terça-feira, 27 de julho de 2021

Em Gálatas, Opção pelos Pobres e “Escravidão, Não!” Por Frei Gilvander

  Em Gálatas, Opção pelos Pobres e “Escravidão, Não!” Por Frei Gilvander Moreira[1]



Na Carta aos Gálatas, livro do jubileu de ouro do mês da Bíblia – setembro - em 2021, o apóstolo Paulo busca manter a unidade entre as primeiras comunidades cristãs em uma imensa diversidade, mas assevera que a Opção pelos Pobres é inegociável. “Não esqueçam os pobres!” (Gl 2,10), Paulo chega a colocar na boca dos chefes da igreja de Jerusalém. Esses “pobres” eram concretamente os “irmãos” da Judeia que viviam em uma pobreza extrema, reinava a fome. Na comunidade cristã de Jerusalém, quando a distribuição se tornou maior do que a entrada ou a produção de recursos, chegou uma hora em que os bens acabaram e a fome se generalizou. Sem produção suficiente, não se pode consumir e/ou distribuir. Em contexto de aumento da pobreza e de muita gente passando fome, sob a liderança do apóstolo Paulo e Barnabé, o espírito de comunidade nascido da fé em/de Jesus Cristo levou comunidades cristãs de outras regiões a fazerem doações para minorar a fome dos irmãos e irmãs. Isto era também uma expressão de unidade. O fato de pensar diferente não era motivo para ‘lavar as mãos’ como Pilatos diante do sofrimento de outras pessoas e comunidades.

Segundo a lei judaica, interpretada de forma rígida, um judeu não podia se sentar à mesa com um gentio. Então seriam duas Igrejas, a dos judeus e a dos gentios, sem a partilha ritual da Ceia do Senhor, mas com a partilha efetiva dos “irmãos” gentios para com os “irmãos” da Judeia. É Paulo defendendo fraternidade real e concreta com todos os empobrecidos, independentemente das opções religiosas ou ideológicas. Mais adiante, ao longo da sua argumentação buscando sempre afirmar a liberdade diante de tudo o que escraviza, o apóstolo Paulo afirma de forma lapidar: “Não há mais diferença entre judeu e grego, entre escravo e homem livre, entre homem e mulher, pois todos vocês são um só em Jesus Cristo” (Gl 3,28).

Na Carta aos Gálatas transparece de forma muito forte Paulo rechaçando a realidade de escravidão, tanto das relações sociais escravocratas do império romano quanto da escravidão que tinha se tornado a Lei judaica sendo imposta inclusive sobre os não-judeus. Paulo repete várias vezes as palavras ‘escravo’, “escrava’ e ‘escravidão’ ao longo da Carta aos Gálatas para enfatizar que: a) está abolida a diferença entre escravo e livre (Gl 3,28); b) quem está agarrado à Lei judaica continua escravizado; c) “éramos escravos” (Gl 4,1.3); d) “você já não é escravo, mas filho” (Gl 4,7); e) “vocês foram escravos de deuses” (Gl 4,8); f) “vocês querem recair na escravidão?” (Gl 4,9); g) na história houve “filhos da escrava Agar gerados para a escravidão” (Gl 4,22.23.24.25); h) “Cristo nos libertou para que sejamos verdadeiramente livres. Portanto, fiquem firmes e não se submetam de novo ao jugo da escravidão!” (Gl 5,1).

Paulo revela que o egoísmo e o individualismo estimulados pela ideologia dominante de uma sociedade escravocrata é estupidez e um corredor de morte para todos/as, pois leva “todos a se morderem e a se devorarem uns aos outros e até a destruição mútua” (Gl 5,15). Como intelectual de alto quilate Paulo não fazia uma análise ingênua, nem idealista, nem romântica da realidade conflituosa na qual os cristãos e as cristãs das comunidades da Galácia viviam. Certamente, Paulo percebia também que não apenas com solidariedade e cuidado dos pobres se superaria as relações sociais escravocratas estimuladas aos quatro ventos pela ideologia dominante do império romano e também por expressões religiosas e culturais que pavimentavam o caminho para a reprodução cotidiana das desigualdades sociais. Além de cuidar dos pobres sendo solidário/a, é preciso enfrentar os lobos vorazes e cruéis, muitas vezes, travestidos de bons samaritanos, seja no mundo da política, da economia ou da religião.

Em Gálatas, Paulo afirma à exaustão que todas as pessoas são livres e devem se comportar como pessoas libertadas e jamais recair nas garras de nenhum tipo de escravização. Paulo terminou sendo martirizado, porque quanto mais radicalizava sua missão mais revelava a incompatibilidade entre o projeto defendido por ele a partir da fé em Jesus Cristo e o projeto imperial ecoado pelos arautos da ideologia imperial. Ontem, o império romano e as religiões domesticadas e domesticantes que serviam aos interesses da classe dos de cima. Atualmente, o sistema capitalista, que, de mil formas, empobrece, violenta e mata o povo, a mãe terra, as fontes de água e todos os ecossistemas. O apóstolo Paulo, nos dias de hoje, no nosso meio, certamente diria que enquanto perdurar a estrutura fundiária pautada no latifúndio e no agronegócio com política econômica capitalista neocolonial, com Estado subserviente aos interesses das grandes mineradoras e do grande empresariado do campo e da cidade, não teremos a superação da pobreza, da fome, da miséria e de tantas escravizações que se reproduzem cotidianamente e explodem em cenas dramáticas, por meio do feminicídio, do racismo estrutural, da homofobia, de expressões religiosas burguesas que desencarnam a fé cristã, espiritualizam a mordência histórica de Deus que, por amor infinito, assumiu a condição humana em Jesus Cristo. Portanto, acolher a mensagem do apóstolo Paulo na Carta aos Gálatas, atualmente, implica em se comprometer com os/as injustiçados/as em todas suas lutas libertárias justas e necessárias.

Paulo não quer somente fraternidade "espiritual" ou de amizade, mas exige principalmente fraternidade econômica[2], política e cultural. Não agrada ao Espírito de Deus pessoas que se encontram para a eucaristia ou cultos aos domingos, mas que durante a semana são umas opressoras das outras. Paulo quer superar as oposições de classes. Se ricos e pobres, judeus e não-judeus, homens e mulheres, trabalhadores e patrões e... comem em lugares diferentes, moram em casas de qualidades muito diferentes, o cristianismo terá um conteúdo diferente para cada grupo e não haverá realmente uma comunhão. É hipócrita e cínica uma comunidade e sociedade na qual uns poucos se banqueteiam, enquanto a maioria passa fome; na qual uns têm casas próprias luxuosas e a maioria geme debaixo da pesadíssima cruz de aluguéis  ou da humilhação que é sobreviver morando de favor na casa de parentes ou ainda sob o frio e os riscos da rua; na qual uns recebem remunerações milionárias, enquanto milhões sobrevivem só com salário mínimo ou com migalhas do trabalho informal. É escravocrata uma sociedade na qual uns vivem luxuosamente, enquanto milhares sobrevivem do/no lixo; na qual uns detêm o muito poder econômico, político, midiático e religioso e as massas são subjugadas. Igrejas que se apegam e casam com o poder opressor trocaram o Evangelho de Jesus Cristo por uma aliança com a mentira, coisa diabólica.

