Cascata: mulheres, homens e crianças que lutam, junto com uma Rede de Apoio, pelo direito à vida e de viver a partir de sua própria cultura!
Alertamos para os direitos ciganos prescritos na Constituição Federal, no Estatuto dos Povos Ciganos (em tramitação no Congresso Nacional), tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, como a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho, ligada à ONU) que exige respeito aos direitos dos Povos Tradicionais, entre os quais estão os Povos Ciganos. Reivindicamos que a prefeitura de Ibirité crie uma Política Pública Municipal voltada especificamente para as Comunidades Ciganas, o que é exigência da Política Nacional de Povos Tradicionais e, agora também, estadual, pois há alguns meses o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, regulamentou a Lei que trata dos Povos Tradicionais. Portanto, o poder público municipal tem o dever, com extrema urgência, de garantir território para assentamento de todas as famílias ciganas existentes no município e todas as políticas públicas nas áreas de saúde, educação, assistência social etc. Criar um Centro de Tradições Ciganas é também um dever do poder público e direito do povo cigano.
Importante lembrar que há toda uma Rede de Apoio mobilizada na luta pelos direitos das Comunidades Ciganas, composta Pela Associação Nacional dos Ciganos (ANEC), CEDEFES (Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva), CPT (Comissão Pastoral da Terra), MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas), MPF (Ministério Público Federal), Defensorias Públicas Estadual e da União, advogadas e advogados populares da RENAP-MG (Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares), Universidade do Estado de Minas Gerais-UEMG (Unidade Ibirité), professores e estudantes universitários, dentre outros.
Feliz quem reconhece as belezas milenares da cultura cigana e se compromete na luta em defesa destes povos que dignificam a plural cultura brasileira! Mexeu com os ciganos, mexeu com muitas forças vivas! Respeito aos povos ciganos, sempre!
Todo apoio e solidariedade aos Povos Ciganos nessa luta por terra e por respeito aos seus direitos, à sua dignidade!

Assinam essa Nota Pública:
Comunidade Cigana do Cascata, em Ibirité, MG;
CPT (Comissão Pastoral da Terra);
Kaipora (Laboratório de Estudos Bioculturais (UEMG – Unidade Ibirité);
CEDEFES (Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva);
RENAP-MG (Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares).

Ibirité, região metropolitana de Belo Horizonte, MG, 10 de julho de 2018.


