Gilvander é frei e padre da Ordem dos carmelitas, Doutor em Educação pela FAE/UFMG; bacharel e licenciado em Filosofia pela UFPR, bacharel em Teologia pelo ITESP/SP, mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas, em Minas Gerais.
domingo, 27 de setembro de 2015
sábado, 26 de setembro de 2015
A prisão de Jobert Fernando é ilegal, injusta e perseguição a quem luta contra injustiças.
A
prisão de Jobert Fernando de Paula é ilegal, injusta e perseguição a quem luta
contra injustiças.
Por frei Gilvander
Moreira, da CPT.
Dia 25 de setembro de
2015, ficamos indignados ao saber da prisão do companheiro lutador Jobert
Fernando de Paula, trabalhador da CEMIG, sindicalista do SINDIELETRO, militante
do Movimento Luta de Classes e do MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e
Favelas). Jobert está preso no Ceresp de Nova Lima, região metropolitana de
Belo Horizonte, MG. Jobert foi preso como bode expiatório. Segundo o advogado
Thales Viote Augusto é uma clara criminalização das ocupações urbanas. Um pátio
de carros da prefeitura de Nova Lima, que fica ao lado de uma das ocupações
urbanas, pegou fogo e querem incriminar alguém, preferencialmente que seja das
ocupações. O caso tem um pano de fundo parecido com o que o juiz Sérgio Moro
tem feito. Jobert foi preso para “confessar” ou entregar quem provocou o
referido incêndio. Os advogados do Sindieletro estão atuando em prol de Jobert.
“A prisão dele é arbitrária, pois do ponto de vista legal ele já poderia ter
sido liberado”, afirma o advogado Thales Viote.
Em 2004, ano da
Campanha da Fraternidade sobre Água, fonte de vida, ao criarmos o Movimento
Capão Xavier Vivo, que lutou em defesa dos quatro mananciais de Capação Xavier
– 10% do abastecimento público de Belo Horizonte -, contra a abertura da mina
Capão Xavier, da Mineradora Vale, sofremos ameaças de morte e vimos de perto o
coronelismo ainda reinante em Nova Lima. Apenas o vereador Octávio de Freitas
teve a coragem de abraçar a luta contra a Mineração em Capão Xavier. Todos os
outros vereadores de Nova Lima, prefeito e etc vociferavam na defesa das
mineradoras MBR e Vale. Só a mineradora Vale se diz proprietária de 70% do
território de Nova Lima, uma injustiça que brada aos céus. As Mineradoras Anglo
Gold e outras vêm usando e abusando do território de Nova Lima e impondo seu
poderio. Em Nova Lima, milhares de trabalhadores são vítimas da silicose,
causada pelas mineradoras. Jobert, Anderson, o MLB, o Sindieletro, o povo das
Ocupações urbanas e outras forças vivas estão questionando um monte de
injustiças que continuam ocorrendo em Nova Lima. Por isso Jobert foi preso pela
segunda vez dentro de dois meses. Jobert
Fernando, preso político!
Em inúmeras lutas
coletivas do Sindieletro, do MLB, das Ocupações urbanas e do Campo, do MST, do
Movimento Quem Luta Educa e etc sempre Jobert estava presente. Eu conheço Jobert
e sou testemunho da idoneidade, da ética e do caráter humanista dele. Jobert,
um grande lutador, companheiro nosso de tantas lutas.
Estou indignado com a
prisão injusta de Jobert, mais um companheiro de luta preso arbitrariamente.
Bem dizia Jesus de Nazaré: “Feliz quem tem fome e sede de justiça, porque será
saciado” (Mt 5,6). Jobert tem fome e sede de justiça. “Felizes os que sofrem
perseguição por estarem lutando por justiça, pois o reino de Deus é deles.
Felizes vocês quando injuriarem e perseguirem vocês, e, mentindo, difamarem
vocês por minha causa” – a causa de Jesus Cristo e dos injustiçados que lutam
de cabeça erguida. (Mt 5,10-11).
Jobert, estamos com
você. Mexeu com você, mexeu conosco e com muita gente de luta. Conquistaremos
sua libertação e você será mais forte e aguerrido na luta ao lado dos
injustiçados.
Exigimos a libertação
de Jobert Fernando e o fim da criminalização dos movimentos sociais e de seus
militantes. Conclamamos todas as entidades de defesa dos Direitos Humanos,
Defensoria e Promotoria de Direitos Humanos do Ministério Público a intervirem
na defesa de Jobert e nesta luta contra a criminalização dos pobres e seus
defensores.
Veja no link, abaixo,
Nota Pública do Movimento Luta de Classes.
Assina, frei Gilvander Moreira, da CPT.
Belo Horizonte, MG, 27/09/2015.
sexta-feira, 25 de setembro de 2015
Prefeitura de BH criminaliza as Ocupações urbanas, segundo frei Gilvander Moreira
Prefeitura
de BH criminaliza as Ocupações urbanas.
Por frei Gilvander
Moreira.
A Prefeitura de Belo
Horizonte (PBH) mais destrói casas do que constrói e tenta jogar pobre contra
pobre para justificar sua insensibilidade e omissão com milhares de famílias
que estão debaixo da pesadíssima cruz do aluguel.
Hoje, dia 25/09/2015,
a PBH realizou mais uma reunião do Conselho Municipal de Habitação com o
objetivo de criminalizar as 8 mil famílias das Ocupações da Izidora (Ocupações
Rosa Leão, Esperança e Vitória) alegando que “as invasões estão impedindo a
construção de moradias em BH”. Mentira.
Com relação à
reportagem que saiu na TV Globo, MGTV, hoje, dia 25/09/2015, ao meio dia,
devemos esclarecer o que segue para restabelecer a verdade:
1.
A
PBH alega que a fila cresceu e que há hoje 17 mil famílias na Fila da moradia.
Há 7 anos exigimos a publicação dessa fila, mas essa fila, a
da habitação, é fila mentirosa, pois, se é que existe, não anda e cuja lista de
nomes nunca é apresentada. A PBH usa essa hipotética fila como desculpa para
perseguir as ocupações urbanas, o que é injustiça covarde.
2.
Cerca
de 25 mil famílias em Belo Horizonte tiveram que ir para ocupações nos últimos
anos, porque a “fila, se é que existe, não anda”. Pior, a PBH exclui as
ocupações do Conselho Municipal de Habitação. Essa é outra injustiça
inadmissível. Por que aceitar no Conselho quase só quem está “resignado”
esperando na fila? Por que não aceitar quem está lutando coletivamente por um
direito humano fundamental, o de morar com dignidade?
3.
Ter
um coronel aposentado como presidente da URBEL, coordenando a política
habitacional, é eloquente, pois revela a postura da PBH: não trata o gravíssimo
problema da habitação como caso de Política, mas como caso de polícia.
4.
Cumpre
recordar que as Ocupações da Izidora (Rosa Leão, Esperança e Vitória) e todas
as outras ocupações coletivas não são invasões, são ocupações, algo legítimo,
justo e inclusive já referendado por decisão do STF. Além disso, as Ocupações
cumprem a função social de uma propriedade, que estava abandonada, função
social esta, que é um princípio importantíssimo assegurado na Constituição
brasileira. Insistir em falar de ocupações chamando-as de invasões é injustiça,
é criminalização.
5.
A
PBH não tem contrato assinado para construir 13 mil apertamentos pelo Programa
Minha Casa Minha Vida. Isso é mentira. Tem apenas um Contrato com a Caixa
Econômica Federal, mas que está suspenso, contrato para construir 8.896 “apertamentos”,
em prédios, 90% de 7 a 8 andares, segundo o engenheiro da construtora
Direcional. O que se diz a mais é apenas promessa enganosa, pode ser que se
torne realidade daqui a uns 5 ou 10 anos.
6.
Por
que a PBH não revela o tamanho do lucro que a construtora Direcional terá ao
comprar por 63 milhões de reais 50 hectares de terra da Granja Werneck, terras
com sérios indícios de grilagem, e ter um lucro de mais de 400 milhões de
reais, podendo inclusive terceirizar toda a construção? E mais: deixando
milhares de famílias em “apertamentos” muito pequenos, sem elevadores, sem ser
moradia digna.
Enfim, esclarecemos
isso por respeito à dignidade humana que é pisada por interesses escusos não
confessados e também porque “a verdade liberta”, gostava de dizer Jesus de
Nazaré.
Veja no link, abaixo,
Reportagem da TV Globo no MGTV de 25/09/2015:
quinta-feira, 24 de setembro de 2015
Prefeitura de Belo Horizonte insiste em mentir e em cometer injustiças sobre Política habitacional. Nota pública.
Prefeitura
de Belo Horizonte insiste em mentir e em cometer injustiças sobre Política
habitacional.
