quinta-feira, 3 de março de 2016

As Ocupações da Izidora na Corte dos Direitos Humanos.

MLB na luta do MST no Sul de MG nas terras da Ariadnópolis: 600 famílias...

Libertai os presos do Presídio Regional de Nova Lima, prisão subterrânea, no porão de uma casa. por frei Gilvander. BH, 03/03/2016.

Libertai os presos do Presídio Regional de Nova Lima, prisão subterrânea, no porão de uma casa.
Frei Gilvander Moreira[1]

Na Campanha da Fraternidade de 2009, ouvimos o brado de Jesus de Nazaré: “Libertai os presos!” “Eu vim para libertar os presos” (Lucas 4,18), proclamou Jesus de Nazaré ao apresentar seu projeto de ação pública na pequena sinagoga de Nazaré.
 Como conselheiro do CONEDH (Conselho Estadual dos Direitos Humanos) e como assessor da CPT (Comissão Pastoral da terra), fiquei estarrecido ao saber que o Presídio Regional de Nova Lima está “torturando” 207 presos, tendo como capacidade máxima 97 presos, mas com capacidade excedida em mais de 113%. Fiquei feliz ao saber que a Defensoria Pública de Minas Gerais, área de Direitos Humanos, ingressou ação coletiva - Ação Civil Pública (ACP) - exigindo o fechamento do presídio. O juiz da 2ª vara cível da Comarca de Nova Lima ainda não julgou a ACP com pedido de liminar com antecipação de tutela para fechar o presídio. Eis, abaixo, um pouco da realidade violentadora dos direitos humanos dos 207 presos que estão lá sendo violentados segundo a segundo, fatos que constam da ACP.
O próprio Diretor do presídio Dr. Willer Cruz Brum de Oliveira, inscrito no Masp sob o n°.1.095.795-9, em 17.01.2016, atesta a situação insuportável gerada pela superlotação, aliada à falta de estrutura do presídio, que conta com apenas quatro agentes penitenciários para a vigia do local, bem como a interdição pela Defesa Civil do Estado de um cômodo do presídio, que era destinado ao setor administrativo do mesmo, são situações de flagrante violação das garantias e dos direitos dos custodiados, trazendo riscos não só aos presos, mas também aos funcionários do presídio e ao povo de Nova Lima, tendo em vista tratar-se de Unidade Prisional localizada no centro da cidade, meio subterrânea, diante das reiteradas e justificadas retaliações à superlotação, como greve de fome e frequentes ameaças de rebeliões e ou motins por parte dos presos.
A Defensoria Pública esteve no Presídio Regional de Nova Lima em várias visitas após o noticiado, relatando a demanda dos presos, funcionários, agentes e do próprio Diretor Geral, sendo certo que na visita conjunta com a Defensoria Pública de Direitos Humanos e o Conselho Penitenciário do Estado, com a presença de vários Conselheiros, dentre eles do Presidente Dr. Bruno César Gonçalves da Silva e do Defensor Público da Comarca Dr. Rafael Pedro Magagnin, realizada no dia 20/01/2016, foi constatado o flagrante desrespeito às garantias e aos direitos humanos dos presos custodiados na Unidade Prisional, que não tem nenhuma condição de abrigar sequer o número de presos dito como comportados pelo local, quanto mais o número excedente que contém.
O Presídio Regional de Nova Lima está sendo uma masmorra, um campo de concentração sem rótulo, é de absoluta ilegalidade a manutenção dos presos em uma Unidade Prisional que, por exemplo, tem o seguinte:
1- a falta de leitos, com casos de três presos dormindo no mesmo leito ou fazendo rodízio para dormir, quando dormem;
2- a falta de ventilação, havendo celas sem qualquer tipo de janelas ou ventanas, sendo que as que “possuem ventilação”, trata-se apenas de basculantes voltados para as áreas internas do próprio presídio, ou seja voltados para dentro do recinto fechado, sendo que os presos ficam pendurados nas paredes agarrados às grades destas aberturas, lá nas alturas, correndo o risco de cair e morrer;
3- a falta de local adequado para pátio de sol, posto que o que existe é uma área sem ventilação adequada, dentro da área interna do presídio, com telhado translucido para a passagem da luz solar;
4- a falta d’água diariamente enfrentadas pela comunidade da Unidade Prisional, posto que a caixa d’água não comporta a vazão diária, sendo necessário fechá-la para ligar bomba d’água para enchê-la, o que leva horas até que seja novamente aberto o registro para consumo d’água, cabendo dizer aqui que tal bomba d’água é extremamente barulhenta prejudicando a saúde de todos que estão dentro e até fora do presídio neste momento;
