terça-feira, 13 de novembro de 2018

Resistência e clamor por justiça: Quilombo Campo Grande/MST, em Campo do...



Resistência e clamor por justiça. Despejo, não. Quilombo Campo Grande (MST), em Campo do Meio, sul de MG. 2ª Parte/07/11/2018.

Aproximadamente quinhentas famílias do MST, há 20 anos dando função social a um latifúndio de 4 mil hectares, terra da ex-usina Ariadnópolis, em Campo do Meio, sul de MG, correm o risco de serem despejadas, por decisão judicial injusta e inconstitucional. Essas famílias, distribuídas em 11 Acampamentos, integram o Quilombo Campo Grande, e já contam com infraestrutura de energia elétrica, casas de alvenaria e produzem uma grande diversidade de produção agroecológica A decisão judicial de reintegração de posse, além de desalojar cerca de 500 famílias, causará a destruição de 1200 hectares de lavoura de milho, feijão, mandioca e abóbora - 40 hectares de horta agroecológica e 520 hectares de café, centenas de casas, currais, quilômetros de cercas e 20 anos de histórias de luta pela terra. Em 25 de setembro de 2015, o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, assinou o decreto n. 365/2015 desapropriando por interesse social a maior parte do latifúndio da ex-usina Ariadnópolis, pavimentando juridicamente o caminho para a conquista da integralidade das terras da Ariadnópolis pelo MST. Dia 09 de março de 2016, aconteceu mais uma conquista: o governador Pimentel assinou um 2º decreto (n. 107/2016) desapropriando outra área da Ariadnópolis para fins de reforma agrária. Entretanto, a queda de braço entre Latifúndio e Sem Terra, que acontece há muitas décadas, continuou. Dia 23 de novembro de 2016, o Órgão Superior do TJMG rejeitou o Mandado de Segurança que questionava o Decreto n. 365/2015 do Governador Pimentel. Contudo, um lobby de deputados ruralistas e do agronegócio conseguiu junto ao judiciário a derrubada dos decretos de desapropriação e um juiz substituto da Vara Agrária de Minas decidiu restabelecer Liminar de Reintegração. Um absurdo jurídico e inconstitucional. Nesse vídeo, a segunda parte da reportagem feita com depoimentos de Sem Terra e apoiadores em mobilização à porta do Fórum da Comarca de Campos Gerais, onde foi realizada a audiência em que foi confirmada a ação de reintegração de posse, no dia 07 de novembro de 2018.

Manifestação dos Sem Terra do MST do Quilombo
Campo Grande, em Campos Gerais, sul de MG, dia 07/11/2918,
 contra o despejo determinado pela Vara Agrária de MG.
Foto: Douglas Mansur.

*Reportagem em vídeo de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Campos Gerais, 07/11/2018.
* Inscreva-se no You Tube, no Canal Frei Gilvander Luta pela Terra e por Direitos, no link: https://www.youtube.com/user/fgilvander, acione o sininho, receba as notificações de envio de vídeos e assista a diversos vídeos de luta por direitos sociais. Se assistir e gostar, compartilhe. Sugerimos.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Aldeia Maracanã: símbolo de mística e de resistência Indígena em contexto urbano

Imagem 1 - Aldeia Maracanã, na capital Rio de
Janeiro, RJ. Foto: Alenice Baeta, Nov. de 2012.



Aldeia Maracanã: símbolo de mística e de resistência Indígena em contexto urbano
Por Alenice Baeta[1]


Para quem se interessa pelo tema história e organização indígena nas grandes cidades ou urbes, impossível não ter lido algo sobre a emblemática e fascinante história da luta dos indígenas da aldeia Maraká’nà ou Maracanã, situada no bairro homônimo, na capital Rio de Janeiro, RJ. O território hoje abrangido pelos antigos bairros Imperial de São Cristovão e Maracanã foram originariamente assentamentos indígenas de povos Tamoios que se aliaram aos franceses que buscavam também se estabelecer nas terras fluminenses durante o século XVI, todavia, estes teriam sido expulsos e/ou dizimados pelos colonizadores portugueses e suas tropas militares, que por sua vez, utilizando as inimizades históricas entre os povos indígenas tiveram o auxílio dos índios Temiminó nos combates. Estes, no ano de 1567, quando houve o embate definitivo conhecido como ‘Uruçumirim’, estabeleceram-se nesta região fundando novas aldeias indígenas sobre as dos Povos Indígenas Tamoio.  Segundo M. Pimentel, entre flechas e chamas teria então nascido a cidade do Rio de Janeiro, “... em meio a dezenas de incêndios (cerca de 160 aldeias indígenas foram queimadas), a milhares de flechas e tiros de canhão e outras armas de fogo –, o céu enfumaçado se tingiu de cinza e as águas da Guanabara, de vermelho sangue. [...] Eles tiveram suas cabeças espetadas em estacas e os poucos índios sobreviventes fugiram, buscando abrigo nas serras.”[2]
A efetiva colonização desta localidade teria ocorrido somente ao longo do século XVII, sobretudo a partir 1627 com a fundação da Igreja de São Cristovão, local onde ainda eram atracadas as embarcações de pescadores e que também interligava São Sebastião do Rio de Janeiro aos engenhos de açúcar, roças e demais áreas de cultivo do entorno.
Com a vinda da família real e a sua comitiva para a colônia no início do século XIX, esta localidade foi escolhida para abrigar o Paço Imperial Quinta de São Cristovão que serviria para a sua residência (1808 a 1821). Posteriormente, foi morada oficial da família imperial (1822 a 1889) na qualidade de Palácio Imperial (Quinta da Boa Vista), tendo sediado, inclusive, a primeira Assembleia Constituinte Republicana, de 1889 a 1891, antes de ser destinado ao uso como Museu Nacional, em 1892. Em terreno circunvizinho ao Palácio Imperial teria sido construído em 1862 um palacete pelo Duque de Saxe, oficial da Marinha austro-húngara e almirante da Armada Imperial Brasileira que ao se casar com a Princesa Leopoldina de Bragança teria recebido a área como dote por ter contraído matrimônio com uma das filhas do D. Pedro II.
Pouco depois de sua construção, em 1865, o imóvel foi doado pelo genro do imperador ao governo, após uma fase de constantes rebeliões populares acirradas pela crise do sistema escravagista. Segundo o termo de doação, o local deveria ser para “destinação ad eternum à preservação das sementes e das culturas indígenas”. Este ato reconheceu que o terreno tinha a origem indígena e que este deveria ser o seu real destino.
O uso da edificação foi requisitado pelo primeiro diretor como sede do Serviço de Proteção ao Índio (SPI)[3], Marechal Rondon, que na ocasião pertencia ao Ministério da Agricultura e Colonização. Em 1953 se tornou abrigo do recém-criado Museu do Índio por solicitação do antropólogo Darcy Ribeiro que idealizou este centro de referência da memória e da cultura indígena. Mas em 1978, sob a ditadura militar, a sede do Museu foi transferida de forma arbitrária para uma edificação no bairro Botafogo, e o antigo palacete, repatriado por decreto, portanto, de forma autoritária e ilegítima, como patrimônio da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), que, como uma empresa, teria mais facilidade na alienação do patrimônio público, ratificada, também por decreto, no início da década de 1980, pelo então presidente do Brasil José Sarney.
O prédio fica então abandonado desde 1978, porém, moradores da região relatam que o local teria sido utilizado de forma clandestina por grupos militares e paramilitares em sessões de tortura e execução de pessoas. De fato, há marcas características na edificação que confirmam tais denúncias, tais como reformas fora do padrão construtivo, que visavam blindar o porão do prédio, por exemplo.
No início do século XXI, o território passa a ser pretendido pelo movimento indígena, denominado “Instituto Tamoio dos Povos Originários”, sendo que algumas das lideranças seriam também advogados, antropólogos e historiadores, o que certamente fortaleceu a luta e a organização da retomada, sendo que a maioria de seus membros seriam indígenas moradores da região metropolitana do Rio de Janeiro, oriundos de bairros periféricos, favelas ou situações de rua. Afonso Guajajara, advogado indígena e membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), cumpria uma intensa agenda política entre Brasília e Rio de Janeiro, sendo auxiliado por seu irmão, professor no ensino fundamental e mestrando em línguas indígenas, na época, que o auxiliava nas tarefas políticas (REBUZZI, 2014: 74).
Após a realização de um congresso na Universidade Estadual do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), (vizinha do antigo prédio do Museu do índio), em 2006, a “Confederação Tamui” com o apoio de diversas entidades e organizações ocupa a edificação definitivamente, quando batiza o local posteriormente com o nome “Aldeia Maracanã” (Teko Haw Maraká’nà), reivindicando por Ação Civil Pública (ACP), a posse, gestão e manejo indígena do território, como espaço de uso indígena, voltado para a convivência espiritual comunitária de diversas etnocosmovisões com a criação de um Centro de Etnoconhecimento Socioambiental (CESAC).  A Aldeia é constituída como pluriétnica, sendo composta por integrantes de várias etnias, entre elas, Guajajara, Xavante, Pataxó, Fulni-ô, Apurinã, Tukano, Xucuru, Puri, Way-Way, além de inúmeros visitantes tribais de várias partes do país e do planeta.

 
Imagem 2 - Aldeia Maracanã. Ao fundo prédio histórico do Museu do Índio. Rio de Janeiro-RJ. Foto: Alenice Baeta, Nov. de 2012.