Em Gálatas, Paulo defende uma comunhão eclesial que seja antes de tudo comunhão integral, fruto de condições materiais que garantam os corpos estarem lado a lado, com respeito à dignidade de todos/as, e comendo da mesma comida, partilhando alegrias e angústias. Paulo nos faz recordar o padre Alfredinho[3], da Fraternidade do Servo Sofredor, que gostava de dizer: “Os ricos se salvarão quando aprenderem a passar fome”.

Ontem, Gálatas; hoje, nós. “E agora, José?” Paulo, em Gálatas, aponta que quem deseja seguir a Jesus deve armar-se de disponibilidade para a cruz, ou seja, tornar próprias as disposições daquele que o precede, identificando seu projeto com o do Mestre. Jesus não temeu ser considerado um fora-da-lei pela sociedade estabelecida. E seus seguidores: o que mais temem? Paulo nos convida a ver na cruz injusta de cada um/a de nossos irmãos e irmãs, próximo ou distante, um crime hediondo contra a humanidade e contra Deus.

Enfim, terminamos este texto no qual buscamos pescar raios de luz e força para a caminhada cristã pessoal e comunitária, apontando se não o maior, um dos maiores perigos da atualidade: "Penso que o maior perigo para a Pedagogia de hoje está na arrogância dos que sabem, na soberba dos proprietários de certezas, na boa consciência dos moralistas de toda espécie, na tranquilidade dos que já sabem o que dizer aí ou o que se deve fazer e na segurança dos especialistas em respostas e soluções. Penso, também, que agora o urgente é recolocar as perguntas, reencontrar as dúvidas e mobilizar as inquietudes."[4] Inspirados/as por Paulo, em Gálatas, sigamos com Opção pelos Pobres, batalhando pela superação das relações sociais escravocratas que perduram na sociedade atual.

Bibliografia

LARROSA, Jorge. Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. 

27/07/2021

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 1

2 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 2

3 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 3

4 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 4

5 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 5

6 - Senhora de Guadalupe, rogai por nós! Reflexão. Gálatas 4,4-7 e Lucas 1,39-47. Manoel Godoy –12/12/20

7 - Live de lançamento do livro: “Carta aos Gálatas: até que Cristo se forme em nós” (Gl 4,19).

8 - Canto da Carta aos Gálatas (Paródia) - Mês da Bíblia/2021 (setembro) - CEBI-MG - 11/7/2021

9 - O texto-base do Mês da Bíblia 2021



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Dom Moacyr Grechi, ao investigar denúncias de torturas de trabalhadores rurais bóias-frias, disse: "Quero uma reunião somente com os trabalhadores, pois junto com os patrões eles não estarão livres para dizer a verdade."

[3] Fredy Kunz, o inesquecível padre Alfredinho. Sua trajetória espiritual entre os excluídos está narrada em seus livros, muitos traduzidos no exterior: A sombra do Nabucodonosor, A Ovelha de Urias, A Burrinha de Balaão, A Espada de Gedeão e O Cobrador.

[4] LARROSA, Jorge. Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. Belo Horizonte: Autêntica, 2004, p. 8.

terça-feira, 20 de julho de 2021

Pedro e Paulo, apóstolos dos gentios? E nós? Por Frei Gilvander

 Pedro e Paulo, apóstolos dos gentios? E nós? Por Frei Gilvander Moreira[1]


Celebraremos os 50 anos do mês da Bíblia, em setembro de 2021, refletindo sobre e a partir da Carta do apóstolo Paulo aos Gálatas, escrita em meados da década de 50 do 1º século da era cristã. Paulo e Pedro aparentam ser bem diferentes conforme o narrado no livro de Atos dos Apóstolos e nas Cartas Paulinas. Por que e para que os apóstolos Pedro e Paulo parecem ser diferentes segundo Atos dos Apóstolos e as Cartas Paulinas? Escrevendo uns 30 anos após a Carta aos Gálatas, o autor de Atos dos Apóstolos, na década de 80 do Século I, sob o impacto dramático dos cristãos e cristãs sendo expulsos/as das sinagogas, busca promover unidade entre cristãos e judeus e, acima de tudo, busca justificar que os cristãos não eram sectários e nem separatistas. Enfatizar as diferenças seria alimentar quem defendia rupturas internas nas primeiras comunidades cristãs. Cultivar a unidade em uma imensa diversidade era imprescindível, pois a divisão interna enfraqueceria as comunidades. Nesta toada, em Atos dos Apóstolos, Pedro é paulinizado e Paulo é petrinizado, ou seja, o autor de Atos dos Apóstolos credita a Pedro Atos que historicamente devem ter acontecido primeiro na atuação missionária de Paulo, como os Atos de Pedro narrados no capítulo 10 de Atos dos Apóstolos: Pedro sai de Jerusalém, a igreja mãe, vai para o meio dos impuros gentios, na casa (oikia, em grego) de outro Simão, um curtidor de couro, Simão se torna Pedro, ao fazer a experiência de Deus na vida concreta dos empobrecidos, segundo a qual Deus não discrimina ninguém. Pedro defende as propostas de Paulo no Concílio de Jerusalém (Cf. At 15,7-12) e advoga, em consonância com os apóstolos Paulo e Barnabé, a superação da circuncisão, a maior barreira e fardo pesadíssimo que os “falsos irmãos” insistiam em impor também sobre as comunidades da Galácia, de Antioquia etc.. O autor de Atos dos Apóstolos mostra o apóstolo Pedro como um grande missionário “percorrendo todos os lugares” (At 9,32) – Lida, Jope, Cesareia etc. – e chega a caracterizar Pedro como “apóstolos dos gentios” (At 15,7). Porém, historicamente, bem antes de Pedro, Paulo deve ter sido o “apóstolo dos gentios” (Gl 1,16), dos de fora, dos considerados bárbaros e impuros.