5- a falta de enxoval, roupa de cama, cobertores, lençóis, bem como uniformes e chinelos para todos os presos;
6- doenças respiratórias e de pele dentre outras, como sarna, sem falar dos presos doentes que não recebem medicação por não haver farmácia e médico que atenda o local;
7- a interdição de uma área pela Defesa Civil do Estado, que está em risco iminente de desabamento;
8- o fato de haver presos condenados não residentes na comarca, que deveriam estar cumprindo a sua pena em penitenciárias;
9- a existência de presos por tentativa de furto e ou crimes com penas semelhantes que aguardam mais de seis meses presos, por audiências marcadas para março e por fim a falta de higiene do local e da alimentação oferecida aos presos.
O Presídio Regional fica no Centro de Nova Lima-MG, sem estrutura alguma para ser sequer carceragem provisória, à época em que foi instalado, como carceragem da Polícia Civil do Estado, quanto mais hoje, como Unidade Prisional da SUAP, posto tratar-se de um porão de uma casa, que tem como frente à Delegacia da Polícia Civil e em seu porão abriga a Unidade Prisional.
A superlotação e a falta de cama obrigam os presos a fazerem rodízio para dormirem ou ainda, dormirem dois ou três presos na mesma cama, o que de fato é um absurdo.
Segundo os detentos o regime a que estão submetidos é insuportável, vivendo acautelados de forma claustrofóbica em celas pequenas, amontoados, dormindo vários em uma cama, não há colchões, nem roupa de cama suficiente para todos.Ainda no que tange ao enxoval, não há uniformes para troca, quando lavam as roupas ficam nus até que seque a roupa lavada, não há calçados para todos e tem preso sem chilenos, descalço no chão úmido.
Quanto à alimentação eles disseram que ela chega sempre fria e até teve casos dela estar com aspecto de estragada porque passou muito da hora de servir, com mau cheiro e aspecto estranho, não sendo ingerida pelos mesmos.
Há reclamação sobre a falta de atendimento médico. A Defensoria Pública presenciou vários casos de doenças causadas pela falta de ar dentro das celas, inclusive essa defensora, bem como todos que foram visitar o presídio não conseguiram ficar dentro sequer do hall de entrada para acesso às celas, quanto mais dentro das celas, sendo que na inspeção foi esvaziada uma delas, a primeira, a fim de que fossem feitas as averiguações necessárias, no entanto as autoridades não puderam permanecer por mais de dois minutos dentro das celas por absoluta incapacidade de respirar o ar dentro delas.
O art. 66, VIII, da Lei de Execução Penal concede ao Juiz da execução a prerrogativa de interditar, no todo ou em parte, estabelecimento penal que estiver funcionando em condições inadequadas ou com infringência aos dispositivos daquela Lei. O juiz Dr. Livingsthon Machado libertou 26 presos em presídio de Contagem, MG, que estavam em situação semelhante aos 207 presos em Nova Lima.
Tudo escrito, acima, consta da ACP que exige o fechamento do presídio.
Entre os 600 mil presos no Brasil, cerca de 40% aguardam julgamento, enquanto os fazendeiros e empresários como Adriano Chafic (condenado a 115 anos como mandante do Massacre de 5 Sem Terra em Felisburgo, MG) e os 4 mandantes da Chacina dos fiscais em Unaí (Antero Mânica, Norberto Mânica, Hugo Pimenta e José Alberto, condenados a quase 100 anos de prisão) continuam livres sob a proteção de recursos intermináveis. Que injustiça! Milhares de presos sendo castigados, enquanto uns poucos privilegiados criminosos gozam de liberdade.
Vale a pena apostar na construção de uma sociedade com verdadeira segurança social, com paz como fruto da justiça (Is 32,17) e SEM PRISÕES. Ouçamos o clamor dos nossos irmãos e irmãs que estão detrás das grades! Libertai os presos, pelo menos do castigo permanente a que estão submetidos!
Peço a quem puder que ecoe o clamor dos 207 presos de Nova Lima, a cidade onde tem prisão que castiga 24 horas por dia seus presos?
Belo Horizonte, MG, Brasil, 03/03/2016.