Visando manter um bom relacionamento com a vizinhança e o seu apoio permanente, buscando ainda provar a “condição de índios”, quebrando assim as barreiras do preconceito e da intolerância, os indígenas desenvolvem inúmeros eventos programados onde realizam rituais religiosos, entre eles, o toré, rezas, contação de histórias, danças, cantos e aulas públicas. Estas atividades vêm fortalecendo o local como espaço de referência da mística indígena se tornando um importante centro de resistência cultural indígena na cidade do Rio de Janeiro e no país, um verdadeiro ‘museu vivo’, como pretendido por seus idealizadores (REBUZZI, 2014: 73).
Com os preparativos da Copa do Mundo, de 2014, e das Olimpíadas, de 2016, começa mais um capítulo tenebroso de perseguição à Aldeia Maracanã e às suas lideranças por parte de empreiteiras consorciadas e dos governos federal e estadual. O terreno passa a ser requerido pelo Estado do Rio de Janeiro como espaço agregado ao projeto do ‘Complexo Desportivo-Empresarial do Maracanã’ para a construção de um estacionamento.
Segundo texto do site do Laboratório de Cartografia Indígena[4], a CONAB teria alienado o patrimônio público federal para o estado do Rio de Janeiro de forma ilegal, por 60 milhões de reais. A operação de compra e venda do espaço ocupado de moradia e uso de dezenas de famílias indígenas não é precedido de qualquer oitiva ‘com as partes interessadas’. A Aldeia Maracanã chegou assim a receber uma notificação da Procuradoria Geral do Estado que estabelecia um prazo de dez dias para que eles se retirassem do local, mas de acordo com Carlos Tukano, uma das lideranças da Aldeia, eles foram orientados pela Defensoria Pública da União, e optaram por não assinar o recebimento do documento. A empresa de licitação já havia sido contratada em 2013, mas a Aldeia Maracanã resistiu bravamente a uma informal ‘ordem de despejo’ no início desse ano, mesmo com a tropa de choque da polícia militar em sua porta. Mas em 22 de março deste mesmo ano a polícia voltou, desta vez com ordem judicial, com operação militar especial, com orientação para remoção da Aldeia. Eclodiram então confrontos sucessivos com os indígenas, ativistas, estudantes, moradores e apoiadores em geral, que tentaram ocupar as ruas em frente à Aldeia em sua defesa. A polícia militar usou de extrema violência contra os indígenas e demais manifestantes. “Pisou na cabeça do advogado da Aldeia sob o asfalto com seu coturno, além de algemá-lo. Uso de gás de “efeito moral” até contra crianças, idosos… Foi um ato de Terrorismo Institucionalizado de Estado...”[5].
As bilionárias obras de engenharia no estádio Maracanã e no seu entorno comprometeram o antigo território Maracanã que teve inúmeras árvores cortadas, benfeitorias destruídas e áreas pavimentadas com asfalto, comprometendo a situação ecológica do espaço e os projetos ambientais e agroecológicos da comunidade, o degradando severamente. Mas em reação, a Aldeia promoveu mutirões de recuperação ecológica e preservação do prédio histórico.
Ainda segundo dados apresentados pelo site do Laboratório de Cartografia Indígena, em dezembro deste mesmo ano, as empreiteiras lideradas pela Odebrecht, começam a demolir uma das edificações do antigo complexo de pesquisa do antigo Ministério da Agricultura e Colonização, mas o movimento indígena, com o apoio, inclusive de trabalhadores e atingidos pelas operações de reurbanização da cidade, ocupa uma destas edificações em protesto contra as demolições e em defesa do patrimônio público-comunitário indígena material e imaterial.
“A Tropa de Choque invade o prédio ocupado sem mandado, expulsa parte dos ocupantes e mantêm três lideranças indígenas em situação de detenção coercitiva por toda a madrugada, vigiados por dezenas de militares. Às 6h da manhã do dia seguinte, a PM, novamente sem mandado judicial, invade o território ocupado pelos indígenas e o interior do prédio, e retira seus ocupantes à força, arrastados sob escadarias em ruínas, sob o uso de gás de pimenta, imobilizados, sob socos e pontapés e golpes de cassetetes, alguns são detidos, de forma exemplar.”[6]
Apesar das inúmeras denúncias e manifestações em outras localidades da capital, quatro prédios e galpões foram lamentavelmente demolidos pelas empreiteiras e pela gestão público-privada do Consórcio Maracanã, tendo só sobrado, ao final, o prédio tombado do antigo Museu do Índio.
A ACP supracitada foi novamente movimentada pelas lideranças indígenas em 2016, quando foi reconhecida na sentença de juízo federal, o direito de uso, de manejo indígena do imóvel ou território. Espera-se que os órgãos de defesa dos direitos indígenas, como o Ministério Público Federal, a FUNAI e a Polícia Federal, cumpram o seu papel institucional neste processo, garantindo tais direitos na prática.
As atrocidades que ocorreram na aldeia Maracanã foram denunciadas e encaminhadas pela organização Justiça Global para diversas plataformas internacionais de Direitos Humanos. Estas serão também analisadas pelo Grupo de Trabalho sobre Detenções Arbitrárias da Organização das Nações Unidas (ONU). Entre as injustiças foram listadas uso indiscriminado do spray de pimenta e de bombas de efeito moral pelo batalhão de choque da polícia militar do Rio de Janeiro, além da prisão de pelo menos seis manifestantes sem justificativas ou permissão de acompanhamento de advogados. As lideranças indígenas solicitam ainda explicações formais às autoridades brasileiras sobre a utilização de acusações de desobediência e desacato como instrumento de criminalização de protestos dos povos tradicionais. Reiteram que a liberdade de expressão deveria ter sido assegurada aos indígenas e apoiadores, sendo um direito presente na Constituição Federal e na Declaração Universal sobre os Direitos Humanos. Lembraram ainda da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da ONU, sobre povos indígenas e tribais, ratificada em 2004 pelo Brasil que garante a noção de territorialidade específica e etnicamente construída, além da promoção à plena efetividade dos direitos sociais, econômicos, culturais, respeitando a sua identidade social, cultural, os seus costumes, tradições e suas instituições.
Uma das atividades culturais e de pesquisa que a Aldeia Maracanã (também considerada “Embaixada Indígena” ou “Acampamento Revolucionário Indígena”) desenvolvia no vizinho Museu Nacional era no Centro de Documentação de Línguas Indígenas, o CELIN, que preservava referências de povos indígenas documentadas há pelo menos duzentos anos, com escritos, fotografias, vídeos e gravações de línguas faladas por muitas tribos, inclusive algumas consideradas extintas, com registros de cantos, discursos e histórias, muitos ainda inéditos.  Alguns indígenas da Aldeia, historiadores e pesquisadores da cultura dos povos originários do Brasil passaram assim boa parte dos últimos anos debruçados sobre o acervo etnológico e indígena em laboratórios desta instituição.
Mas infelizmente, mais um momento trágico assola a Aldeia Maracanã e todo o país no dia 02 de setembro de 2018, com um incêndio inaceitável do prédio histórico do Museu Nacional. Segundo os moradores da Aldeia, assim que avistaram as chamas, correram para o local, mas o fogo já teria consumido tudo. Em entrevista para a Revista Piaui[7], o historiador Daniel Tutushamum Puri, de 42 anos, conta que assistiu em silêncio às labaredas que consumiam objetos, fotografias e registros orais de seu povo, os Puri, que já foram considerados extintos pela FUNAI. “O material que estava ali servia de base para pesquisas do nosso povo e de muitos outros povos nativos do Brasil. Era uma forma de ter reconhecida nossa cultura e afirmar nossa existência. Sem eles, é como se fôssemos extintos novamente”, disse Tutushamum, que é mestre em Educação pela USP.
Para José Urutau Guajajara, de 57 anos: “Isso é a morte da memória dos povos originários, uma negligência com o nosso patrimônio. A memória de todas as línguas da América Latina estava aqui. Tínhamos registros sonoros e escritos de povos que já não existem. Estamos vendo a cultura indígena sendo apagada. Uma perda irreparável”, disse Urutau Guajajara, mestre em Linguística e Língua Indígena pela UFRJ. Integrante da tribo Tenetehara-Guajajara, Urutau fez sua tese sobre a estrutura do Ze’egté, sua língua ancestral, no Museu Nacional. Segundo Tutushamum, “a sensação é que nos odeiam... É mais uma destruição para a nossa cultura. Temos a destruição das nossas línguas, dos nossos costumes, das nossas terras e até mesmo dos nossos indivíduos. Então, esse incêndio no Museu Nacional parece parte da mesma agressão. É o que a gente sente,” conclui a liderança em sua entrevista para a revista.
Desde o inexplicável incêndio no Museu Nacional, indígenas da Aldeia Maracanã vem realizando inúmeros rituais, tanto na Aldeia quanto nas proximidades do prédio do Museu em memória ao acervo destruído, pois o imaterial ali permanece... “Rezas para os espíritos ancestrais vem sendo realizadas...” como explica o indígena Dario Jurema Xucuru.
Outra atividade de luta e de expressão deste importante núcleo indígena urbano é a organização da terceira edição do Congresso Intercultural de Resistência dos Povos Indígenas e Tradicionais do Maraka´nà, que busca promover a articulação dos povos tradicionais em torno da luta pela autodemarcação do território, do saber e do seu protagonismo.
 Luto sim, contra estas injustiças e tragédias... em permanente Luta. Sigamos.

 
Imagem 3 - Foto enviada por Dario Jurema da Aldeia Maracanã de uma manifestação de indígenas e ativistas no Rio de Janeiro onde se denuncia o trágico incêndio do Museu Nacional e a destruição total de acervo e de documentação indígena. Outubro de 2018.

Referências.

Artigo citado:
REBUZZI, D. C. Aldeia Maracanã: um movimento contra o índio arquivado. Revista de Antropologia da UFSCAR, 6 (2) Jul/Dez de 2014.

Sites /Matérias Consultadas:
Belo Horizonte, MG, 12 de novembro de 2018.



Entre os dias 15 e 19 de Novembro de 2018 ocorrerá o COIREM - Congresso Intercultural de Resistência dos Povos Indígenas e Tradicionais do Maraka´nà.
“Após enormes ataques sofridos e remoções truculentas, a ‘ReXistência’ da Aldeia Maraka'nà  completa 12 anos desde a nossa retomada e frente ao quadro nacional de brutais ataques contra os povos indígenas, convocamos todos guerreiros e guerreiras à realização do III Congresso Intercultural da ‘ReXistência’ dos Povos Indígenas e Tradicionais do Maraka'nà. Este Congresso visa promover a articulação dos povos tradicionais em torno da luta pela autodemarcação do saber e do território. Vivemos num dos poucos países do continente onde não existe uma universidade indígena. Nosso protagonismo sempre foi negado e é ferramenta fundamental para avançarmos em nossa luta por garantia de nossa dignidade como povos soberanos.”
https://www.facebook.com/events/255345975185846/

[1] Doutora em Arqueologia e Historiadora. Membro do Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES); e-mail: alenicebaeta@yahoo.com.br

[3]O SPI foi sucedido pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em 1967.
[6] Cf. Nota 2  ( Site do Laboratório de Cartografia Indígena)
[7] Entrevista para Camila Zarur em 3 de Setembro de 2018.

Quilombo Campo Grande (MST) em Campo do Meio, sul de MG: Despejo, não. 1...



Quilombo Campo Grande (MST) em Campo do Meio, sul de MG: Terra pra quem nela trabalha. Despejo, não. 1ª Parte. 07/11/2018.

Cerca de 500 famílias do Quilombo Campo Grande, constituído de 11 Acampamentos do MST, em Campo do Meio, sul do estado de Minas Gerais, há 20 anos ocupando, trabalhando e produzindo a terra, estão sob ameaça de despejo iminente, depois de decisão judicial favorável à reintegração de posse, em audiência realizada no Fórum de Campos Gerais, MG, no dia 07/12/2018. Um desfecho inaceitável para um dos conflitos agrários mais antigos do país. As 500 famílias dos 11 Acampamentos tiveram do atual governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, a promessa de tornar o Quilombo um assentamento, mas foram surpreendidas por essa nova ameaça de despejo. O Governador Pimentel assinou decreto desapropriando por interesse social os 3.900 hectares do latifúndio da ex-usina Ariadnópolis visando assentar as 500 famílias que há 20 anos ocupam o mega latifúndio da Ariadnópolis, mas o poder judiciário impugnou o decreto e, pior, levantou Liminar de Reintegração de posse, uma injustiça que clama aos céus. As 500 famílias do Quilombo Campo Grande, em Campo do Meio, sul de MG, já contam com infraestrutura de energia elétrica, casas de alvenaria e produzem uma grande diversidade de produção agroecológica, como café, muitas variedades de milho, feijão, hortaliças, frutas, sementes orgânicas, gado, galinhas, porcos, além de remédios naturais, produzidos com plantas medicinais por eles/elas cultivadas. A safra anual do café Guaií, cuja marca é conhecida em todo o Brasil e também no exterior, chegou a 510 toneladas por ano. Essas 500 famílias geram, com seu trabalho, soberania alimentar, não apenas para quem produz e vive na terra, mas também para milhares de pessoas do município de Campo do Meio e da região, que passaram a ter acesso a um alimento saudável, sem veneno e de qualidade. Os 11 acampamentos também geram distribuição de renda. A terra traz dignidade para cerca de 500 famílias, mais de 2.000 pessoas. É injusta, imoral, extremamente desumana e inaceitável essa decisão judicial que ignora toda uma história de luta pela terra, de resistência, de trabalho, de construção de cidadania e dignidade para atender interesses de grandes fazendeiros, políticos e empresas do agronegócio da região. As 500 famílias vivem na área da falida usina Ariadnópolis, da Companhia Agropecuária Irmãos Azevedo (CAPIA), que encerrou suas atividades em 1996, embora ainda possua dívidas trabalhistas que ultrapassam R$ 300 milhões de reais. Nesse vídeo, a primeira parte de registro feito com depoimentos de Sem Terra e apoiadores em mobilização à porta do Fórum da Comarca de Campos Gerais, onde foi realizada a audiência em que foi confirmada a ação de reintegração de posse, no dia 07 de novembro de 2018.

Amostra da Produção agroecológica dos 11 Acampamentos do MST
 em Campo do Meio no latifúndio da ex-usina Ariadnópolis,
na praça de Campos Gerais, diante do Fórum, dia 07/11/2018.
Foto: Douglas Mansur.

*Reportagem em vídeo de frei Gilvander, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Campos Gerais, 07/11/2018.
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domingo, 11 de novembro de 2018

Barragem de Itaipu, no Paraná: Violência contra indígenas, passado e pr...





Barragem de Itaipu, no oeste do Paraná: Violência contra povos indígenas guarani no passado e no presente. 2ª Parte - 16/10/2018.