Para superarmos contradições aparentes existentes entre Atos dos Apóstolos e as Cartas Paulinas é sensato seguir o princípio segundo o qual as Cartas Paulinas têm mais consistência histórica do que Atos dos Apóstolos, pois foram escritas uns 30 anos antes de Atos e também por serem cartas. Atos dos Apóstolos é acima de tudo Teologia da História e jamais história das primeiras comunidades cristãs. Podemos atribuir algum valor histórico a informações que estão em Atos dos Apóstolos apenas em casos sobre os quais não há nenhuma informação em nenhuma carta paulina. Assim, por exemplo, as restrições apresentadas em Atos dos Apóstolos, após a abolição da circuncisão, não devem ter sido dos anos 49/50 do século I quando deve ter acontecida uma reunião entre os apóstolos Paulo, Barnabé, Pedro, Tiago e João, em Jerusalém, segundo Gálatas 2,1-10, reunião que o autor de Atos dos Apóstolos, 30 anos depois, narra como tendo sido uma Assembleia ampliada. Segundo o autor de Atos dos Apóstolos, nesta Assembleia ampliada a circuncisão foi abolida, com algumas condições: “abster-se de carnes sacrificadas aos ídolos, do sangue, das carnes sufocadas e das uniões ilegítimas” (At 15,29). Estas restrições devem ser dos anos 80 e impostas por Tiago, o irmão de Jesus e líder da Igreja mãe, em Jerusalém, na época. Sobre a Assembleia acontecida em Jerusalém, em Gálatas, Paulo, faz questão de enfatizar que Pedro, João e Tiago “pediram apenas que nos lembrássemos dos pobres, e isso eu tenho procurado fazer com muito cuidado” (Gl 2,10). “Lembrar dos pobres” é fazer Opção pelos Pobres, é conviver com os injustiçados/as, ouvir atentamente seus clamores, abraçar suas causas e COM os pobres se comprometer em lutas pelos seus direitos. Não basta ajudar os pobres, trabalhar para eles ou por eles. Os pobres devem ser reconhecidos como sujeitos e protagonistas de suas lutas. Nas lutas libertárias dos pobres, às vezes, é preciso estarmos à frente apontando o rumo da caminhada, mas, muitas vezes, é preciso estarmos no meio dos pobres sentindo o cheiro do povo, compreendendo suas dores e seus saberes e, outras vezes, é preciso andarmos atrás dos pobres na luta pelos seus direitos, amparando os mais enfraquecidos, os que vão mais devagar.

Não se sustenta a interpretação bíblica com ranço dualista, segundo a qual Lucas, em Atos dos Apóstolos, faz uma Teologia da Glória e Paulo, em suas cartas, faz Teologia da Cruz, abrindo brecha para se concluir que Lucas negava o Cristo crucificado e Paulo negava o Cristo ressuscitado. Em um olhar mais atento, observamos que Lucas, em Atos dos Apóstolos, não nega a cruz: “depois da sua paixão” (At 1,3), enfatiza o sofrimento de Jesus e as aparições de modo convincente (Lc 24,38-43). No Evangelho de Lucas, o Cristo ressuscitado não aparece vindo da Glória, mas de baixo para cima: Porventura não convinha que o Cristo padecesse estas coisas e entrasse na sua glória?” (Lc 24,26). Logo, dizer que em Atos dos Apóstolos está uma Teologia da Glória em contraposição a uma Teologia da Cruz (das cartas paulinas) não condiz com a teologia lucana. Atos dos Apóstolos afirma uma Teologia da Glória, do Jesus Cristo ressuscitado, tendo como base a Teologia da Cruz. Lucas não nega a cruz e enfatiza que a ressurreição brota a partir do assumir radicalmente o projeto de Deus, o que implica passar pelo martírio sofrido por Jesus Cristo e por muitos/as outros/as discípulos/as de Deus e de Cristo. Por outro lado, não condiz com a Teologia Paulina dizer que Paulo faz uma Teologia da Cruz ignorando uma Teologia da Glória. Paulo enfatiza o cristo crucificado, mas em momento algum nega a fé em Jesus Cristo ressuscitado. A diferença é só de ênfase requerida pelos contextos diferentes em que atuavam o apóstolo Paulo e, uns 30 anos depois, o autor de Atos dos Apóstolos. E, recordemos, os dois – Pedro e Paulo – se assemelharam tanto a Jesus Cristo que, como ele, terminaram martirizados, segundo a tradição da igreja. Agora a missão está em nossas mãos. Que honremos o legado espiritual, ético e profético de Pedro e Paulo, duas colunas mestras das comunidades cristãs.

20/07/2021

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 1

2 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 3

3 - Senhora de Guadalupe, rogai por nós! Reflexão. Gálatas 4,4-7 e Lucas 1,39-47. Manoel Godoy –12/12/20

4 - Live de lançamento do livro: “Carta aos Gálatas: até que Cristo se forme em nós” (Gl 4,19).

5 - Canto da Carta aos Gálatas (Paródia) - Mês da Bíblia/2021 (setembro) - CEBI-MG - 11/7/2021



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

terça-feira, 6 de julho de 2021

Vem aí o mês da Bíblia, em 2021, com a Carta aos Gálatas. Por Frei Gilvander

 Vem aí o mês da Bíblia, em 2021, com a Carta aos Gálatas. Por Frei Gilvander Moreira[1]


Vem aí o mês da Bíblia: setembro. Por que e para quê? Porque dia 30 de setembro é dia de Jerônimo (342-420), o tradutor da Bíblia para o latim, a Vulgata. Um dos pilares da patrística, Jerônimo colocou a Bíblia na linguagem do povo, o latim. E também porque, com a Opção pelos Pobres e a Dei Verbum, um dos ótimos Documentos do Concílio Vaticano II, a leitura da Bíblia a partir dos pobres, de forma comunitária, militante, (macro)ecumênica e transformadora, foi incentivada e vem sendo feita há cinquenta anos. Inicialmente com Dia da Bíblia e sucessivamente, Tríduo Bíblico, Semana Bíblica e, assim, pouco a pouco, setembro se tornou o Mês da Bíblia.  Em 2021, a Carta do apóstolo Paulo aos Gálatas foi o livro bíblico escolhido para iluminar nossa caminhada no mês da Bíblia. 

"Não esqueçam os pobres!" (Gl 2,10) e “sejam livres!” (Gl 5,13), eis duas colunas mestras imprescindíveis na Carta do apóstolo Paulo aos cristãos e cristãs da região da Galácia: Gálatas. A utopia é construir uma sociedade de pessoas livres e libertadas e a condição é cuidar bem dos pobres e defendê-los de toda e qualquer relação social que cause empobrecimento.

Assim como Jesus não nasceu Cristo, mas tornou-se Cristo, o apóstolo Paulo não nasceu discípulo de Jesus Cristo e do seu Evangelho. Aliás, Paulo nasceu Saulo, se tornou perseguidor de cristãos antes de se converter ao Evangelho de Jesus Cristo e se tornar um dos melhores e maiores apóstolos no meio das primeiras comunidades cristãs. Após estudar muito e se tornar um intelectual orgânico na convivência com o povo escravizado, fora da Palestina, Paulo passou por um profundo processo de adesão ao Evangelho de Jesus Cristo, que durou muito tempo, enfrentou ‘noites escuras’ e desertos - “foi para a Arábia” (Gl 1,17) -, muita incompreensão, perseguição e, por fim, foi martirizado – segundo a Tradição da Igreja -, identificando-se radicalmente com Jesus Cristo – “não sou eu que vivo, mas Cristo que vive em mim” (Gl 2,20) -, condenado à pena de morte pelos podres poderes da religião institucional, da política imperial e de um modelo econômico escravocrata. Ao longo da vida, Paulo se transfigura de judeu perseguidor contumaz das comunidades cristãs a apaixonado missionário de Jesus Cristo e do seu Evangelho. Paulo se descobriu chamado por Deus, “nosso Pai”, desde o ventre materno (Gl 1,15), assim como o profeta Jeremias e outros profetas e profetisas. Ele descobriu a vocação de ser ‘apóstolos dos gentios’, considerados pagãos (Gl 1,16). Paulo aprendeu a amar radicalmente as pessoas das comunidades fundadas ou animadas por ele como a mãe que, por amor, enfrenta as dores de parto, pois sabe que gerará um/a filho/a muito amado/a: “Meus filhos, sofro novamente como dores de parto, até que Cristo esteja formado em vocês” (Gl 4,19).

