domingo, 1 de setembro de 2013

Reportagem do Jornal BRASIL DE FATO MG sobre a Ocupação Rosa Leão, em Belo Horizonte, MG. 28/08/2013.

Reportagem do Jornal BRASIL DE FATO MG sobre a Ocupação Rosa Leão, em Belo Horizonte, MG. 28/08/2013.

Reportagem de Leonardo Dupin.

Milhares de Famílias não tem onde morar.
Na zona norte, 1400 famílias ocupam terreno e constroem comunidade Rosa Leão.

O Brasil Fato começa hoje uma série de reportagens sobre as ocupações urbanas de Belo Horizonte. Nos últimos seis anos pelo menos uma nova ocupação surgiu na cidade por ano. Uma situação que desafia o poder dos ricos e do governo municipal, que criminaliza a luta dos pobres por moradia.
A cada semana será mostrada uma ocupação diferente: Camilo Torres (145 famílias), Dandara (1200 famílias), Rosa Leão (1400 famílias), Vila do Cafezal (90 famílias), Zilah Spósito-Helena Greco (160 famílias), Irmã Dorothy (190 famílias) e Eliana Silva (350 famílias).
A equipe do BF foi conhecer as pessoas que se organizam em ocupações para exigir seus direitos, fugir do aluguel e não morar mais de favor. Ouviu também especialistas em planejamento urbano e militantes que vêm trabalhando com essas ocupações. Eles apontam uma solução para o problema: reforma urbana.

Milhares de famílias não têm onde morar
A falta de moradia é um problema que atinge milhares de famílias no Brasil. Um estudo realizado pela Fundação João Pinheiro, em 2008, revela que o déficit habitacional alcança 6.273 milhões de famílias no país. Em Minas Gerais 474 mil famílias não tem moradia adequada. E na região metropolitana de Belo Horizonte, o estudo fala em 115 mil famílias.  
Porém, os números parecem ser maiores. Na inscrição para o programa Minha Casa, Minha Vida, em 2009, o número de inscritos só em BH chegou a 198.000, indicando que o problema tem se agravado com o alto preço dos imóveis e dos alugueis. Situação que contraria o direito a moradia assegurado pela Constituição.

Viúva com oito filhos e um neto luta por moradia na Ocupação Rosa Leão

“Aqui dormem três: eu, Olavo Júnior e a Diana. Embaixo o Darlan Breno. Do outro lado dormem mais quatro”, conta Neide Borges Pacheco, 44 anos, apontando para dois colchões que divide com oitos filhos e um neto.
Dona Neide, como é conhecida, vive há dois meses em uma barraca de lona amarela, na Ocupação Rosa Leão, no bairro Zilah Spósito, zona norte de BH, próximo a Santa Luzia. A ocupação ganhou destaque nesse período, quando cerca de 1 mil famílias sem-teto, espontaneamente ocuparam o terreno de 350.000 , juntando-se a outras 400 que já viviam no local.

Sem ter onde morar
A história que levou Dona Neide a se juntar à Ocupação Rosa Leão, começou há três anos, com o assassinato do filho de nove anos, em Betim. O marido, deprimido pela perda do filho, morreu em seguida. Sem esposo, tendo que cuidar de oito filhos e mais um neto, Neide não conseguia pagar luz, água e aluguel (que subiu de R$300,00 para R$450,00). Foi despejada.
Ela começou, em seguida, uma peregrinação com a família pelas periferias da região metropolitana Belo Horizonte (Betim, Morro Alto, Vila da Fé, Santa Luzia), nunca tendo dinheiro suficiente para morar e comer. Sem alternativa, ela foi viver na rua com os filhos. Foi então que ela tomou uma decisão: “Eu vou invadir um lugar para morar porque não aguento mais”, lembra. “Quando cheguei aqui (Rosa Leão) as pessoas me apoiaram, trouxeram cestas (alimentos), cobertores e me emprestaram um colchão porque eu não tinha nada”, conta ela.