A maior hidrelétrica do mundo em termos de geração de energia, Itaipu, localizada no rio Paraná, entre o Brasil e o Paraguai, com 36 anos de funcionamento, apesar da imensa riqueza gerada nessas três décadas, foi incapaz, até hoje, de saldar a dívida que gerou com a remoção de 47 comunidades indígenas dos Povos Guarani para a formação de uma imensa barragem, lago artificial. a hidrelétrica e barragem de Itaipu tem um nome em língua guarani que significa “pedra que canta”, e foi construída em pleno território indígena, em lugar onde, há séculos, os cronistas e historiadores registram a presença de grupos guarani. Estima-se que quase 100 comunidades guarani – falantes dos dialetos nhandeva (conhecidos como Avá-Guarani) e mbya – sofreram o impacto da instalação da usina, e a imensa maioria delas até hoje não recebeu compensação adequada pelos territórios tradicionais que perderam: mais de 80 mil hectares, só do lado brasileiro, segundo cálculos de estudiosos. E esse fato se agrava ainda mais: além de não terem cumprido com suas obrigações legais pelo alagamento do território indígena, a empresa continua desrespeitando os direitos dos Povos Indígenas Guarani e, mais que isso, persegue, humilha, ameaça, violenta, negando-lhes, sobretudo, o direito ao território que lhes pertence por legítimo direito. Com sua população significativamente diminuída, de 6 mil para 1800 parentes, os indígenas guarani seguem em resistência na luta por seus direitos, apesar da grande dificuldade de sobrevivência, uma vez que lhes são negados o direito ao trabalho, o acesso às políticas públicas, entre outros direitos fundamentais. Esse vídeo registra a segunda parte do depoimento/denúncia de Júlia Navarro, Assessora Jurídica da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), llson Soares, Cacique da Aldeia Tekoha Y'Hovy, em Guaíra/PR e de Oscar Benitez, Cacique Ava Guarani , de Itaipulândia/PR, que participaram da reunião da Comissão Nacional de Defesa dos Defensores de Direitos Humanos e enfrentamento à Criminalização dos Movimentos Sociais, em Brasília/DF, no dia 16/10/2018 e denunciaram a situação de injustiça, violência e opressão sofridas pelas aldeias dos Povos Indígenas Guarani, na região oeste do Paraná, praticadas e/ou motivadas por latifundiários do agronegócio da região e por grupos ligados à Itaipu.
*Reportagem em vídeo de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Brasília/DF, 16/10/2018.
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Barragem de Itaipu, no oeste do Paraná, viola direitos de Povos Indígen...



Barragem de Itaipu, no oeste do Paraná, viola direitos de Povos Indígenas Guarani. 1a Parte - 16/10/2018.

A maior hidrelétrica do mundo em termos de geração de energia, Itaipu, localizada no rio Paraná, entre o Brasil e o Paraguai, com 36 anos de funcionamento, apesar da imensa riqueza gerada nessas três décadas, foi incapaz, até hoje, de saldar a dívida que gerou com a remoção de 47 comunidades indígenas guarani para a formação de uma imensa barragem, lago artificial. A hidrelétrica e barragem de Itaipu tem um nome em língua guarani que significa “pedra que canta”, e foi construída em pleno território indígena, em lugar onde, há séculos, os cronistas e historiadores registram a presença de grupos guarani. Estima-se que quase 100 comunidades guarani – falantes dos dialetos nhandeva (conhecidos como Avá-Guarani) e mbya – sofreram o impacto da instalação da usina, e a imensa maioria delas até hoje não recebeu compensação adequada pelos territórios tradicionais que perderam: mais de 80 mil hectares, só do lado brasileiro, segundo cálculos de estudiosos. E esse fato se agrava ainda mais: além de não terem cumprido com suas obrigações legais pelo alagamento do território indígena, a empresa continua desrespeitando os direitos do Povo Indígena Guarani e, mais que isso, persegue, humilha, ameaça, violenta, negando-lhes, sobretudo, o direito ao território que lhes pertence por legítimo direito. Com sua população significativamente diminuída, os indígenas guarani seguem em resistência na luta por seus direitos, apesar da grande dificuldade de sobrevivência, uma vez que lhes são negados o direito ao trabalho, o acesso às políticas públicas, entre outros direitos fundamentais. Esse vídeo registra a primeira parte do depoimento/denúncia de Júlia Navarro, Assessora Jurídica da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), llson Soares, Cacique da Aldeia Tekoha Y'Hovy, em Guaíra/PR e de Oscar Benitez, Cacique Ava Guarani , de Itaipulândia/PR, que participaram da reunião da Comissão Nacional de Defesa dos Defensores de Direitos Humanos e enfrentamento à criminalização dos Movimentos Sociais, em Brasília/DF, no dia 16/10/2018 e denunciaram a situação de injustiça, violência e opressão sofridas pelas aldeias do Povo Indígena Guarani, na região oeste do Paraná, praticadas e/ou motivadas por latifundiários do agronegócio da região e por grupos ligados à Itaipu.

Publicações: Os Avá-Guarani no oeste do Paraná: 

(Re)Existência em Tekoha Guasu Guavira


*Reportagem em vídeo de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Brasília/DF, 16/10/2018.
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sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Povo indígena Tuxá em luta pelo território, em Buritizeiros, MG: "A Terr...



Povo indígena Tuxá em luta pelo território, em Buritizeiros/MG: "A terra é mãe!". 09/10/2018.

Há três anos, parte da Comunidade Indígena Tuxá, na aldeia Tuxá Setor Bragagá, se encontra em uma Retomada (Ocupação) na fazenda Santo Antônio, no distrito da Cachoeira da Manteiga, município de Buritizeiro/MG, próximo à confluência do rio Paracatu com o rio São Francisco. Os indígenas Tuxá estão há 65 anos na região de Pirapora. Foram trazidos de localidades atingidas pela barragem de Itaparica, no Rio São Francisco, em Rodelas, na Bahia, para Minas Gerais pela liderança Tuxá Mestre Roque, Os Tuxá reivindicam a fazenda Santo Antônio, de propriedade do Estado de Minas Gerais, bem como o acesso às políticas públicas a que têm direito. Eles querem produzir nessa terra, plantar e colher para sobreviver, manter as suas tradições culturais, sua história. Em uma Nota Oficial da comunidade datada de 23 de novembro de 2015, os Tuxá denunciam o clima de tensão provocado por latifundiários da região que, ao longo dos anos, vêm explorando a terra em retomada, dela fazendo uso indevido para criação de gado, matança de animais silvestres, desmatamento, sendo percebido ali vestígios de atividade madeireira e de carvoaria, entre outras formas de devastação ambiental. Nesse vídeo, o depoimento da Cacica Anália Tuxá, que participou de Reunião com representantes do Governo de Minas Gerais, juntamente com outras lideranças dos Povos Indígenas em Minas Gerais e agente de pastoral da Comissão Pastoral da Terra (CPT), na Cidade Administrativa, em Belo Horizonte, no dia 09/10/2018. Na pauta da Mesa, a luta dos povos indígenas em Minas Gerais por direitos e pela posse das terras em retomada, terras antes ociosas, sem cumprir qualquer função social e que, para os Povos Indígenas, são fundamentais para sua sobrevivência e sua (re)existência.

Cacica Anália do Povo Indígena Tuxá, de Buritizeiro, MG.

*Filmagem de frei Gilvander Moreira, da CPT, das CEBs e do CEBI. Edição de Nádia Oliveira, colaboradora da CPT-MG. Belo Horizonte/MG, 09/10/2018.
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quinta-feira, 8 de novembro de 2018

TRÊS ANOS DE UMA GRANDE TRAGÉDIA NO VALE DO RIO DOCE:

TRÊS ANOS DE UMA GRANDE TRAGÉDIA NO VALE DO RIO DOCE: Sobre uma Arqueologia[1] do Esquecimento e dos Direitos ao Patrimônio Cultural

Por Alenice Baeta e Henrique Piló[2]

 
Imagem 1 - Muro de pedra em localidade atingida pela lama e rejeito. Paracatu de Baixo. Foto: H. Piló, 2017.

“... alimentar a memória dos homens requer tanto gosto,
 tanto estilo, tanta paixão, como rigor e método.”
 (Jacques Le Goff)