Inserida no Segundo Testamento após a Carta aos Romanos, a 1ª e 2ª Carta aos Coríntios, a Carta aos Gálatas, com seis capítulos, não é menos importante e nem menos eloquente que nenhuma outra carta paulina. Endereçada não apenas a uma comunidade, mas a várias, Gálatas foi escrita por um Paulo profundamente indignado e irado diante das calúnias e ataques que “intrusos, falsos irmãos” (Gl 2,4) lhe desferiam pelas costas no meio das comunidades da região da Galácia, alegando que ele não era Apóstolo, que inclusive os não-judeus deveriam se circuncidar e cumprir a Lei judaica, como condição para participar das comunidades cristãs. Essas acusações e questionamentos ao seu Evangelho anunciado não afetavam apenas Paulo, mas caso não fossem desmascarados, podiam implodir as comunidades cristãs que se inspiravam no ensinamento e testemunho de Paulo. Em contexto de diversas tendências na evangelização, que vinham desde a briga entre Paulo e Pedro em Antioquia (Gl 2,14) por causa do conflito com “falsos irmãos” (Gl 2,4), Gálata é Carta de resistência e de luta contra os ataques que afetavam as bases da vida em comunidade e da luta pela superação de relações sociais escravocratas e busca conquistar condições objetivas que viabilizem a construção de relações sociais de liberdade, de equidade e de respeito à dignidade da pessoa humana. A Carta aos Gálatas nos convida à superação de uma vida cristã fundamentalista - ritualista, espiritualista, moralista, religião do consolo e da autoajuda – e conclama-nos ao compromisso radical com o Evangelho de Jesus e a causa de todos/as escravizados/as da história, o que exige abraçarmos pelo nosso modo de vida um estilo simples e austero, opção de classe e batalhar ao lado dos/as empobrecidos/as na luta pela conquista de seus direitos: terra, teto, trabalho com salário justo, meio ambiental sustentável e superação de todos os preconceitos e discriminações.

Paulo reivindica sua condição de apóstolo na controvérsia com os "falsos irmãos", ao travar um debate "intracristão". Em Gálatas, Paulo não está defendendo o Evangelho de Jesus Cristo diante de judeus, seguidores do judaísmo, mas está indignado com “falsos irmãos” que se dizem também seguidores de Jesus Cristo. Paulo se sentia Apóstolo autorizado diretamente por Jesus Cristo e por Deus, que ele compreendia como “nosso Pai” (Gl 1,3) e como quem ressuscitou Jesus Cristo (Gl 1,1), que é o “Senhor” de nossas vidas. Afirmar Jesus Cristo como Senhor (Kyrios, em grego) é algo tremendamente subversivo e revolucionário, pois “Senhor’ no Império Romano era o imperador divinizado. Sustentar que ‘senhor de nossas vidas’ é Jesus Cristo, aquele fora da lei, transgressor e subversivo condenado à morte pela pena mais execrável, a crucifixão, era ‘cutucar com vara curta’ o divinizado imperador romano e assumir o risco de sofrer a mesma condenação do galileu Jesus.

Paulo é elo vivo de um movimento comunitário de resistência: “eu e todos os irmãos que estão comigo” (Gl 1,2) são os autores da Carta aos Gálatas. Segundo Paulo, Jesus não quis nos tirar do mundo, mas “do mundo mau” (Gl 1,4), ou seja, de um mundo com relações sociais escravocratas e alienadoras. Paulo abomina a ideia de “vários evangelhos” (Gl 1,6-7), como se fosse possível moldar o Evangelho de Jesus Cristo segundo interesses de classe e domesticá-lo para justificar posturas hipócritas e cúmplices de relações sociais de opressão. As comunidades cristãs não podem se reduzir a um grande guarda-chuva que abriga “gregos e troianos”, opressores e oprimidos, cada um/a com o tipo de religiosidade que lhe agrada. Esse relativismo é fulminado pelo apóstolo Paulo. De forma enfática, ele afirma: ‘Não existe outro Evangelho” (Gl 1,7), além do de Jesus Cristo, revelado a ele nas entranhas das relações humanas conflituosas (Gl 1,12). “Maldito quem anunciar a vocês um evangelho diferente do que anunciamos” (Gl 1,8-9). Paulo faz perguntas inquietantes: “Busco aprovação dos homens ou de Deus? Procuro agradar aos homens?” (Gl 1,10). É claro que aqui Paulo não se refere a todo e qualquer homem, toda e qualquer pessoa humana, mas certamente não busca a aprovação dos homens de poder, dos que sustentam e reproduzem relações sociais escravocratas. Paulo também não aceita adocicar o Evangelho de Jesus Cristo para “agradar aos homens”, seja os que estão no poder, seja o povão alienado e escravizado. Levemos a sério a exortação do apóstolo Paulo aos Gálatas: "Não esqueçam os pobres!" (Gl 2,10) e “sejam livres!” (Gl 5,13).

06/07/2021

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 1

2 - CARTA AOS GÁLATAS - BLOCO 3

3 - Senhora de Guadalupe, rogai por nós! Reflexão. Gálatas 4,4-7 e Lucas 1,39-47. Manoel Godoy –12/12/20

4 - Live de lançamento do livro: “Carta aos Gálatas: até que Cristo se forme em nós” (Gl 4,19).



 

 

 



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

terça-feira, 29 de junho de 2021

Saciar a fome e combater suas causas. Por Frei Gilvander

 Saciar a fome e combater suas causas. Por Frei Gilvander Moreira[1]



Em palavras de fogo, Carolina Maria de Jesus, no livro Quarto de Despejo, de 1960, denuncia a brutal injustiça social. Diz ela: “Hoje não temos nada para comer. Queria convidar os filhos para suicidar-nos. Desisti. Olhei meus filhos e fiquei com dó. Eles estão cheios de vida. Quem vive, precisa comer. Fiquei nervosa, pensando: será que Deus esqueceu-me? Será que ele ficou de mal comigo?”. Após o Brasil ter sido tirado do Mapa da Fome, durante o Governo Lula, agora o Brasil foi empurrado novamente para o Mapa da Fome. O enorme número de pessoas pedindo comida, e pesquisas recentes indicam que a fome voltou de forma brutal no Brasil. Mais de 19 milhões de pessoas estão na extrema pobreza (renda mensal abaixo de R$89,00 per capita) passando fome e 27,7% da população (58 milhões de pessoas) estão com insegurança alimentar, segundo pesquisa de Food for Justice. Cadê o respeito ao direito à alimentação prescrito na Constituição Federal? O número de pessoas em situação de rua cresce cotidianamente beirando a 500 mil. O desemprego bate recorde diariamente. As campanhas para arrecadação de alimentos se multiplicam. Os clamores são ensurdecedores, tais como: “Estou deixando de tomar café da manhã para que minhas irmãzinhas possam comer alguma coisa”. “Vários dias por semana vou tentar achar algo para comer no resto da feira ou dos sacolões”. “Dói demais ver e ouvir uma criança da gente, em prantos, pedindo pão e a gente não ter como alimentar nossos filhos”.

