Gilvander é frei e padre da Ordem dos carmelitas, Doutor em Educação pela FAE/UFMG; bacharel e licenciado em Filosofia pela UFPR, bacharel em Teologia pelo ITESP/SP, mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas, em Minas Gerais.
sexta-feira, 29 de setembro de 2017
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domingo, 24 de setembro de 2017
Mateus 20,1-16: parábola dos trabalhadores da vinha, justiça anticapitalista.
Mateus
20,1-16: parábola dos trabalhadores da vinha, justiça anticapitalista.
Por frei Gilvander Luís
Moreira[1]
Enquanto tomava café
da manhã em uma lanchonete na beira de uma estrada, voltando de um curso
bíblico do CEBI na cidade de Coluna, MG, - o assunto tinha sido as Primeiras
Comunidades Cristãs e nossa prática cristã -, vi e ouvi em uma TV um integrante
da alta hierarquia da igreja católica tecer comentários sobre o Evangelho lido,
hoje, dia 24 de setembro de 2017, segundo o calendário litúrgico, salvo
exceções, em todas as celebrações da igreja católica. Trata-se do Evangelho de
Mateus 20,1-16: a parábola dos trabalhadores da vinha. Achei horrorosa a
interpretação feita: fundamentalista, espiritualizante e retirando toda eloqüência
do contexto histórico abordado pela parábola. Senti-me impelido a socializar
outra interpretação de Mt 20,1-16 na perspectiva das Comunidades Eclesiais de
Base (CEBs) e das Pastorais Sociais. Ei-la, abaixo.
A parábola narrada em
Mateus 20,1-16 é a dos trabalhadores na vinha. Diz que “um pai de família saiu
cedo para contratar trabalhadores para sua vinha” (Mt 20,1). Tornou-se dono de
uma vinha, mas continuava sendo acima de tudo pai. Começou a contratar trabalhadores
por volta das 6 horas da manhã. Contratou outros às 9 horas, outros às 12, às
15 horas, etc. Combinou que pagaria um denário para cada um. À tarde, à busca
de mais trabalhadores, observou que muitos ainda continuavam na praça porque
ninguém os tinha contratado (Mt 20,7). Os últimos contratados trabalharam
apenas uma hora. Como prescreve a Bíblia, ao final do dia de trabalho, o
salário deve ser pago (Tiago 5,4). O pai e dono da vinha disse ao seu administrador
para pagar um denário para cada um, conforme o combinado, começando pelos
últimos. Os contaminados pelo espírito da meritocracia do capitalismo
reclamaram: “Não é justo os que trabalharam apenas uma hora receber valor igual
a nós que trabalhamos mais” (Mt 20,12). Eis, em síntese, o relato da parábola.
Por que o pai e dono
da vinha agiu de forma justa? O dono da vinha disse àqueles que foram
contratados para o trabalho às nove horas da manhã: “Vão para minha vinha, e eu
lhes pagarei o que for justo” (Mt 20,4). Assim como Noé e José, o pai e dono da
vinha da parábola primava por ser justo, mas não justiça legalista do status quo. Segundo a parábola todos
recebem igualmente. Os que trabalharam o dia inteiro e os que trabalharam uma
hora apenas. Que justiça é essa, que incomoda quem tem o espírito/ideologia do
capitalismo na cabeça? Para se entender a parábola, contudo, é necessário
prestar atenção ao diálogo de Mt 20,6-7. O dono da vinha pergunta aos
trabalhadores que se encontram na praça às cinco horas da tarde: “Por que vocês
estão aí o tempo todo sem fazer nada?” E a resposta vem na hora: “Porque
ninguém nos contratou”. Desemprego já existia naquela época... Assim como nas
cidades há sempre o local onde se podem contratar trabalhadores: um ponto de
encontro entre desempregados e quem precisa de trabalhadores, na praça estava
quem procurava emprego. Se fossem irresponsáveis, estariam em casa dormindo. Mas
se está na praça, significa que estão procurando emprego. Podemos imaginar quem
teria sido deixado lá na praça, sem ser contratado: as pessoas enfraquecidas,
quem sabe alguns doentes, quem sabe deficientes ou idosos (hoje, diríamos,
jovens inexperientes, adultos com idade avançada já sem a força da juventude, homossexuais,
negros, analfabetos, os “despreparados para o mercado”, etc)...