 Será abordado nesta matéria o tema patrimônio arqueológico, que já não parece pouco, tendo em vista o grande potencial cultural do vale do rio Doce... onde serão enfatizados os aspectos legais, teóricos, a diversidade e a importância do patrimônio arqueológico e o simbolismo dos bens materiais das localidades atingidas pela Tragédia[3] ou Desastre Tecnológico[4] decorrente do rompimento da barragem de Fundão no vale do rio Gualaxo do Norte - cujo rejeito adentrou o vale do rio Doce, atingindo o litoral, também o impactando severamente.
A nossa pesquisa original (com muitos mais dados e imagens) levantou fontes processuais, primárias e secundárias que permitiu construir interpretações objetivas sobre o tema, seu contexto e questões metodológicas, propondo recomendações e algumas reflexões a respeito. Foram ainda produzidas pela equipe bases cartográficas que permitiram identificar eventuais estruturas arqueológicas em localidades degradadas no vale do rio Gualaxo do Norte, além da indicação de vestígios atingidos pela lama, a partir de identificações em trabalhos de campo. Visando apresentar o contexto e a política patrimonial vigente referente aos bens arqueológicos nos quais nossas análises se ancoram, seguem os principais suportes legais e normativos.
Aportes Legais, Normativos, Teóricos, Éticos e de Direitos
A Constituição Federal promulgada em 1988 determina que os bens de natureza material e imaterial, incluindo os sítios arqueológicos e as cavidades naturais subterrâneas são de forma indubitável bens da União Federal. Ainda considera como bens de direito coletivo as referências culturais de uma comunidade.
“Art.216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores de referência à identidade, à ação, à memoria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais incluem:
(...) V- os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.”
Os sítios arqueológicos pré-coloniais e/ou históricos são protegidos pela Lei Federal no 3.924, de 1961, que já possui mais de cinquenta anos de vigência e que vem sendo desde então o principal instrumento de salvaguarda e proteção específica deste tipo de bem cultural no país.
Art. 1- Os monumentos arqueológicos ou pré-históricos de qualquer natureza existentes no território nacional e todos os elementos que neles se encontram ficam sob a guarda e proteção do Poder Público, de acordo com o que estabelece o art. 175 da Constituição Federal.”
O artigo 5 considera crime a destruição e a mutilação deste tipo de patrimônio, que incorrem em infrações sujeitas a penalidades conforme o Código Penal.
“Art. 5 – Qualquer ato que importe na destruição ou mutilação dos monumentos a que se refere o art. 2 será considerado crime contra o Patrimônio Nacional e, como tal punível de acordo com o disposto nas leis penais.”
Esta lei, inclusive, não distingue bens arqueológicos emersos ou submersos, nem bens de natureza material ou imaterial (SOARES, 2007).
Novos instrumentos jurídicos foram posteriormente elaborados de maneira a operacionalizar e assegurar a preservação do patrimônio arqueológico e cultural. Nesta esteira protecionista, a Lei no 9.605 de 1998, também conhecida como “Lei de Crimes Ambientais”, estabeleceu em sua Sessão IV intitulada: “Dos Crimes Contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural” penalidades no que se refere à danificação de bens culturais e arqueológicos, merecendo aqui ser destacado o artigos 63.
“Art. 63- Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de valor paisagístico, ecológico, turístico, ecológico, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena-reclusão de um a três anos e multa.
A Portaria Federal SPHAN no 07, de 1988, atual IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional),  é considerada um grande legado do educador e arquiteto Augusto Carlos da Silva Telles, que em seu primeiro ano como presidente da instituição assinou este documento de grande importância para a eficaz proteção e conhecimento do patrimônio arqueológico e da cultura material a ele associada. Este documento regulamenta e orienta há praticamente trinta anos, sem interrupção, o desenvolvimento das pesquisas de campo e escavações arqueológicas no Brasil a fim de se resguardar os objetos de valor científico e cultural, identificados e coletados nas pesquisas. Em função da urgência de uma fiscalização efetiva das atividades que envolvem os bens de interesse arqueológico do país, define o seguinte:
“Art. 1- Estabelecer os procedimentos necessários à comunicação prévia, às permissões e às autorizações para pesquisas e escavações arqueológicas em sítios arqueológicos e pré-históricos previstas na Lei no 3.924, de 26 de julho de 2017.”
Para que se possa desenvolver uma pesquisa arqueológica, sobretudo de caráter interventivo e/ou escavação arqueológica deverá ser previamente protocolado no IPHAN um projeto detalhado, cujo escopo precisa ser seguido segundo orientações indicadas no quinto artigo. O(s)/a(s)  arqueólogo(s)/a(s) coordenador(es)/a(s) deverá apresentar todos os itens e documentação exigida tendo em vista estar se tratando de coleta e consequentemente de guarda de bens arqueológicos, quer dizer, patrimônio da União e de interesse puramente coletivo.
A autorização ou permissão de pesquisa vem sendo publicada no Diário Oficial da União (DOU), Sessão do Ministério da Cultura, com a indicação do prazo de vigência. Ao final do período, segundo o cronograma proposto no projeto de referência, deverá ser entregue um relatório final completo.
Ainda deve ser mencionada a Instrução Normativa nº  001, de 25 de Março de 2015, que estabelece procedimentos administrativos a serem observados pelo IPHAN especificamente nos processos de licenciamento ambiental. Segundo o seu primeiro artigo, o IPHAN deverá ser instado a se manifestar nos processos de licenciamento ambiental federal, estadual e municipal em razão da existência de intervenção na Área de Influência Direta (AID) de empreendimentos econômicos que possam afetar bens culturais acautelados em âmbito federal.
Do ponto de vista legal, reforça-se que todos os sítios arqueológicos, independentemente de cronologia, dimensão, exposição no sítio (exposto, submerso ou sotoposto), antiguidade, diacronia e estado de conservação, têm a mesma importância histórica e cultural. Todos os sítios arqueológicos, sem distinção, são protegidos e amparados por legislação, bem como, por normativas internacionais e nacionais.
O sistema jurídico brasileiro admite assim a integração entre os bens culturais e ambientais considerados como “macrobem”[5], por sua vez, os bens culturais são compostos por testemunhos de natureza material e imaterial.
Nessa mesma direção, se busca nas cartas internacionais as bases conceituais e epistemológicas do aparato legal acima mencionado, pois estes documentos são os aportes na construção das leis, instruções, deliberações e condutas em geral dos países signatários no que se refere à politica e pesquisa patrimonial e arqueológica.
Iniciamos com a Carta de Veneza, elaborada pela Sociedade das Nações, em Atenas no ano de 1931, que tratou sobre os princípios gerais e das doutrinas concernentes à proteção dos monumentos.  Apesar de ter sido redigida no início do século XX pós-primeira guerra europeia parece ainda muito atual, pois recomenda em seu item V, o seguinte:
“1. A colaboração em cada país dos conservadores de monumentos e dos arquitetos com os representantes das ciências físicas, químicas e naturais para a obtenção de métodos aplicáveis em casos diferentes.”
No item VI, que trata sobre técnica de conservação, reitera (... ):
não é preciso dizer que a técnica de conservação de uma escavação impõem a colaboração estreita do arqueólogo e do arquiteto. Quanto aos outros monumentos, os especialistas unanimemente aconselham, antes de toda consolidação ou restauração parcial, análises escrupulosas das moléstias que os afetam, reconhecendo de fato que cada caso constitui um caso especial.”      
Buscando destacar o patrimônio arqueológico na seara que envolve os bens culturais, o primeiro documento imprescindível é a “Recomendação que define os princípios internacionais a serem aplicados em matéria de pesquisa arqueológicas”, elaborada pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), reunida em Nova Delhi, em 1956.
Muito interessante a definição de Pesquisas Arqueológicas no item I, deste documento:
“1.(...) todas as investigações destinadas à descoberta de objetos de caráter arqueológico, quer tais investigações impliquem uma escavação do solo ou uma exploração sistemática de sua superfície, quer sejam realizadas sobre o leito ou no subsolo das águas interiores ou territoriais de um Estado-membro.”
No item seguinte relativo a Bens Protegidos informa que:
“2. As disposições da presente recomendação se aplicam a qualquer vestígio cuja conservação apresente um interesse público do ponto de vista da história ou da arte. (...) Deveriam estar, principalmente, submetidos ao regime previsto pela presente recomendação os monumentos, móveis e imóveis, que apresentem interesse do ponto de vista da arqueologia no sentido mais amplo.”
As cartas internacionais, sobretudo a de Nova Delhi, influenciaram e serviram de base teórica e conceitual para a discussão e elaboração da Lei no 3924, de 1961, bem como da Portaria no 07, de 1988, supracitadas.
As Normas de Quito, por sua vez, foram redigidas durante uma reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA) em 1967, que tratou sobre a conservação e a utilização de monumentos e sítios de interesse histórico e artístico, inserindo os países da América de forma mais contundente à agenda de responsabilidades sobre a questão arqueológica e patrimonial. No item II, que trata sobre as “Considerações Gerais”, indica a necessidade de tratar a noção de espaço sempre atrelada ao conceito de monumento, ao ambiente natural que o emoldura e aos bens culturais que o constitui.
Anos depois, já em 1972, foi elaborado um documento fulcral da UNEP, ou melhor, da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente, tendo sido conhecida como “Declaração de Estocolmo”. Esta declaração refere-se ao “Ambiente Humano”, abrindo uma discussão holística no que se refere a patrimônio cultural e ambiental e suas relações indissociáveis com a natureza e com a conservação do nosso planeta.
“4. O homem tem a responsabilidade especial de preservar e administrar judiciosamente o patrimônio representado pela flora e pela fauna silvestres, bem como o seu habitat, que se encontram atualmente em grave perigo por combinação de fatores adversos. Em consequência, ao planejar o desenvolvimento econômico, deve ser dada a devida importância à conservação da natureza (...).
  1. Deve-se por fim à descarga de substâncias tóxicas e/ou de outras matérias e à liberação de calor, em quantidades ou concentrações tais que não possam ser neutralizadas pelo meio ambiente, a fim de se evitar danos graves e irreparáveis aos ecossistemas. Assim, deverá ser apoiada a justa luta dos povos contra a poluição.”
Este documento ainda aborda, em sua parte final, a necessidade de melhorias no que se refere ao Direito Internacional, a respeito de indenizações das vítimas de poluição e de outros tipos de danos e prejuízos ambientais e sociais, alertando também sobre a necessidade de investimentos em pesquisas científicas e em novas tecnologias nos âmbitos nacional e multinacional.
Neste mesmo ano, na esteira deste debate foi organizada pela UNESCO a Convenção de Paris de 1972, que tratou sobre a salvaguarda do patrimônio mundial, cultural e natural de valor excepcional, constatando que estes vêm sendo cada vez mais ameaçados de destruição, não somente pelas causas tradicionais de degradação, mas também por fenômenos ainda mais temíveis.  Considera que: “a degradação ou o desaparecimento de um bem cultural e natural constitui o empobrecimento nefasto do patrimônio de todos os povos do mundo”.  
Define com maior exatidão patrimônio cultural, a dizer: obras arquitetônicas, elementos de natureza arqueológica, cavernas; grupos de construção ou bem isolado, além de sítios de valor histórico, estético, etnológico e ou antropológico.
No caso de “patrimônio natural”, considera- se tratar de formações geológicas e fisiográficas, sítios naturais, além de habitat de espécies ameaçadas.  Sítios considerados patrimônio mundial que estejam em perigo ou em situação de vulnerabilidade são identificados e divulgados periodicamente em uma lista pelo Comitê do Patrimônio Mundial (órgão executivo da World Heritage Convention- WHC da UNESCO), chamando a atenção sobre a necessidade de esforços emergenciais, além de colaborações  em nível internacional.
Consciente da existência de uma gama de monumentos suscetíveis na América Latina foi organizado um seminário na República Dominicana, em 1974, pela OEA sobre a conservação e a restauração do patrimônio associado aos períodos colonial e republicano. Foi assim redigida a Resolução de São Domingos, onde foram alertados que os problemas referentes a  preservação monumental obrigam a um trabalho prévio de investigação documental e arqueológico, exigindo estudos integrais para resgatar a maior quantidade de dados relacionados a história dos sítios ameaçados.
Respaldados na noção de “centro monumental”, tais pesquisas deveriam ser estendidas à proteção dos valores tradicionais e naturais da área em questão, reforçando a necessidade de um programa completo que defina a sua função e a sua manutenção, levando prioritariamente a melhoria socioeconômica para os seus habitantes.
A Recomendação relativa à salvaguarda dos conjuntos históricos e a sua função na vida contemporânea realizada pela UNESCO, em Nairóbi, em 1976, por sua vez, detalha no item 1, a definição de “conjunto histórico”, aprofundando tal conceito, considerando:
“todo grupamento de construções e espaços, inclusive os sítios arqueológicos e paleontológicos, que constituam um assentamento humano, tanto no meio urbano como rural e cuja coesão e valor são reconhecidos do ponto de vista arqueológico, arquitetônico, pré-histórico, histórico, estético ou sócio cultural. Entre esses conjuntos, que são muito variados, podem-se distinguir especialmente os sítios pré-históricos, as cidades históricas, os bairros urbanos antigos, as aldeias e lugarejos, assim como os conjuntos monumentais homogêneos, ficando entendido que estes últimos deverão, em regra, ser conservados em sua integridade.”
Releva a importância da “ambiência” dos conjuntos históricos por se tratar do quadro natural ou construído que influencia de maneira direta o espaço e a sua percepção. No item 4, reitera que os conjuntos históricos e a sua ambiência deveriam ser protegidos de qualquer tipo de deterioração, particularmente resultantes de uma utilização imprópria, inclusive as provocadas por qualquer forma de poluição.          
Em 1980 o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS) realizou reunião no Sul da Austrália na cidade de Burra, onde foram discutidos importantes termos e procedimentos relacionados ao tratamento e preservação de bens culturais ou patrimoniais, definidos em seu primeiro artigo, como: “significação cultural”, expressão que designará o valor estético, histórico, científico ou social, de um bem para as gerações passadas, presentes ou futuras; “substância”, conjunto de materiais que fisicamente constituem o bem; conservação, cuidados a serem dispensados a um bem para preservar-lhe as características que apresentem uma significação cultural; “manutenção”, proteção continua da substância, do conteúdo e do entorno de um bem e não deve ser confundido com o termo reparação; “preservação”, manutenção do estado da substância de um bem em um estado anterior conhecido; “restauração”, restabelecimento da substância de um bem em um estado anterior conhecido; “reconstrução”, restabelecer com o máximo de exatidão, de um estado anterior conhecido; “adaptação”, agenciamento de um bem a uma nova destinação, sem a destruição de sua significação cultural; “uso compatível”, utilização que não implique mudança na significação cultural da substância, modificações que sejam substancialmente reversíveis ou que requeiram um impacto mínimo.
No artigo 8, reitera que deve ser proibida a introdução de elementos estranhos ao meio circundante que prejudiquem a apreciação ou fruição de um bem. Na parte dedicada a “Procedimentos”, no artigo 23, informa ainda que qualquer intervenção em um bem deverá ser “precedida de um estudo dos dados disponíveis, sejam eles materiais, documentais e outros (...).”
No que se refere ao item significação cultural na Carta de Burra, que “se corporifica no sítio propriamente dito, no seu tecido, entorno, uso, associações, significados, registros, sítios relacionados e objetos relacionados (...)” há ainda o instrumento denominado como “Declaração de Significância (DS)”, que é um documento que expressa o valor cultural de um bem para uma comunidade, justificando a sua importância e conservação para as futuras gerações (GREEN, 1988).
O ICOMOS também realizou em 1986 um evento voltado à salvaguarda das cidades históricas, cujo documento de referência, a Carta de Washington, indica seu item 5 a confecção de um  plano de salvaguarda, que deve compreender em uma análise completa de dados, particularmente arqueológicos, históricos, arquitetônicos, técnicos, sociológicos e econômicos, que deve definir as principais orientações e modalidades de ações a serem empreendidas no plano jurídico, administrativo e  financeiro.
No item 11 reitera a importância das pesquisas arqueológicas urbanas e da apresentação adequada das descobertas, contribuindo para um melhor conhecimento do passado das cidades históricas. No item 14 aponta o seguinte: “Devem ser adotadas nas cidades históricas medidas preventivas contra as catástrofes naturais e contra os danos (notadamente, as poluições e as vibrações) não só para assegurar a salvaguarda do seu patrimônio, como também para a segurança e o bem estar dos seus habitantes.”
De grande importância é o Comitê Científico Internacional sobre Gestão do Patrimônio Arqueológico (ICAHM)[6], criado em 1984, e que aconselha e orienta o ICOMOS no que se refere aos procedimentos, padrões, técnicas e metodologias em arqueologia. Trata-se de um organismo de grande importância no âmbito do patrimônio arqueológico. Em 1990, o ICAHM organizou em Lausanne, um evento para tratar sobre esta temática.  Por isto, a Carta de Lausanne é considerada um documento cardeal no estabelecimento da proteção e gerenciamento eficaz deste tipo de patrimônio.