[1]  Padre da Ordem dos carmelitas, doutorando em Educação pela FAE/UFMG, assessor da CPT, de CEBs e do SAB. www.freigilvander.blogspot.com.brgilvanderufmg@gmail.com

MST de MG não aceitará despejo na sede e nem nos escombros da ex-usina Ariadnópolis em Campo do Meio, Sul de Minas. Nota da CPT/MG. BH, 03/03/2016.

MST de MG não aceitará despejo na sede e nem nos escombros da ex-usina Ariadnópolis em Campo do Meio, Sul de Minas.

Nota da CPT/MG. Belo Horizonte, MG, 03/03/2016.

Dias 1 e 2 de março de 2016, um militante do MLB e eu, frei Gilvander, da CPT/MG, participamos da luta do MST no Sul de Minas Gerais, no município de Campo do Meio. No Sul de MG, o MST já conquistou 3 assentamentos: O P.A Primeiro do Sul e o P.A Nova Conquista II, no município de Campo do Meio, e o P.A Santo Dias, no município de Guapé. No latifúndio da ex-usina Ariadnópolis, em cerca de 5 mil hectares, o MST está com 12 acampamentos com cerca de 600 famílias. Em 25/09/2015, o Governador Pimentel assinou decreto desapropriando grande parte da área da ex-usina Ariadnópolis, a Fazenda Gravatá em Novo Cruzeiro e a Fazenda Nova Alegria, em Felisburgo, repassando para cerca de 800 famílias do MST, que estão acampadas há 18 anos. Mas faltam ainda 864 hectares da ex-usina Ariadnópolis para ser desapropriada e 26 hectares da sede e a parte onde está a carcaça e os escombros da ex-usina Ariadnópolis. Pior: o Geovane, gerente da massa falida CAPIA, entrou com recurso no TJMG para derrubar o decreto de desapropriação do governador de MG. As centenas de famílias acampadas nas terras da Ariadnópolis estão muito indignadas com este questionamento do Geovane. Dia 11/10/2015, o MST, com cerca de 2 mil Sem Terra ocuparam a sede da ex-usina Ariadnópolis e a área do escombros da ex-usina da Ariadnópolis, formando, assim, o 12º acampamento nas terras da Ariadnópolis. Fomentando o gravíssimo conflito agrário nas terras da Ariadnópolis, um dos maiores conflitos agrários do país, que se arrasta há 18 anos, o juiz da Vara Agrária de MG, sem visitar a área, acreditando em mentiras do Geovane/CAPIA, deferiu liminar de reintegração de posse e um desembargador do TJMG confirmou a liminar. Está marcado para se tentar fazer o despejo dia 10 de março próximo, prazo concedido pelo juiz da Vara Agrária. Mas as 600 famílias do MST da Ariadnópolis e cento e poucas famílias dos 3 assentamentos da região e uma grande Rede de Apoio não aceitarão jamais o despejo do MST da sede da Ariadnópolis e nem da área dos escombros da ex-usina. Não dá mais para tolerar a violência que o latifúndio vem perpetrando nas terras da Ariadnópolis. Há mais de 100 trabalhadores assentados na Ariadnópolis que eram trabalhadores na Usina. Um nos disse que há 18 anos, quando o MST chegou na região, a dívida trabalhista dele era de 135 mil reais. Hoje deverá estar acima de 500 mil reais. São cerca de 500 trabalhadores violentados pela ex-usina Ariadnópolis sem receber suas dívidas trabalhistas. A massa falida da ex-usina Ariadnópolis devem milhões ao erário público e dívidas trabalhistas. A mansão da sede tem 5 andares, com elevador e luxo que não acaba mais. É um escárnio, uma indecência, uma imoralidade, uma mansão daquela no meio do povo Sem Terra que sua para se libertar da escravidão do capital. Em volta da mansão da sede há mais de 20 grandes casas, incluindo um grande castelo e casas históricas. O MST tem projeto para implantar na sede e nessas 20 grandes casas uma Escola estadual, um Centro de Formação Eduardo Galeano, que será uma “filial” da Escola Nacional Florestan Fernandes. O Instituto Federal de Machado, do Sul de MG, já tem parceria com o MST e quer colocar lá também cursos em várias áreas técnicas.