Nota
pública das Ocupações da Izidora, BPs, MLB e CPT.
“Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz
violentas as margens que o comprimem.” (Bertolt Brecht)
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e a Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo
Horizonte (URBEL) insistem em mentir e
em continuar cometendo injustiça sobre a Política habitacional, por vários
motivos.
A PBH, nos últimos 7 anos, mais
demoliu/destruiu casas do que construiu. Mais de 14 mil casas foram demolidas
pela PBH nos últimos 10 anos para construir “casas” para automóveis, ou seja,
para ampliar avenidas e construir viadutos - que podem cair, inclusive!. Assim,
se cuida melhor da dignidade dos automóveis do que da dignidade humana. Injusto.
O déficit habitacional em BH estima-se que
esteja acima de 150 mil moradias. Pesquisa da Fundação João Pinheiro, com dados
de 2010, diz que, naquele ano, o déficit era de 78 mil moradias. Nos últimos 5
anos esse número aumentou muito.
O povo cansou de esperar em uma fila
mentirosa, a fila da habitação, fila que - se é que existe - não anda e cuja
lista de nomes nunca é apresentada. Não suportando mais a pesadíssima cruz do
aluguel ou a humilhação que é sobreviver de favor, para diminuir o estrago que
a PBH vem fazendo na área habitacional, o povo resolveu ir para Ocupações
urbanas, onde, nos últimos 8 anos, já construíram mais de 12 mil casas dignas.
As Ocupações da Izidora (Rosa Leão, Esperança
e Vitória), com cerca de 8 mil famílias, são Ocupações legítimas, justas e em
franco processo de consolidação. Ocuparam terrenos abandonados que não cumpriam
sua função social e já construíram mais de 5 mil casas por meio de
autoconstrução. Em média, 10 mil reais por cada casa, e os moradores estão
devendo cerca de 50% desse valor, pois muitos deles tiveram que pegar
empréstimo para construir. Dia 17/09/2015, o Superior Tribunal de Justiça (STJ),
em julgamento de mérito de um Mandado de Segurança, manteve a decisão do
Ministro Og Fernandes, que proíbe despejos das Ocupações da Izidora. Além dessa
decisão favorável ao povo, há 31 ilegalidades nos processos de reintegração de
posse da Izidora e na Operação Urbana Simplificada do Isidoro (o nome correto é
Izidora, mulher negra quilombola que lavava roupa no ribeirão que passou a ter
seu nome), conforme estudo apresentado pelo Grupo de Pesquisa Indisciplinar, da
UFMG. O contrato com a Caixa Econômica Federal (CEF), para construir 8.896
apartamentos de 43 m² ,
em prédios de 8 andares, sem elevadores, pelo Programa Minha Casa Minha Vida
(MCMV), está suspenso por várias
pendências, entre elas: a) a PBH mentiu para a CEF dizendo que tinha na área
ocupada apenas cerca de 60 a
160 famílias em 27/12/2013, quando o contrato foi assinado. E a realidade é que
desde julho de 2013 já existiam aproximadamente 8 mil famílias ocupando as áreas;
b) pesquisa cartorial feita pelo padre Piggi na cadeia dominial da matrícula
1202 (documento da Granja Werneck S/A que consta do contrato da CEF), comprova
que a documentação da Granja Werneck é falsa, forjada ilegalmente em cartórios,
sem cadeia dominial e com título Torrens falso. Logo, se trata de terras
griladas, terras devolutas que devem ser resgatadas e devolvidas ao Governo de
MG.
A PBH/URBEL tem sido irresponsável no trato
da gravíssima questão habitacional de BH, pois alimenta a especulação
imobiliária, não dialoga com o povo das Ocupações urbanas e nem com os
movimentos sociais que as acompanham. Prova disso é que as Ocupações urbanas,
com cerca de 25 mil famílias em Belo Horizonte, estão excluídas do Conselho
Municipal de Habitação.
PBH/URBEL não priorizou construir moradias
dignas para a população e agora, ardilosamente, quer colocar povo contra povo,
ao tentar jogar a culpa pela falta de moradia popular nas Ocupações. As Ocupações
são solução, e não problema.
As Ocupações da Izidora sempre estiveram
abertas à negociação, desde que seja justa e ética. Não aceitamos despejos: nem
vermelho e nem branco/humanizado. As Ocupações da Izidora já apresentaram mais
de 10 propostas na Mesa de Negociação coordenada pelo Governo de MG. Há como
compatibilizar o MCMV na Izidora com a continuidade de parte das Ocupações, mas
para isso exigimos garantias em 7 pontos, tais como: A) Cadastro prévio e
idôneo, com acompanhamento do Ministério Público, Defensoria Pública, PUC/MG e
UNA, BPs, MLB e CPT; B) Construção do MCMV em várias etapas para viabilizar,
sem maiores transtornos, o reassentamento de todas as famílias que precisam e que
estão vivendo nas Ocupações; C) Desapropriação, regularização fundiária e
urbanização de toda a Ocupação Rosa Leão e das partes das Ocupações Vitória e
Esperança que estão fora do MCMV; D) Auxílio pecuniário de 500 reais para cada
família até o reassentamento; E) Comitê gestor plural; F) Mudanças no contrato
com a CEF, que garantam reassentamento, rediscussão das áreas comerciais e critérios
que não excluam quem mora e precisa. Com tantos cortes no orçamento do Governo
Federal haverá dinheiro para construir MCMV na Izidora?
Respeitamos os núcleos de moradia, mas
repudiamos a PBH tentar nos dividir para dominar. Há diversas formas de se
lutar. Alertamos que muita gente que está nas Ocupações se cansou de esperar na
fila da habitação. Os núcleos têm o direito e o dever de pressionarem a PBH para
que construa “pra ontem” moradia digna, mas culpar as Ocupações pela falta de
moradia em BH é injustiça, é inverter as responsabilidades: as Ocupações são
consequência da falta de política habitacional séria, e não a sua causa.
Reafirmamos que as Ocupações têm construído mais casas do que a PBH. Repudiamos
a postura da PBH que tenta dividir os Sem-casa e o Povo das Ocupações.
A PBH alega que não há terrenos, mas insistiu
em vender 129 terrenos da municipalidade. No Barreiro há muitos terrenos
grilados que já deveriam ter sido resgatados e destinados a um grande programa
habitacional.
Ainda vale lembrar que o Povo das Ocupações
luta também pela reforma urbana, para que toda a cidade seja acessível, segura,
sustentável e atenda a todas e todos que a constroem cotidianamente,
coletivamente.
Enquanto morar for um privilégio, ocupar é um
direito. De cabeça erguida, em luta coletiva, seguiremos batalhando por moradia
própria, digna e adequada para todas e todos.
Belo
Horizonte, 24 de setembro de 2015.
Assinam essa nota:
Coordenações
das Ocupações da Izidora (Rosa Leão, Esperança e Vitória)
Frente
Pela Reforma Urbana das Brigadas Populares em Minas Gerais (BPs)
Comissão
Pastoral da Terra (CPT)
Movimento
de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB)
Contatos para maiores informações: frei
Gilvander (31 9473 9000); Charlene (31 8534 4911); Rose (31 8941 2083); Elielma
(31 9343 9696); Isabella (31 9383 2733); Leonardo (31 9133 0983).
quarta-feira, 23 de setembro de 2015
Ocupações Urbanas nas ruas contra ajuste fiscal nas costas do povo brasileiro. Isso é injustiça gravíssima!
Ocupações Urbanas nas ruas contra ajuste fiscal
nas costas do povo brasileiro. Isso é injustiça gravíssima!
Em Belo Horizonte, as organizações Brigadas
Populares e MLB e as ocupações da Izidora e do Barreiro, ocuparam na manhã de
hoje, quarta-feira, dia 23/09/2015, o Ministério da Fazenda como parte do ato
nacional contra os cortes do orçamento federal nos gastos sociais, sobretudo do
Ministério das Cidades. Reivindicam também mais orçamento do Estado para
habitação de interesse social: 1) Mais recursos para a construção
habitacional do Estado; 2) Recursos para urbanização das comunidades/ocupações.
Segue o manifesto nacional do ato:
Segue o manifesto nacional do ato:
Dia 23/09/2015
TOMAMOS AS RUAS!
Mais uma vez repudiamos as soluções adotadas pelo Governo Federal que joga o custo da crise nas costas dos trabalhadores mais pobres e dos servidores públicos. Desta vez foi anunciado o corte de mais R$26 bilhões no Orçamento. Os principais cortes referem-se ao congelamento no salário de servidores e ao financiamento do Minha Casa Minha Vida, além de R$3,8 bilhões na saúde.