Este documento é considerado essencial neste estudo sendo balizador para a contextualização e conceituação da situação patrimonial em Mariana, que deveria ser rigorosamente considerado, sobretudo em termos práticos.  O texto introdutório de Lausanne, diz o seguinte:
A proteção desse patrimônio não pode fundar-se unicamente na aplicação das técnicas da arqueologia. Exige um sólido embasamento de conhecimentos científicos e competência profissional.”
A definição de patrimônio arqueológico apresenta-se muito abrangente e completa:
“Art. 1. O Patrimônio Arqueológico compreende a porção do patrimônio material para a qual os métodos da arqueologia fornecem os conhecimentos primários. Engloba todos os vestígios da existência humana e interessa todos os lugares onde há indícios de atividades humanas, não importando quais sejam eles; estruturas e vestígios abandonados de todo o tipo, na superfície, no subsolo ou sob as águas. Assim como o material a eles associados.”
No que se refere à previsão de sanções no caso de ameaças ou danos a este tipo de patrimônio, a legislação deverá prever penalidades proporcionais às infrações cometidas. Sobre as intervenções ou escavações em sítios arqueológicos o artigo 5 alerta para a necessidade de definição dos métodos de pesquisa, incluindo a possibilidade de intervenção não destrutiva, passando pelas sondagens limitadas e/ou levantamentos por amostragem.
A respeito da preservação e conservação, propõe que deveria ser objetivo fundamental a conservação in situ dos monumentos e sítios, além dos cuidados com a documentação, inventários, bem como com as coleções a ele relacionadas.
Como consta no cenário aqui focalizado, bens culturais imóveis e móveis que também se encontram submersos nas barragens instaladas em Bento Rodrigues, indispensável mencionar a Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Subaquático, organizado pela UNESCO em 2001, em Lisboa. Como apêndice deste documento há a indicação das regras relacionadas às atividades dirigidas ao patrimônio cultural sob as águas. Nesta ocasião foi criado o ICUCH[7] (Comitê Internacional para o Patrimônio Cultural Subaquático), que é, como o ICAHN, um órgão científico, composto por especialistas em patrimônio arqueológico submerso em todo o mundo.
O Patrimônio cultural Subaquático é constituído por todos os bens móveis e imóveis, testemunhos de uma ação humana situados inteiramente ou em parte no mar, rios, nos lagos, nas lagoas, nos cais, nas valas, nos cursos de água, nos canais, nas represas, nos reservatórios artificiais, nos poços e outros planos de água, em zonas de maré, manguezais ou quaisquer outras zonas inundadas periodicamente, ou recuperados num tal meio, ou encontrados em margens atualmente assoreadas” (RAMBELLI, 2002:39).
Especificamente sobre os desastres no mundo, que devastam pessoas e lugares, os Estados Membros das Nações Unidas, em 2000, adotou a Estratégia Internacional para Redução de Desastres (ISDR) que coordena os esforços de uma ampla rede de parceiros para alcançar uma redução substancial das perdas ocasionadas por desastres e construir nações e comunidades resilientes como uma condição essencial para o desenvolvimento sustentável.  Atrelada a este sistema a ECHO (Comissão Europeia para Assistência Humanitária e Proteção Civil) engloba assistência humanitária e proteção civil e objetiva salvar e preservar vidas, bem como prevenir o sofrimento humano de populações afetadas por desastres naturais ou humanos. A UNISDR lançou, em 2010, a campanha mundial para construir cidades mais resilientes, instrumento chave para implantação da redução de riscos de desastres.
“1. Integrar a Redução de Riscos de Desastres às políticas, planos e programas de desenvolvimento sustentável. 2. Desenvolver instituições, mecanismos e capacidades em todos os níveis, particularmente no nível comunitário, que contribuam para a construção da resiliência às ameaças. 3. Incorporar sistematicamente a Redução de Riscos de Desastres nas ações de preparação para emergências, resposta e programação de recuperação” (UNISDR, 2012).
Em nível nacional, merecem ser aqui mencionadas algumas cartas, que se encontram imbricadas com os fundamentos e preceitos dos documentos internacionais discorridos acima e tantos outros, agregando peculiaridades relacionadas à realidade e diversidade patrimonial brasileira.
O Compromisso de Brasília realizado em 1970, tendo sido coordenado pelo arquiteto Lúcio Costa, abrange ainda um tema de interesse neste estudo no item 19, quando aponta necessidade de uma conduta defensiva no que se refere ao tratamento dos sepultamentos históricos, incluindo túmulos e elementos artísticos a eles associados.
“19. Urge legislação defensiva dos antigos cemitérios e especialmente dos túmulos históricos e artísticos e monumentos funerários.”
 A Carta de Petrópolis, de 1987, sobre preservação e revitalização de centros históricos, considera que os “sítios históricos urbanos (SHU)” devem ser tratados como um “organismo histórico” composto pelas paisagens construídas e naturais e por sua “polifuncionalidade”. Considera que a proteção legal dos SHU deve ser um processo contínuo e permanente utilizando diferentes instrumentos, entre os quais: tombamento, inventário, normas urbanísticas, isenções e incentivos, declaração de interesse cultural e desapropriação. 
A Declaração de Foz do Iguaçu, elaborada em 2008 pelo ICOMOS Américas, especifica que os componentes tangíveis e intangíveis do patrimônio são essenciais para a preservação da identidade das memórias das comunidades, que por sua vez, criam e transmitem espaços de relevância cultural, territorial e histórica.
A Carta da Terra, também conhecida como Carta dos Povos, foi escrita em 2000 com a participação de várias entidades internacionais, relacionadas ao Meio Ambiente e aos Direitos Humanos. Apregoa a necessidade de uma sociedade sustentável baseada no respeito aos direitos universais, na justiça econômica, na memória social e seus fundamentos éticos. Em seu item 6 reitera o compromisso de:
“6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura de precaução. a. Orientar ações para evitar a possibilidade de sérios ou irreversíveis danos ambientais mesmo quando a informação científica for incompleta ou não conclusiva. b. Impor o ônus da prova àqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que os grupos sejam responsabilizados pelo dano ambiental. c. Garantir que a decisão a ser tomada se oriente pelas consequências humanas globais, cumulativas, de longo prazo, indiretas e de longo alcance.”
Este documento propõe que se façam esforços no sentido da erradicação da pobreza, garantindo o direito à água potável, ao ar puro, à segurança alimentar, aos solos não contaminados, ao abrigo e saneamento seguro, distribuindo os recursos nacionais e internacionais requeridos.
Convoca a todos os cidadãos que busquem aportar a segurança coletiva e social a todos àqueles que não são capazes de manter-se por conta própria, reconhecendo os ignorados, protegendo os vulneráveis, e permitir-lhes que desenvolvam as suas capacidades, de análise e de posicionamento de maneira a conquistar as suas aspirações.
Insiste que se defenda o direito de todas as pessoas no sentido que estas recebam informação clara e oportuna sobre assuntos ambientais e sociais e sobre os seus direitos. Tais compromissos humanitários implicam no apoio às sociedades civis locais, regionais e globais e a promoção da participação significativa de todos os indivíduos e organizações na “tomada de decisões”.
Houve em Quebec, em 2008, uma reunião histórica pela ocasião da 16ª Assembleia Geral do ICOMOS que tratou exclusivamente sobre os  princípios e recomendações para a preservação do “Spiritu loci” através da proteção do patrimônio tangível e intangível. Discutiu-se a necessidade da proteção dos espíritos dos lugares, isto é da essência da vida, do social e do espiritual de uma localidade. O tema tratado no bojo dessa assembleia foi fruto de uma sequência de eventos científicos sobre patrimônio imaterial que merecem ser citados, visando a contextualização do “Spiritu loci”, o “Espírito do lugar”.
Em 2003, o ICOMOS enfocou o simpósio científico de sua 14ª Assembleia Geral sobre o tema da preservação dos valores sociais intangíveis de monumentos e sítios. Na Declaração de Kimberly, o ICOMOS se comprometeu também em considerar os valores intangíveis (memória, crenças, conhecimento tradicional, ligação ao lugar) das comunidades locais, guardiãs destes valores, no manejo e preservação de monumentos e sítios, ainda em conformidade com a supracitada Convenção do Patrimônio Mundial de 1972.
A Declaração Xi'an do ICOMOS, realizada em 2005, enfatizou a conservação de contextos definidos enquanto aspectos físicos, visuais e naturais, assim como práticas sociais e espirituais, costumes, conhecimento tradicional e outras formas e expressões intangíveis na proteção e promoção dos monumentos e sítios que compõem o patrimônio mundial. Este evento ainda advertiu sobre a necessidade da abordagem multidisciplinar e as diversas fontes de informação para melhor compreender, administrar e conservar o contexto da forma mais completa. Retornando aos preceitos da reunião de Quebec, após este panorama, neste se definiu o espírito do lugar de forma relacional, envolvendo:
os elementos tangíveis (edifícios, sítios, paisagens, rotas, objetos) e intangíveis (memórias, narrativas, documentos escritos, rituais, festivais, conhecimento tradicional, valores, texturas, cores, odores etc.) isto é, os elementos físicos e espirituais que dão sentido, emoção e mistério ao lugar.   Em vez de separar o espírito do lugar, o intangível do tangível e considerálos como antagônicos entre si, investigamos as muitas maneiras dos dois interagirem e se construírem mutuamente.”
As relações no lugar são caracterizadas por movimentos e contatos interculturais crescentes, pluralísticas, transacionais, constituídos por múltiplas ligações com um lugar, tendo em vista o caráter vivo, dinâmico, multiforme e permanente de monumentos, sítios e paisagens culturais.
No item Repensando o Espírito do Lugar, destaca-se o primeiro item:
“1. Reconhecendo que o espírito do lugar é composto por elementos tangíveis (sítios, edifícios, paisagens, rotas, objetos) bem como de intangíveis (memórias, narrativas, documentos escritos, festivais, comemorações, rituais, conhecimento tradicional, valores, texturas, cores, odores etc.) e que todos dão uma contribuição importante para formar o lugar e lhe conferir um espírito, declaramos que o patrimônio cultural intangível confere um significado mais rico e mais completo ao patrimônio como um todo, e deve ser considerado em toda e qualquer legislação referente ao patrimônio cultural e em todos os projetos de conservação e restauro para monumentos sítios, paisagens, rotas e acervos de objetos.”
No que se refere a sugestões no sentido de valorizar um lugar em sua complexidade, merece ser citado o item 6:
“6. Como hoje em dia na maioria dos países do mundo o espírito do lugar, sobretudo seus componentes intangíveis, atualmente não se beneficiam de programas de educação formal ou de proteção legal, recomendamos a implementação de reuniões e consultorias com peritos de diferentes origens e recursos, pessoas das comunidades locais, e o desenvolvimento de programas de treinamento e políticas jurídicas para uma melhor proteção e promoção do espírito do lugar”.
Em um dos seus itens finais este meritório documento sugere a realização do registro das diferentes maneiras de transmissão não‐formais (narrativas, rituais, atuações, experiência e práticas tradicionais etc.) e formais (programas educativos, bancos de dados digitais, websites, ferramentas pedagógicas, apresentações multimídia etc.), reiterando que estas deveriam ser fomentadas, porque não apenas garantem a proteção eficaz do espírito do lugar, mas, acima de tudo, ativa, estimula e protege o desenvolvimento sustentável e social da comunidade.
Na esteira dos debates sobre lugar é que se arrefece também o uso do termo “território” que tem suas origens nas ciências da natureza, mas que também passa a ser apropriado pelas ciências da terra e sociais. Território, assim como outros conceitos correlatos como territorialidade e territorialização, assume importância sui generis na geografia cultural e humana, pois passa a ser tratado como uma categoria espacial polissêmica no trato das questões políticas, fundiárias, socioeconômica, mas sobretudo, no campo simbólico e cultural das comunidades (RASFETTIN, 1993; HAESBAERT, 2004; SAQUET, 2010).
Haesbaert (2007) propõe assim que o território seja concebido como “espaço-tempo-vivido” resultado de processos diversos e complexos produzido nas tramas materiais e imateriais do cotidiano social, ou seja, na vivência e na identidade das pessoas.
“A territorialidade é um fenômeno social que envolve indivíduos que fazem parte do mesmo grupo e de grupos distintos. Há continuidade e descontinuidade no tempo e no espaço; as territorialidades estão intimamente ligadas a cada lugar: elas dão lhe identidade e são influenciadas pelas condições históricas e geográficas de cada lugar” (SAQUET, 2009: 88).
Sob este prisma, a Declaração de Foz do Iguaçu, elaborada em 2008 pelo ICOMOS Américas, específica que os componentes tangíveis e intangíveis do patrimônio de um território são essenciais para a preservação da identidade das comunidades que criaram e transmitiram espaços de relevância cultural e histórica.
A Carta de Porto Alegre, de 2014, por sua vez, organizada pela ABRAMPA (Associação Brasileira do Ministério Público do Meio Ambiente), ratificando as conclusões dos Encontros de Goiânia, Santos, Brasília, Ouro Preto e Rio de Janeiro, votam e aprovam conclusões e importantes diretrizes referentes à gestão do patrimônio cultural, reiterando a necessidade de se valorizar as entidades que representam os interesses da sociedade e dos movimentos sociais de um território. Reforçam a necessidade de valorização dos diferentes tipos de patrimônio cultural.
“6. É imperiosa a necessidade de fortalecimento das organizações da sociedade civil que atuam na defesa do patrimônio cultural.
  1. O patrimônio cultural imaterial ou intangível, que congrega grande diversidade de manifestações associadas aos valores e tradições dos grupos formadores da identidade brasileira, precisa ser efetivamente valorizado, mediante ações de identificação, promoção e, sobretudo, apoio para sua continuidade histórica.”
No que se refere a cultural material e ao seu tratamento (coleta, inventário, gestão e musealização) cabe ainda mencionar o Código de Ética do ICOM (Conselho Internacional de Museus), adotado por unanimidade em 1986 e revisado pela 21ª Assembleia Geral realizada em Seul, Coréia do Sul, em outubro de 2004.
O documento principal do ICOM é o Código de Ética que visa o estabelecimento e a gestão de museus. Estabelece normas mínimas que devem ser consideradas quando da discussão de uma política de acervos, aquisição, conceituação e de musealização de coleções e acervos, e que devem ser consideradas a partir da sua diversidade, tipologia, natureza, propósitos e que respeitem os interesses, a territorialidade e as prioridades das comunidades dos locais a serem musealizados ou onde estes sejam instalados.
No item 3.3 sobre coletas de campo, adverte:
“Se um museu promove coletas de campo deve ter uma política conforme as normas científicas, atendendo às obrigações legais nacionais e internacionais. As coletas de campo devem levar em consideração os pontos de vista das comunidades locais, de seus recursos ambientais e de suas práticas culturais e esforços para valorizar o patrimônio natural e cultural.”
A Política Nacional de Museus (PNM) insere o Brasil entre os poucos países que tem como compromisso formular uma política pública de museus balizada em parte na Lei federal no 11.904 de 2009, conhecida como “Estatuto dos Museus” prevê em seu primeiro artigo, consideram-se museus:
“ ... as instituições sem fins lucrativos que conservam, investigam, comunicam, interpretam e expõem, para fins de preservação, estudo, pesquisa, educação, contemplação e turismo, conjuntos e coleções de valor histórico, artístico, científico, técnico ou de qualquer outra natureza cultural, abertas ao público, a serviço da sociedade e de seu desenvolvimento.”
Estabelece a necessidade de uma gestão participativa articulada com os seus princípios fundamentais, dentre os quais se destacam: a valorização da dignidade humana; a promoção da cidadania; o cumprimento da função social; a valorização e a preservação do patrimônio cultural e ambiental; universalidade do acesso, o respeito e a valorização à diversidade cultural.
Por isto, causa estranheza imaginar que neste cenário pós-desastre possa ser desenvolvido um programa de educação patrimonial padronizado, ou melhor, nos moldes tracionais junto à comunidade atingida. A questão patrimonial deve ser tratada na perspectiva dos direitos humanos e de reparações. Ninguém mais que os moradores sabem exatamente o valor sentimental do seu lugar e de suas memórias.  Em sua obra Pedagogia do Oprimido (1974), Paulo Freire critica a noção de ensino onde os alunos, passivos e calados, “recebiam” do professor as informações de forma distante do seu mundo prático e cotidiano, o que ele denominou de “educação bancária”.
Nesta linha de atuação é que a arqueologia colaborativa e simétrica encontra em termos práticos, ou melhor, para além de discursos, formas de interceder de maneira eficaz no que se refere à socialização, difusão responsável e proteção do patrimônio cultural de um território.
Segundo Greer et al. (2002), a arqueologia colaborativa, abordagem da qual nos identificamos neste estudo, é o único caminho possível de interação com a comunidade, pois  busca ir além da consulta aos moradores locais para a realização de uma pesquisa. A arqueologia colaborativa não busca apenas o consentimento ou mesmo o convencimento das comunidades ou lideranças sobre a importância da pesquisa, mas o engajamento crítico e a interação durante todo o processo de construção do conhecimento arqueológico, bem como da proteção e gestão participativa patrimonial (GREER et al., 2002). Este estudo adveio da demanda das comunidades atingidas e para assessorá-las.

