Reportagem de Maíra Gomes, do Brasil de Fato MG, 27/09/2013.
Na divisa entre Belo Horizonte e Santa Luzia vivem mais de 1050 famílias em situação irregular. Elas moram na Ocupação Esperança, nome que marca a luta por melhores condições de vida, sem o sacrifício do aluguel. Na madrugada do dia 04 de julho, cerca de 30 famílias entraram no terreno, na Granja dos Werneck. Na semana seguinte já eram mais de 50. Atualmente, três meses depois, o número multiplicou. “Teve uma reunião, com umas 20 pessoas, e começamos a ocupar. Quando era meia noite, ainda tinha gente marcando seu lote. Mas foi no dia seguinte que começou o forte mesmo, todo mundo ficou sabendo, né? E foi chegando mais gente, ainda teve uma desocupação ali em cima, em Santa Luzia, no bairro Duquesa. Quando vai ver, nós estamos com mais de mil famílias”, conta Leandro Gonçalves Dias, 26, morador da ocupação e um dos coordenadores.
Alguns dias depois, os novos moradores começaram a se organizar, promovendo reuniões duas vezes por semana, onde elegeram 20 coordenadores. Agnaldo Liberato de Jesus, conhecido como Pajé, é um deles. Ele não está morando na ocupação, mas mora no bairro Londrina, vizinho luziense da ocupação. Há 15 anos, Pajé faz um trabalho social através da ONG Soldados da Fé, do qual ficou conhecido e foi convidado pelos moradores da ocupação. “Eu fiquei feliz em poder ajudar. Tem muita gente aqui que precisa mesmo, não tem pra onde ir”, declara. Pajé acredita que uma das principais razões para a extrema falta de moradia na Região Metropolitana é a chegada da Copa do Mundo, em 2014. “Com essas obras, os prefeitos estão empurrando as pessoas pra fora da cidade. Muitas casas foram desapropriadas, e o prefeito tira dali sem se importar para onde vão aquelas pessoas”, denuncia.
As famílias vivem no local ainda em casa de lona, mas muitos já construíram seus fogões à lenha e trouxeram suas camas. O dia-a-dia do terreno é quase como a vida em uma área rural. Local tranqüilo, silencioso, próximo à mata, com cheiro de madeira queimando para o preparo do almoço. O casal Ruth Marcelino Brum, 44, e Reginaldo de Faria, 33, estão no local desde o segundo dia. Sua casa, de madeirite, tem varanda e banheiro. Ruth conta que morava na casa dos filhos antes de ir para a ocupação. “Eu mesma não tinha nada, estou buscando meu cantinho aqui. E está delicioso, é bem tranqüilo. Fiz uma hortinha, e já plantei abacaxi. Tudo limpinho e arrumadinho”, orgulha-se.
Outro casal que começa sua vida na Ocupação Esperança é Elenilda Lima Moreira, 42, e Renan Ângelo Moreira, 33. Ele, pedreiro, e ela dona de casa, moravam na cidade de Caratinga, interior do estado e vieram para Belo Horizonte buscar uma vida melhor. “Trabalhava, e no final do mês não tinha dinheiro nem pra comprar um chinelo. Eu fiquei sabendo que com esses negócios de Copa estavam pegando muito pedreiro, e a mãe dela está aqui. Uma coisa foi juntando na outra e viemos pra cá, com o objetivo não só de sonhar, mas sonhar e obter” conta Renan.
Seu cantinho também já está arrumado, montado em lona, mas Elenilda conta que está preocupada com o período de chuvas. “Agora vem o período das águas, e como que eu vou viver em uma barraca dessa em uma tempestade, que é como chove aqui em BH. Tendo uma segurança sobre a posse do terreno, posso construir uma casinha e saber que não vai chover dentro de casa, ter uma condição de vida melhor”, afirma Elenilda.
Especulação imobiliária devora mata.
Um dos últimos locais de área verde em Belo Horizonte, o terreno ocupado tem sido alvo de polêmicas e denúncias de irregularidades fundiárias e crimes ambientais, envolvendo o nome do prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda (PSB), e os proprietários do local.
A área pertence à empresa Granja Werneck S.A., mas a titularidade é questionada na justiça. Na década de 1910, uma parte da área foi doada a um médico da família dos Werneck para a construção de um sanatório, mas apenas 200 mil m² foram usados, de um total de 10 milhões. O restante foi irregularmente repassado através de herança.
Atualmente, um empreendimento imobiliário de grande porte será erguido no local, para abrigar 300 mil novos habitantes, o equivalente à população de Governador Valadares, no Vale do Rio Doce. No entanto, 90% dos apartamentos devem ser destinados a famílias ricas, sobrando pouco aos mais necessitados, como os moradores da Ocupação Esperança. Como o local é uma reserva ambiental, o prefeito de BH, Márcio Lacerda, criou a Operação Urbana do Isidoro, para aprovar na Câmara diversas liberações ambientais que por lei não seriam permitidas.
O coordenador da Ocupação, Pajé, afirma que o presidente da empresa Fernando Werneck entrou com pedido de reintegração de posse, mas este foi suspendido devido às suspeitas de irregularidade na posse do terreno.
Belo Horizonte, MG, Brasil, 28/09/2013.Cf. também www.ocupacaoesperanca.blogspot.com.br
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