Mais uma vez repudiamos as soluções adotadas pelo Governo Federal que joga o custo da crise nas costas dos trabalhadores mais pobres e dos servidores públicos. Desta vez foi anunciado o corte de mais R$26 bilhões no Orçamento. Os principais cortes referem-se ao congelamento no salário de servidores e ao financiamento do Minha Casa Minha Vida, além de R$3,8 bilhões na saúde.
A terceira
fase do MCMV foi anunciada no último dia 10/9 e seu formato incorporou várias
das propostas apresentadas pelos movimentos, tais como: maior priorização da
modalidade Entidades, aumento do limite de renda da faixa 1, recurso para
equipamentos públicos e regulamentação de áreas comerciais nos condomínios.
Mas de nada adianta ganhar e não levar. Não houve compromisso do Governo com a definição do orçamento do programa nem com metas de novas contratações. O cenário se agravou ainda mais com os novos cortes anunciados que deixam ainda mais distante o direito humano de milhões de famílias pobres de morar dignamente.
Com o adiamento do MCMV, carro chefe do Ministério das Cidades, o Governo Federal ficou praticamente sem nenhum investimento na política urbana. Tal cenário poderia ser diferente se houvesse combatido a raiz do problema: a estrutura fundiária das cidades e a segregação urbana. Problemas que devem ser tratados com uma reforma urbana estrutural. O MCMV sem outras medidas não tem conseguido, como vemos desde 2009, reduzir o número de famílias sem teto no Brasil e, portanto, não deve ser tratado como única saída possível para a questão habitacional. Seguimos lutando por uma reforma urbana de verdade: que depende também de políticas estruturais de controle da especulação, regularização fundiária e de medidas de garantia da infraestrutura urbana para as famílias pobres, medidas que vem sendo deixadas de lado nos últimos anos de governo.
Mas de nada adianta ganhar e não levar. Não houve compromisso do Governo com a definição do orçamento do programa nem com metas de novas contratações. O cenário se agravou ainda mais com os novos cortes anunciados que deixam ainda mais distante o direito humano de milhões de famílias pobres de morar dignamente.
Com o adiamento do MCMV, carro chefe do Ministério das Cidades, o Governo Federal ficou praticamente sem nenhum investimento na política urbana. Tal cenário poderia ser diferente se houvesse combatido a raiz do problema: a estrutura fundiária das cidades e a segregação urbana. Problemas que devem ser tratados com uma reforma urbana estrutural. O MCMV sem outras medidas não tem conseguido, como vemos desde 2009, reduzir o número de famílias sem teto no Brasil e, portanto, não deve ser tratado como única saída possível para a questão habitacional. Seguimos lutando por uma reforma urbana de verdade: que depende também de políticas estruturais de controle da especulação, regularização fundiária e de medidas de garantia da infraestrutura urbana para as famílias pobres, medidas que vem sendo deixadas de lado nos últimos anos de governo.
Por isso,
mobilizamos milhares de pessoas hoje, dia 23/09/2015, em mais de 10 capitais do
país contra os cortes e pelas reformas populares. Deixamos claro que não
aceitamos pagar a conta da crise.
Além disso, o
Fórum Dos Servidores Públicos Federais, a categoria mais diretamente atingida
pelos cortes, somou-se às nossas mobilizações e fizeram sua jornada hoje
também. Entendemos que esta iniciativa fortalece a luta contra o ajuste fiscal
e avança na unidade dos/as trabalhadores/as para uma saída popular para a
crise.
O problema
fiscal só será realmente solucionado se atacado em suas raízes: a gigantesca
dívida pública e o injusto sistema tributário. Por isso, defenderemos nas ruas
a taxação das grandes fortunas, de dividendos e remessas de lucro, maior
progressividade no Imposto de Renda e uma auditoria da dívida pública. Os
ricos, banqueiros e empresários devem pagar a conta. A saída para a crise é com
o povo e não contra ele.
Assinam essa Nota:
MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto)
MLB (Movimento de Luta nos Bairros, vilas e favelas
Brigadas Populares
Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG)
Contatos: Charlene (31
85344911) Isabella (31 93832733), Leonardo (31 91330983), Cadu (31 93982553) e
Rose (31 89412083).
Sobre a ausência insurgente: da política habitacional à política urbana! Nota sobre o falso conflito MCMV x Ocupações.
Sobre a ausência
insurgente: da política habitacional à política urbana!
Nota sobre o falso
conflito MCMV x Ocupações.
“A quem possa interessar. Escutaram? Esse silêncio é o som do
seu mundo caindo. É o do nosso mundo ressurgindo. O dia que foi o dia era
noite. E noite será o dia que será o dia.” (Sub-Comandante Marcos)
No dia 02 de junho de 2015, o Movimento Nacional
de Luta por Moradia (MNLM), a Central dos Movimentos Populares (CMP), a
Confederação Nacional de Associações de
Moradores(CONAM) e a União Nacional por Moradia Popular (UNMP) foram recebidos
pelo Ministro das Cidades, Gilberto Kassab, pelo governador Fernando Pimentel e
pela Secretária Nacional de Habitação, Inês Magalhães, no Palácio da Liberdade
(foto abaixo).
No dia 18 de setembro de 2015, o ministro
das Cidades esteve novamente em Belo Horizonte para a entrega de unidades
habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida no bairro Paulo VI (foto
abaixo). No mesmo dia, o MNLM soltou nota intitulada “Maior entrega do MCMV em BH sob
impasse”em que considera as ocupações da região da Izidora como atraso ao
início da sobras e conclama todos os núcleos de moradia a exigir, em caráter de
urgência,do Conselho Municipal de Habitação uma audiência pública para debater
a questão. Hoje o MNLM soltou convocatória para plenária do Conselho Municipal
de Habitação a ser realizada no dia 29/09 no auditório da truculenta Guarda
Municipal para "discutir
a quantas anda a maior entrega do MCMV em BH, na Granja Werneck, região
Izidora."
Frisamos que nos colocamos a favor da
solidariedade a todas as formas de luta pela reforma urbana, pois acreditamos
no povo organizado em marcha por uma vida melhor. Por isso realçamos que não
será a oposição entre as ocupações da Izidora e os núcleos de moradia que
resolverá o déficit habitacional na cidade, mas sim a somatória de várias
formas de luta e expressão do povo dando voz aos silenciados. Aliás,
parte das famílias das ocupações vieram de núcleos de moradia. Cansaram de
esperar em uma fila que não anda, pois é um engodo.
No entanto, as imagens e a nota são muito
simbólicas. Gilberto Kassab é conhecido pelos movimentos sociais em São Paulo,
cidade que (des) entre 2006 e 2012,como o prefeito inflamável, ou o “Nero” do
PSD – na sua gestão ocorreram mais de 500 incêndios em favelas na cidade em
áreas de interesse do mercado imobiliário. Fato é que o Ministro das Cidades representa
diretamente o setor do capital imobiliário no governo federal.
Já Fernando Pimentel e Inês Magalhães
representam a financeirização da política habitacional expressa no Minha Casa,
Minha Vida (MCMV). Tal programa foi diretamente construído pelo capital
imobiliário em associação direta com o Governo Federal sem considerar a
participação dos movimentos sociais e destruindo o Sistema Nacional de
Habitação de Interesse Social (SNHIS) que havia sido construído de forma
participativa.
As fotos também representam um silêncio. Uma
ausência que incomoda o sistema – uma ausência insurgente. As ocupações urbanas
de Belo Horizonte e Região Metropolitana nunca foram recebidas pelo Governador
Fernando Pimentel, nunca foram ouvidas diretamente por ele. Mesmo Anastasia do
PSDB recebeu lideranças das Ocupações da Izidora. No entanto, essa ausência
representa a coragem do novo, representa aqueles e aquelas que querem construir
a cidade e a Política Urbana de form ajusta. Dentre as ocupações da Izidora
temos a ocupação Esperança. Não é à toa esse nome. A esperança tem duas lindas
filhas: a raiva e a coragem. Justa raiva do estado de coisas em que vivemos e
coragem para mudar essa situação e ir à luta! O déficit habitacional é
falsamente enfrentado com uma política habitacional mercadológica sem a
efetivação de instrumentos do Estatuto das Cidades.
Acreditamos em uma Política Urbana que não
seja confundida com política habitacional gerida pela construção civil. Esse
silêncio e essa ausência representam os escombros da cidade construída como
mercadoria e o ressurgimento do direito à cidade para milhares de famílias que
vivem e lutam nas ocupações! As ocupações não são problema, mas solução.
É uma grande injustiça social empurrar o
gravíssimo problemas social pra frente com auxílio moradia despejando ocupações
legítimas que estão dando função social a terrenos que não cumpriam sua função
social e eram propriedades especulativas, muitas delas terras griladas.