Cultura Material e a Diversidade de Sítios Arqueológicos
O termo “objetos da memória” deveria ter sido considerado desde a ocasião do evento, com o estabelecimento preciso de normas científicas, conceitos e critérios, evitando que determinada coleção fosse valorizada em detrimento a outra(s).
Segundo a historiadora e museóloga L. Julião, em artigo publicado no Caderno de Diretrizes Museológicas (2006), a noção e tratamento da cultura material deve atentar, sobretudo, para a multiplicidade de elementos, evitando hierarquizações, valorizando assim o sistema de significações do patrimônio de uma localidade.
“A adoção deste conceito de cultura pressupunha abandonar alguns procedimentos que faziam tradição nos museus — a priorização de segmentos da cultura dominante, a valorização de tipologias específicas de acervo, a ideia de hierarquização da cultura — em favor da ampliação do patrimônio a ser preservado e divulgado. De lugares consagrados ao saber dogmático, os museus deveriam se converter em espaços de reflexão e debate, ajustados aos interesses e às demandas reais das comunidades” (JULIÃO, 2006: 25-26).
Essa nova tendência em museologia e tratamento de acervos e coleções valoriza a concepção antropológica de cultura, compromissada com a percepção mais abrangente do sistema de significações patrimoniais de uma comunidade, permitindo comunicar, reproduzir e vivenciar um modo de vida global distinto e de fazer, envolvido em todas as formas de atividade social. Rompe assim com a tradição ocidental renascentista que tem como premissa a valorização das obras de arte, peças e templos religiosos católicos em detrimentos a outros tipos de artefatos e nuances culturais.   As marcas e danos impressos em peças e objetos podem, por sua vez, também dizer muito sobre a sua história, o seu lugar e o seus novos significados e olhares.
A proposição da Nova História[8], que tanto alargou o campo de análise e reflexão do historiador a partir do século XX, insiste na necessidade de se recuperar e valorizar os diversos tipos de fontes, em detrimento da utilização excessiva de documentos escritos por parte dos historiadores positivistas. Propõe a multiplicidade de fontes e de abordagens, com a valorização das narrativas e de diferentes tipos de vestígios - a “história em migalhas”; introduzindo a premência de maior rigor com relação ao tratamento da cultura e da vida material e de suas inúmeras dimensões e possibilidades.
Segundo os historiadores Bucaille e Pesez, a noção de cultura material é heterogênea, crucial e rica em diferenças matizes.
“Em primeiro lugar, demasiadas vezes se ignora o facto de que a cultura material é cultura. Nessa qualidade possui dois dos seus aspectos principais: a colectividade (oposta à individualidade) e a repetição (por oposição ao acontecimento) dos fenômenos que a compõem, o que, em qualquer ciência, define uma importante situação epistemológica e, por conseguinte, opções ideológicas e metodológicas” (BUCAILLE & PESEZ, 1989: 25).       
O sociólogo Otávio Ianni (1988) enfatiza que se não fosse as pressões e documentos internacionais dos quais o Brasil se tornou signatário (vide item anterior), o patrimônio oficial estaria possivelmente ainda sendo relacionado a monumentos religiosos, edificações suntuosas, quadros, esculturas associados às famílias aristocráticas e à elite em geral.
A Arqueologia Histórica na esteira do debate sobre a necessidade de ampliar esta reflexão em termos práticos questiona as aporias e as contradições[9] no tratamento da cultura material quando se privilegia monumentos edificados, peças e/ou bens de valor monetário ou estético (FUNARI, 2007).
“Não é por acaso que a Arqueologia Histórica engajada e pública volta-se precisamente, para resgatar vozes, os vestígios e os direitos dos nativos, negros e de todos os outros excluídos das narrativas dominantes. Essas tendências, cada vez mais importantes no contexto mundial, tornam-se da mesma forma, mais e mais conhecidas e praticadas no Brasil, inserindo nossa Arqueologia nas práticas internacionais” (FUNARI, 2007:85).
Alguns viajantes e naturalistas estiveram em Mariana e percorreram o trecho da estrada real de Camargos, descrevendo dentre outros locais, o antigo povoado de Bento Rodrigues, tais como, J. Mawe (1748); Eschwege (1979); Saint- Hilaire(1975); Spix & Martius (1981); J. E. Pohl (1976); A. Caldcleugh (2000); Bunburry(1981); Gardner ( 1975); Burton (1976). Dentre os relatos destaca-se a descrição da paisagem feita por Spix e Martius da região focalizada neste estudo, revelando a importância histórica e potencialidade arqueológica da mesma.
Ainda à tarde, seguimos para o Arraial de Bento Rodrigues, distante uma légua a sudoeste, e pernoitamos num rancho, de onde apreciamos mais uma vez o panorama da bela Serra do Caraça. O pouso estava repleto de mineiros das Minas Novas, que seguiam para o Rio de Janeiro, levando carga de algodão, e nos deram ensejo de apreciar o aspecto bem característico da vidadas tropas em viagem. Na região de Bento Rodrigues, acha-se ouro por toda parte, na argila vermelha, que jaz por cima do xisto quartzítico. Como o modo de exploração dessas minas não divergia do que até aqui havíamos visto, não nos demoramos na estrada real, que leva à cidade de Mariana, distante três léguas ao sul de Bento Rodrigues (...)”( SPIX & MARTIUS, 1981:250).
Visando mensurar esta potencialidade arqueológica e histórica do território há inúmeros  locais com estigmas ou indícios de se tratar, pelo menos, de unidades de mineração que foram atingidas pela lama e que deveriam ser averiguadas; importantes guias para se localizar estruturas anexas, ou não, de menor visibilidade com outros usos e funções, visando entender as relações sistêmicas e de territorialidade no vale Gualaxo do Norte ao longo do tempo e seus manejos.
“Aqui, neste texto, falaremos dessa construção social e, além disso, de enxadas e foices, machados, moinhos, monjolos, moendas, gamelas, caixas de mantimentos, quartas de madeira, de alambiques... Deixemos de lado os almocafres, os carumbés e as bateias. Falemos de terras que se lavram e de onde se tiram alimentos e de homens e mulheres que as amainam e que distribuem seus produtos em caminhos e descaminhos” (MENEZES, 2007: 338).
Por isto, faz-se necessário identificar e mapear os muros, valos, engenhos, monjolos, moinhos, rodas d’ água, paiol, forjas, tornos, chiqueiros, currais, locais de oferendas, entre outros, visando resgatar a sua história, distintas tecnologias e cronologias. Enfim, lugares que fazem parte da memória e da sócio economia das comunidades rurais da região mineradora.
Necessário ainda destacar a relevância dos antigos muros na região aqui focalizada, que é uma categoria de bem de interesse arqueológico, vinculada ao cercamento de distintas áreas de trabalho voltadas ao criatório de gado (currais) e de animais domésticos, plantio, divisas de propriedades rurais e de edificações religiosas, civis e terrenos em núcleos urbanos, entre outras funções. Este tipo de bem cultural é também marcante na paisagem mineira, tendo sido objeto de um recente artigo de M. P. Miranda e L. Alvarenga (2017).
Entre os vestígios das intervenções humanas que modelaram as paisagens mineiras, mormente no período colonial, destacam-se os valos divisores e os muros de pedra - largamente utilizados, certamente por influência dos europeus  que aqui se instalaram àquela época quando a mão de obra escrava era abundante e a tecnologia do uso do arame ainda não existia. Tais estrutura eram utilizadas, principalmente para a demarcação de divisas entre propriedades  (MIRANDA & ALVARENGA, 2017:9).
Estes pesquisadores da área do direito patrimonial e ambiental ainda expõem a necessidade de se valorizar as “contexturas espaciais” de valos, currais e muros ao abrigarem materializações de “modos de fazer” típicos de comunidades.