domingo, 8 de julho de 2018

IZIDORA RESISTE E CAMINHA PARA A REGULARIZAÇÃO, MAS PIMENTEL PREMIA SUSPEITO DE ESPECULAÇÃO E GRILAGEM


IZIDORA RESISTE E CAMINHA PARA A REGULARIZAÇÃO, MAS PIMENTEL PREMIA SUSPEITO DE ESPECULAÇÃO E GRILAGEM

Dia 06 de julho de 2018, mais de cinco anos (5) após o início das ocupações Rosa Leão, Esperança e Vitória, na região da Izidora, em Belo Horizonte e Santa Luzia, MG, onde resistem 8.000 famílias, no último dia antes de iniciar o período de vedação eleitoral, de forma eleitoreira (Por que não assinou antes?), foi assinado pelo Governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, um despacho governamental que autoriza a COHAB (Companhia de Habitação de Minas Gerais) a realizar permutas de terrenos com os pretensos "proprietários" das áreas ocupadas para transformar os terrenos das ocupações em áreas públicas destinadas a regularização fundiária.
O despacho governamental, na prática, ainda não é uma garantia de regularização, o que dependerá de muita luta do povo das ocupações e dos movimentos Brigadas Populares, MLB, CPT e Coletivo Margarida Alves. Mas representa um pequeno avanço, pois uma vez que as áreas passem a ser do Estado elas podem e devem receber a infraestrutura urbana e os equipamentos públicos necessários a uma vida digna como postos de saúde, escolas, creches, saneamento e eletrificação. Direitos que têm sido negados até então para o povo das Comunidades da Izidora.
Lutamos pela regularização das Ocupações da Izidora, para que as comunidades Rosa Leão, Esperança e Vitória sejam reconhecidas no novo Plano Diretor de Belo Horizonte como AEIS - Área de Especial Interesse Social -, e para que as terras que não cumpriam a sua função social sejam passadas a seus legítimos possuidores: as 30 mil pessoas que vivem e constroem três grandes bairros populares e de resistência em Belo Horizonte e Santa Luzia.
No entanto, desconhecemos o teor do acordo realizado, se é que já foi firmado, entre o Estado de Minas e os pretensos "proprietários" das áreas ocupadas e repudiamos a forma como a negociação excluiu as ocupações e os movimentos sociais (Brigadas Populares, CPT e MLB), que até hoje não foram recebidos em uma reunião com o Governador Pimentel para tratar deste assunto. Injusta a postura do Pimentel que em 3 anos de 6 meses de gestão estadual não recebeu nem uma vez as coordenações das Ocupações da Izidora e repudiamos, mais uma vez, as violências cometidas pelo Estado de Minas, cujo ápice foi a repressão na MG 10 dia 19 de junho de 2015, quando mais de 100 companheiros foram feridos, entre eles Ricardo Freitas (o Kadu), e mais de 50 pessoas presas. Foi repressão covarde, estúpida e asquerosa, pois a marcha de mais de 2 mil pessoas seguia pacificamente pela MG 010 rumo à Cidade Administrativa. Do helicóptero da PM de MG foi jogada bomba de gás lacrimogêneo que caiu no colo de Alice, uma criança de 9 meses que estava no carrinho de bebê. Por um milagre não foi assassinada pela PM uma criança de 9 meses.
Além disso, entendemos que a permuta de terrenos e a desapropriação com dinheiro não são as medidas justas a serem tomadas pelo Estado, pois premiam a especulação imobiliária e a grilagem de terras, sobretudo da Granja Werneck S.A, cujo título de propriedade da Matrícula 1202 apresenta 09 fortes indícios de grilagem, o que foi denunciado pelas ocupações, movimentos e rede de apoio. A Granja Werneck S.A, além de pressionar por cinco anos (5) pelo despejo da Izidora, avançou sobre as terras do Quilombo Mangueiras e ainda, por meio de familiares da Granja Werneck, processou Frei Gilvander, da Comissão Pastoral da Terra, porque ele também denunciou os fortes indícios de grilagem de terra. É uma injustiça que a família Werneck seja premiada com um terreno valioso na região metropolitana. A granja Werneck já recebeu ou vai receber um terreno que vale 47 milhões de reais? E a existência de fortes indícios de grilagem de terra, milhões em dívida de IPTU, terreno que estava abandonado, sem cumprir a função social, no momento em que foi ocupado? Isso não conta? Especuladores e grileiros não merecem ficar com a terra que é do povo. Por que o Estado de Minas não faz o estudo da cadeia dominial que comprovará a grilagem conforme já atestado por parecer de advogados especialistas em grilagem de terras?
Ressaltamos, por fim, que se a Izidora está caminhando para a regularização é porque houve muita luta do povo organizado. Izidora, o maior conflito fundiário urbano do Brasil, é exemplo de resistência e luta para todo o povo trabalhador. É Vitoriosa, assim como vitoriosas são as ocupações Dandara, Camilo Torres, Irmã Dorothy, Eliana Silva, Paulo Freire, Carolina Maria de Jesus e tantas outras que ensinaram com o exemplo a maior lição de todas: só a luta muda a vida! E, direito se conquista na luta!
Pátria Livre! Venceremos!