Dia 01/03/2015, em reunião, in loco, com representantes do Governo de MG (casa civil, sec. do Planejamento e AGE) e com 4 comandantes da PM, lideranças do MST e representantes da Rede de Apoio deixaram claro que não aceitarão o despejo marcado para dia 10/03/2016, que caso a PM tente fazer o despejo, poderá acontecer um grande massacre, pois as 600 famílias da Ariadnópolis já sofreram 12 despejos, já foram muito humilhadas pelo Geovane e Rose, gerentes da massa falida. E não abrem mão de instalar na sede e nas 20 casas grandes ao redor uma Escola Estadual e um Centro de Formação Eduardo Galeano. Se o juiz da Vara Agrária tivesse ido visitar e tivesse visto o luxo e a ostentação da mansão e os escombros da ex-usina, provavelmente não teria concedido a liminar de reintegração, que é injusta e inconstitucional. Despejar o MST da sede e dos escombros da ex-usina Ariadnópolis é premiar mais uma vez o latifúndio, a corrupção, a especulação em cima do sequestro da terra, é impedir a instalação de uma necessária Escola estadual e de um grande Centro de Formação Eduardo Galeano. Os Sem Terra e o MST toleraram 18 anos sem ocupar a sede da ex-usina e a área dos escombros da ex-usina Ariadnópolis, mas dia 11/10/2015 ocuparam para não sair mais. Esperamos que o Governo de MG, o TJMG e o alto comando da PM tenham a sensatez de não tentar despejar essa nova ocupação e que desaproprie inclusive a sede da ex-usina Ariadnópolis e a área dos escombros da ex-usina Ariadnópolis. Isso será justiça agrária tardia. Isso é o justo que deve prevalecer.

Obs.: Veja, abaixo, algumas fotografias la luta digna e justa dos Sem Terra do MST lá nas terras da ex-usina Ariadnópolis. Fotos de 01/03/2016, de Gilvander Moreira.













domingo, 28 de fevereiro de 2016

A luta pela terra e pela Educação do/no Campo, em Arinos, noroeste de Minas Gerais. por Elza Cristiny e frei Gilvander Moreira

A luta pela terra e pela Educação do/no Campo, em Arinos, noroeste de Minas Gerais.
Por Elza Cristiny Carneiro Batista, com apresentação de frei Gilvander Luís Moreira.

Eu, frei Gilvander, fiquei feliz ao descobrir que Elza Cristiny Carneiro Batista fez mestrado em sociologia, na UFSC, terminando em 2015, com dissertação sobre “Trajetórias escolares de jovens assentados: estudo em Arinos/MG.” Mais feliz ainda fiquei ao ler a dissertação de Elza, a quem parabenizo pela pesquisa feita e pelo texto produzido. Sugiro a quem puder que leia a dissertação de Elza na íntegra. O texto em pdf está disponibilizado na internet no link https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/135135/334647.pdf?sequence=1
Mas como aperitivo, reuni, abaixo, alguns flashes da Dissertação de Elza: “um olhar sociológico sobre a luta pela terra e pela Educação do/no Campo, no município de Arinos, no noroeste de Minas Gerais.” Todos/as professores/ras, estudantes, pais e mães, autoridades e pessoas de boa vontade do Instituto Federal do Norte de MG campus de Arinos (IFNMG), da Escola Estadual Chico Mendes, do município de Arinos, precisam ler e acolher com carinho as análises e sugestões que a mestra Elza Cristiny faz com muita pertinência. Eis, abaixo, alguns recortes da dissertação de Elza.