Um poema profetiza: “Quem tem fome, tem pressa. Não pode esperar. Então corre irmão, vamos. Nesse momento tem gente morrendo de fome, no nosso Brasil. A fome é perversa. E quem alimenta esse monstro do mal é a desigualdade social. Tem barriga vazia fazendo chorar ...”[2]. Por amor ao próximo todo povo precisa, urgentemente, se fazer solidário e acudir de forma solidária todos/as que estão passando fome. Campanhas para arrecadação de cestas básicas e todos os gestos de filantropia são necessários com urgência neste momento. Que todos/as doem o máximo possível. Entretanto, faz-se necessário atacar as causas que estão gerando a fome que implode as pessoas por dentro: a estrutura fundiária baseada no latifúndio há 521 anos; o agronegócio que, em latifúndios, com uso indiscriminado de agrotóxico, tecnologia de ponta e muitas vezes submetendo os/as trabalhadores/as a trabalho análogo à situação de escravidão; política econômica neocolonial que concentra cada vez mais riqueza nas mãos da elite; repasse de cerca de 40% do orçamento do país para pagar juros e amortização da dívida pública que já foi paga várias vezes; injustiça tributária (proporcionalmente os pobres pagam muito mais impostos do que os ricos); imposto irrisório sobre herança; falta de taxação justa das fortunas; desmonte do Estado brasileiro com privatizações que são tremendamente danosas ao povo e encarecem o custo de vida; asfixia do SUS e da agricultura familiar; falta de reforma agrária; invasão dos territórios dos Povos e Comunidades Tradicionais; a política genocida do inominável antipresidente que estica e aprofunda a pandemia matando de forma orquestrada mais de 520 mil irmãos e irmãs nossos/as, deixando milhões com sequelas graves e piorando de forma brutal a crise econômica que recai como um fardo insuportável, principalmente nas costas da classe trabalhadora; redução do valor real do salário mínimo e das aposentadorias; salário mínimo de apenas R$1100,00, enquanto o preço da cesta básica está em R$600,00, segundo o DIEESE[3]; Extinção do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), em fevereiro de 2019, por Bolsonaro, entre outros fatores. Tudo isso tece relações sociais que estão fazendo a fome se alastrar de forma vertiginosa, pois aumentam em progressão geométrica a injustiça social e reproduz cotidianamente uma das maiores desigualdades sociais do mundo.

No meio do fogo do latifúndio, o capitalismo - atualmente mundializado e em crise estrutural desde a década de 1970 -, ao avançar sobre os territórios, expropriando os camponeses,  tem transformado o Brasil em imensas pastagens e imensas monoculturas de cana, de eucalipto, de café, de capim etc. Agronegócio não produz alimento; produz, sim, commodities, que são mercadorias primárias para exportação, exportadas com isenção de Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM). Agronegócio produz, sim, desertificação de territórios, violência no campo, desmatamento, envenenamento da terra, dos cursos de água, do ar e epidemia de câncer, alzheimer e várias doenças que se multiplicam no meio do povo pelo exagero de agrotóxicos que aumentam a quantidade do que é produzido, mas com péssima qualidade sanitária. Muitos insistem em manter grande parte do povo brasileiro como rebanho a ser tocado como gado, conforme diz a música Vida de gado, de Zé Ramalho: “Eh, ôô, vida de gado / Povo marcado, ê”.  Ainda em 1989, o sociólogo José de Souza Martins atestava: “Os pobres da terra, durante séculos excluídos, marginalizados e dominados, têm caminhado em silêncio e depressa no chão dessa longa noite de humilhação e proclamam, no gesto da luta, da resistência, da ruptura, da desobediência, sua nova condição, seu caminho sem volta, sua presença maltrapilha, mas digna, na cena da História” (MARTINS, 1989, p. 12-13).

Ano a ano, no planeta Terra, nossa única Casa Comum, o ser humano e toda a biodiversidade estão em perigo crescente de um apocalipse provocado pelo capitalismo com seu atual modo de produção devastador socioambientalmente em progressão geométrica. Em sua etapa monopolista, o capitalismo no campo com seus complexos industriais de produção agropecuária tem colocado questões inéditas e desafiadoras para a luta pela terra, pois “esse processo contínuo de industrialização do campo traz na sua esteira transformações nas relações de produção na agricultura, e, consequentemente, redefine toda a estrutura socioeconômica e política no campo” (OLIVEIRA, 2007, p. 8). O futuro da humanidade e de todas as espécies vivas está ameaçado como nunca esteve. Como uma cruel máquina de destruir vidas humanas e ecológicas, nos 521 anos de colonização do nosso país, contando o período da acumulação primitiva, o capitalismo está se mostrando cada vez mais feroz e destruidor, atualmente em forma de imperialismo global hegemônico capitaneado pelos Estados Unidos e pelas empresas transnacionais.

Convivendo com o povo simples, oprimido e superexplorado, Jesus Cristo alia a solidariedade libertadora à luta pela justiça profunda. Jesus aprendeu, colocou em prática e ensinou a pedagogia da partilha dos pães de forma tão enfática que as primeiras comunidades cristas narraram seis vezes nos quatro evangelhos da Bíblia (Jo 6,1-15; Mt 14,13-21; Mt 15,32-38; Mc 6,32-44; Mc 8,1-10; Lc 9,10-17), pedagogia que envolve uma série de passos articulados e interdependentes: 1º) Jesus “atravessa para a outra margem” (Jo 6,1), ou seja, vai para o meio dos “estranhos”, considerados impuros e hereges. O Galileu se coloca no meio do povo faminto. Ouçamos o povo sofrido com seus clamores!; 2º) Vê a realidade nua e crua a partir dos empobrecidos. Coloquemo-nos no lugar social dos famintos! “Sente aí e escute o povo”, diz Lúcia, defensora dos Direitos Humanos, em reunião com o povo em situação de rua, no Filme Anel de Tucum; 3º) Comove-se com a dor do povo sofrido. Tenhamos empatia!; 4º) Provoca a todos/as para a buscar solução para o grave problema social, fruto de injustiça social: a fome. Vocês é que têm de lhes dar de comer” (Mt 14,16; Mc 6,37).; 5º) Discerne junto com o povo faminto qual projeto pode ser o caminho da superação da fome; 6º) Excluí a postura de quem queria se esquivar da responsabilidade diante do problema - “despede as multidões para elas irem ...” (Mt 14,15) - e o projeto de mercado apresentado por discípulo Filipe: “comprar pão para ...” (Jo 6,7; Mc 6,37). A idolatria do mercado é a causa da fome e jamais será a solução; 7º) Acolhe o projeto socialista, de partilha – humano - apresentado pelo discípulo André: “Eis uma criança com cinco pães e dois peixinhos” (Jo 6,9). “Temos só sete pães e alguns peixinhos” (Mt 15,34, Mc 8,5); 8º) Propõe organizar o povo em grupos de 5, de 10, de 50, de 100 etc; 9º) “Diga ao povo para se assentar na terra” (Mc 8,6), não no sofá e nem só diante da internet. Ou seja, a solução da fome passa necessariamente pela partilha, democratização e socialização da terra, que é reforma agrária e resgate, identificação e titulação de todos os territórios dos Povos e Comunidades Tradicionais; 10º) Abençoa os pães e os peixes, ou seja, cultiva a espiritualidade e a mística que envolve nossa vida e toda a realidade; 11º) Conta com lideranças no meio do povo para “repartir o pão!”; 12º) Propõe que seja recolhido o que está sobrando: “recolham o que sobrar”.