Belo Horizonte, 21 de setembro de 2015
Assinam essa nota,
Frente Pela Reforma Urbana das Brigadas Populares em Minas
Gerais
Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Por uma cidade onde haja tudo para todos!
Obs.: Nota publicada originalmente no link, abaixo:
terça-feira, 22 de setembro de 2015
sexta-feira, 18 de setembro de 2015
Ocupação Nova Canaã em Betim é despejada. Injustiça grave! Nota pública.
Ocupação
Nova Canaã em Betim é despejada. Injustiça grave! Nota pública.
Dia 15 de setembro de 2015, foi consumado o "despejo
branco" da Ocupação Nova Canaã, no bairro Nossa Sra. de Fátima em Betim –
MG. "Branco" porque foi facilitado por suposto processo de acordo,
através da Mesa Estadual de Diálogo e Negociação (Decreto nº 203/15). Das
82 famílias que residiam na ocupação (com casas de alvenaria construídas),
somente 25 foram contempladas, as outras 57 restaram com sua dignidade literalmente
demolida.
A prefeitura de Betim, junto a COHAB do Governo do Estado,
realizou a seguinte proposta às famílias: bolsa aluguel de 350 reais e ingresso
na fila do Minha Casa Minha Vida para aquelas famílias que “passassem” nos
critérios municiais dos dois programas. Para todas as outras, DESPEJO E
RUA.
Sem qualquer transparência, sem a participação das famílias e
dos movimentos sociais, a prefeitura de Betim realizou o cadastro,
informou individualmente a
cada família se ela tinha sido contemplada e lhes conferiu o prazo de 1 semana para encontrar um
imóvel e se mudar, sob pena de perder o benefício. A
maioria das famílias despejadas eram evidentemente pobres e vivem em situação
de vulnerabilidade, mas não se sabe porque seu perfil não foi contemplado, uma
vez que a prefeitura não apresentou qualquer abertura para a participação ou
transparência. É o
caso do Sr. Tião, idoso, aposentado, morador da ocupação há 18 anos, que não
foi contemplado e terminou arrancado a força de dentro de sua casa por mais de
30 policiais.
Cada família contemplada se viu forçada à difícil escolha de
optar pela alternativa precária, ou tentar coletivamente resistir, sem nenhuma
garantia. Muitas fizeram a primeira opção. A maioria teve que
assistir passivamente à destruição de suas casas pelo Batalhão de Choque da PM.
É a alardeada tática utilizada pelo poder público do “divides e reinarás”.
As Brigadas Populares e outros movimentos sociais como o MLB e a
CPT não coadunam com este método de resolução dos conflitos sociofundiários que
a COHAB insiste em promover. A combinação entre de remoção + bolsa moradia para
família contempladas + espera na fila pelo empreendimento do Minha Casa Minha
Vida é solução precária, insuficiente e vai na contramão do interesse público e
das inovações em termos de política urbana apresentadas pelas Constituição
Federal e o Estatuto das Cidades.
São vários os instrumentos que o Poder Público poderia utilizar
para promover a desapropriação das áreas ocupadas e sua destinação para os
processos de regularização fundiária, contemplando universalmente as famílias
envolvidas e partindo do esforço que essas coletividades já realizaram para a
conquista de seu direito à moradia, no processo de autoconstrução das casas e
da infraestrutura dos assentamentos.
Ao propor a remoção parte-se do pressuposto que o exercício ao
direito à propriedade dos proprietários é legitimo, quando praticamente todos
os terrenos ocupados estavam abandonados e eram descumpridores de sua função
social. Os critérios utilizados pelos programas de Bolsa Moradia e do próprio
Minha Casa Minha Vida são muito estreitos e se situam dentro de concepções
focalizadas de políticas públicas, contrastando com a universalidade do direito
à moradia sacramentado na Constituição Federal. E em relação ao MCMV tem-se
todos os problemas exaustivamente apresentados pelos movimentos sociais e
literatura especializada: os apartamentos são padronizados e minúsculos, os
empreendimentos se dão nas periferias das periferias, em zonas desprovidas de
cidade e equipamentos básicos, os custos de reprodução do habitar são
altíssimos (água e luz formalizados, IPTU e taxa mensal de compra) se se tem em
tela as condições de famílias de baixa renda, ademais da longa espera até que a
burocracia estatal apresente os empreendimentos prontos.
É importante também frisar que na atualidade não existem
recursos para novos empreendimentos do MCMV. Cortes importantes na política de
moradia foram anunciados pelo Governo Federal e o MCMV3 não terá recursos para
novas contratações antes de 2016, isso se a verba sair. O que significa que as
famílias não tem a perspectiva de serem contempladas em programas habitacionais
tão cedo. Destrói-se
suas casas, gasta-se dinheiro público com aluguel social, o que aumenta a
especulação imobiliária, e não há qualquer perspectiva de reassentamento
definitivo.
O caso da ocupação Nova Canaã é paradigmático, o terreno era
público municipal, bastava que o município iniciasse a regularização fundiária
da área ou a sua transformação em ZEIS, integrando a ocupação como mais um
bairro à cidade. Contudo se optou pelo despejo, pela criação
de mais um contingente de famílias sem-teto, pelo pagamento oneroso aos cofres
públicos da Bolsa Aluguel mensal e a espera de um empreendimento do MCMV que
não sabemos que se vai realizar dado a política de arrocho e cortes em gastos
sociais insistentemente anunciados pelo Governo Federal.
O Governo do Estado não poderia ser leniente com esta proposta
inicialmente capitaneada pela Prefeitura de Betim hoje sob o comando de um
tucano – o prefeito Carlaile Pedrosa (PSDB) - notoriamente atrelado aos
interesses privatistas e do capital imobiliário. Recentemente foi denunciado
pelo Ministério Público desta cidade, a entrega desenfreada de terrenos e lotes
público sob o controle da municipalidade à iniciativa privada.
As organizações sociais que estão presentes na Mesa de Diálogo e
Negociação recentemente instituída e que tratam da problemática da moradia
devem estar atentas quanto a este modelo de solução dos conflitos fundiários
que se está fomentando quase como paradigma. A tríade acima apresentada
(remoção das ocupações + bolsa moradia + fila do MCMV) não é a única possível e
muito menos a mais desejada se tivermos como objetivo a promoção do direito
à cidade e a salvaguarda plena do direito à moradia adequado das
famílias pobres e sem-teto.
Assina
esta nota:
Brigadas
Populares-MG
Comissão
Pastoral da Terra (CPT)
Fórum
das Ocupações Urbanas de Betim
Betim,
MG, Brasil, 16 de setembro de 2015.
MANTIDA A SUSPENSÃO DO DESPEJO DAS OCUPAÇÕES DA IZIDORA NO STJ!
MANTIDA A SUSPENSÃO DO DESPEJO DAS OCUPAÇÕES DA
IZIDORA NO STJ!
Nota do Coletivo Margarida Alves de Assessoria jurídica.
Conquistou-se
hoje mais uma vitória histórica para a luta popular neste país!
As Ocupações
da Izidora de Belo Horizonte e Santa Luzia, MG, assessoradas pelo Coletivo
Margarida Alves, a Rede Margarida Alves e o escritório do Cezar Britto
(ex-presidente da OAB Nacional), tiveram ontem, dia 17/09/2015, o seu recurso
provido pela 2a Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para anular decisão
anteriormente proferida pelo TJMG. Em sustentação oral realizada pela combativa
Dra. Camila Gomes de Lima, ressaltou-se a incompetência absoluta da 6º Câmara
Civil para analisar o Mandado de Segurança no qual se questiona o despreparo da
Polícia Militar de Minas Gerais e do aparato estatal para realizarem o despejo,
bem como a relevância social do caso, que atinge cerca de 30 mil pessoas.
Nesse
julgamento que traz um precedente importantíssimo para as ocupações urbanas, os
ministros ressaltaram a necessidade de se manter a suspensão do despejo, tendo
em vista a alta complexidade do caso e o seu imenso impacto social. Afirmaram
ainda que, em casos de remoção forçada, o poder executivo não pode se esquivar
do cumprimento dos tratados internacionais e da legislação brasileira que
garantem os direitos fundamentais dos ocupantes. Para os ministros, a força
policial deve ser utilizada como último recurso e sempre observado o princípio
da proporcionalidade.
#ResisteIzidora
Para maiores
informações fazer contato com:
Thaís Lopes -
31 98820094
Mariana
Prandini - 61 81010846
Isabela Corby
- 31 96437703
Camila Gomes –
6182458828
https://www.facebook.com/coletivomargaridaalvesap?fref=ts
quarta-feira, 16 de setembro de 2015
terça-feira, 15 de setembro de 2015
Prêmio Humanidades de Direitos Humanos da Academia Brasileira de Direitos Humanos, dia 14/09/2015, a frei Gilvander, prof. José Luiz Quadros, Antônio Romanelli, Jefferson de Paula e Ricardo Garcia.