Como praticar uma
justiça que não reproduza os esquemas de discriminação e marginalização? O
pagamento igual justamente vem nessa direção: quem trabalhou menos tem as
mesmas necessidades que as demais pessoas! Todos têm família e despesas
semelhantes. No Brasil devemos lutar para que todos recebam um salário – renda mínima
-, independentemente se estão ou não trabalhando. A radicalidade desta parábola
faz pensar em tantas práticas que se apresentam como justas. Em uma sociedade
forjada em cima de desigualdades para se conquistar igualdade é preciso tratar
de forma desigual os desiguais. Para as comunidades do Evangelho de Mateus o
desafio era praticar uma justiça maior: a partir da misericórdia. É o que se
define no julgamento decisivo: veja Mt 25,31-46: “Eu estava com fome, nu,
preso...”! Será justo quem se comprometer com a causa dos famintos, dos
encarcerados, dos injustiçados.
Os ensinamentos de
Jesus se distinguem dos ensinamentos dos fariseus ritualistas, dos escribas e
saduceus. A justiça do reino de Deus – Deus da vida para todos e tudo - pretende
superar aquela dos fariseus, escribas e saduceus, e acolher quem estava sendo
injustiçado. Para isso foi necessário romper com esquemas já estabelecidos,
formas comuns de se viver e interpretar a Lei. Isso para ser fiel àqueles que as
comunidades tinham certeza de que estavam presentes nos pequeninos.
Segundo cálculos de
alguns estudiosos, um trabalhador como aquele da parábola de Mt 20,1-16, que
recebeu um denário por um dia de trabalho, levaria mais de quinze anos para
conseguir juntar um único talento! As parábolas devem ser interpretadas como
parábolas, mas não podemos esquecer que são construídas com tijolos da realidade
histórica. Por isso as parábolas falam de desemprego (veja Mt 20,1-16) e de
trabalho duro (Mt 13,1-9.24-33.47-50).
Enfim, a parábola
narrada em Mateus 20,1-16 é mais um dos textos em que as primeiras comunidades cristãs
expressam sua compreensão e experiência de justiça, que não mede as pessoas
pelo que elas produzem – não se mede por meritocracia -, mas por aquilo de que
precisam. Se todas têm necessidades iguais, logo o salário deve ser igual para
todos, independentemente se foi contratado antes ou depois, se produziu mais ou
menos. Quem está contaminado pelo espírito do capitalismo – sistema satânico e
máquina de moer vidas – não consegue entender a parábola dos trabalhadores da
vinha: parábola anticapitalista que aponta para a construção de uma sociedade
verdadeiramente justa a partir das necessidades das pessoas e não a partir do
mérito que muitas vezes é construído à custa do sangue de outros.
Belo Horizonte, MG,
24/9/2017.
[1]
Padre da Ordem
dos carmelitas; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em
Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto
Bíblico de Roma, Itália; doutor em Educação pela FAE/UFMG; assessor da CPT,
CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; e-mail: gilvanderlm@gmail.com –www.freigilvander.blogspot.com.br
- www.gilvander.org.br
– www.twitter.com/gilvanderluis
– Facebook: Gilvander Moreira III
quinta-feira, 21 de setembro de 2017
MLB, CPT E OCUPAÇÃO NOVA CACHOEIRA CONQUISTAM VITÓRIA EM SÃO JOSÉ DA LAPA, MG: terra e moradia digna.