 
Imagem 2 - Segmento de muro de alvenaria de pedra seca no Núcleo Histórico de Bento Rodrigues. Mariana, MG. Foto: A. Baeta, 2013 (Antes da Tragédia).

A análise de uma menor unidade material encontrada em uma localidade traduzida por “ínfimos vestígios”, dispostos no solo, encerra uma extensa rede de informações que parte faz parte da cultural material de um lugar; que vão desde a análise e formas de confecção utilizada, até o reconhecimento da paisagem ao redor e da sua contextualização temporal e estilística (SILVA, 2007).
Uma modalidade muito rara e considerada excepcional em Minas Gerais são os muros de “pedra fincada”, onde lajes ou lajotas apresentam-se perfiladas lateralmente cujas bases são enterradas no solo, constituindo um tipo de cerca vedada cujas arestas das lajes se ladeiam impedindo a passagem de pequenos animais, por exemplo.  Em Bento Rodrigues, os locais onde havia trechos de pedras fincadas foram atingidos pela avalanche de material lamoso, se encontrando, no momento, submersos e/ou sotopostos na barragem do Dique S4, segundo informações dos moradores.

 
Imagem 3 - Segmento de muro de pedra “fincada”, modelo excepcional - Núcleo Histórico de Bento Rodrigues. Mariana, MG. Foto: A. Baeta, 2013 (Antes da Tragédia). Este local foi atingido pela lama e se encontra ainda submerso pela S4.

Trechos dos muros de modalidade pedra fincada ainda estavam associados a segmentos da estrada real[10] que também foram afetados pela onda de lama e posteriormente pela instalação do Dique S4.
Sob este espectro, merece mencionar a importância de se valorizar os itinerários culturais de um território ou ainda os bens culturais lineares e seus alinhaves microregionais. Este é o caso dos antigos caminhos do ouro e/ou da mineração na região de Mariana e de Ouro Preto, e a sua conectividade com sítios (ainda inventariados ou não) que os bordeja, como, estalagens, hospedarias, roças, vendas, capelas, cemitérios, núcleos urbanos, fazendas, ranchos de tropeiros, pontes etc.
Os itinerários relacionados especificamente aos “caminhos da mineração” iam muito além da necessidade de circulação do metal precioso, mas, sobretudo, de pessoas, alguns com seus produtos e artigos de consumo, imbuídos em atividades que dessem suporte para a manutenção das minas e do aquecimento das relações mercantis entre várias localidades da colônia (ZEMELLA, 1990).
Na obra “A Geografia do Crime” (2005), C. Anastasia traça o perfil da sociedade colonial e dos usuários dos caminhos e descaminhos, revelando atos generalizados de resistência, violência e de repressão nesses territórios mineiros.
As inúmeras sublevações faziam que a coroa tomasse uma série de medidas com relação à segurança dos caminhos reais, desde o controle de consumo de aguardente pelos negros e mestiços nos engenhos próximos aos caminhos, até a restrição no comércio e uso da pólvora. “Salteadores, quilombolas, vadios, contrabandistas e monstros das mais variadas estirpes povoavam essas áreas” (ANASTASIA, 2005: 14).
Neste contexto efervescente, identificamos em Mariana e adjacências pequenas cavernas que podem ter sido utilizadas como locais integrantes de rotas de fuga de fugitivos e esconderijos provisórios (BAETA & PILÓ, 2015).
 “Os incidentes da serra da Moeda, a queixa de moradores de Mariana e a dos São João del Rei não foram ocorrências isoladas na capitania das Minas Gerais no século XVII. Caminhos, serras e matas gerais eram palco de constantes violências cometidas por escravos, forros e pardos [...]. Mas esses insidiosos não agiam sozinhos. Redes de solidariedade estabeleciam-se entre eles, congregando negros cativos, forros, mestiços, homens brancos pobres e potentados [...]” (ANASTASIA, 2005:19).
A Capela de Santo Antônio se assenta em antigo núcleo do início do século XVIII, sendo a sua feitura original atribuída ao início do século XVIII. Há relatos de que foi ouvido ainda “badalos” do sino da capela no momento do desmoronamento e de seu colapso.
Este local que já se constituía como um importante campo sagrado tradicional adquiriu outros e outros significados após este desastre tecnológico, devendo ser entendido enquanto uma “paisagem simbólica” com as marcas da tragédia fluida e dinâmica. Segundo Marcelina de Almeida (2013), o cemitério é um local pleno de significações que se inserem no campo dos dogmas, superstições, lendas e verdades. Um campo simbólico onde o invisível é evocado através do visível.
Por isto, estes sítios devem ser tratados de forma muito criteriosa, sobretudo junto aos moradores locais e descendentes dos que ali foram sepultados, devendo sempre privilegiar a sua proteção e reverência.
“Perturbar os mortos, mesmo em busca de conhecimento, não é mais aceito por inúmeros grupos sociais. Trata-se de uma violência contra a memória e contra a cultura, hoje vista como injustificável por alguns segmentos sociais. Por se tratar de um espaço que evoca ancestralidade, é necessária a correta observação de aspectos éticos, religiosos e científicos, antes e durante as intervenções arqueológicas no interior dos campos santos” (TAVARES, 2012).
A arqueóloga T. Lima, buscando subsidiar a elaboração de uma postura ética da Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB), no que se refere a pesquisa em sítios cemitérios históricos, elaborou artigo nos anos noventa em revista internacional que propôs o seguinte: “Restos humanos históricos não devem ser por princípio, perturbados, a menos que isso seja inevitável. O interesse científico não é considerado, por si só, razão suficiente para sua perturbação. Em caso de intervenção, o tratamento a ser dispensado aos restos humanos deve ser discutido com as populações descendentes, que terão sempre a última palavra em questão” (LIMA, 1994).
O cemitério deve ser interpretado e traduzido como ambiente simbólico em uma cidade por onde se apreende os estímulos sensoriais e a cosmologia das pessoas, além da sua organização social e territorial, por onde se dá laços afetivos dos seres humanos com o meio ambiente material” (TUAN, 1980).
Segundo o teólogo Leonardo Boff estamos vivenciando fruto da cultura dominante, uma cultura de medo e da guerra, voltados a valores cambiantes. Os valores relacionados à justiça social, direitos humanos e étnicos, respeito e sensibilidade à diversidade cultural e ao patrimônio cultural devem sempre prevalecer (BOFF, 2002).
Esta crise, segundo o pensador e sociólogo Z. Bauman é caracterizada pela “liquidez dos conceitos e dos valores” na pós-modernidade. Os conceitos volúveis, maleáveis e descartáveis, se refletem diretamente na vida das pessoas e nos seus direitos, as quais vêm a sofrer diante da mencionada crise de valores e da falta de referência humanitária, onde prevalecem os interesses econômicos e políticos imediatos e atitudes individualistas e autoritárias.
“Atualmente, o problema da identidade resulta principalmente da dificuldade de se manter fiel a qualquer identidade por muito tempo, da virtual impossibilidade de achar uma forma de expressão da identidade que tenha boa probabilidade de reconhecimento vitalício, e a resultante necessidade de não adotar nenhuma identidade com excessiva firmeza, a fim de poder abandoná-la de uma hora para a outra, se for preciso” (BAUMAM, 1998:155.
A Arqueologia da Paisagem é uma tendência teórico-metodológica, da qual este dossiê se nutriu também, que considera a necessidade da percepção dos estigmas deixados pelo tempo nas paisagens onde se situam os sítios arqueológicos estudados, valorizando o processo de ocupação humana e os sucessivos manejos do território e suas peculiaridades microespaciais e intrassítios. Certamente o desastre tecnológico ocorrido no vale do Gualaxo do Norte é um marco temporal do ponto de vista socioambiental excepcional na paisagem cultural.
Segundo a Instrução Normativa n. 1, de 2013, do Ministério da Integração Nacional, “Desastre Tecnológico” é definido em seu sétimo artigo:
“§ 3º São desastres tecnológicos aqueles originados de condições tecnológicas ou industriais, incluindo acidentes, procedimentos perigosos, falhas na infraestrutura ou atividades humanas específicas, que podem implicar em perdas humanas ou outros impactos à saúde, danos ao meio ambiente, à propriedade, interrupção dos serviços e distúrbios sociais e econômicos.”
Os desastres podem ocasionar estigmas e perdas materiais e humanas imensuráveis nas pessoas.  Nesse universo de danos, as pessoas afetadas podem ter perdido familiares, amigos, casa, estrutura de apoio comunitário, trabalho e outros bens de valor para a sobrevivência e afetivo, estando assim expostas a um contexto social vulnerável e incerto, e consequentemente a um grande estresse individual e coletivo. Um desgaste abrupto pode causar graves sequelas à saúde física e psicológica das pessoas envolvidas (REYES, 2006; BRITTON, 1986).
Bawden & Reycraft (2000) organizaram importante publicação a partir dos simpósios da 62ª Reunião Anual da Society for American Archaeology em Nashville, em 1997, que busca examinar e interpretar as evidências e as interações entre desastres e mudanças humanas no registro arqueológico.  As contribuições demonstram que a resposta humana ao desastre ambiental não é predeterminada e sim resultado de fatores culturais, econômicos, ideológicos e políticos. Estas primeiras discussões deram embasamento à construção da linha de pesquisa arqueologia de desastres que lida com o rescaldo de eventos de fatalidade em massa e lida com necessidades urgentes, como identificação de vítimas e investigação de cenas, insiste que as cenas das tragédias são provas e devem ser registradas, investigadas e musealizadas. Em alguns casos a arqueologia do desastre trabalha de forma afinada e atrelada com a arqueologia forense, possuindo, por isso, forte caráter humanitário e social (GOULD, 2007).
Garcia-Renedo (2008) acrescentou o termo “catástrofe” como sendo um evento ou desastre de maior grau de estresse coletivo. Este parece ser o cenário socioambiental e o contexto das comunidades atingidas do vale do Gualaxo do Norte.
Sobre os estigmas na paisagem o nível máximo da camada da lama que foi depositada tornou-se depois de rebaixada e assentada um marco da tragédia ocorrida em 2015, cujo conteúdo foi constituído por testemunhos variados deslocados através do movimento do deslizamento da lama. Configurou, assim, uma camada sotoposta de referência histórica e ambiental desta tragédia. A onda de lama deixou diferentes marcas nas paredes, por impregnação, nos postes, nas árvores e rochas colorizando a parte baixa dos mesmos atingidos pela avalanche.  Trata-se ainda de uma prova da tragédia crime, que não deve ser apagada e, sim, registrada  e reparada.
Segundo os geólogos Saadi e Campos (2017), a avalanche de lama deixou um rastro de destruição de vidas humanas e patrimonial no sentido amplo, por meio de uma corrente fluvial com altíssima turbidez que percorreu o restante do fundo de vale “empurrando” uma onda de cheia, removendo e/ou destruindo tudo o que encontrava no canal e sobre os baixos terraços e encostas que constituem as margens dos rios Gualaxo do Norte e do Carmo.
“Quatro meses após o desastre, houve assentamento e selamento do solo (hard-setting) formando uma crosta de areia fina/silte duríssima à penetração” (SCHAEFER et al. 2016: 19).
Importantíssimo lembrar que abaixo da camada de tecnossolo que está sendo recomposta pode ainda haver inúmeras estruturas e/ou bens móveis variados. Estes bens culturais e vestigiais sotopostos como exposto são bens da união.

Resquícios do Pré-Colonial no Gualaxo

Durante o período pré-colonial localidades que hoje pertencem ao município de Mariana e adjacências (incluindo o Espinhaço Meridional e a Serra da Moeda) fizeram parte de rotas de grupos humanos pelo menos nos últimos milênios.
O abrigo Mirandinha ou Gualaxo é um importante guia nesse sentido, pois se situa no vale do Gualaxo do Norte, na região de Camargos, a aproximadamente 6 Km do Núcleo Histórico Bento Rodrigues.
Por enquanto, é o único abrigo com figurações rupestres cadastrado no município de Mariana, sendo assim referência regional no que tange ao tipo abrigo sob rocha com grafismos pré-coloniais na região do Quadrilátero Ferrífero neste município.