Um futuro melhor
Na ocupação, as condições são precárias. A água e luz foram improvisadas. Não há banheiros e os moradores utilizam fossas. Porém, há uma perspectiva de futuro melhor, é o que afirma frei Gilvander Moreira, padre carmelita e assessor da Comissão Pastoral da Terra. “Essas ocupações tem um papel importante, além de livrar as pessoas da cruz que é o aluguel. Elas aumentam a autoestima daqueles que, muitas vezes, chegam aqui doentes por não enxergarem um caminho para melhorar de vida”, relata.
Contudo, a situação dos moradores da ocupação continua incerta. Uma parte do terreno onde fica a Ocupação Rosa Leão pertence à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), que pediu reintegração de posse do terreno. O processo corre na justiça, descumprindo um acordo feio com representantes das ocupações urbanas da cidade. Uma reunião acontecerá até o fim da semana e os moradores esperam que o problema seja resolvido. A Companhia Urbanizadora e de Habitação Belo Horizonte (URBEL) não quis comentar o tema.

Carta anônima espalha o preconceito no bairro Zilah Spósito.

No dia 13 de agosto, começou a circular no bairro Zilah Spósito uma carta anônima acusando as lideranças da Ocupação Rosa Leão pelos problemas de assalto que vem acontecendo na região. “Somos contra uma favela dentro do bairro. O bairro terá que pagar os custos sociais, mais vez como sempre foi com as outras favelas, digo, ocupações dentro do bairro”, afirma texto.
Lideranças da ocupação suspeitam que ela tenha sido elaborada pelos moradores de classe média da região, que temem pela desvalorização de suas propriedades.
O conteúdo da carta é contraditório. Em outro trecho ela afirma o importante papel do bairro na luta por moradia, absorvendo mais de 10.000 famílias nos últimos 20 anos. Ela lembra das quatro grandes ocupações que aconteceram ali: “Estrada Velha, Manilha, Mariquinha, Zilah Spósito”.
Os moradores dessas essas ocupações têm demonstrado apoio à Ocupação Rosa Leão, que contam também com o apoio das Brigadas Populares, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), do Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas (MLB) e vários arquitetos (as) da UFMG e da PUC/MINAS, que estão elaborando um plano urbanístico para organizar a comunidade.

Manifestantes ocupam prédio da PBH. Lacerda é obrigado a negociar .

Esperando há anos para serem ouvidos pela Prefeitura, nos dias 29 e 30 de julho, cerca de cem moradores das ocupações urbanas da cidade ocuparam o prédio da PBH. Eles ficaram por horas isolados, sem água e alimentos. Uma manifestante, sem poder ter nos braços a filha de oito meses, que estava do lado de fora do prédio, amamentou a criança pelas grades do portão. O caso repercutiu no país e o prefeito Márcio Lacerda cedeu à pressão e teve que negociar.
Três pontos foram acordados: Foi formada uma comissão para elaborar propostas para cada uma das ocupações de BH. Fazem parte dessa comissão moradores das áreas, integrantes de movimentos sociais, representantes da PBH e órgãos dos direitos humanos da Defensoria Pública e do Ministério Público de Minas Gerais; Os locais ocupados serão decretados como Áreas de Especial Interesse Social, o que facilita a legalização de posse para os novos moradores. No caso de áreas públicas, isso será feito por decreto e, no caso de terrenos particulares, o caminho será a apresentação de projeto de lei à Câmara de Vereadores; Imediata suspensão dos processos de reintegração de posse contra as ocupações em que a PBH é proprietária do terreno, até que a comissão apresente os resultados.

Moradores da Ocupação Rosa Leão e PBH fecham acordo para a preservação de área ambiental.

No início do mês, a PBH solicitou a coordenação da ocupação que algumas famílias sem-teto desocupassem a área ambiental, que fica ao lado do terreno ocupado, ao lado da Av. Atanásio Jardim. O pedido foi aceito e estas famílias foram realocadas em lotes fora da área de preservação ambiental. Na ocasião, foi acertado um esforço conjunto para preservar as áreas de proteção ambiental.
Ademir da Silva Monteiro, 38 anos, é morador antigo da área. Vivendo na região há 31 anos, ele afirma a vegetação estava degradada quando eles entraram no terreno: “Isso aqui nunca foi habitado, era área de pasto grosso, é utilizado por motoqueiros realizarem trilhas no local”, relata.

Grafiteiros fazem arte na ocupação.

Wendell Opdr e Marcos Lago vêm trabalhando na organização das famílias no terreno. Eles são pintores e fazem grafites em paredes do acampamento. A imagem de uma leoa e rosas foi pintada, junto à frase: “Quando morar for um privilégio, ocupar é um direito”. “Pintei a fachada de um salão de beleza e a tinta que sobrou guardei para grafitar aqui no acampamento”, conta Opdr. Os dois esperam pela a construção de um centro cultural no local para começar a realizar oficinas de grafite com jovens e adultos da região.


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