MLB, CPT E OCUPAÇÃO NOVA
CACHOEIRA CONQUISTAM VITÓRIA EM SÃO JOSÉ DA LAPA, MG: terra e moradia digna.
Ontem, dia 20 de setembro de
2017, se constituiu uma data histórica para a luta da classe trabalhadora pela
reforma urbana no Brasil. A Ocupação Nova Cachoeira, desde 2013, no município
de São José da Lapa/MG, região metropolitana de Belo Horizonte, com quase 100
famílias que não suportavam mais a pesadíssima cruz do aluguel, da especulação
imobiliária e a falta de política habitacional séria, diante da omissão do
poder público em realizar políticas públicas de habitação social, bem como a
especulação de proprietários particulares que não cumpriram com nenhuma função
social da terra, ocuparam três terrenos completamente abandonados há anos, uma
parte de propriedade pública municipal, e outras duas partes de propriedade
particulares, ali edificando suas casas de alvenaria e consolidando suas
vidas.
Por se tratar de uma
ocupação espontânea, não havia nenhum movimento social atuante na ocupação,
quando no final do ano de 2015, o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e
Favelas (MLB) foi chamado a intervir diante da iminência de um despejo violento
a ser praticado pela aliança espúria entre a Polícia Militar de Minas Gerais
(PMMG - comandada pelo governador Fernando Pimentel do Partido dos
Trabalhadores - PT), Poder Judiciário e os três proprietários das áreas ocupadas
(dois particulares e a prefeitura de São José da Lapa - gestão do Partido dos
Trabalhadores). Naquela ocasião, o despejo somente foi evitado graças a luta
política-jurídica das famílias (que em sua maioria não aceitaram o despejo e
ficaram dispostas a resistir a um despejo sem alternativa digna), do MLB e da
Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, o que gerou como fruto da
resistência justa e necessária, há a apenas cerca de uma hora antes da PMMG
iniciar o despejo, uma liminar junto ao Desembargador plantonista obrigando-a a
desmontar seu aparato repressor já preparado para derramar o sangue de
trabalhadores e trabalhadoras. Passados dois anos, a referida liminar foi
revogada por uma decisão insensata e premiadora da especulação imobiliária proferida
pela 5° Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Voltou a
tensão, pois o TJMG mandava despejar uma comunidade já consolidada, sem nenhuma
alternativa digna. O povo da Ocupação Nova Cachoeira bateu o pé, o MLB e a CPT
reforçaram a luta e, sob pressão da comunidade Nova Cachoeira, a Prefeitura de
São José da Lapa/MG chamou a sua responsabilidade constitucional para si e fez
o que todo gestor público deve fazer em conflitos envolvendo ocupações urbanas:
oferecer uma alternativa digna que respeite o direito constitucional e humano à
moradia. Nesse sentido, o prefeito Diego se comprometeu a retirar o processo
judicial de reintegração de posse afeto à parte do terreno de propriedade do
município de São José da Lapa/MG, e assinou o decreto 1.558/2017, declarando de
utilidade pública para fins de moradia popular o restante da área da ocupação
Nova Cachoeira, o que lhe permitirá realizar a desapropriação no prazo de 5
anos, afastando qualquer possibilidade de despejo nesse período. Presente também
na reunião, ontem, Rômulo Perilli, diretor da COPASA em Belo Horizonte e região
metropolitana, assumiu o compromisso de iniciar o processo para instalação de
rede de água e saneamento na Ocupação-comunidade Nova Cachoeira. A secretaria
de obras da prefeitura de São José da Lapa fará também intervenções na
comunidade para melhorar o acesso para que pessoas em cadeira de rodas possam
transitar em segurança.
Há ainda muita luta a se fazer para concretizar a desapropriação e a regularização fundiária da ocupação, mas um grande passo foi dado por nós, e esperamos que essa conquista ilumine outros conflitos fundiários para terem um desfecho como este.