 
Imagem 4 - Figurações Rupestres do abrigo arqueológico Mirandinha. Camargos, Mariana, MG. Foto: H. Piló, 2014. (Acervo: Artefactto Consultoria).

As figurações impressas no suporte do Abrigo Mirandinha, por suas características temáticas e estilísticas podem ser atribuídas a Tradição Planalto, que possivelmente é a mais antiga expressão gráfica e de longa duração, com suas devidas fases estilísticas, na região central de Minas Gerais. Essa tradição é identificada desde o norte do Paraná até o estado de Tocantins, sendo que a região de maior ocorrência corresponde aos Cerrados e às regiões serranas do Centro de Minas Gerais, onde suas figuras, a princípio, seriam as mais antigas e permanentes.
Caracteriza-se pela predominância visual (e, muitas vezes, quantitativa) de figuras de animais, quadrúpedes (sobretudo cervídeos) e peixes, além de formas abstratas, tais como traços, pontos e pectiformes. Os cervídeos e quadrúpedes são as representações mais comuns, mas, segundo as localidades e as épocas, há também representações de peixes isolados ou de cardumes, como ocorre em um nível pictural intermediário em abrigos na Serra do Cipó e Cocais, por exemplo. Há ainda representações de homens em sua maioria em formados por linhas, conhecidos com “lambdas” (BAETA, 2011).
Por sua importância no cenário regional este sítio arqueológico merecia inclusive tombamento, mas, sobretudo, programas eficazes de proteção especial.
Aldeões das terras baixas no Quadrilátero Ferrífero possivelmente transitavam nas zonas mais altas e campos rupestres utilizando os ambientes e trajetos de cumeadas, meia-encostas, fundos de vales e cachoeiras para inúmeras atividades cotidianas e ritualísticas, perpassando os territórios que compõem as serras da Calçada, Moeda, Cipó, Gandarela, Veloso, Conta História, Caraça e Espinhaço Meridional. Em Mariana, por exemplo, pode existir sítios arqueológicos a céu aberto Sapucaí ou associados a cavernas na região do Gualaxo e arredores.
Bento Rodrigues e muitos outros lugares do vale do rio Gualaxo do Norte são importantes sítios históricos e arqueológicos, antes e depois da Tragédia-Crime, obviamente, pois a lama decerto encobriu, destruiu parcialmente (em diferentes níveis) e deslocou vestígios e estruturas; todavia,  os sítios e muitos de seus componentes sempre estiveram na localidade e arredores, prova disto, é que poucos meses seguintes foram expostos e elucidados inúmeros segmentos de muros, curral, cochos, bases e paredes de casarios e da própria capela de São Bento, cemitério, caminhos e inúmeras modalidades de testemunhos móveis associados a unidades domésticas, comerciais, religiosas, de interesse pessoal e coletivo,  sendo algumas delas também de cunho “sacro”, religioso e mágico, associadas a diferentes períodos da história desses núcleos e de propriedade de diferentes pessoas da comunidade.
As marcas da lama e de seus danos, como quebras, rachaduras e/ou torções na cultura material, inclusive, deveriam ser consideradas e analisadas como um importante estigma a ser, aliás, mantido em pelo menos parte das peças e objetos.
Trata-se assim de um território munido de muitos conjuntos que merecem ser inventariados, contextualizados e protegidos, possuidores de grande valor patrimonial, arqueológico, intangível e museológico. A musealização deste amplo território e a atenção a alguns sítios tipológicos, tradicionais e suas paisagens transformadas e fluidas poderão ser importantes estratégias de gestão e de administração desta rica e complexa memória.
É notória a alta potencialidade arqueológica de Bento Rodrigues e arredores. Reforça-se que é muito provável que haja outros abrigos com figurações rupestres pré-coloniais nesta localidade. Esforços no sentido de rastreamentos por profissionais experientes sobre este tema devem ser incentivados o mais urgentemente possível, visando o seu inventário e proteção.  O tombamento de Bento Rodrigues e a iniciativa de “Declaração de Significância” por parte do ICOMOS já vem sendo um importante passo nesse sentido.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES EM SÍNTESE

Premente externar inicialmente que lamentamos profundamente a Tragédia de Mariana, que completa três anos. Todavia, é importante alertar para as demais barragens consideradas instáveis ou inconclusivas sobre o seu aspecto estrutural, indicadas pelo próprio governo em Minas Gerais em inventário elaborado após a Tragédia de Mariana (2016) e a urgente necessidade de medidas preventivas e corretivas que impeçam que outros colapsos similares e/ou de diferentes magnitudes possam ocorrer.
Este estudo no âmbito do patrimônio arqueológico teve o intuito de colaborar de forma positiva propondo ações complementares que possam ainda ser refletidas e recomendadas no sentido de aportar a construção e a valorização da memória dos bens de interesse arqueológico e histórico afetados pelo rompimento da Barragem de Fundão em Mariana, MG. A orientação da Procuradora da República em São Paulo, Dra. Inês Virgínia Soares, deve sempre ser seguida:
“A não utilização de metodologia arqueológica durante todo o processo de pesquisa, salvamento e resgate, com a descontextualização do bem - se sua história ou de sua origem - acarreta risco ao registro das informações bem como no repasse destas, pela produção e registro do conhecimento para as próximas gerações. Nesse sentido, a realização (produção científica) e o registro do trabalho acadêmico e das pesquisas arqueológicas expressam uma das vertentes mais importantes da segurança para as gerações futuras. Porém, a própria natureza frágil e não renovável do bem realça a necessidade de cuidados e indica sempre a presença de riscos, mesmo que o manejo do patrimônio conte com arqueólogo ou pesquisador habilitado e apto para a atividade. A utilização da metodologia arqueológica não significa certeza cientifica, mas serve para delinear, com maior ou menor precisão, a situação de risco” (SOARES, 2007: 92).            
A partir das leituras e análises feitas do conjunto dos documentos disponibilizados e levantados em nossas pesquisas, baseando-se ainda nas normas e conceitos patrimoniais nacionais e internacionais, condutas éticas e legislação de referência, além do conhecimento acumulado que a nossa equipe possui sobre o município de Mariana e demais localidades do vale do rio Doce, reuniões e entrevistas com representantes das comunidades atingidas além de participação em seminários técnicos multidisciplinares, reitera-se que o vale do rio Gualaxo é munido de inúmeros lugares de interesse histórico, arqueológico e espeleológico, onde há ainda inúmeros estigmas ou marcas de mineração, além de sedes de fazendas antigas e estruturas associadas ao processo de colonização dessa região, tais como, inúmeros tipos de áreas de trabalho, muros, canais, galerias, estradas e outros tipos de testemunhos materiais.
Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, dentre muitos outros lugares do vale do rio Gualaxo do Norte, são importantes sítios históricos e arqueológicos, antes e depois da Tragédia, obviamente, pois a lama decerto encobriu, destruiu parcialmente (em diferentes níveis) e deslocou vestígios e estruturas; todavia, os sítios e muitos de seus componentes sempre estiveram na localidade e arredores, prova disto, é que poucos meses seguintes foram expostos e elucidados inúmeros segmentos de muros, curral, cochos, bases e paredes de casarios e da própria capela de São Bento, cemitério, caminhos e inúmeras modalidades de testemunhos móveis associados a unidades domésticas, comerciais, religiosas, de interesse pessoal e coletivo,  sendo algumas delas também de cunho “sacro”, religioso e mágico, associadas a diferentes períodos da história desses núcleos e de propriedade de diferentes pessoas da comunidade.
Após a Tragédia, os lugares atingidos e os diversos tipos e variedades de objetos e artefatos coletados (listados nos relatórios periódicos das empresas contratadas pela Samarco) e os que ainda, felizmente estão in loco, agregam, na verdade, importância peculiar, pois se encontram impregnados de distintos valores, sentidos e significados relacionados também a esta grave catástrofe e aos efeitos causados por ela. As marcas da lama tóxica e de seus danos, como quebras, rachaduras e/ou torções na cultura material, inclusive, deveriam ser consideradas e analisadas como um importante estigma a ser, aliás, mantido em pelo menos parte das peças e objetos.
Trata-se assim de um território munido de muitos conjuntos que merecem ser inventariados, contextualizados e protegidos, possuidores de grande valor patrimonial, arqueológico, intangível e museológico. A musealização deste amplo território e a atenção a alguns sítios tipológicos, tradicionais e suas paisagens transformadas e fluidas, poderá ser importante estratégia de gestão e de administração desta rica e complexa memória.
Aconselha-se à Comissão(s) de Atingidos/as a assessoria de uma equipe com formação jurídica e patrimonial na proposição e acordos referentes também às medidas reparatórias e/ou compensatórias neste âmbito. Passamos por momentos onde uma política de esquecimento de memórias vem dominando instituições públicas e pessoas. Lembremos da outra grande tragédia que ocorreu no Museu Nacional do Rio de Janeiro com o inaceitável incêndio que destruiu coleções e acervos inigualáveis em 2018. Nosso intuito, aqui apresentado parcialmente ou em recortes, vem sendo valorizar os interesses coletivos das comunidades em suas diferenças, respeitando os seus direitos constitucionais garantidos, a sua variada cultura material, histórias, além dos seus espaços de vivência e de reapropriações. Conquistas e Direitos, enfim.

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[1] Os estudos de arqueologia no vale do Gualaxo do norte fizeram parte de uma pesquisa contratada pela Cáritas Brasileira, regional Minas Gerais, organismo da Conferência Nacional dos Bispos (CNBB), à empresa Pólen Consultoria e Projetos, em 2017, constituída por uma equipe multidisciplinar tendo por fim a elaboração de um “Diagnóstico Preliminar dos Bens Culturais Identificados no Território Atingido em Mariana pelo Rompimento da Barragem de Fundão” dando subsídios à assessoria técnica dos atingidos pela barragem de rejeitos da Samarco em Mariana, MG, visando a democratização e difusão das informações colaborando nas decisões relativas à reparação de perdas e danos.
[2] Arqueólogos e Historiadores (Artefactto Consultoria)
[3] Termo utilizado pelo MPF que tipifica legalmente o evento. Reforça o enquadramento do desastre como homicídio qualificado com dolo eventual.  (cf. http://www.mpf.mp.br/mg/sala-de-imprensa/noticias-mg/mpf-denuncia-26-por-tragedia-em-mariana-mg  e https://fase.org.br/wp-content/uploads/2016/11/Nota-da-Articula%C3%A7%C3%A3o-Internacional-dos-Atingidos-e-Atingidas-pela-Vale.pdf)
[4] Termo também adequado para o tema aqui tratado, mas que evidencia o tipo de evento ou colapso, no caso, quando não possui origem natural e sim tecnológica, a partir de erro ou negligência humana e de planejamento. Definido na Instrução Normativa IN n. 1 de 2012 - Ministério da Integração Nacional.
[5] Meio Ambiente considerado em sua máxima complexidade, em sua máxima extensão; todas as formas de vida interagindo entre si e com todas suas manifestações materiais e intangíveis.
[6] International Committee on Archaeological Heritage Management.
[7] International Committee on Underwater Cultural Heritage.
[8] A Nova História está associada, para muitos aos historiadores a L. Febvre e a M. Bloch, que fundaram a revista Annales em 1929 para divulgar a sua nova abordagem, e na geração seguinte, a Fernand Braudel.  Difícil negar a importância do movimento para a renovação da história liderado por esses estudiosos. Todavia, eles não estavam sozinhos tendo na Grã-Bretanha e Alemanha pesquisadores insatisfeitos com a história positivista e tradicional (Cf. BURKE, 1992).
[9] Em 2003, foi criada a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) por meio de uma medida provisória, convertida na lei 10.678 e instituída a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial, por meio do Decreto n. 4.886, que visa a redução das desigualdades raciais no Brasil, com ênfase na população negra e sua cultura tradicional e afrodescendente. Os espaços das práticas religiosas afrobrasileiras são considerados o “locus de resistência cultural negra” (CONAPIR, 2005). Sobre a religiosidade popular e a diáspora africana em Mariana Cf. SOUZA, 1995; NOGUEIRA, 2009.
[10] “Estrada Real” aplica-se aos trechos de caminhos do período colonial onde foi implantado controle fiscal por parte da coroa com a instalação de registros e pedágios. O termo caminhos antigos parece assim bem mais apropriado e abrangente, tanto no tempo, quanto no espaço, pois abarca outras malhas de acessos, tais como, trilhas, passagens, travessias, rotas de fuga, descaminhos, entre outros.