A Academia Brasileira de Direitos Humanos, ao celebrar seus
10 anos na luta em defesa dos Direitos Humanos, concedeu ao Frei Gilvander Luís Moreira, ao prof.
José Luiz Quadros de Magalhães, ao Antônio Ribeiro Romanelli, ao Jefferson de
Paula e ao Ricardo
Garcia, dia 14/09/2015, em Belo
Horizonte, o Prêmio Humanidades em reconhecimento pela luta na defesa dos
Direitos Humanos e da Justiça Social. Na oportunidade foi lançado o livro
Direitos Humanos e Meio Ambiente, obra dedicada ao Instituto Terra.
Os homenageados receberam uma estatueta Humanidades, criada pelo artista
plástico Penithencia.
segunda-feira, 14 de setembro de 2015
Cristãos no Brasil de hoje: desafios da Fé e Política, papa Francisco e tarefas emancipatórias. por frei Gilvander Moreira
Cristãos no Brasil de
hoje: desafios da Fé e Política, papa Francisco e tarefas emancipatórias.
No 7º Encontro de Fé
e Política do estado do Rio de Janeiro, tarefas emancipatórias a partir dos
clamores dos injustiçados, do testemunho e dos ensinamentos do papa Francisco
na Exortação Apostólica A Alegria do Evangelho e no Discurso aos Movimentos
Sociais na Bolívia.
Gilvander Luís Moreira[1]
1. Introdução.
Dias 12 e 13 de setembro de
2015, tive a alegria e a responsabilidade de contribuir na assessoria do 7º
Encontro de Fé e Política do estado do Rio de Janeiro, em Angra dos Reis, com o
objetivo
de refletir, meditar, orar e
contemplar à luz da palavra de Deus na Bíblia e nas entranhas da realidade
histórica o tema Cristãos no Brasil de hoje: desafios da Fé e
Política. Para isso faz-se necessário resgatar a profecia do Concílio
Vaticano II e da Opção da Igreja pelos pobres e pelos jovens, opção da Igreja
afrolatíndia. Imprescindível ouvirmos os
clamores dos injustiçados e levarmos a sério o testemunho e os ensinamentos do
papa Francisco na Exortação Apostólica A Alegria
do Evangelho e no seu Discurso aos Movimentos Sociais na Bolívia.
Fizemos referência
ao cap. IV de A Alegria do Evangelho,
do papa Francisco, que trata justamente da Dimensão Social da Evangelização. Prestemos
atenção a algumas afirmações do papa Francisco:
“Se a dimensão social da evangelização não for devidamente explicitada,
corre-se o risco de desfigurar o sentido autêntico e integral da missão
evangelizadora.” (n. 176).
“Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter
saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se
agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o
centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos.” (n.
49).
Além de ser
pobre e para os pobres, a Igreja desejada por Francisco é corajosa em denunciar o atual
sistema econômico, "injusto na sua
raiz" (A alegria do Evangelho, n. 59). Como disse João
Paulo II, a Igreja "não
pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça" (n. 183).
"Saiam!" é a essência da mensagem que o papa Francisco envia a
bispos, padres, membros da comunidade. Saiam para fora das suas cômodas
estruturas eclesiais burguesas e do caloroso círculo dos convencidos – anunciem
o Evangelho às periferias das cidades, aos marginalizados pela sociedade, aos
pobres, aos injustiçados.
Às questões sociais, o
papa Francisco dedica
dois dos cinco capítulos da Exortação Apostólica A Alegria do Evangelho, o
segundo e o quarto. Critica o "fetichismo do dinheiro" e "a
ditadura de uma economia sem rosto e sem um objetivo verdadeiramente
humano", versão nova e implacável da "adoração do antigo bezerro de
ouro".
Francisco critica o atual sistema econômico:
"esta economia que mata"
porque prevalece a "lei do mais
forte". Ele volta à cultura do "descartável" que criou
"algo novo" e dramático:
"Os excluídos não são 'explorados',
mas resíduos, 'sobras'" (n. 53). Enquanto não se resolverem
radicalmente os problemas dos pobres, renunciando "à autonomia absoluta
dos mercados e da especulação financeira e atacando as causas estruturais da
desigualdade social – insiste –, não se resolverão os problemas do mundo e, em
definitivo, problema algum". E indica na "desigualdade social" as raízes dos males sociais.
A Igreja não pode ficar indiferente a tais
injustiças. "A economia não pode
mais recorrer a remédios que são um novo veneno, como quando se pretende
aumentar a rentabilidade reduzindo o mercado de trabalho e criando assim novos
excluídos". Ele dedica páginas à denúncia da "nova tirania invisível, às vezes virtual"
em que vivemos, um "mercado
divinizado", onde reinam a "especulação
financeira", "corrupção
ramificada", "evasão fiscal
egoísta" (n. 56).
2. Pressuposto básico: Deus na história e o divino no
humano.
O Deus do cristianismo é um Deus da história,
quer dizer, age nas entranhas dos fatos e dos acontecimentos. O Deus da vida,
mistério de infinito amor, não faz mágica. Desde que Deus, por infinito amor à
humanidade, se encarnou-se, o divino está no humano.
O Concílio de Calcedônia, no ano de 451,
reconheceu Jesus Cristo com “natureza” divina e humana. O
apóstolo Paulo reconhece que Jesus de Nazaré é o Cristo, filho de Deus, mas
“nascido de mulher” (Gal 4,4), ou seja, humano como nós desenvolveu seu
infinito potencial de humanidade. “Jesus, de tão humano, se tornou divino,”
dizia o papa João XXIII.
“Não é ele o filho de Maria e Jose?”.
Progressivamente, na Galileia, Samaria e Judéia, Jesus se revela, à primeira
vista, em aparentes contradições, mas, no fundo, com tal equilíbrio que chama a
atenção de todos. Assim, ele testemunha que Deus é mais interior a nós do que
imaginamos. A mística “encarnatória” revela a pessoa humanamente divina e
divinamente humana. “Quem me vê, vê o Pai”.
Jesus, antes de se tornar mestre, foi
discípulo. Antes de ensinar, aprendeu muito com muitos: com Maria e José, com o
povo da sinagoga, com os vizinhos, amigos, com os acontecimentos históricos,
com a natureza etc.
Somos discípulos/as de Jesus Cristo, um jovem
camponês, da periferia, que foi condenado à pena de morte pelos podres poderes
da política, da economia e da religião. Somos discípulos/as de um mártir. Feliz
quem não esquece a vida, o testemunho e o ensinamento dos mártires.
3. Tarefas emancipatórias que a Dimensão Social da Fé Cristã
exige de nós hoje.
Vamos elencar na reflexão, abaixo, uma série
de tarefas que julgamos decorrer da Dimensão Social da Fé Cristã, dos desafios
da Fé e Política.
3.1 – Promover
libertação integral.
Uma das tarefas das pessoas cristãs é lutar
pela libertação integral das pessoas e de tudo e não apenas por libertação
espiritual. No programa de Jesus, em Lc 4,16-21, consta uma libertação política
(“libertar os presos”), social e econômica (“anunciar uma boa notícia aos
pobres”), libertação ideológica (“restituir a visão”, e espiritual (“proclamar
o Ano de Graça do Senhor”). Assim, Jesus resgata o Jubileu Bíblico (Lev
25,8-12). No ano do Jubileu, toca-se o “berrante” (em hebraico “sofar”), que acontece no primeiro ano
após sete vezes sete anos. Neste Jubileu, todas as dívidas devem ser perdoadas;
todas as terras devem voltar ao primeiro dono (aos ancestrais); todos os
escravos devem ser libertados. Enfim, é tempo de se fazer uma re-organização
geral na sociedade; tempo para recriar as relações humanas com fraternidade, justiça,
solidariedade libertadora, reconciliação e novos sonhos.
3.2 – Acreditar na ortopráxis.
Outra tarefa é defender uma ortopráxis (=
testemunho libertador), não uma ortodoxia (= opinião certa). O que de fato faz
diferença não é tanto o que a gente pensa ou em que acreditamos, mas o que
fazemos (ou deixamos de fazer). É hora de compromisso com o modelo de Igreja
querido pelo papa Francisco: Igreja popular, justa e misericordiosa. Urge
compromisso com outro projeto de sociedade, que seja justo, ecumênico e
sustentável ecologicamente.
3.3 - Rever
conceitos.