“No ano de 2000, os assentados ocuparam a Escola Estadual Major Saint' Clair, no centro da cidade de Arinos por, aproximadamente, uma semana. Nesse ínterim, várias negociações envolvendo lideranças e políticos locais aconteceram até que o governador Itamar Franco autorizasse o funcionamento da escola no assentamento. A partir daí, a comunidade de assentados, com o apoio do MST, segundo dados de entrevistas, arrecadou doações de colaboradores e da prefeitura. Com este recurso adaptaram parte da antiga sede da fazenda desapropriada para que a escola começasse a funcionar. Dentre as instalações reaproveitadas para a escola, estava um curral de bezerros, também chamado pelos alunos de "o barracão". Foi nesse espaço que aconteceram boa parte das histórias que pais, alunos, professores e lideranças do MST nos contaram. Alguns com indignação, diante da precariedade das condições; outros, com um sentimento de conquista, por ter sido a adaptação do curral uma marca da resistência dos assentados em deixar os filhos estudarem na cidade. Somente em 2010, um prédio próprio para o funcionamento da escola foi entregue à comunidade (p. 26).”
“Há registros de que entre 1970 e 1980, houve um fluxo migratório significativo no município de Arinos e foi justamente nessa época que ocorreram as primeiras ocupações de áreas improdutivas na região. O marco referencial na luta pela terra é a desapropriação das fazendas Saco Grande/Palmeirinha (em Unaí, 1984) e Fruta D'Anta (em João Pinheiro, 1986) (p. 42).”
“O Entorno do Distrito Federal possui 57 assentamentos da reforma agrária (Leite et al., 2004). Vinte e três deles estão localizados no município de Arinos (INCRA, 2014), a saber: Santa Terezinha, Mimoso, Rancharia, Riacho Claro, Santo Antônio dos Gerais, Caiçara, Grande Borá, Carro Quebrado, Roça, Chico Mendes, Carlos Lamarca, Colônia dos Ciganos, Buriti Grosso/Boqueirão, Paulo Freire, Elói Ferreira da Silva, PIC Sagarana e outros sete assentamentos de crédito fundiário (como Banco da Terra, Para Terra e Cédula da Terra) (p. 43).”
“O MDA indica, utilizando dados de 2011, que existem no Noroeste de Minas 79 assentamentos, abarcando 5.715 famílias, mais treze acampamentos, com 863 famílias acampadas (aproximadamente). Tais assentamentos estão em etapas diferenciadas, já que alguns deles foram criados, ainda nas décadas de 1970 e 1980, como o PIC (Projeto Integrado de Colonização) Sagarana e o PA Mimoso, respectivamente. Em Arinos, o número de famílias assentadas, ainda segundo o relatório do MDA é de 1.031. Em toda a região Noroeste existe ainda a presença significativa de assentamentos via financiamento por programas governamentais como Banco da Terra e Para Terra em um total de dezenove, com 395 famílias assentadas (p. 44).”
“A região Noroeste de Minas Gerais hoje é formada por 22 municípios: Arinos, Chapada Gaúcha, Pintópolis, Urucuia, Formoso, São Romão, Riachinho, Uruana de Minas, Bonfinópolis de Minas, Natalândia, Dom Bosco, Brasilândia de Minas, Santa Fé de Minas, Paracatu, João Pinheiro, Lagoa Grande, Guarda-Mor, Vazante, Presidente Olegário, Varjão de Minas, Lagamar e São Gonçalo do Abaeté. O Noroeste ocupa uma área que equivale a 10,38% de área total do estado de Minas Gerais, mas apenas 1,60% da população do estado ocupa essa área, o que representa 5,15 habitantes por km², um grande vazio demográfico (p. 45).”
“A população de Arinos, de acordo com Censo de 2010 é de 17.674 habitantes. Deste total, 38,5% reside na zona rural (p. 46). Atualmente há forte presença da agricultura empresarial, sobretudo na produção de grãos (feijão e milho), com espaço também para a pecuária e a agricultura familiar. Dados do IBGE indicam que em 2011 o Noroeste de Minas foi líder na produção de grãos no estado de Minas Gerais (p. 47).”
“O rio Urucuia e mais cinco grandes afluentes (Rio São Domingos, Rio Piratinga, Rio Claro, Rio São Miguel e Ribeirão da Areia) atravessam o município de Arinos. Guimarães Rosa (2006) apresenta a região do Urucuia como parte do cenário de Grande Sertão: Veredas. Há também várias referências ao urucuiano e à sua região em outros contos do autor, como A Menina de Lá, Famigerado e Barra da Vaca. “Barra da Vaca” é o nome pelo qual era conhecido o povoado que transformou-se na cidade