Há ainda muita luta a se fazer para concretizar a desapropriação e a regularização fundiária da ocupação, mas um grande passo foi dado por nós, e esperamos que essa conquista ilumine outros conflitos fundiários para terem um desfecho como este.
Assinam essa Nota Pública:
MLB (Movimento de Luta nos
Bairros, Vilas e Favelas)
CPT/MG (Comissão Pastoral da
Terra)
Coordenação da
Ocupação-comunidade Nova Cachoeira.
São José da Lapa, MG, 21 de
setembro de 2017.
Obs.: em breve, divulgaremos
vídeo sobre essa conquista.
quarta-feira, 20 de setembro de 2017
terça-feira, 19 de setembro de 2017
segunda-feira, 18 de setembro de 2017
sábado, 16 de setembro de 2017
Uma igreja justa e sempre próxima do povo. Este é o sonho do frei Gilvander. Entrevista ao Jornal Marco, da PUC Minas.
Uma igreja justa e
sempre próxima do povo. Este é o sonho do frei Gilvander.
Entrevista que frei Gilvander concedeu ao Jornal MARCO,
Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo, da Faculdade de Comunicação e Artes,
da PUC Minas, Ano 44, edição 331, setembro de 2017, p. 16. Entrevista realizada
pelas estudantes Marina Menta e Sophia Tibúrcio, 1º e 3º períodos, com
fotografia de Elisa Senra.
Título da Entrevista:
Religioso dedica toda a sua vida à justiça social
Um
homem a serviço de Deus, um soldado da dignidade humana. Talvez essa seja uma
boa definição do frei Gilvander Luís Moreira, da Ordem dos Carmelitas, um dos
grandes defensores das populações que ocupam áreas ociosas na Região Metropolitana
de Belo Horizonte e lutam pela realização do seu direito de ter uma casa própria.
Frei
Gilvander já foi trabalhador na roça, vítima de exploração de patrões e hoje é
bacharel e licenciado em Filosofia pela Universidade Federal do Paraná,
bacharel em Teologia pelo Instituto Teológico São Paulo, mestre em Exegese
Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; doutor em Educação
pela Faculdade de Educação da UFMG; assessor da Comissão Pastoral da Terra
(CPT), CEBs, SAB e de Ocupações Urbanas, em Minas
Gerais. Nessa entrevista, frei Gilvander comenta a crise política e econômica atual do Brasil e aponta
a importância do papel do sacerdote na sociedade.
Jornal Marco: Como o sr. vê a situação
dos trabalhadores no atual momento e que soluções poderiam ser buscadas para
impedir mais perdas de direitos?
Frei Gilvander: “A classe trabalhadora e a
camponesa não estão sendo apenas exploradas, estão sendo superexploradas. A
opressão que o sistema capitalista está perpetrando hoje contra estas classes
nunca foi tão cruel na história, a exploração atingiu um nível insuportável.
Então, o problema principal, hoje, no Brasil não é a corrupção: 80% a 90% da
injustiça e da violência que pairam sobre o povo brasileiro são causados pela
exploração do capital em cima da mão de obra.”
Jornal Marco: No cenário político e econômico de dificuldades
que passa o Brasil, qual deve ser o papel dos padres?
Frei Gilvander: “O papel de seguir, na
prática, Jesus Cristo, o evangelho Dele e de seguir, também, o que diz o papa
Francisco. Se fizermos isso, já vamos dar uma contribuição importante para
superar a montanha de injustiças e violências que, infelizmente, está permeando
o tecido social brasileiro.”
Jornal Marco: O que os padres podem
fazer?
Frei Gilvander: “A solução que eu e os
companheiros da Comissão Pastoral da Terra e dos movimentos sociais populares
propomos é a gente seguir organizando o povo para construir um poder popular em
todos os bairros, todos os cantos e recantos, nas periferias, nas cidades, no
campo, em todos os lugares. Tem que ter o povo organizado fazendo pressão para
frear essa avalanche de violência, porque não pode depender mais da democracia
representativa com políticos desonestos que não representam ninguém.”