Verdade não é adequação de um conceito a um
objeto. Isso é verdade formal. “Verdade é o que liberta todos e tudo”, diz o
quarto evangelho da Bíblia. A verdade deve ser buscada conjuntamente. Ninguém é
dono da verdade. Verdade como o que liberta deve ser buscada a partir dos
pobres (últimos, pequenos, discriminados): pobre, excluído, sem terra,
indígenas, negros, pessoas com deficiências, idosos, desempregados,
homossexuais, mãe terra, irmã água, favelados, vítimas da violência etc.
É hora de perceber que a coisa mais sagrada é
também profana. Profanar é retirar do uso exclusivo para dar acesso a todos.
Pro-fanar vem do verbo grego faneo,
que quer dizer “brilhar”. Ou seja, que o brilho do sagrado seja estendido a
todos sem distinção e sem nenhuma discriminação. É hora de gritar “Não a todo e
qualquer dualismo!” Não há separação entre espiritual e material, entre sagrado
e profano, entre divino e humano, entre santo e pecador, entre puro e impuro
etc. Tudo está intimamente relacionado.
Jesus não morreu na cruz porque Deus quis,
mas foi condenado à pena de morte pelos podres poderes político-econômico e
religioso.
Jesus doou sua vida por todos e tudo. Jesus
testemunha um caminho de salvação, porque nos amou demais e não porque sofreu
demais.
Jesus tornou-se Cristo, pois conseguiu
desenvolver o infinito potencial de humanidade que cada pessoa traz consigo ao
chegar a este mundo. “Jesus foi tão humano, tão humano, que só podia ser Deus”,
disse o papa Paulo VI.
Milagre não é algo fruto de um poder
extraordinário que está acima do humano. Milagre é uma maravilha de Deus,
conforme diz o Primeiro Testamento da Bíblia. Milagre é um gesto solidário e
libertador de Deus agindo nas entranhas da história.
Deus não é juiz, pois Deus é amor. O único
poder que Deus tem é o poder do amor, que é de fato o que constrói.
Deus não é transcendente, mas
transdescendente. Na Bíblia, de ponta a ponta, vemos a imagem de um Deus
apaixonado pelo humano.
Deus não é neutro diante dos conflitos. Deus
faz opção preferencial pelos pobres (cf. Ex 3,7-10).
Não existe inferno, nem purgatório e nem
limbo como locais destinados aos pecadores, como descrito de forma
tradicionalista por muitos nas igrejas. Satanás (satã, em hebraico) ou diabo (diabolos, em grego) não são entes
abstratos, um deus negativo que faz oposição ao Deus da vida. Satanás (diabo) é
tudo o que divide, separa, desune, oprime, exclui, discrimina e depreda. Pode
ser uma dimensão interior nossa, mas em uma sociedade capitalista neoliberal
como a nossa, trata-se prioritariamente de estruturas e instituições que
oprimem, excluem e depreda a natureza. Podemos dizer que o agronegócio é
satânico, pois concentra riqueza em poucas mãos, expulsa os pequenos do campo e
devasta a biodiversidade. Uma democracia burguesa formal que não respeita a
Constituição Brasileira e pisa na dignidade das pessoas é uma falsa democracia,
algo também satânico.
Ser cristão implica ser anticapitalista. Não
dá para compactuar com os pretensos valores do capitalismo: concorrência,
competição, acumulação, lucrar e lucrar. Ser cristão é ser outro Cristo, alguém
que consola os aflitos, mas que também incomoda os acomodados. Tarefa da pessoa
cristã é buscar vida e liberdade para todos e tudo – e não apenas para alguns -
mas a partir dos últimos.
3.4 - Sentir-se
igreja, membro vivo de uma comunidade de fé libertadora.
“Igreja é Povo de Deus”, nos ensina o
Vaticano II. É hora de percebermos que o sacerdócio comum está acima do
sacerdócio ordenado. Os jovens não podem aceitar uma relação que os coloquem
como infantis e em uma postura de quem só deve obedecer. Nada disso. Os jovens
têm o direito e o dever de dialogar, discutir e reivindicar o direito de
decidir conjuntamente todos os assuntos que envolvem a vida da comunidade
cristã e da sociedade.
3.5 – Comprometer-se
com a Opção pelos pobres e pelos jovens.
O apóstolo Paulo, ao escrever sobre o
Concílio de Jerusalém, acontecido por volta dos anos 49/50 do 1º século diz que
a circuncisão, a maior de todas as barreiras, tinha sido abolida e que a única
coisa que os apóstolos fizeram questão de alertar foi: “Não esqueçam os
pobres.” (Gal 2,10) Esse alerta deve ser acolhido por todas as pessoas cristãs.
Mas faz bem ter um bom entendimento sobre quem é pobre. Primeiro, o carente
economicamente. Depois, a mulher, o indígena, o negro, o homossexual, a
divorciada, a mãe terra, a irmã água, o meio ambiente.
O pobre não é apenas como um poço de
carência, mas principalmente um portador de força ética e espiritual. Deus age
a partir dos pequenos. “O mundo será melhor quando o menor que padece acreditar
no menor”, dizia Dom Hélder Câmara, o santo rebelde.
3.6 - Partir da
periferia e dos injustiçados. O Evangelho de Lucas interpreta a vida, as ações
e os ensinamentos de Jesus ao longo de uma grande caminhada da Galileia até
Jerusalém, ou seja, da periferia geográfica e social ao centro econômico,
político, cultural e religioso da Palestina. A Palavra, no Evangelho de Lucas,
é a palavra de um leigo, de um camponês galileu, “alguém de Nazaré”, pessoa
simples, pequena, alguém que vem da grande tribulação. Não é palavra de sumo
sacerdote, nem do poder.
3.7 - Priorizar a
formação de base.
Na grande viagem de subida para Jerusalém, Jesus prioriza a formação dos
discípulos e discípulas. Ele percebe que não tem mais aquela adesão
incondicional da primeira hora. Jesus descobriu que para consolar os aflitos
era necessário também incomodar os acomodados e denunciar pessoas e estruturas
injustas e corruptas. Assim, o homem de Nazaré começou a perder apoio popular.
Era necessário caprichar na formação de um grupo menor que pudesse garantir os
enfrentamentos que se avolumavam. Jesus sabia muito bem que em Jerusalém estava
o centro dos poderes religioso, econômico, político e judiciário. Lá travaria o
maior embate.
3.8 - Não fugir do
combate.
O Evangelho de Lucas diz: Jesus, cheio do Espírito, em uma proposta periférica
alternativa, vai, em uma caminhada, de Nazaré a Jerusalém; ou seja, vai da
periferia para o centro, caminhando no Espírito. Em Jerusalém acontece um
confronto entre o projeto de Jesus e o projeto oficial. Este tenta matar o
projeto de Jesus (e de seu movimento) condenando-o à morte na cruz. Mas o
Espírito é mais forte que a morte. Jesus ressuscita. No final do Evangelho de
Lucas, Jesus diz aos discípulos: “Permaneçam
em Jerusalém até a vinda do Espírito Santo” (Lc 24,49).
3.9 - Estar sempre em movimento. Seguir Jesus exige uma dinâmica de permanente movimento. A
sociedade capitalista leva-nos a buscar segurança, o que é uma farsa. É hora de
aprendermos a seguir Jesus de forma humilde e vulnerável, porém mais autêntica
e real. Isso não quer dizer distrair com costumes e obrigações que provêm do
passado, mas não ajudam a construir uma sociedade justa, solidária e
sustentável ecologicamente.
3.10 - Andar na
contramão.
Seguir Jesus implica andar na contramão, remar contra a correnteza de tantos
fundamentalismos e da idolatria do consumismo. Exige também rebeldia, coragem,
audácia diante de costumes que entortam o queixo e de modas que aniquilam o
infinito potencial humano existente em nós. Ser , na prática, luz no mundo, sal na
comida, fermento na massa, algo que sempre incomoda.
3.11 -
Saber a hora de conviver e a hora de lutar. O Evangelho de Lucas apresenta dois
envios de discípulos para a missão. No primeiro envio (Lc 10,1-11), Jesus
indicou aos discípulos que fossem para o campo de missão despojados e
desarmados. Assim deve ser todo início de missão: conhecer, conviver,
estabelecer amizades, cativar, assumir a cultura do outro, tornar-se um irmão
entre os irmãos para que seja reconhecido como “um dos nossos”. No segundo
envio (Lc 22,35-38), em hora de luta e combate, Jesus sugere que os discípulos
devem ir preparados para a resistência. Por isso “pegar bolsa e sacola, uma espada – duas no máximo.” (Lc 22,36-38).