de Arinos. Barra da Vaca é o nome de uma vereda que hoje localiza-se no
centro da cidade de Arinos. Destacamos que, em Grande Sertão Veredas, as metáforas existenciais relacionam os conflitos do homem aos aspectos da natureza do sertão, sobretudo à dos rios: há sessenta e seis referências ao Urucuia e ao povo que no vale (com)vive. “(...) Nessas referências, Guimarães Rosa destaca, além da cultura sertaneja, as belezas naturais do sertão brasileiro, sobretudo no que diz respeito às bacias hidrográficas. Nenhum rio foi tão citado, descrito, comparado quanto o rio Urucuia (Silva, 2014:38) (p. 48).”
“O município de Arinos compreende parte das terras do parque Nacional "Grande Sertão Veredas" criado em 1989 e cuja área de 8.875 hectares se estende também entre os municípios de Chapada Gaúcha, Formoso e Cocos (no estado da Bahia) (p. 49).”
“O assentamento mais antigo de Arinos (e também o primeiro assentamento realizado pelo INCRA, em Minas Gerais, no ano de 1974)
recebeu o nome de Sagarana. Ainda segundo Silva (2014), a escolha deste nome é resultado do reconhecimento, por parte dos responsáveis
técnicos pelo projeto na região, da relação literária existente entre a região do Rio Urucuia e João Guimarães Rosa (p. 49).”
“Os quatro assentamentos que fazem parte desta pesquisa são acessados pela rodovia MG 202, sentido Arinos/Buritis. Nesta direção, a
aproximadamente 20 quilômetros do centro de Arinos, existe um trevo que dá acesso ao PA Chico Mendes. Do trevo em diante, no sentido do assentamento, as estradas são todas sem pavimentação. Dentro do Chico
Mendes existem outras estradas que dão acesso aos assentamentos Carro Quebrado e Roça. O PA Carlos Lamarca, pela mesma rodovia, tem o acesso a 4 quilômetros depois do trevo para o Chico Mendes (p. 50).”
As sedes desses assentamentos funcionam nas casas dos antigos
proprietários das fazendas desapropriadas. Nesses espaços acontecem as
reuniões das associações e outros eventos coletivos como almoços e festas das comunidades (p. 50).”
“A produção de leite é a principal atividade econômica dessas comunidades. Dados divulgados pela Cooperativa Agropecuária Unaí Ltda. (CAPUL) em 2010 revelam que aproximadamente 40% da captação de leite da cooperativa advém das unidades familiares de produção nos assentamentos rurais (Souza et. al., 2010:13)  (p. 50).”
“No total, são 11 tanques de resfriamento: 4 no Chico Mendes, 2 no assentamento Carro Quebrado (sendo 1 tanque particular), 4 no assentamento Carlos Lamarca (sendo dois particulares) e 1 tanque no assentamento Roça. As associações de cada um desses assentamentos são cooperadas com a CAPUL que recebe o leite e faz o pagamento para as associações (p. 51).”
“O preço do leite é variável e determinado pela Itambé, empresa que compra o leite da CAPUL. As variações dos preços não são justificadas ou previamente informadas para as associações. Cada assentado tenta imaginar/deduzir os motivos das causas das mudanças de preço e é sempre pego de surpresa, só sabe quanto vai receber na hora do pagamento. Este comportamento é chamado por autores como Garcia-Parpet de compra não firme: uma relação de dominação em que pequenos agricultores e neste caso assentados ficam reféns de negociações com atores mais poderosos e que possuem uma posição de mercado mais privilegiada (Garcia-Parpet, 2003). Outra prática realizada pela CAPUL é a de descontar as compras dos assentados no ato do pagamento mensal do leite, ou seja, as compras de supermercado, vacinas ou ração para o gado são feitas na própria CAPUL para que sejam descontadas posteriormente, quando do pagamento do leite. Pela opção de comprar "fiado", todos os assentados que entregam leite acabam por submeter-se à compra de produtos apenas no supermercado ou loja veterinária da cooperativa (p. 51-52).”
“Pela localização em meio ao cerrado, os quatro assentamentos possuem muitas árvores nativas de frutos como o Pequi, a mangaba, o
baru, a cagaita, o araticum, o jenipapo, o buriti, o cajuzinho do cerrado, dentre outros. Nos quintais, vimos ainda alguns pés de manga, acerola,
goiaba e coco (p. 52).”
A estrutura e o acabamento das casas varia bastante. Conhecemos desde pequenas casas com telhado de amianto, sem reboco ou revestimento, até outras ampliadas, com varandas, pintura e banheiros modernos. Todas elas possuem água (tanto por meio de poços artesianos, uso de rios e nascentes ou mesmo de cisternas) e energia elétrica (p. 52).”