Assumir radicalmente o projeto transformador e libertador de Jesus de Nazaré: eis a tarefa que temos que fazer, com urgência.

Referências.

MARTINS, José de Souza. Caminhada no chão da noite: emancipação política e libertação nos movimentos sociais do campo. São Paulo: HUCITEC, 1989.

OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Modo de Produção Capitalista, Agricultura e Reforma Agrária. São Paulo: Labur Edições, 2007. Disponível em http://www.geografia.fflch.usp.br/graduacao/apoio/Apoio/Apoio_Valeria/Pdf/Livro_ari.pdf

 29/06/2021

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 - 16ª Live: A FOME VOLTOU ... QUE FAZER? – Mov. Inter-Religioso do Vale do Aço, MG, 27/6/2021

2 - "Corpus Christi" e os corpos do povo sendo violentados: e nós? , com frei Gilvander

3 - Live - DECISÃO DO STF CONTRA DESPEJOS NA PANDEMIA: análise de seus benefícios e limites - 05/6/2021.

4 - Live - A luta por MORADIA no Brasil: todo despejo é cruel e desumano, na pandemia, pior e inadmissível.

5 - Luta contra a mineração em Minas Gerais e na Amazônia e os territórios indígenas

6 - Estenda a mão a quem passa fome na Ocupação Rosa Leão, em Belo Horizonte, MG. Seja solidário/a!

7 - MLB ocupa Carrefour em Belo Horizonte: Por "Natal sem fome", contra racismo. Fora, fascista!22/12/20



 



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Fonte: Poema “Quem tem fome tem pressa”, no site http://gilvander.org.br/site/%ef%bb%bfpoema-quem-tem-fome-tem-pressa/

[3] Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos.

quarta-feira, 23 de junho de 2021

Ir às ruas para salvar 1,5 milhão de pessoas. Por Frei Gilvander

  Ir às ruas para salvar 1,5 milhão de pessoas. Por Frei Gilvander Moreira[1]


O dia 19 de junho de 2021 provavelmente entrará para a história como um dia histórico, por dois motivos: a) o dia em que no Brasil ultrapassou 500 mil mortos[2] durante a pandemia da covid-19, mortos não apenas pelo coronavírus, mas, principalmente, pela política genocida, política de morte, planejada e coordenada pelo desgoverno federal do inominável antipresidente; b) o dia que cerca de um milhão de pessoas foram às ruas em 420 cidades no Brasil e em dezenas de cidades no exterior gritar por “Fora, Bolsonaro”, “Vacina, já!” e “Auxílio Emergencial justo e digno, de pelo menos R$600,00”. Duplicou-se o número de pessoas na luta nas ruas e também o número de cidades em relação às manifestações de 29 de maio último. Iniciou-se o dia 19 de junho com a notícia de que o Brasil tinha ultrapassado os 500 mil mortos, vítimas da política genocida em curso no país. Ao entardecer do mesmo dia, se vê a imagem de 500 mil pessoas na Avenida Paulista em São Paulo lutando em defesa da vida, da democracia e por todos os direitos.  



Todos com máscara, álcool em gel, distanciamento, muita criatividade, com muito amor, ao som dos tambores, com inúmeras mensagens estampadas em cartazes, faixas e banners, com uma energia revolucionária contagiante! O povo, de crianças a idosos, mas com destaque para a juventude e as mulheres, deu mais uma vez o recado em alto e bom som. Destaco algumas das centenas de gritos ecoados nas ruas no último sábado. Por exemplo, uma vovó, em João Pessoa, cantou: “Eu vou, eu vou rezar, vou rezar o meu rosário para que Nossa Senhora bote fora Bolsonaro.”; “Se o povo protesta em meio a uma pandemia, é porque o governo é mais perigoso que o vírus.”; “Eu te responsabilizo, Bolsonaro!”; “MAIS amor, vacina e ciência e MENOS ódio, negacionismo e Bolsonaros.”; “Queremos vacina no braço, comida no prato e Fora, Bolsonaro!”; “Não tem vacina, mas tem chacina. Em memória dos 29 do Jacarezinho.”; “Nem tiro, nem fome e nem covid. Fora, Bolsonaro!”; “Vacina salva vidas, Amazônia salva o Planeta”; “Com Bolsonaro no poder, as mortes só aumentam.”; “Não estão todos, faltam 500 mil vidas.”; “Nem tiro, nem vírus, nem fome: a CPI tem que acabar em impeachment.”; “Pela Vida! Pela Vacina! Fora, BolsonaroFora, Governo Genocida!”; “Vida, Pão, Vacina e Educação! Fora, Genocida!”; “A Ciência e a Educação salvam. Bozo mata!”; “Fora, Bolsonaro! Chega de mortes! Vacina, já!”; “Chega de genocídio, fome e desemprego!”; “Vacina para todos, já!” “Luto(a) pelas 500 mil vidas perdidas. Basta! Chega! Vacina e responsabilização, já, de Jair Bolsonaro, na CPI e no STF!”.



Marcante também foi a articulação dos Movimentos Sociais Populares e outras forças vivas da sociedade que, em mutirão estabeleceram redes e transmitiram ao vivo os Atos Públicos, as Marchas e as manifestações que ocorreram em 420 cidades. O “Jornal A Verdade” e a “TV Resistência Contemporânea”, por exemplo, fizeram cobertura ao vivo durante quase dez horas, com centenas de lideranças entrando ao vivo e mostrando os Atos por todo o Brasil, via celular configurado em Rotação Automática e usado na posição horizontal (deitado). Militantes do Mídia Ninja, Jornalistas Livres, TV 247 etc divulgaram ao vivo muitos flashes das manifestações ao longo do dia. Marcante também foi a participação de centenas de cidades do interior mostrando que é possível e necessário que aconteçam Atos Públicos em todas as 5.568 cidades brasileiras nos próximos “Fora, Bolsonaro!”. Canindé, no Ceará, e Ibirubá, no Rio Grande do Sul, por exemplo, deram o exemplo a ser seguido. Nestas duas cidades do interior, dezenas de pessoas em um ponto simbólico da cidade, com uma série de cartazes e várias faixas, entoaram vários gritos de luta por “Fora, Bolsonaro!” e por direitos. Gravaram vídeos e divulgaram. O exemplo de luta do povo de Canindé e Ibirubá precisa ser seguido pelas forças vivas de todas as cidades do país. As lutas precisam passar a ser quinzenais, semanais e diárias. Bolsonaro e seu desgoverno parecem invencíveis, mas são vencíveis, pois são opressores recheados de mentiras, violência e contradições. Por isso, “têm pés de barro”.