Jornal Marco: O sr. acredita na
possibilidade de mudar nossa sociedade? Como?
Frei Gilvander: "Eu
não vejo uma solução a partir dos poderosos; a solução tem que ser a partir da
união dos pequenos. Isso passa por organização de base, passa por formação. Nós
temos que, hoje, fazer uma conversão social das pessoas religiosas, superando o
atual descolamento da fé com o social, com o político, com o econômico. A
solução existe, só não é fácil porque não é a partir de alguns figurões de cima
que vamos conseguir fazer mudanças. Tem que ser um grande movimento de resgate
dos verdadeiros valores da vida; temos que despertar a sociedade para ver a
beleza que é a pessoa ser justa, honesta, solidária, desenvolver
responsabilidades sociais, cultivar a responsabilidade ambiental.”
Jornal Marco: Faltam padres no Brasil e no mundo?
Frei Gilvander: “Não
acho que faltam padres, eu acho que falta valorizarmos mais o sacerdócio comum
e não o sacerdócio ordenado. Se a gente for olhar na Bíblia, principalmente nos
evangelhos do Novo Testamento, o que é mais valorizado são as lideranças
leigas. As primeiras comunidades que celebravam a eucaristia não tinham padre.
Os leigos, as lideranças e, em sua maior parte, mulheres, celebravam. Então, é
errado pedagogicamente essa hiper-valorização do sacerdócio ordenado, porque estaríamos
privatizando a fé.”
Jornal Marco: O que é ser sacerdote?
Frei Gilvander: “Sacerdote
significa, etimologicamente, fazer sagrado; a missão de revelar a sacralidade
existente nas pessoas, na biodiversidade, em tudo. Na verdade, sacerdote não é
aquele que de uma forma mágica vai impor o sagrado sobre a realidade; a missão
dele é revelar e explicitar a dimensão sagrada já existente no real. Tudo é
sagrado. O profano é uma das realidades mais sagradas, como, por exemplo, o trabalho,
as pessoas. Onde tem vida aí está o sagrado.
Ser sacerdote é contribuir para que as pessoas percebam a luz e a força
divina, permeando e perpassando toda a realidade.”
Jornal Marco: O sr. teve de renunciar a
muita coisa?
Frei Gilvander: “Sim,
toda opção implica uma renúncia. Para ser frei e padre eu renunciei a ter uma
companheira, casar e formar uma família, mas na vida é sempre assim. Outro exemplo
é o de que abdiquei de ter filhos, mas conheço dez crianças que carregam meu
nome porque as mamães e os papais colocaram porque admiram o trabalho pastoral que
eu faço. Eu não gerei nenhum filho, mas sinto que tenho um monte de filhos por
aí. Então a gente renuncia a alguma coisa, mas quando a vocação é desenvolvida
com paixão e dedicação, vale a pena.”
Jornal Marco: O que o motivou a ser religioso? Qual foi a reação de sua família?
Frei Gilvander: “Mil
e uma circunstâncias, mas vou falar as principais. Uma delas são meus pais,
porque eram pessoas muito justas, solidárias, amigas de todo mundo. Então, desde
pequeno, eu fui formado e educado para ser uma pessoa solidária, justa, honesta
e isso contribuiu. Outro aspecto é que eu tive uma infância e uma adolescência
muito sofridas, no sentido de viver sem terra, sem moradia, trabalhar na roça e
latifúndio, e quando o fazendeiro levava metade da nossa produção, eu escutava
no meu coração duas afirmações, que diziam “Deus não quer isso”, e “isso não é
justo”. Então, com essa experiência de ser explorado, cresceu em mim o desejo
de ser frei e padre, para ajudar a construir uma sociedade justa, solidária,
lutar contra as injustiças.”