Assinam essa Nota:
Coordenações das Ocupações-comunidades Rosa Leão, Esperança e Vitória
Brigadas Populares - BP
Coletivo Margarida Alves - CMA
Comissão Pastoral da Terra – CPT/MG
Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas - MLB
Associação Arquitetas Sem Fronteira – ASF

Belo Horizonte, MG, 08 de julho de 2018.

sexta-feira, 6 de julho de 2018

Retomada Indígena na FUCAM/Esmeraldas/MG: Luta legítima pelo direito à t...

Retomada Indígena Aldeia Kamakã Grayra, na FUCAM, em Esmeraldas, MG: Luta legítima pelo direito à terra. 3ª Parte. 06/6/2018.

A cacica Marinalva e o vice-cacique Merong e outras duas indígenas
 da Aldeia Kamakã Grayra, em Esmeraldas, MG, dia 06/6/2018.
Foto: G. L. Moreira.
Há um ano e meio, no dia 1º de janeiro de 2017, dezenas de famílias indígenas, que moravam antes na Região Metropolitana de Belo Horizonte, MG - expulsas de seus territórios e sobrevivendo em diáspora forçada -, apoiadas pela Associação dos Povos Indígenas de Belo Horizonte e Região Metropolitana (APIBHRM), ocuparam parte de uma das três fazendas da FUCAM (Fundação Educacional Caio Martins), Fazenda Santa Tereza, no município de Esmeraldas, RMBH, fazenda de propriedade do Governo de
Minas Gerais. Na época da retomada, essa fazenda e as outras duas fazendas da FUCAM encontravam-se totalmente abandonada, sem cumprir sua função social, e essa situação só foi alterada após a retomada indígena, quando, então, o Governo de Minas Gerais preocupou-se em desenvolver, ali, algumas ações. Essa retomada indígena deu origem à Aldeia Kamakã Grayra, em homenagem à Jacinta Grayra, última ancestral a falar a língua Kamakã. Na aldeia encontram-se 62 famílias, com 264 indígenas, que, cansados das injustiças, da discriminação, da violência e do preconceito sofridos na capital mineira, do descaso do Poder Público em relação a essa realidade, e tendo conhecimento, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, dessa extensa área, com benfeitorias abandonadas, decidiram por sua ocupação, melhor dizendo, decidiram retomar do Estado de Minas Gerais as terras que, originariamente, lhes pertencem, por legítimo direito. Nesse vídeo, a 3ª parte da reunião realizada no dia 06/6/2018, com lideranças indígenas da Aldeia Kamakã Grayra e representantes da FUNAI (Fundação Nacional do Índio), do CEDEFES (Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva) e da CPT-MG (Comissão Pastoral da Terra), em que são relatados mais detalhes da luta por essa retomada indígena, incluindo ações concretas da FUNAI pela garantia desse direito ao território aos indígenas. Nessa reunião, a FUNAI fez a Qualificação da nova Aldeia, uma espécie de cadastro da realidade da nova
aldeia. Faz-se necessário que o Governo do Estado de Minas Gerais, a direção da FUCAM e a Mesa de Negociação do Governo com as Ocupações iniciem, com urgência, um processo de negociação sério, ético e humano que reconheça a legitimidade da Retomada Indígena Kamakã Grayra, em Esmeraldas, MG e efetue a Concessão de Uso da terra para essa Comunidade Indígena. Espera-se do Governo de Minas Gerais a celeridade nas ações, evitando qualquer forma de violência e repressão aos indígenas da RMBH; antes, e, sobretudo, reconheça o direito à terra dos Povos Indígenas e respeite sua dignidade. Há toda uma vida pra ser (re)construída, resgatada e vivida na Aldeia Kamakã Grayra, em perfeita harmonia com a Mãe Natureza que clama por cuidado e revitalização e tem nos indígenas seus legítimos e amorosos guardiães.

*Reportagem em vídeo de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, da Equipe de Comunicação da CPT-MG. Esmeraldas,MG, 06/6/2018. * Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a outros vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe.
Sugerimos.