Durante a evolução da missão, chega a hora em que não basta esbanjar ternura,
graciosidade e solidariedade. É preciso partir para a luta, pois as injustiças
precisam ser denunciadas. Ao tomar partido e “dar nomes aos bois” irrompem-se
as divisões e desigualdades existentes na realidade. Os incomodados tendem naturalmente
a querer calar quem os está incomodando. É a hora das perseguições que exigem
resistência. Confira a trajetória de vida dos/as mártires da caminhada: Padre
Josimo, Padre Ezequial Ramin, Chico Mendes, Margarida Alves, Sem Terra de
Eldorado dos Carajás, Irmã Dorothy, Santo Dias, Chicão Xucuru, Padre Gabriel
etc.
3.12 -
Resistir, o que não é violência, mas legítima defesa. Diante de qualquer
tirania e de um Estado violentador, vassalo do sistema capitalista que sempre
tritura vidas e pratica injustiças, é dever das pessoas cristãs resistirem
contras as opressões perpetradas contra os empobrecidos, os preferidos de
Jesus. Lucas, em Lc 22,35-38, sugere desobediência civil – econômica, política
e religiosa. Em uma sociedade desigual, esse é “outro caminho” a ser seguido
(cf. Mt 2,12) por nós, discípulos e discípulas de Jesus, o rebelde de Nazaré.
3.13 - Exercitar a Pedagogia da partilha de pães, a que
liberta e emancipa. A fome era um
problema tão sério na vida dos primeiros cristãos e cristãs, que os quatro
evangelhos da Bíblia relatam Jesus partilhando pães e saciando a fome do povo.[2]
É óbvio que não devemos historicizar os relatos de partilha de pães como se
tivessem acontecido tal como descrito. Os evangelhos foram escritos de quarenta
a setenta anos depois. Logo, são interpretações teológicas que querem ajudar as
primeiras comunidades a resgatar o ensinamento e a práxis original de Jesus.
Não podemos também restringir o sentido espiritual da partilha dos pães a uma
interpretação eucarística, como se a fome de pão se saciasse pelo pão
partilhado na eucaristia. Isso seria espiritualização do texto. Eucaristia,
celebrada em profunda sintonia com as agruras da vida, é uma das fontes que
sacia a fome de Deus, mas as narrativas das partilhas de pães têm como
finalidade inspirar solução radical para um problema real e concreto: a fome de
pão.
A beleza espiritual
das narrativas de partilha de pães está no processo seguido. Em uma série de
passos articulados e entrelaçados que constituem um processo libertador. O
milagre não está aqui ou ali, mas no processo todo. Ei-lo:
3.13.1 - Cidade, lugar de violência? Mateus mostra que o
povo faminto “vem das cidades”, ou seja, as cidades, ao invés de serem locais
de exercício da cidadania, se tornaram espaços de exclusão e de violência sobre
os corpos humanos. Faz bem recordar que Deus criou – e continua criando -, nas
ondas da evolução, tudo “em seis dias e no sétimo dia descansou.” Conta-se que
alguém teria perguntado a Deus porque ele resolveu descansar após o sexto dia.
Deus teria dito que já tinha criado tudo com muito amor e para o bem da
humanidade e de toda a biodiversidade. Quando viu que faltava criar a cidade, o
Deus criador concluiu que era melhor descansar.
3.13.2 - Ir para o meio dos excluídos e injustiçados. “Jesus atravessa para a outra margem do mar
da Galileia” (Jo 6,1), entra no mundo dos gentios, dos pagãos, dos impuros,
enfim, dos excluídos e injustiçados. Jesus não fica no mundo dos incluídos, mas
estabelece comunicação efetiva e afetiva entre os dois mundos, o dos incluídos
e o dos excluídos. Assim, tabus e preconceitos desmoronam-se.
3.13.3 - Nunca perder a capacidade de se comover e de se
indignar.
Profundamente comovido, porque “os pobres
estão como ovelhas sem pastor” (Mc 6,34), Jesus percebe que os governantes
e líderes da sociedade não estavam sendo libertadores, mas estavam colocando
grandes fardos pesados nas costas do povo. Com olhar altivo e penetrante, Jesus
vê uma grande multidão de famintos que vem ao seu encontro, só no Brasil são
milhões de pessoas que têm os corpos implodidos pela bomba silenciosa da fome
ou da má alimentação. -----------
3.13.4 - Ter postura crítica. Jesus não sentiu
medo dos pobres, encarou-os e procura superar a fome que os golpeava e
humilhava. Apareceram dois projetos para resgatar a cidadania do povo faminto.
O primeiro foi apresentado por Filipe: “Onde
vamos comprar pão para alimentar tanta gente?” (Jo 6,5). No mesmo tom,
outros discípulos tentavam lavar as mãos: “Despede
as multidões para que possam ir aos povoados comprar alimento.” (Mt 14,15).
Filipe está dentro do mercado e pensa a partir do mercado. Está pensando que o
mercado é um deus capaz de salvar as pessoas. Cheio de boas intenções, Filipe
não percebe que está enjaulado na idolatria do mercado.
3.13.5 - Ter postura criativa a partir dos injustiçados e
dos pequenos.
O segundo projeto é posto à baila por André, outro discípulo de Jesus, que,
mesmo se sentindo fraco, acaba revelando: “Eis
um menino com cinco pães e dois peixes” (Jo 6,9). Jesus acorda nos discípulos
e discípulas a responsabilidade social, ao dizer: “Vocês mesmos devem alimentar os famintos” (Mt 14,16). Jesus quer
mãos à obra. Nada de desculpas esfarrapadas e racionalizações que tranqüilizam
consciências. Jesus pulou de alegria e, abraçando o projeto que vem de André
(em grego, andros = humano), anima o
povo a “sentar na grama” (Jo 6,10).
Aqui aparecem duas características fundamentais do processo protagonizado por
Jesus para levar o povo da exclusão à cidadania, da injustiça à justiça. Jesus
convida o povo para se sentar. Por quê? Na sociedade escravocrata do império
romano somente as pessoas livres, cidadãs, podiam comer sentadas. Os escravos
deviam comer de pé, pois não podiam perder tempo de trabalho. Era só engolir e
retomar o serviço árduo. Um terço da população era escrava e outro terço,
semi-escrava. Logo, quando Jesus inspira o povo para sentar-se, ele está, em
outros termos, defendendo que os escravos têm direitos e devem ser tratados
como cidadãos.
3.13.6 - Organizar os oprimidos, pois organização é o
segredo da pedagogia de Jesus. Jesus estimula a organização dos famintos. “Sentem-se, em grupos de cem, de cinqüenta, ...” (Mc 6,40). Assim, Jesus e os primeiros
cristãos e cristãs nos inspiram que o problema da fome só será resolvido, de
forma justa, quando o povo marginalizado e injustiçado se organizar e partir
para lutas coletivas.
3.13.7 - Cultivar gratidão. “Jesus agradeceu a Deus...” A dimensão da
mística foi valorizada. A luz e a força divinas permeiam e perpassam os
processos de luta. Faz bem reconhecer isso. Vamos continuar cantando com
Manoelão cantos revolucionários, tal como: É
madrugada, levanta povo! / A luz do
dia vai nascer de novo! / Rompe as
cadeias, abre o coração,/ Vamos dar
as mãos, já é o reino do povo! / O
povo agora é senhor da historia, / Somos
rebentos desta nova era. / A
liberdade, a fraternidade. / São as
bandeiras desta nova terra!
3.13.8 - Não ser paternalista. Quem reparte o pão
não é Jesus, mas os discípulos. Jesus provoca a solidariedade conclamando para
a organização dos marginalizados como meio para se chegar à cidadania de e para
todos. Dar pão a quem tem fome sem se perguntar por que tantos passam fome é
ser cúmplice do capital que rouba o pão da boca da maioria.
3.13.9 - Reaproveitar. “Recolham
os pedaços que sobraram, para não se desperdiçar nada.” (Jo 6,12). Economia
que evita o desperdício. Quase 1/3 da alimentação produzida é jogada no lixo,
enquanto tantos passam fome. É hora de reduzir o consumo. Reaproveitar,
reciclar. Nada deve se perder, mas ser tudo transformado. Em uma casa ecológica
tudo é reaproveitado, inclusive as fezes são consideradas recursos, pois viram
adubo fértil e orgânico. É hora de reduzir a produção, reciclar,
reaproveitar...
3.14 - Participar
da vida pública transformando a sociedade (Lc 10,38-42).
Seguindo para Jerusalém, Jesus entra na casa de duas mulheres, Marta e
Maria. Tradicionalmente, a narrativa de Lc 10,38-42 tem sido interpretada como
uma oposição entre vida Ativa e vida contemplativa. Ao longo dos séculos e
ainda hoje, muitos usam e abusam de Lc 10,38-42 para justificar a vida
contemplativa, mas essa interpretação não tem consistência exegética. Não há
nenhuma referência no texto que diga que Jesus estivesse rezando ou orando com
Maria. Para entender bem Lc 10,38-42 é preciso considerar algumas coisas.