Jornal Marco: O que o deixa mais feliz
na realização do seu trabalho e missão?
Frei Gilvander: “Deixa-me
feliz perceber que, quando a gente faz esse trabalho de base, nessas lutas
populares a gente conquista direitos humanos e sociais. Só para citar um exemplo,
nos últimos dez anos a Prefeitura de Belo Horizonte destruiu e demoliu mais de
15 mil casas para alargar avenidas, construir viadutos, então eu me pergunto:
“será que a dignidade dos automóveis tem mais valor que a dignidade humana?” E a
gente luta contra isso. Na luta coletiva as Ocupações em Belo Horizonte, nos últimos
10 anos, construíram mais de 15 mil casas próprias e dignas.”
Jornal
Marco: Como o sr. vê as posições e ideias inovadoras do papa Francisco?
Frei Gilvander: “Com muita alegria,
o papa Francisco está sendo uma bênção. É o verdadeiro pastor, bom samaritano,
um verdadeiro profeta. O que está deixando muito a desejar nas igrejas de hoje
são alguns padres jovens e seminaristas que não estão seguindo o caminho do
papa. Antes de se tornar papa, ele trabalhou com os pobres mais de 30 anos,
então é um homem muito solidário e está ajudando a libertar a Igreja de muitas coisas
horrorosas.”
Jornal
Marco: As igrejas (neo)pentecostais vêm ganhando espaço cada vez mais no Brasil,
atraindo fiéis especialmente nas periferias das cidades. Qual a causa disto?
Frei
Gilvander:
“Várias causas. Uma delas é o conservadorismo da Igreja Católica com padres moralistas
e autoritários. Outra causa é o capitalismo, quanto mais ele aumenta o nível de
opressão, mais deixa as pessoas angustiadas, buscando um “Oásis”, uma aba de
salvação, então correm para as Igrejas (neo)pentecostais que lhes prometem isto.
Lá são abraçadas, acolhidas e vivenciam uma literatura de auto ajuda ao lidar
com as grandes opressões. Por um lado as pessoas são acolhidas, mas, por outro,
são sugadas através do dízimo e do que se chama de “teologia da prosperidade”.
Nesse caso, se desenvolve uma grande
mentira, que é fruto de uma falsa interpretação da Bíblia.”
Jornal
Marco: A
igreja Católica tem dificuldade de dialogar com o povo mais humilde? Por quê? Frei
Gilvander: “Aconteceu na Igreja Católica de 1962 a 1965 o Concílio do Vaticano
II, que abriu a Igreja para o mundo, para opção pelos pobres, para o profetismo,
para a inculturação. Depois de cinco conferências dos bispos latino-americanos,
a opção pelos pobres e o protagonismo dos leigos permaneceu. Infelizmente, nos
pontificados de João Paulo II e do Ratzinger, a cúpula da Igreja foi gradativamente
abandonando a opção pelos pobres. Agora o papa Francisco está sinalizando para
as igrejas corrigirem esse grave erro e retomar a opção pelos pobres, conviver
com eles e serem solidárias com suas lutas.”
sexta-feira, 15 de setembro de 2017
quinta-feira, 14 de setembro de 2017
quarta-feira, 13 de setembro de 2017
terça-feira, 12 de setembro de 2017
domingo, 10 de setembro de 2017
sábado, 9 de setembro de 2017
quarta-feira, 6 de setembro de 2017
Ocupação Carolina Maria de Jesus, no centro de Belo Horizonte, MG. Cerca de 200 famílias se juntam ao MLB determinadas a conquistar a moradia digna!!!
Ocupação Carolina
Maria de Jesus, no centro de Belo Horizonte, MG. Cerca de 200 famílias se
juntam ao MLB determinadas a conquistar a moradia digna!!!