“A maioria das famílias que conhecemos produz algum tipo de alimento como: milho, mandioca, abóbora, feijão catador ou melancia. Algumas famílias cultivam apenas hortaliças, outras famílias plantam apenas cana para alimentar o gado (p. 53).”
“Vilma, professora e assentada no P.A Chico Mendes, narra assim a história: “Tudo teve início na cidade de Buritis, no mês de dezembro de 1999. Quando foram organizadas as manifestações pelo sindicato dos trabalhadores rurais de Buritis e juntamente com o movimento dos trabalhadores rurais (MST). (...) No dia 15/12 desse mesmo ano às 7:00 horas da manhã, partiram em direção a fazenda Campolino15, em ônibus, caminhões e vários carros pequenos. Eles traziam consigo alimentos, lona, ferramentas e muita força de vontade, garra determinação e muitos sonhos para com essa terra.(...) No dia 19/12, as margens do Córrego Jabuticaba, no Município de Arinos - MG, foi asteada a bandeira do MST, e aí, nasceu o PA. Chico Mendes; com 73 famílias iniciantes.(...) Com o passar do tempo, a cada dia, a cada luta e conquista, aquele número inicial de famílias foram crescendo cada vez mais, chegando a um total de 300 famílias acampadas (p. 59).”
“Osmar, assentado do PA Carlos Lamarca, ligado ao MST, assim narra a luta pela Educação do/no Campo, no P.A Chico Mendes: “Mas ao certo que na época o governo federal criou aquele programa de nucleação das escolas, então aquela onda de pegar, de trazer as crianças do meio rural pra cidade. E quando a gente pensou aquele complexo de assentamentos, a gente pensou um território, um território onde a gente poderia ... ao invés de trazer as pessoas pra cidade, fazer com que elas permanecesse na terra, e a educação, ela é um ponto chave, a educação
do campo, ela tem suas particularidades que na cidade não vai ter, (...) a gente então, sempre sonhou em ter a educação do campo no campo, e
por isso que nós então começamos com essa reivindicação de ter a escola, uma escola polo ali, a qual juntaria todas as famílias tanto do Chico
Mendes, como do PA Roça, da Colônia dos Ciganos, Carro Quebrado e Carlos Lamarca, vinculado também a um projeto produtivo. Então a nossa ideia sempre foi essa, de a gente pensar de como a gente organiza produção a partir do território (p. 63).”
“Um assentado ligado ao MST, o senhor Moisés, nos conta que houve uma grande assembleia para definir os termos da ação de reivindicação: “(...)ouviu mais ou menos as decisões que seria ocupar um espaço público pra forçar os governos. Mas como ocupou a câmara e não deu nenhuma
repercussão, resolvemos ocupar, falo resolvemos porque eu também participei da assembleia de decisão, resolvemos, foi decidido em assembleia que iríamos ocupar a maior escola, na época tida como a escola das elites no centro da cidade, escola Major Saint’ Clair, na época. Aí, ocupamos essa escola e por lá ficamos por quase uma semana, durante essa semana, é... houve grande conflito, grande pressão por parte da administração da época, por parte das lideranças retrógradas do município, então, eles pagaram, incentivaram pra apedrejar o pessoal dentro da escola. (Sr. Moisés, assentado do PA Mimoso) (p. 64).”
“Um assentado ligado ao MST, o senhor Moisés, nos conta que houve uma grande assembleia para definir os termos da ação de reivindicação: “(...)ouviu mais ou menos as decisões que seria ocupar um espaço público pra forçar os governos. Mas como ocupou a câmara e não deu nenhuma
repercussão, resolvemos ocupar, falo resolvemos porque eu também participei da assembleia de decisão, resolvemos, foi decidido em assembleia que iríamos ocupar a maior escola, na época tida como a escola das elites no centro da cidade, escola Major Saint’ Clair, na época. Aí, ocupamos essa escola e por lá ficamos por quase uma semana, durante essa semana, é... houve grande conflito, grande pressão por parte da administração da época, por parte das lideranças retrógradas do município, então, eles pagaram, incentivaram pra apedrejar o pessoal dentro da escola. (Sr. Moisés, assentado do PA Mimoso).”