Primeiro, nas duas
perícopes anteriores, Lucas revelou uma oposição, um contraste: humildes X
entendidos (Lc 10,21-24) e samaritano X sacerdote e levita (Lc 10,29-37). Em Lc
10,38-42 também há uma oposição, um contraste: Maria X Marta. A postura de
Maria é elogiada por Jesus e a postura de Marta é censurada: “Marta, Marta! ... uma só coisa é necessária...”
(Lc 10,41-42).
Segundo, precisamos
considerar a situação das mulheres na época de Jesus e de Lucas. As mulheres
eram - não todas, é óbvio - propriedades do pai e, depois de casadas, dos
maridos; não participavam da vida pública, deviam ficar restritas ao lar; não
aprendiam a ler e a escrever; não recebiam os ensinamentos da Torá. Encontra-se escrito
no Talmud dos Judeus (Escritura não-sagrada): “Que as palavras da Torá sejam queimadas, mas não transmitidas às
mulheres”. A oração que muitos judeus piedosos rezavam dizia: “Louvado sejas Deus por não ter-me feito mulher!”
Ao sentar-se aos
pés de Jesus, para ouvir-lhe os ensinamentos, Maria reivindica para si o
direito de ser discípula. Ela reclama para si o direito de ser cidadã no
sentido pleno. “Sentar-se aos pés”
era a atitude dos discípulos dos rabis.
Em Lc 10,38-42,
Maria faz desobediência civil e religiosa, pois fica aos pés de Jesus
ouvindo-o. Só os homens judeus podiam ficar aos pés de um mestre e se tornarem
discípulos. Ouve Jesus e, provavelmente, dialoga com Jesus e o interroga, e se
torna discípula.
Um judeu entrar em
uma casa onde só havia mulheres também era algo censurável pela sociedade.
Jesus desobedece a essa regra moral e entra na casa de duas mulheres. Assim,
Jesus vai formando seus discípulos e discípulas enquanto caminha para
Jerusalém.
3.15
- Ser simples como as
pombas e espertos como as serpentes.
Após uma longa marcha da Galileia a
Jerusalém, da periferia à capital (Lc 9,51-19,27), Jesus e seu movimento estão
às portas de Jerusalém. De forma clandestina, não confessando os verdadeiros
motivos, Jesus e o seu grupo entram em Jerusalém, narra o Evangelho de Lucas
(Lc 19,29-40). De alguma forma deve ter acontecido essa entrada de Jesus em
Jerusalém, provavelmente não tal como narrado pelo evangelho, que tem também um
tom midráxico, ou seja, quer tornar presente e viva uma profecia do passado.
Dois
discípulos recebem a tarefa de viabilizar a entrada na capital, de forma
humilde, mas firme e corajosa. Deviam arrumar um jumentinho – meio de
transporte dos pobres -, mas deviam fazer isso disfarçadamente, de forma
“clandestina”. O texto repete o seguinte: “Se alguém lhes perguntar: “Por que
vocês estão desamarrando o jumentinho?”, digam somente: ‘Porque o Senhor
precisa dele’”. A repetição indica a necessidade de se fazer a preparação da
entrada na capital de forma clandestina, sutil, sem alarde. Se dissessem toda a
estratégia a entrada em Jerusalém seria proibida pelas forças de repressão.
Com os “próprios mantos” prepararam o
jumentinho para Jesus montar. Foi com o pouco de cada um/a que a entrada em
Jerusalém foi realizada. A alegria era grande no coração dos discípulos e
discípulas. “Bendito o que vem como rei...”
Viam em Jesus outro modelo de exercer o poder, não mais como dominação, mas
como gerenciamento do bem comum.
Ao ouvir o anúncio dos discípulos – um novo
jeito de exercício do poder – certo tipo de fariseu se incomoda e tenta sufocar
aquele evangelho. Hipocritamente chamam Jesus de mestre, mas querem
domesticá-lo, domá-lo. “Manda que teus
discípulos se calem.”, impunham os que se julgavam salvos e os mais
religiosos. “Manda...!” Dentro do paradigma “mandar-obedecer”, eles são os que
mandam. Não sabem dialogar, mas só impor. “Que se calem!”, gritam. Quem anuncia
a paz como fruto da justiça testemunha fraternidade e luta por justiça, o que
incomoda o status quo opressor. Mas
Jesus, em alto e bom som, com a autoridade de quem vive o que ensina,
profetisa: “Se meus discípulos (profetas)
se calarem, as pedras gritarão.” (Lc 19,40). Esse alerta do galileu virou
refrão de música das Comunidades Eclesiais de Base: “Se calarem a voz dos profetas, as pedras falarão. Se fecharem uns poucos caminhos, mil trilhas
nascerão... O poder tem raízes na areia, o tempo faz cair. União é a
rocha que o povo usou pra construir...!”
3.16 - Ser
intransigente diante da opressão econômica e política. Os quatro evangelhos da Bíblia[3]
relatam que Jesus, próximo à maior festa judaico-cristã, a Páscoa, impulsionado
por uma ira santa, invadiu o templo de Jerusalém, lugar mais sagrado do que os
templos da idolatria do capital que muitas vezes tem a cruz de Cristo pendurada
em um ponto de destaque. Furioso como todo profeta, ao descobrir que a
instituição tinha transformado o templo em uma espécie de Banco Central do país
+ sistema bancário + bolsa de valores, Jesus “fez um chicote de cordas e
expulsou todos do templo, bem como as ovelhas e bois, destinados aos
sacrifícios. Derramou pelo chão as moedas dos cambistas e virou suas mesas. Aos
que vendiam pombas (eram os que diretamente negociavam com os mais pobres
porque os pobres só conseguiam comprar pombos e não bois), Jesus ordenou:
‘Tirem estas coisas daqui e não façam da casa do meu Pai uma casa de negócio.”
Essa ação de Jesus foi o estopim para sua condenação à pena de morte, mas Jesus
ressuscitou e vive também em milhões de pessoas que não aceitam nenhuma
opressão.
4. Enfim...
Contamos com todas as pessoas cristãs para
vivenciar a Opção preferencial pelos Pobres e pelos Jovens, buscar alternativas
para a superação da atual crise socio-política-econômica-cultural e religiosa.
Apoiar firmemente a Economia Popular Solidária, as lutas pelas Reformas Agrária
e urbana, por agricultura familiar, por preservação ambiental, pela mudança do
atual modelo econômico neoliberal. Queremos um modelo econômico que seja
popular, democrático, soberano, justo e sustentável ecologicamente. Queremos
construir outro modelo de igreja, onde, de fato, a igreja seja Povo de Deus, em
comunidades que se relacionam em sistema de rede.
Apêndice.
Sugestão de textos e eventos bíblicos
libertadores que podem inspirar a vivência da Fé e Política e levarmos a sério os
apelos do testemunho e dos ensinamentos do papa Francisco:
1) Gn 1:
Toda a Criação é muito boa, imagem e semelhança de Deus.
2) Ex
1,15-22: O Movimento das parteiras faz Desobediência civil e religiosa. Cf.
Gandhi, Martin Luther King, as camponesas da Via Campesina.
3) Ex
3,7-10: Deus ouve o clamor dos oprimidos e faz opção pelos injustiçados.
4) Davi
vence Golias.
5) Is
65,17-25: Eis um novo céu e uma nova Terra.
6) Dn
2,31-37: Uma pedrinha destrói um gigante de pés de barro – a força da profecia.
7) Jo
6,1-15: Solução radical para a fome de pão – partilha de pães.
8) Mt
21,12-13: Jesus expulsa os capitalistas do Templo.
10) Ap 12,1-17: Uma mulher
grávida, em dores de parto, vence um Dragão.
11) At 21,1-7: Deus deixa o céu e
arma sua tenda no meio dos pobres.
Angra dos Reis, RJ, 13 de setembro de 2015.
Frei Gilvander Luís Moreira, gilvanderlm@gmail.com
www.freigilvander.blogspot.com.br
- www.gilvander.org.br Face:
Gilvander Moreira
[1] Frei e padre carmelita;
bacharel e licenciado em Filosofia pela UFPR, bacharel em Teologia pelo
ITESP/SP; mestre em
Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma,
Itália; doutorando em Educação pela FAE/UFMG; assessor da CPT, CEBI, SAB, PJR e
Via Campesina, em Minas
Gerais ; e-mail: gilvanderlm@gmail.com
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[2] Cf. Mt 14,13-21; Mc 6,32-44; Lc 9,10-17 e Jo 6,1-13.