Em todas as lutas por direitos o povo corre risco: repressão da PM, risco de ter que enfrentar fascistas, risco de algum incidente etc. Lutar tem risco, mas o maior risco hoje é não lutar pela superação dos desmandos na política brasileira. A política genocida está se reproduzindo cotidianamente. Estamos já no início da terceira onda da política genocida, nos alertam os infectologistas. Os números são assustadores. De 2 mil a 2.500 mortos por dia; quase 5 mil em dois dias; dez mil em 4 dias; 20 mil em uma semana; 80 mil por mês. 160 mil em dois meses. Se continuarmos assim, até as próximas eleições em 2022 poderemos ter cerca de 2 milhões de mortos. Portanto, ir às ruas e realizar lutas populares cada vez mais massivas em todas as periferias, cantos e recantos, se tornou o caminho necessário, justo e urgente a ser trilhado para impedirmos que mais 1,5 milhão de pessoas sejam mortas nos próximos 1,5 ano. Com Bolsonaro e seu desgoverno no poder, só aumenta o número de mortos e a devastação dos biomas: Amazônia, Pantanal, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga e Pampas etc. Ninguém tem o direito de se omitir, pois omissão significa cumplicidade com a política de morte e de violência que campeia no Brasil.

Evangélicos e católicos contra o fascismo, na luta pela democracia e por todos os direitos sociais, foram às ruas com a mensagem bíblica que diz: “Javé – Deus solidário e libertador – disse a Moisés: “Por que clamas a mim? Diga ao povo que marche!” (Êxodo 14,15). Esta passagem bíblica faz referência ao momento em que o povo, após uns 500 anos de superexploração pelo imperialismo dos faraós no Egito, está unido, organizado e irmanado para fugir da “casa da escravidão” – o Egito. O povo está encurralado: na frente o Mar Vermelho; atrás, a tropa de choque das forças repressivas e milicianas do faraó. Muita gente orando e pedindo a Deus para livrá-las da morte, como muita gente que ora hoje pedindo a Deus que acabe com a “pandemia”. Moisés, um dos líderes do movimento popular religioso de libertação, ao lado das mulheres parteiras – Séfora e Fua -, de Miriã e outras, transmite ao povo o que o Deus da vida pede: “Dê um passo à frente! Marche!” Irmanados/as, de cabeça erguida, superando o medo e o encurralamento, o povo, em luta libertária, deu um passo à frente e o mar Vermelho se abriu. Assim, o povo escravizado passou “a pé enxuto” e o exército de faraó afogou-se nas águas do mar Vermelho. No episódio da partilha dos pães, narrado seis vezes nos quatro evangelhos da Bíblia, diante dos que se esquivavam da responsabilidade em solucionar o problema da fome e das injustiças, Jesus Cristo também mostrou o caminho a ser seguido: “Vocês é que têm de lhes dar de comer” (Mateus 14,16). Enfim, “felizes os/as que constroem a paz” (Mateus 5,9), fruto da justiça social, agrária, urbana e ambiental, o que passa necessariamente pelo resgate da democracia, o que exige “Fora, Bolsonaro!”.

23/06/2021

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 - Atos “Fora, Bolsonaro!” com mais de 1 milhão de pessoas em mais de 400 cidades no Brasil– 19/06/2021

2 - Ato “Fora, Bolsonaro!” Belo Horizonte, MG – 19/6/2021 - “POVO NA RUA: FORA, BOLSONARO!”

3 - COBERTURA ESPECIAL DO JORNAL A VERDADE DAS MANIFESTAÇÕES #19JFORABOLSONARO

4 - AO VIVO. Semana de protestos no Brasil começa com os Povos Indígenas em Brasília.

5 - Atos “Fora, Bolsonaro!”: BH, Recife, Juiz de Fora, Dublin/Irlanda e outras cidades – 19/6/2021



 

 

 



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente da CPT, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH e de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Esse é o número oficial. Há pesquisas que indicam que o número de mortos por covid-19 no Brasil possa estar sendo 20% acima dos números divulgados, pois, segundo Pesquisa de uma Universidade dos Estados Unidos sobre mortos no Brasil em 2019 morreram 50 mil pessoas e em 2020 morreram 150 mil pessoas por Síndrome respiratória aguda, o que pode ser por covid-19 não diagnosticado. Logo, é possível que em 2020 tenha tido 100 mil mortos por covid-19 não caracterizados em atestado de óbito. E nos primeiros seis meses de 2021?

terça-feira, 15 de junho de 2021

Analfabeto político é cúmplice do genocídio. Por Frei Gilvander

 Analfabeto político é cúmplice do genocídio. Por Frei Gilvander Moreira[1]


Felizes os que constroem a paz, pois serão chamados filhos de Deus” (Mateus 5,9), bradou Jesus Cristo no Discurso da Montanha, na Palestina, colônia com povo escravizado e explorado pelo Imperialismo Romano. Vivemos em uma Casa Comum, onde tudo está interconectado com tudo. Sendo assim, não há espaço para neutralidade e omissão, pois toda “postura neutra e de omissão” se torna, na prática, cumplicidade. Todo analfabeto político, que elege os piores políticos, não é apenas omisso diante das injustiças que os podres políticos causam ao não governar para o bem comum, mas para privilegiar aliados da classe dominante. Vejamos alguns exemplos!

Na Zona da Mata Mineira, na cidade de Tombos, MG, que tem oito mil habitantes, em tempos de pandemia da covid-19, já com 21 pessoas mortas, o prefeito Tiago Pedrosa Lazarone Dalpério (PP – Partido Progressista), assinou o Decreto Municipal N° 125/2021, de 20 de maio de 2021, desapropriando um terreno de propriedade da Associação dos Pequenos Agricultores e Trabalhadores Rurais de Tombos (APAT), terreno vendido para oito famílias que adquiriram lotes, onde algumas estão construindo, outras já estão residindo, além de ter ali uma plantação com diversas hortaliças, mandioca e abóbora que ajudam nas finanças de uma família que faz uso da terra desenvolvendo atividade de Agricultura Familiar. Agora todos foram pegos de surpresa pelo Decreto de desapropriação dos terrenos das oito famílias. O motivo aparente apresentado pelo prefeito, ao desapropriar, é que precisa do terreno de 4.600 metros quadrados (quase ½ hectare, ½ campo de futebol) para fazer um canil, “um centro de zoonose para cães”. Entretanto, é de conhecimento de todos/as que a Prefeitura de Tombos dispõe de vários terrenos, alguns em situação de abandono, onde pode ser construído um canil sem nenhum custo com indenização, para cuidar dos animais que não têm culpa por essa atitude injusta e perseguidora contra os trabalhadores e trabalhadoras rurais. O terreno e as construções das oito famílias valem mais de um milhão de reais. No entanto, no decreto do prefeito foi avaliado em apenas 80 mil reais, ou seja, menos de 7% do valor real. Além do valor econômico das oito pequenas propriedades, há valor de memórias de anos de luta, dignidade e respeito ao povo Tombense, tudo isso sendo violado e pisado nesta decisão absurda do prefeito.