“A professora Tonica associa a reação da população ao estigma que os assentados sofriam na época junto aos moradores de Arinos: Aí, como tudo o que o movimento conquistava era por meio de lutas, eles vieram prá cá pra Arinos, pr'uma movimentação... e foram pra frente da prefeitura, e na época eles foram atacados com pedras pela própria população da cidade de Arinos porque sem-terra não era bem visto aqui em Arinos. Na verdade, foi de muito pouco tempo prá cá que a gente conseguiu um certo respeito, mas a gente não era bem visto aqui. Eles foram atacados com pedra, na época eles dizem que foi... próprias pessoas da administração que articularam pessoas da comunidade pra atacar. Atacou com pedras, depois, quando eles foram atacados com pedras na prefeitura, eles recuaram pra dentro da escola Major Saint Clair. E lá dentro dessa escola Major Saint Clair, teve até uma mãe [grávida] que perdeu o filho dela, jogaram bomba, como se fosse uma guerra mesmo, e lá dentro tinha criança, tinha mulheres, e aí eles jogaram bombas, pedra, a população. E
a gente, na verdade, não sabe quem foi. (...) E aí teve perca de bebê nessa luta pela escola. Mas, moral da história, teve tudo isso, a mãe perdeu o filho, mas conseguiu o direito da escola. (Tonica, assentada do PA Chico Mendes, professora no acampamento e no assentamento) (p. 64-65).”
“Sr. Zacarias, assentado do PA Chico Mendes: “Foi uma luta muito assim dolorosa, mas conseguimo, né. A minha esposa mesmo, na época
pra conseguir esse colégio, ela tava grávida recente do primeiro filho, na luta lá no outro colégio lá na cidade de Arinos, ela ganhou uma tijolada nas costas e perdeu o primeiro filho. Mas é a tal coisa, faz parte da vida também, o que a gente queria, a gente conseguimo, graças a Deus, tá lá, é o sonho. (...)A gente sempre fala (...) que essa escola nossa sempre é deferenciada das outras, através desse motivo (p. 65-66).”
A fala de um ex militante do MST mostra como a percepção dos moradores da cidade com relação aos assentados era no sentido de tomá-los como invasores: “A Major Saint' Clair foi ocupado lá. Aí naquela época os pessoal de Arinos também não era apoiador. Hoje sim, hoje eles apoiam porque o pessoal que trabalha ali, a maioria é de Arinos, na escola. Mas, então, naquela época, o pessoal de Arinos também era contra a gente... Igual eu te disse, os fazendeiros na época, Arinos antigamente era uma cidade comandada por fazendeiros, né? Então o que os fazendeiros queriam era o que a população toda queria. Então o fazendeiro foi contra o assentado, então o pessoal, a cidade parece que toda se revoltava. Então foi espedrejado lá. Nós teve companheiro que ganhou pedrada que quase quebrou a cara, quase ficou cego, da população. A mulher perdeu o nenê lá nessa ocupação da escola. A gente fez isso pra gente conseguir ela (a escola) aí. (Sr. Tião, assentado do PA Chico Mendes, ex-militante do MST) (p. 66).”
“O saldo dessa ação foi a autorização do funcionamento de uma extensão da Escola Estadual Major Saint' Clair no assentamento Chico Mendes com as séries finais do Ensino Fundamental, já que as séries iniciais estavam sob a responsabilidade do município (p. 68).”
“A escola começou a funcionar no curral da fazenda, que foi adaptado para ser sala de aula. Onde se tirava leite, os adolescentes passaram a estudar, graças à luta coletiva liderada pelo MST no município de Arinos, MG. Daí em diante, os assentados envolveram-se em outra luta, esta para a construção do prédio da escola. Foram várias negociações entre o INCRA, que precisaria demarcar um terreno, a Secretaria de Estado da
Educação de Minas Gerais e os assentados. Somente em 2010, o decreto
45519 autorizaria o funcionamento da Escola Estadual Chico Mendes nas novas instalações. Em 2012, o Decreto Lei 20534/2012 criou oficialmente a escola (p. 72).”

Obs.: Fico por aqui para que o texto não fique muito grande, mas a segunda metade da dissertação é de ótima qualidade.
Elza Cristiny, ao fazer essa dissertação, você contribuiu muito com a história de luta pela terra e pela educação do/no campo não só no município de Arinos, mas em todo Brasil. Estou escrevendo tese de doutorado em Educação na FAE/UFMG sobre “A luta pela terra em Minas Gerais: pedagogia rumo à emancipação humana?” Obrigado, Elza. Sua dissertação me trouxe ótimas inspirações.

Belo Horizonte, MG, 28/02/2016.
Abraço terno. Frei Gilvander Moreira