Enquanto
o centro não chega à periferia, a periferia chega ao centro. A Ocupação
Carolina Maria de Jesus, localizada na Av. Afonso Pena nº 2.300, no coração de
Belo Horizonte, MG, traz à tona a enorme incoerência entre as quase 80 mil
famílias sem casa de Belo Horizonte e os mais de 171 mil imóveis e terrenos
vazios na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH)! As ocupações são uma
resposta para essa desigualdade e imensa injustiça social. Nossa luta é para
fazer valer os direitos à moradia digna, o direito à terra e o combate à gestão
empresarial da nossa cidade, uma resistência frente a higienização e
gentrificação do centro de Belo Horizonte!
A
ocupação homenageia Carolina Maria de Jesus, mulher negra, mãe de quatro
filhos, semi-alfabetizada, escritora e moradora da favela do Canindé, em São
Paulo. Trabalhava como catadora de lixo e com os cadernos que encontrava ela
escrevia sobre o seu dia-a-dia na favela. Considerada uma importante escritora
brasileira, é autora do livro Quarto de
Despejo – Diário de uma favelada, uma das obras mais vendidas e um dos
primeiros relatos sobre a realidade de marginalização, denunciando a
desigualdade social e o racismo.
O
Movimento de Luta de Bairros, Vilas e Favelas (MLB) reivindica que o prédio
seja destinado para moradia dessas famílias, que sofreram por anos com a falta
de habitação digna e adequada, condição fundamental para constituírem suas
vidas. Somos uma luta contra a especulação imobiliária e pela efetivação do
direito à cidade para uma parcela da população que sempre teve a cidade negada!
A região central de Belo Horizonte é concentradora de trabalhos, infra-estruturas
e serviços que são negados a grande parte das famílias periféricas da capital
mineira. Ocupar o centro é possibilitar acesso aos serviços básicos de saúde,
educação, transporte e oportunidades de emprego a quem precisa!
Segundo
a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001),
toda propriedade deve cumprir uma função social, seja ela habitacional,
ambiental, cultural ou econômica. Terrenos e imóveis que permanecem vazios não
cumprem nenhuma função social. Ao contrário, incentivam o processo de
especulação imobiliária, que eleva o preço do solo urbano, gerando acumulação
de capital para seus proprietários. As ocupações são uma resposta para fazer
valer os direitos de acesso a terra e garantir que a função social da
propriedade seja cumprida!!!
Por
isso, buscamos diálogo com o poder público sobre a existência de tantos
edifícios vazios espalhados no centro de Belo Horizonte. Em 2009, a Prefeitura
de Belo Horizonte (PBH) publicou o Plano de Reabilitação da Região do
Hipercentro, que trazia um estudo indicando existir só na região do hipercentro
um total de 107 imóveis vazios e lotes vagos sem uso, isso sem contar os 165
lotes que são usados como estacionamento!!!! Vários desses imóveis continuam na
mesma situação!!!
Edifícios
sem usos comprovados por mais de cinco (5) anos estão sujeitos à aplicação de
vários instrumentos criados para garantir o cumprimento da função social: desde
IPTU progressivo no tempo, que aumenta o valor dos impostos a serem pagos pelo
imóvel a cada ano vazio, até a desapropriação do terreno, com transferência da
propriedade ao Poder Público. Queremos que esses instrumentos sejam usados para
criar uma cidade mais justa!
Vamos
dar vida ao centro de Belo Horizonte com a classe trabalhadora dessa cidade:
onde antes existia vazio agora existe esperança; onde antes existia um vazio, brotou
nas noites frias de Belo Horizonte e existem famílias com um sonho. Reprimir e
reintegrar pisando na Constituição e violando a dignidade humana desintegra
sonhos lindos que nasceram no coração de Belo Horizonte. Por diálogo clamamos!
Morar dignamente é um direito humano!
Reforma
urbana popular já!
Assina
essa nota: MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas).
Apoio:
Comissão Pastoral da Terra (CPT) e ampla Rede de Apoio.