Em Sete Lagoas, MG, com 242 mil habitantes, já com mais de 540 mortos pelo genocídio coordenado pelo desgoverno federal, há um déficit habitacional acima de 15 mil moradias, uma tremenda desigualdade social na cidade. Em 17 maio de 2020, há mais de um ano, cerca de 200 famílias ocuparam um terreno da prefeitura de Sete Lagoas, terreno que estava abandonado há décadas, sem cumprir sua função social. O atual prefeito de Sete Lagoas, Duílio de Castro (do Partido Patriota), durante a campanha eleitoral, visitou a Ocupação Cidade de Deus e prometeu para as famílias que não iria requerer reintegração de posse, que iria regularizar fundiariamente a permanência das famílias na área ocupada. Fez isso para ganhar votos. Entretanto, na prática, o prefeito requereu judicialmente a reintegração de posse, alegando que “é área verde”, o que não é verdade. A juíza da Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Sete Lagoas, Wstânia Barbosa Gonçalves, determinou liminar de reintegração de posse, mandando a prefeitura arrumar abrigo provisório para as famílias. As famílias têm direito à moradia permanente e adequada e não apenas a “abrigo provisório”. A prefeitura de Sete Lagoas está fazendo vistas grossas com a invasão de áreas ambientais por famílias ricas. Para beneficiar famílias ricas, a prefeitura desafetou um terreno que era Área Ambiental para colocar como preferencialmente para habitação, ao lado do shopping, próximo da Serra Santa Helena. Esta gravíssima injustiça social acontece em Sete Lagoas, enquanto o prefeito já colocou à venda mais de 100 terrenos da prefeitura e já anunciou que pretende vender para uma construtora o terreno onde estão as 100 famílias da Ocupação Cidade de Deus. Poderíamos citar muitos outros exemplos de injustiças que estão sendo praticadas por prefeitos, governadores, antipresidente etc.

A CPI[2] da covid-19 no Senado Federal já concluiu que a política genocida do antipresidente e do desgoverno federal, com a cumplicidade de 70% dos deputados/as e senadores/as, parte do Supremo Tribunal Federal e parte da mídia, é responsável por mais de 400 mil mortes que poderiam ter sido evitadas, caso o (des)governo Federal tivesse comprado vacina para os 213 milhões de brasileiros/as, no final de 2020, e não tivesse implementado politica negacionista com falsos remédios e sempre desdenhando da ciência e das orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Trata-se de uma política para matar os mais enfraquecidos, uma eugenia não declarada. Pesquisas comprovam que o número de mortos pela covid-19 foi muito maior nos estados e municípios (des)governados por bolsonaristas (políticos do centrão, da direita e extrema direita). A todos esses dedicamos a profecia do profeta Isaías, que, com ira santa, exorta: “Ai daqueles que fazem decretos iníquos e daqueles que escrevem apressadamente sentenças de opressão, para negar a justiça ao fraco e fraudar o direito dos pobres do meu povo, para fazer das viúvas a sua presa e despojar os órfãos” (Isaías 10, 1-2).

Todos os/as eleitores/as têm responsabilidade sobre as ações políticas dos seus políticos eleitos. Óbvio que as lideranças, sejam elas religiosas ou não, a mídia e todos que influenciam o povo durante a campanha eleitoral são os primeiros e maiores (ir)responsáveis. Errar é humano, mas permanecer no erro é mais do que burrice, é se tornar cúmplice dos políticos opressores. E não basta arrepender por ter votado errado e chegar na próxima eleição votar em nomes diferentes, mas opressores como os anteriores. A história das eleições demonstra que os políticos do centrão, da direita e da extrema direita (PSL, NOVO, Democratas, Progressistas, PTB, PSD, PMDB, PL, PSDB, PSC, Podemos, PRTB, PMB etc) governam contra o povo, contra o meio ambiente e a favor dos grandes empresários e capitalistas. Os partidos e políticos de esquerda ou de centro-esquerda (UP, PCO, PSTU, PCB, PSOL, PT, PCdoB, PSB, REDE, PDT etc) não são perfeitos, mas implementam políticas sociais que são vitais para assegurar algum nível de respeito à dignidade humana e aos direitos sociais garantidos pela Constituição Federal. O fato é que voto não tem preço, tem consequências! “Somos seres políticos”, já dizia o filósofo Aristóteles. Ingenuidade dizer: “Sou apolítico. Não gosto de política. Sou neutro.” Errado dizer “todo político é corrupto”. Há, sim, uma minoria de políticos que são éticos e tentam governar para o bem comum. Todos nós fazemos Política o tempo todo. Política é como respiração. Sem respiração, morremos. Política refere-se ao exercício de alguma forma de poder, como nos ensina Bertold Brecht em “O Analfabeto Político”. A política, como vocação, é a mais nobre das atividades; como profissão, a mais vil.

A história da humanidade mostra muitos povos que foram seduzidos por “espinheiros” que, com mil artimanhas, acabaram sendo eleitos e exerceram o poder oprimindo, violentando e explorando o povo. Por exemplo, o imperador Nero se deleitava em jogos no Coliseu enquanto incendiava Roma, a capital do império; Benito Mussolini, eleito pelo povo, se tornou o criador do fascismo e um ditador; Adolf Hitler, também aclamado pelo povo diante do seu populismo, se tornou nazista contumaz e mandou matar em campos de concentração milhões de judeus, comunistas, ciganos, homossexuais etc. A história mostra também que todos os ‘espinheiros’ eleitos usam e abusam do nome de Deus e dizem defender os “valores da família”, mas na prática colocam “a morte acima de tudo” e arrasam com as famílias e todo o povo de mil formas. 



Atribuído a Bertolt Brecht, o texto “O Analfabeto Político” mostra as consequências que o analfabeto político causa: "O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio dos exploradores do povo.” Nascem também os políticos fascistas e genocidas. Por isso, os analfabetos políticos são cúmplices das políticas genocidas em curso no Brasil. Convertam-se antes que seja tarde demais!

15/06/2021

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 - Live-denúncia: Prefeito de Tombos, MG, desapropria 8 famílias para fazer canil. Despejar famílias para abrigar cães? - 12/6/2021

2 - Visão panorâmica da área de 8 famílias da APAT desapropriadas pelo prefeito de Tombos, MG: injustiça que clama aos céus – 10/6/2021.

3 - Injustiça! Prefeito de Tombos, MG, Tiago Dalpério (PP), desapropriou 8 famílias p/ fazer um canil

4 - Povo da Ocupação Cidade de Deus, de Sete Lagoas, MG, marcha na luta contra despejo: Diocese e Câmara Federal pedem suspensão do despejo – 25/5/2021

5 - Três mulheres de luta dizem: “O justo é NÃO DESPEJAR a Ocupação Cidade de Deus, de Sete Lagoas, MG” – 24/5/2021.

6 - Padre, mãe com 6 filhos e avó com câncer clamam para não serem despejados em Sete Lagoas/MG -23/5/21

7 - Plantão das Lutas direto de Sete Lagoas, MG, na Ocupação Cidade de Deus: “DESPEJO, NÃO!” – 20/5/2021

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[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente da CPT, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH e de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Comissão Parlamentar de Inquérito.